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Série DEIXADOS PARA TRÁS
Sé rie de icçã o mais lida no mundo, Deixados Para Trá s vendeu mais de 70 milhõ es de
livros e foi traduzida para mais de 30 idiomas. A histó ria reú ne icçã o cristã , açã o e suspense
comlancesdealtatecnologianumtrillerdetirarofô lego.Otemaprincipalé nadamenosqueo
própriofinaldostempos.
TimLaHaye&JerryB.Jenkins
ASSASSINOS
MISSÃO:JERUSALÉM,ALVO:ANTICRISTO
Traduzidopor
MariaEmíliadeOliveira
UNITEDPRESS
Estaediçãoépublicadasobcontratocom
TyndaleHousePublishers,U.S.A.
OriginalmentepublicadoeminglêscomoAssassins
Copyright®1999TimLaHayeeJerryB.Jenkins.
Todososdireitosreservados.
LeftBehindéumatrademarkdaTyndaleHousePublishersInc.
Copyright®2001EditoraUnitedPress
Tradução:MariaEmiliadeOliveira
Revisão:
LiegeMariaMarucci
JosemardeSouzaPinto
JoãoGuimarães
Supervisãoeditorialedeprodução:VeraK.Villar
1aediçãobrasileira:2001
DadosInternacionaisdeCatalogaçãonaPublicação(CIP)
(CâmaraBrasileiradoLivro,SP,Brasil)
Jenkins,JerryB.
OsAssassinos/JerryB.Jenkins,TimLaHaye;TraduçãoMariaEmiliadeOliveira.—Campinas,
SP:EditoraUnitedPress,2001.
Títulooriginal:Assassins.
ISBN85-243-0234-8
1.Ficçãonorte-americanaI.Jenkins,JerryB.II.Título01-0768CDD-813-5
Índicesparacatálogosistemático:
1.Ficção;século20:Literaturanorte-americana813
2.Século20:Ficção:Literaturanorte-americana813
PublicadonoBrasilcomadevidaautorizaçãoecomtodososdireitosreservadospela
EDITORAUNITEDPRESSLTDA.
RuaTaquaritinga,118,13.036-530
Campinas—SP
Fone/Fax(0xx19)3278-3144
Visiteonossosite:www.unitedpress.com
O COMANDO TRIBUTAÇÃO CAMINHA PERIGOSAMENTE AO ENCONTRO DOS QUATRO
ASSASSINOS PREDITOS NA BÍBLIA.
A vida do chefe da Fé Mundial Enigma Babilô nia está por um io. As duas testemunhas
diante do Muro das Lamentaçõ es també m tê m suas vidas ameaçadas, à medida que o "tempo
determinado" se aproxima. O anticristo sofrerá um ferimento mortal na cabeça, conforme
indicamasprofecias.
Enquanto um exé rcito sobrenatural de 200 milhõ es de cavaleiros demonı́acos extermina
um terço da populaçã o restante, os membros do Comando Tributaçã o se preparam para viver
comofugitivos...
Rayford e o mais recente membro do Comando Tributaçã o sã o agredidos nos Estados
Unidos pelos guardas de segurança da Comunidade Global... Mac e seu novo co-piloto sã o
atacados a bordo do Condor 216 na Africa... Hattie é presa na Bé lgica... Rayford cai em uma
armadilha na França, escapa por um triz de um fuzilamento e dos aviõ es de caça da
Comunidade Global em Al Basrah e planeja uma forma de liquidar o anticristo. Nesse meiotempo,váriasoutraspessoasesforçam-separateromesmo"privilégio".
Ahistó riamundialeasprofeciasentramemcon litoemJerusalé m,nomeiodoperı́ododa
Tributação,eprovocamomaisexplosivodosepisódios.
Tudo isso e muito mais num drama cheio de açã o e suspense que tem como palco o
mundodosúltimosdiasecomodiretoroDeusquedirigeaHistória.
Acompanhe os passos seguintes do eletrizante seriado daqueles que foram deixados para
trás.
O PERÍODO DA TRIBUTAÇÃO COMPLETA 38 MESES.
O MUNDO CONTINUA A SOFRER OS DUROS GOLPES DO JULGAMENTO DIVINO, TAL A
CEGUEIRA ESPIRITUAL DOS HOMENS, TOTALMENTE OBSTINADOS EM SEUS
DESCAMINHOS!
"E quando abriu os olhos, Tsion Ben-Judá pensou, a princípio, que estaria sonhando.
Tomandocontadeseucampodevisão,dooutroladodavidraça,umimensoexércitodecavaleiros
estava preparado para guerrear... Centenas e centenas de milhares, cavalgando, cavalgando. As
cabeças dos cavalos assemelhavam-se a cabeças de leões, e eles expeliam fogo e fumaça pela
boca... Em pleno dia, com o sol da primavera a pino, esse fenomenal exército parecia irado e
determinado.Suascouraçascoloridasbrilhavam,esuasenormescavalgadurasmovimentavam-se
fazendoumruídoestrondoso,ganhandovelocidadeepassandodotroteparaogalopeedogalope
paraumacorridadesenfreada.
Parecia que o tempo deles havia chegado... A cavalaria demoníaca, que só pouparia os
escolhidos de Deus, disparou para atacar, deixando um rastro de terror e morte sobre toda a
Terra..."
Assassinos é o sexto livro sobre o drama dos que foram deixados para trá s no
Arrebatamento.Oscincoprimeirostı́t ulosdasé riebateramrecordesderapidezemvendasna
categoriadelivroscristãosdeficção.Oquintolivro,Apoliom,figurounaslistasdosmaisvendidos
doNew York Times, Wall Street Journal, USA Today, Publishers Weekly, Dallas Morning News,
ChicagoTribuneeoutros,bemcomonaslistasdossitesamazon.comebarnesandnoble.com.
"Oscristãosdependemcadavezmaisdainternetparacomunicar-sesecretamente,ecresce
entre eles aidéia de usar a violência como meio de lutar contra as forças malignas que tomam
conta do mundo. Mas o mundo é atacado por gafanhotos demoníacos, uma praga divina enviada
paradestruiraquelesquenãotêmoselode Deus na testa; essa praga dá aos cristãos um pouco
mais de tempo para resolver suas crises pessoais, tudo isso descrito de maneira tão envolvente
que prenderá a sua atenção, leitor, da primeira até a última página." Comentá rio dosite
Amazon.comsobreApoliom.
AoDr.JohnF.Walvoord
que,pormaisde50anos,
temajudadoamanteracesa
atochadaprofecia
O PERÍODO DA TRIBULAÇÃO COMPLETA 38 MESES
OSCRENTES
RayfordSteele: cerca de 45 anos de idade; ex-capitã o-aviador do 747 das Linhas Aé reas
Pan-Continental; perdeu esposa e ilho no Arrebatamento; ex-piloto do potentado da
Comunidade Global, Nicolae Carpathia; membro-fundador do Comando Tribulaçã o; tornou-se
umfugitivointernacionaleagoraviveexiladonacasasecretaemMonteProspect,Illinois
Cameron("Buck")Williams: pouco mais de 30 anos; ex-articulista sê nior doSemanário
Global; ex-editor doSemanário Comunidade Global, de propriedade de Carpathia; membrofundador do Comando Tribulaçã o; editor da revista virtualAVerdade; fugitivo exilado na casa
secreta
ChloeSteeleWilliams:poucomaisde20anos;ex-alunadaUniversidadeStanford;perdeu
amã eeoirmã onoArrebatamento; ilhadeRayford;esposadeBuck;mã edeKennyBruce,um
bebêdedezmeses;presidentedaCooperativaInternacionaldeMercadorias,associaçãosecreta
composta de crentes; membro-fundadora do Comando Tribulaçã o; fugitiva exilada na casa
secreta
Tsion Ben-Judá: cerca de 50 anos; ex-estudioso das doutrinas dos rabinos e estadista
israelense; revelou sua conversã o a Cristo pela TV em um programa levado ao ar
internacionalmente, o que provocou o assassinato de sua esposa e de dois ilhos adolescentes;
fugiuparaosEstadosUnidos;professorelı́derespiritualdoComandoTribulaçã o;suaspregaçõ es
diárias,viaInternet,alcançammaisdeumbilhãodepessoas;residenacasasecreta
Dr.FloydCharles: cerca de 40 anos; ex-mé dico da Comunidade Global; exilado na casa
secreta
Mac McCullum: cerca de 60 anos; piloto de Nicolae Carpathia; reside no palá cio da
ComunidadeGlobal,naNovaBabilônia
David Hassid: cerca de 25 anos; diretor de compras/ embarque/recebimento de
mercadoriasdaComunidadeGlobal;residenopaláciodaCG,naNovaBabilônia
Leah Rose: cerca de 40 anos; enfermeira-chefe do Arthur Young Memorial Hospital,
Palatine,Illinois;morasozinha
Tyrola ("T") Mark Delanty: beirando os 40 anos; proprietá rio/diretor do Aeroporto de
Palwaukee,Wheeling,Illinois
Sr.eSra.Lukas(Laslos)Miklos:cercade45anos;magnatasdoramodemineraçã ode
linhito;residemnaGrécia
AbdullahSmith:30epoucosanos;ex-pilotodeaviõesdecaça;residenaJordânia
OSINIMIGOS
NicolaeCarpathia: cerca de 35 anos; ex-presidente da Romê nia; ex-secretá rio-geral da
Organizaçã o das Naçõ es Unidas; autodesignado Potentado da Comunidade Global; reside no
paláciodaCG,naNovaBabilônia
Leon Fortunato: cerca de 50 anos; braço direito de Carpathia; supremo comandante;
residenopaláciodaComunidadeGlobal,naNovaBabilônia
Peter Mathews: beirando os 50 anos; ex-cardeal da arquidiocese de Cincinnati;
autodesignadoSumoPontíficePeterII,chefedaFéMundialEnigmaBabilônia;residenoPalácio
doTemplonaNovaBabilônia
OSINDECISOS
HattieDurham:30anos;ex-comissá riadebordodasLinhasAé reasPan-Continental;exassistentepessoaldeNicolaeCarpathia;residenacasasecreta
Dr.ChaimRosenzweig:beirandoos70anos;botâ nicoeestadistaisraelense;descobridor
da fó rmula que fez lorescer os desertos de Israel; recebeu o tı́t ulo de Homem do Ano pelo
SemanárioGlobal;resideemJerusalém
PRÓLOGO
TrechosExtraídosdeApoliom
Um grande nú m ero de igrejas nos lares havia surgido da noite para o dia,
espontaneamente, organizadas por judeus convertidos, que faziam parte das 144.000
testemunhaseassumiramaposiçã odelı́derescristã os.Elestransmitiamensinamentosdiá rios,
com base nos sermõ es e aulas virtuais do talentoso Tsion Ben-Judá . Dezenas de milhares de
igrejas clandestinas nos lares, cuja existê ncia era de conhecimento de todos, inclusive da Fé
Mundial Enigma Babilô nia, viam, diariamente, corajosos convertidos sendo admitidos em seu
meio...
Já havia muito tempo que Buck Williams transmitia anonimamente uma revista
eletrônica,viaInternet,intituladaAVerdade,quepassariaaseroúnicomeiodedarvazãoaseu
talentoparaescrever.Ironicamente,arevistaatraiuumnú m erodezvezesmaiordeleitoresdo
que ele possuı́a noSemanário Comunidade Global. Buck preocupava-se com sua segurança,
evidentemente,porémmaiscomadesuaesposaChloe...
Nicolae Carpathia passou a recitar sua ladainha de realizaçõ es, discorrendo sobre a
reconstruçã odascidades,estradaseaeroportos,até chegarà miraculosareconstruçã odeNova
Babilônia,transformadaagoranacidademaisdeslumbrantequejáexistiunafacedaTerra.
— Trata-se de uma obra-prima, e espero que você s a visitem o mais breve possı́vel —
disseCarpathia.
Elemencionouosistemadesaté litecelular-solar(Cel-Sol),quepermitiaqueaspessoasse
comunicassempelotelefoneepelaInternet,independentementedehorá riooulocal.Tudoisso
faziapartedainfra-estruturanecessáriaparaNicolaegovernaromundo...
Chegaria o dia em que a cruz na testa seria algo muito signi icativo entre os santos da
tribulaçã o. Até mesmo o simples gesto de apontar para o cé u atrairia a atençã o das forças
inimigas.
O problema era que també m chegaria o dia em que o povo do outro lado teria, de igual
modo, uma marca, visı́vel a todos. De acordo com a Bı́blia, aqueles que nã o ostentassem a
"marcadabesta" icariamimpedidosdecomprarouvenderqualquercoisa.Ograndenú m erode
santosdatribulaçãoteriadeorganizarummercadoclandestinoparaconseguirsobreviver...
O supremo comandante da Comunidade Global, Leon Fortunato, apresentou Sua
Excelê ncia, o potentado Nicolae Carpathia, aos telespectadores do mundo inteiro. Tsion BenJudá advertira Rayford de que, em breve, os poderes sobrenaturais de Nicolae seriam
evidenciadoseaté mesmocomcertoexagero,preparandooterrenoparaeleseautoproclamar
deusduranteasegundametadedaTribulação...
Gargalhadas ou brincadeiras haviam deixado de fazer parte da vida do Comando
Tribulaçã o. O sofrimento era desgastante demais, pensava Rayford. Ele aguardava com
ansiedade o dia em que Deus enxugaria as lá grimas dos olhos de seu povo, o dia em que nã o
haveriamaisguerras...
—Sintomuitacompaixã oporvocê —disseTsionaHattie.-Eugostariamuitoquevocê
aceitasseJesus.—Orabinonãoconseguiuprosseguir.
Hattiefranziuatesta,olhandofirmeparaele.
— Perdoe-me — ele conseguiu dizer em voz baixa, depois de beber um pouco de á gua
paratentarrecompor-se.Lá grimascomeçaramacorrerporseurosto.—Deusmeconcedeua
graça de poder enxergá -la do jeito como Ele a vê ... uma jovem assustada, com raiva e
desiludida,quetemsidousadaeabandonadapormuitagente.Deusaamacomumamorpuro.
Certavez,Jesusolhouparaaspessoasqueocercavamedisse:"Jerusalé m,Jerusalé m,quematas
os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir os teus ilhos,
comoagalinhaajuntaosseuspintinhosdebaixodasasas,evó snã ooquisestes!"Srta.Durham,
você conhece a verdade. Eu a ouvi dizer que conhece. E, mesmo assim, nã o está disposta a
aceitá -la... Olho para você , uma jovem de delicada e rara beleza, e vejo o que a vida lhe fez.
Gostaria muito que você tivesse paz. Penso no quanto você poderia fazer pelo Reino de Deus
nestestemposperigososqueatravessamoseestouansiosoparaquefaçapartedenossafamı́lia.
Receioquevocêestejaarriscandoavidapornãoentregá-laaDeusenãogostariadevê-lasofrer
antesqueEleaalcancecomsuamisericórdia.
A vida de Rayford como piloto de vô os comerciais parecia ter-se perdido no tempo. Era
difı́c il acreditar que, pouco menos de trê s anos atrá s, ele era um marido comum e pai como
outroqualquer,cujaú nicapreocupaçã ogiravaemtornodesaberquandoseriaseupró ximovô o
eparaonde.Rayfordnã opodiaqueixar-sedenã oternadaimportanteparaocuparseutempo.E
quantolhecustouchegaraesseponto!Eleentendiamuitobemaposiçã odeTsion.Sedirigiro
ComandoTribulaçã oeraumatarefadifı́c ilparaumcidadã ocomumcomoRayford,muitomais
complexaeraamissãodeliderar144.000testemunhasepregaraumbilhãodenovoscrentes...
Buck adorava conversar com Tsion. Eles haviam atravessado muitos momentos difı́c eis
juntos. De repente, Buck se deu conta de estar reclamando das complicaçõ es da gravidez de
Chloe a um homem cuja esposa e ilhos haviam sido assassinados. Tsion, contudo, possuı́a
sabedoriaeumavisãoclaradosproblemasdasoutraspessoas,esabiacomoacalmá-las...
—Opró ximoJulgamentodasTrombetasserá osexto—disseBuck.—Oquevocê tema
dizersobreele?
Tsiondeuumlongosuspiro.
—Opontofundamental,Cameron,é umexé rcito,compostode200milhõ esdecavaleiros,
queexterminaráaterçapartedapopulaçãodomundo.
Bucknãosabiaoquedizer.Eleleraaprofecia,masnuncahaviaassimiladosuaessência.
—Quepalavradeâ nimovocê dariaaopovodepoisquetodossouberemoqueterã opela
frente?—perguntouBuck.
— Direi apenas que todo o sofrimento pelo qual passamos e todo o horror que
presenciamospassarãoaserinsignificantesdiantedopróximojulgamento.
—Eosseguintesserãopioresainda?
—Edifı́c ilimaginarmos,nã o?Apenasaquartapartedaspessoasqueforamdeixadaspara
trá snoArrebatamentosobreviverá até odiadoGloriosoAparecimento,Cameron.Eunã otenho
medo da morte, mas peço a Deus todos os dias que me conceda o privilé gio de vê -lo retornar
para estabelecer seu Reino na Terra. Se Ele me levar antes disso, estarei reunido com minha
famíliaemeusamigos,mas,oh!comoserágrandeaalegriadeestaraquiquandoJesuschegar!
"Oprimeiroaipassou.Eisque,depoisdestascoisas,vêmaindadoisais.
Osextoanjotocouatrombeta,eouviumavozprocedentedosquatroâ ngulosdoaltarde
ouroqueseencontranapresençadeDeus,dizendoaosextoanjo,omesmoquetematrombeta:
SoltaosquatroanjosqueseencontramatadosjuntoaogranderioEufrates.
Foram,entã o,soltososquatroanjosqueseachavampreparadosparaahora,odia,omê s
eoano..."Apocalipse9.12-15
CAPÍTULO1
Indignação.
NãohaviaoutrapalavraparadescreverosentimentodeRayford.
Elesabiaquetinhamuitosmotivosparaseragradecido.NemIrene—suaprimeiraesposa
durante21anos—nemAmanda—suasegundaesposadurantemenosdetrê smeses—teriam
de passar por mais sofrimentos neste mundo. Raymie també m estava no cé u. Chloe e o bebê
Kennygozavamdeboasaúde.
Istodeveriaserosu iciente.Mesmoassim,apalavraesgotamento,tã ousadaatualmente,
passaraafazerpartedavidadeRayford.Elesaiuimpulsivamentedacasasecreta,emumafria
manhã de segunda-feira do mê s de maio, sem se importar em pegar um agasalho. Seu mau
humornãotinhanadaavercomaspessoasquemoravamnacasasecreta.
Hattiecontinuavaaagirdemaneiraegoı́sta,choramingandopornã opodersairdalie,ao
mesmotempo,recuperandoasforças.
— Você acha que nã o vou conseguir — ela lhe dissera durante uma das sessõ es de
exercíciosabdominais.—Vocêtemamaniademesubestimar.
—Nãotenhodúvidadequevocêpodecometeraloucuradetentar.
—Masvocênãomelevariaatéládeaviãopornadadestemundo.
—Dejeitonenhum.
Rayford caminhou com di iculdade pelo terreno acidentado até aproximar-se de uma
ileiradeá rvoresqueseparavaoquerestaradacasasecretadosescombrosdascasasvizinhas.
Ele parou e esquadrinhou o horizonte. Sentir raiva era uma coisa. Ser idiota era outra
completamentediferente.Nã ofazianenhumsentidorevelaroesconderijodelessó pararespirar
umpoucodearfresco.
Apesardenã oavistarnadanemningué m,procurou icarmaispertodasá rvoresdoquedo
terreno descampado. Que diferença de um ano e meio atrá s! Aquela á rea toda havia sido, um
dia, um bairro que se estendia por muitos quilô m etros. Agora nã o passava de uma porçã o de
montes de entulho produzidos pelo terremoto, um local abandonado adequado a fugitivos e
necessitados. Rayford era um fugitivo havia meses. Em breve, entraria na categoria dos
necessitados.
Umafú riasanguiná riaameaçavadevorá -lo.Seuraciocı́niofrioecalculistacon litavacom
suasemoçõ es.Eleconheciaoutraspessoas—sim,Hattieinclusive—quesentiamumimpulso
igualaoseu,ouaté maior.Mesmoassim,RayfordimploravaaDeusquelheconcedesseaquela
oportunidade.Elequeriaseroautordaqueleato.Acreditavaqueesseeraoseudestino.
Rayford balançou a cabeça de um lado para o outro e encostou-se em uma á rvore,
cocando as costas em sua grossa casca. Onde estavam o aroma da grama recé m-aparada e a
algazarra das crianças brincando no quintal? Nada era como antes. Ele fechou os olhos e
repassou seu plano mais uma vez. Entrar disfarçado no Oriente Mé dio. Posicionar-se no lugar
certo, no momento certo. Ser a arma de Deus, o instrumento da morte. Matar Nicolae
Carpathia.
DavidHassidincumbiu-sedeacompanharohelicópterodaComunidadeGlobalquepegaria
umacargaenormedecomputadoresdestinadaaopalá ciodopotentado.Metadedopessoalda
CG que trabalhava no departamento de Hassid estava encarregada de passar as pró ximas
semanas realizando uma minuciosa busca para encontrar o local de onde partiam os
ensinamentosdiáriosdeTsionearevistaeletrônicadeBucktransmitidaviaInternet.
Opotentadotinhapressaequeriasaberemquantotempooscomputadorespoderiamser
instalados.
— Podemos calcular meio dia para desembarcarmos a carga, colocá -la no helicó ptero e
trazê -la para cá diretamente do aeroporto — dissera David a Carpathia. — Depois de
desembarcá-lanovamente,levaremosmaisunsdoisdiasparaacomodaçãoeinstalação.
Carpathia começou a estalar os dedos assim que a palavra "meio dia" foi proferida por
David.
—Queroquesejamaisrápido—eledisse.—Existemcondiçõesdereduziressetempo?
—Ocustoseriabemmaisalto,masosenhorpoderia...
—Nãoestoupreocupadocomcustos,Sr.Hassid.Querorapidez.Rapidez.
—Ohelicó pteropoderiapegaracargatodaedeixá -ladoladodeforadosetordeentrada
demercadorias.
—Isso—disseCarpathia.—Sim,éisso.
—Eugostariadesupervisionarpessoalmentearetiradaeaentrega.
Carpathia,quevoltaraaconcentrar-seemoutroassunto,dispensouDavidcomumaceno.
—Claro—eledisse.—Façacomoquiser.
DavidligouparaMacMcCullumpelotelefonesigiloso.
—Funcionou—eledisse.
—Quandovamoslevantarvôo?
—Omaistardepossível.Temosdedeixartransparecerquehouveumerro.
Macdeuumarisadinha.
—Vocêconseguiuumjeitodefazeromaterialserentreguenapistaerrada?
—Claro.Eudisseaelesumacoisa,enosdocumentosconstaoutra.Elesvã ofazeroque
ouviram. Os documentos vã o servir de prova a meu favor perante os dois trapalhõ es: Abbott e
Costello(CarpathiaeFortunato).
—Fortunatocontinuacontrolandovocê?
—Comosempre,masnemelenemNicolaesuspeitamdenada.Osdoistambé madoram
você,Mac.
—Eeunãosei?Precisamosfazerestacoisavoaratéondeelanospossalevar.
Rayfordnã otinhacoragemdediscutirseussentimentoscomTsion.Orabinoestavamuito
atarefado,eRayfordsabiaoqueelediria:"Deustemseusplanos.Deixetudonasmãosdele."
Poré m,quemalhaveriaseRayforddesseumaajuda?Eleestavadisposto.Tinhacondiçõ es
defazê -lo.Poderiacustar-lheavida,masedaı́?Elesereuniriaà suaesposae ilho.Maistarde,
outrossereuniriamaele.
Rayfordsabiaqueseuplanoeraumaloucura.Elenuncasedeixaralevarporsentimentos.
Talvezessamudançativesseocorridoporeleestarforadecirculação,isolado,sempoderagir.O
medo e a tensã o que sentiu durante os meses em que trabalhou como piloto de Carpathia
valeram a pena, porque a aproximaçã o que teve com aquele homem havia sido muito ú t il ao
ComandoTribulação.
Operigoqueeleenfrentavaagoranã oeraomesmo,comopilotoprincipaldaCooperativa
Internacional de Mercadorias, ú nica entidade capaz de sustentar materialmente os crentes
quandoaliberdadedecompraevendalhesfossevetada.Porora,Rayfordestavaapenasfazendo
contatos, programando roteiros, trabalhando para sua ilha. Ele precisava permanecer no
anonimatoeaprenderemquemcon iar.Asituaçã onã oeramaiscomoantes.Elenã osesentia
tãonecessárioàcausadeDeus.
MaspoderiaseroautordoassassinatodeCarpathia!
Que brincadeira era aquela? O assassino de Carpathia seria sentenciado à morte sem
julgamento.EseCarpathiafossedefatooanticristo—comomuitaspessoasacreditavam,com
exceçã o de seus seguidores -, ele nã o permaneceria morto. O homicı́dio só serviria para
prejudicarRayford,nã oCarpathia.Nicolaevoltariaà cenamaisheró icodoquenunca.Poré m,o
fato de Rayford saber que o assassinato deveria ocorrer de qualquer maneira e que ele pró prio
tinhacondiçõesdecometê-lo,dava-lheummotivoparaviver.Etambémparamorrer.
Seu neto, Kenny Bruce, lhe roubara o coraçã o, mas o nome da criança fazia Rayford
lembrar-se das perdas dolorosas que sofrerá . Ken Ritz lhe deu provas de ter sido um amigo de
verdade. Rayford aprendeu muito com Bruce Barnes, seu primeiro mentor, apó s ter recebido
dasmãosdeleovideoteipequeofezaceitaraCristo.
Entã o era isso! Eram aquelas perdas que haviam produzido tanta ira, tanta indignaçã o
dentro dele. Rayford sabia que Carpathia nã o passava de um simples fantoche nas mã os de
Sataná s, fato este que fazia parte do plano de Deus havia muitos sé culos. Mas o homem tinha
provocado tantas tragé dias, causado tantas destruiçõ es, fomentado tanto sofrimento, que
Rayfordnãopodiadeixardeodiá-lo.
Rayford nã o queria permanecer insensı́vel à s catá strofes, mortes e devastaçõ es que
passaram a ser fatos comuns. Ele queria continuar vivo, sentindo-se agredido, ofendido. A
condiçã odevida,quejá eramá ,setornariacadavezpior,eocaossemultiplicariadiaapó sdia.
Tsiondisseraqueasituaçã oatingiriaopontoculminantenametadedosseteanosdetribulaçã o,
daliaquatromeses.Aseguir,viriaaGrandeTribulação.
Rayfordgostariamuitodesobreviveraoperı́odointeirodosseteanosparatestemunharo
gloriosoaparecimentodeCristo,quandoEleestabeleceriaseureinodemilanosnaTerra,mas
quaiseramasprobabilidades?Tsionensinaraque,quandomuito,apenasumquartodapopulação
deixada para trá s no Arrebatamento sobreviveria até o im, e que aqueles que sobrevivessem
desejariamnãotertidoessaoportunidade.
Rayford tentou orar. Será que Deus responderia à sua oraçã o, lhe daria permissã o,
esboçaria o plano em sua mente? Mas ele sabia que sua estraté gia era apenas uma forma de
sentir-sevivo.Mesmoassim,elaoconsumiapordentro,dando-lhemotivoatépararespirar.
Elenã otinhaoutrarazã oparaviver.Amavasua ilha,seugenroeseuneto,massentia-se
responsá vel por Chloe nã o ter sido arrebatada. A ú nica famı́lia que lhe restara enfrentaria o
mesmomundoqueele.Quefuturoosaguardava?Elenã oqueriapensarnisso.Só queriapensar
nasarmasàsquaiseleteriaacessoeemcomousá-lasnomomentocerto.
PoucoantesdoanoitecernaNovaBabilônia,Davidrecebeuumtelefonemadogerenteque
controlavaasrotasdosaviões.
—Opilotoquersaberseeledevepousarnapistaouno...
—Eujálhedeiasinstruções!Digaaeleparacumprirasordensrecebidas!
—Senhor,noavisodeembarqueconsta"pistadopalá cio".Maseleachaqueosenhorlhe
disseparapousarnoAeroportodaNovaBabilônia.
Davidfezumapausacomoseestivessezangado.
—Vocêentendeuoqueeudisse?
—Osenhordisseaeroporto,mas...
—Obrigado!Qualéohorárioprevistodachegada?
—Trintaminutosatéoaeroporto.Quarentaecincoatéapista.Sóentãovoupoder...
DavidbateuotelefoneeligouparaMac.Meiahoradepois,elesestavamsentadosdentro
do helicó ptero na pista do palá cio. Evidentemente, o aviã o que transportava os computadores
nãoseencontravaali.Davidligouparaoaeroporto.
—Digaaopilotoondeestamos!
—Cara—disseMac-,você pô stodomundoacorrerdeumladoparaooutro,semsaber
oquefazer.
—Você achaqueeuiacolocaroscomputadoresnovosnafrentedosmelhoresté cnicosde
informáticadomundo,vasculhandotudoparaencontraracasasecreta?
Mac sintonizou o rá dio na freqü ência do aeroporto e ouviu a instruçã o transmitida ao
pilotodoaviã odecargaparaqueelepousassenapistadopalá cio.EleolhouparaDavidcomar
deindagação.
—Paraoaeroporto,jóqueivoador—disseDavid.
—Vamoscruzarcomelenoar.
—Esperoquesim.
Eelescruzaram.Finalmente,Davidtevepenadopiloto,garantindo-lhequeeleeMacnã o
sairiamdali,einstruiu-oavoltar.
Um guindaste ajudou a descarregar os computadores, e Mac manobrou o helicó ptero na
posiçã o correta para erguer a carga. O encarregado da carga engatou as caixas a um cabo de
aço, disse a Mac que o helicó ptero tinha tamanho e força su icientes para transportar os
computadores,einstruiu-osobrecomodescarregá-los.
—Osenhortemautorizaçãoparalivrar-sedacargaemcasodeemergência—eledisse-,
masnãodeveráterproblemas.
MacagradeceueolhouderelanceparaDavid.
— Você nã o teria coragem de... — ele disse, balançando a cabeça de um lado para o
outro.
—Claroquetenho.Estaalavancaaqui?Podedeixarqueeutomocontadela.
CAPÍTULO2
Pouco antes do meio-dia, Buck sentou-se diante de seu computador no amplo abrigo
localizadodebaixodacasasecreta.Ele,seusogroeoDr.Charleshaviamfeitoamaiorpartedos
trabalhosdeescavação.ODr.Ben-Judáseofereceraparaajudar,maseleeracomprovadamente
um homem talhado para obras intelectuais e para passar a maior parte dos dias com os olhos
grudadosdiantedateladocomputador.
BuckeosoutrosoincentivaramaseconcentraremseuimportantetrabalhoviaInternet,
doutrinandograndenú m erodenovoscrentesefazendoapelosparaqueoutrosseconvertessem.
Tsion deixara claro que estava se sentindo um folgado por deixá -los fazer o trabalho pesado
enquantoeleseocupavadotrabalhosuaveemumdoscô m odosdopavimentosuperior.Durante
dias,insistiraparaajudarosoutrosacavar,aensacaraterraeatransportaroentulhodoporã o
paraosterrenosvizinhos.Seuscompanheirosdisseram-lhequepoderiamprosseguirsemaajuda
dele,queolocalestavaatravancadodemaisparacomportarquatro
homens trabalhando, que o ministé rio de Tsion era muito importante para ser retardado
porcausadeumatarefabraçal.
Bucklembrou-se,comumsorriso,doqueRayforddisseraaTsion:
— Você é o mais velho, nosso pastor, nosso mentor, nosso intelectual, mas, com a
autoridade que meu cargo me confere por ser o mais antigo desta corporaçã o, sou eu quem
comandaatropa.
Tsionendireitaraocorponoporã oabafado, icandoemposiçã odesentidoe ingindouma
expressãodemedo.
—Sim,senhor—eledisse.—Qualéminhamissão?
—Permanecerlongedaqui,meucaro.Você temasmã osmaciasdeumhomemculto.E
claroquenóstambémtemos,masvocêestásobrandoaqui.
— Ora, Rayford — disse Tsion enxugando a testa com a manga da camisa — , pare de
caçoardemim.Sóestouquerendoajudar.
Buck e o mé dico pararam de trabalhar e continuaram a brincadeira que Rayford iniciara
comTsion.
— Dr. Ben-Judá — disse Floyd Charles -, todos nó s achamos que o senhor está perdendo
tempo,oumelhor, nósestamosgastandoseutempopermitindoqueosenhortrabalheaqui.Por
favor,tranqüilizenossasconsciênciasenosdeixeterminarestetrabalhosozinhos.
FoiavezdeRayfordfingir-seofendido.
—Ondeficaminhaautoridade?—eledisse.—Eudeiumaordem,eodoutoraindatemde
convencê-loaobedecer!
— Cavalheiros, percebi que você s estã o falando sé rio — disse Tsion, acentuando mais
aindaseusotaqueisraelense.
—Finalmente!—disseRayfordlevantandoasduasmãos.-Agoraeleentendeu.
Tsion subiu a escada, resmungando "continuo a achar que nã o está certo", poré m nunca
maistentaraajudarnasescavações.
Buck icou impressionado ao ver o entrosamento que havia entre eles trê s. Rayford era o
maisastutotecnicamentefalando;Buck,à svezes,eraanalı́t icodemaiseFloyd—apesardeter
diplomademé dico—pareciacontentar-seemfazeroquelhemandavam.Buckbrincavacom
eleporisso,dizendoquesempreimaginouqueosmé dicossabiamtudo.Floydnã orevidava,mas
també mnã oachavagraçanoqueBuckdizia.Naverdade,Floyddemonstravaseraquelequese
cansava primeiro, mas nunca fazia corpo mole. Ele apenas parava um pouco para recuperar o
fôlego,passavaasmãospeloscabelosecocavaosolhos.
Rayford esquematizava o trabalho diá rio por meio do esboço de uma planta baseada em
informaçõ escolhidasdeduasfontes.Aprimeiravinhadasanotaçõ esemcadernosespiraisfeitas
peloprimeiroproprietá riodolocal,DonnyMoore,quemorreraesmagadosobosescombrosda
igreja durante o grande terremoto da ira do Cordeiro ocorrido quase 18 meses antes. Buck e
Tsion encontraram o corpo da esposa de Donny na sala que desabara no fundo da casa, onde o
casalcostumavatomarocafédamanhã.
Aparentemente,Donnyhaviafeitoplanosparaofuturo,imaginandoque,umdia,eleesua
esposa teriam de viver isolados do mundo. Quer fosse por temer uma precipitaçã o radioativa
provocada por explosã o nuclear, quer fosse por precisar esconder-se das forças da Comunidade
Global, ele havia elaborado um plano muito arrojado. A ampliaçã o do pequeno e ú m ido porã o
nos fundos da casa estendia-se até o outro lado da casa geminada, chegando até parte do
quintal.
A outra fonte que Rayford consultara foi o plano original de Ken Ritz, morto há alguns
meses, para dar um toque mais aperfeiçoado ao local. Ken enganara a todos com sua imagem
de piloto simpló rio e rú stico. Na verdade, ele era diplomado pela Escola de Economia de
Londres, possuı́a autorizaçã o para pilotar aviõ es a jato e — conforme mostravam os projetos
que desenhou sobre o porã o — provou ser um arquiteto autodidata. Ken havia elaborado um
plano mais detalhado para o processo de escavaçã o, deslocara as vigas de sustentaçã o
projetadasporDonnyeidealizaraumacentraldecomunicaçõ es.Quandotudoestivessepronto,
o abrigo nã o seria detectado por ningué m. Os vá rios comunicadores via saté lite, os
transmissoresereceptorescelulareseasconexõ esentrecomputadoresseriamacessadoscom
facilidade.
Enquanto Buck trabalhava com Rayford e o mé dico, e Tsion escrevia suas magistrais
missivasdiá riasparasuaaudiê nciaglobal,ChloeeHattieocupavam-sedeseusafazeres.Hattie
aproveitava cada momento livre, esforçando-se furiosamente para recuperar a saú de e o peso
queperdera.Buckpreocupava-se,imaginandoqueelaestivessedeterminadaaaprontaralguma
coisa.Normalmente,elaestava.Ninguémdogruposabiaaocertoseelajánãohaviadivulgadoo
local da casa secreta, com suas tentativas para viajar a qualquer custo para a Europa alguns
mesesatrá s.Até aquelemomento,ningué mapareceraparabisbilhotarolocal,masporquanto
tempoaquelesossegoduraria?
Chloe passava a maior parte do tempo cuidando do bebê Kenny. Quando nã o estava
tirando um cochilo para tentar recuperar as forças, ela usava seus momentos livres para
trabalhar via Internet com um nú m ero cada vez maior de fornecedores e distribuidores da
Cooperativa de Mercadorias. Os crentes já estavam começando a usar esse tipo de comé rcio
entresi,prevendodiastenebrososemqueseriamproibidosdecomprarevender.
Apressã odevivercomoutraspessoas,aliadaaotrabalhopesado,semmencionaromedo
do futuro, fazia parte constante da vida de Buck. Ele se sentia grato por poder escrever seus
artigos,ajudarRayfordeomé diconoabrigoeterumpoucodetempoparapassarcomChloee
Kenny,masseusdiaslhepareciamlongosdemais.Osú nicosmomentosqueeleeChloetinham
parapassarasó serano inaldodia,quandoambosmalconseguiam icardeolhosabertospara
conversar.Obebê dormianoquartodeles.ApesardeKennynã operturbarosdemaismoradores
dacasa,BuckeChloeacordavamcomfreqüênciaànoiteparacuidardele.
Certamadrugadaemquenã oconseguiapegarnosono,Buckdeitou-sedecostasnacama,
satisfeito por ouvir a respiraçã o regular de Chloe, que dormia profundamente a seu lado. Ele
estavaimaginandocomomelhorarae iciê nciadoComandoTribulaçã o,desejandodedicarmais
desimesmocomofaziamosoutrosintegrantesdogrupo.Desdeoinı́c io,quandooComandose
compunha de apenas quatro membros — Bruce Barnes, Rayford, Chloe e ele pró prio -, Buck
sentiu que fazia parte de um trabalho fundamental, grandioso. Da mesma forma que os novos
crentesquesurgiramapósoArrebatamento,oComandoTribulaçãoassumiraocompromissode
ganhar almas para Cristo, fazer oposiçã o ao anticristo e sobreviver até a volta de Jesus, que
ocorreriadaliapoucomaisdetrêsanosemeio.
Tsion, o homem que Deus colocara no grupo para substituir Bruce, era um bem precioso
quenecessitavaserprotegidoacimadetudo.Seuconhecimentoepaixã opelascoisasdeDeus,
aliadosà suahabilidadedecomunicar-secompessoasleigasnoassunto,transformaram-noem
inimigo nú m ero um de Nicolae Carpathia, sem contar as duas testemunhas do Muro das
Lamentações,quecontinuavamaatormentarosincréduloscompragasejulgamentos.
Chloe o surpreendia com sua habilidade para dirigir uma empresa internacional e, ao
mesmo tempo, para tomar conta do bebê . O mé dico provara ser uma dá diva de Deus por ter
salvoavidadeHattieecuidardasaúdedorestantedopessoal.Hattieeraaúnicaincrédula.Seu
egoísmoalevavaapassaramaiorpartedotempocuidandodesimesma.
MasamaiorpreocupaçãodeBuckeracomRayford.Ultimamente,seusogroestavamuito
mudado. Parecia revoltado, nã o tinha paciê ncia com Hattie e, geralmente, perdia-se em
pensamentos, com o rosto marcado pelo desespero. Rayford també m começara a ausentar-se
dacasa,caminhandoaesmonomeiododia.Bucksabiaqueseusogroeraumhomemsensato,
mas gostaria que algué m pudesse ajudá -lo. Ele havia pedido a Tsion que interferisse, mas o
rabinolhedisse:
—Ocapitã oSteelecostumarecorreramimquandodesejarevelaralgumacoisa.Nã ome
sintoàvontadeparapuxarassuntosdenaturezapessoalcomele.
BuckpediraaopiniãodeFloyd.
—Eleé meumentor,enã oocontrá rio—disseraFloyd.-Conversocomelequandotenho
problemas;nãovouforçá-loacontar-meosseus.
Chloetambémnãoquisseintrometer.
— Buck, ele é um pai tradicional, à moda antiga. Costuma me dar todos os tipos de
conselho,mesmoquandonãopeço,maseunãomeatreveriaatentarfazê-loabrir-secomigo.
—Masvocêestávendoqueeleestácomproblemas,nãoé?
— Claro. O que a gente poderia esperar? Estamos todos confusos demais. Isso é maneira
de viver? Nã o podemos sair daqui à luz do dia, a nã o ser para ir de vez em quando até
Palwaukee.Mesmoassim,temosdeusarnomesfalsoseestarsemprepreocupadosparaquenão
descubramnossoesconderijo.
OscompanheirosdeBucktinhammotivossuficientesparanãoinquirirRayford.Essatarefa
caberiaaBuck.Ah!quealegria...,elepensou.
Sentado no banco de passageiros do Helicó ptero Um da CG, David Hassid observava, ao
ladodeMacMcCullum,oqueestavaacontecendo.Atripulaçã odeterradoAeroportodaNova
Babilô nia havia engatado um grosso cabo de aço que ia do helicó ptero até as trê s caixas
amarradas entre si que continham 144 computadores. O chefe da tripulaçã o fez um sinal para
que Mac começasse a subir devagar até que o cabo icasse completamente esticado. Em
seguida,MaclevantouvôoparalevaracargaaopaláciodaComunidadeGlobal.
—Nã ovaiacontecernadacomascaixas—disseMac-,anã oserquevocê toquenaquela
alavanca.Vocênãofariaisso,certo?
— Para atrasar meus funcioná rios de encontrar o local de transmissã o de Tsion, Buck e
Chloe?Claroquesim,seestafosseaúnicamaneira.
—Se?
— Vamos, Mac. Já é tempo de você me conhecer melhor. Acha que eu jogaria no lixo
aquelescomputadores?Possoterumterçodesuaidade,mas...
—Ei!Nemtanto.
— Tudo bem, um pouco menos da metade, mas acredite em mim. Você acha que o
númerodecomputadoresqueencomendamosfoiporacaso?
Maclevantouamãoeapertouobotãodeseurádiotransmissor.
—HelicópteroUmdaCGparaatorredopalácio,câmbio.
—Torrefalando,Um,prossiga.
—Chegaremosemtrêsminutos,câmbio.
—Positivo,desligo.
Macvirou-separaDavid.
—Jáseiporquevocêfezumpedidotãogrande.Umparacadamiltestemunhas.
—Nãopenseiemreparti-losdestaforma,masnãovoujogá-losnodeserto.
— Mas també m eu nã o vou descarregá -los no palá cio, vou? David sorriu e balançou a
cabeçadizendoquenão.Da
posiçã o em que estavam, ele avistava o imenso palá cio. Edifı́c ios que se espalhavam por
quilô m etrosdeextensã ocercavamoexuberantecastelo—queoutronomepoderiaserdadoa
ele? — construı́do por Carpathia em homenagem a si mesmo. Ali havia todo tipo de conforto,
com milhares de empregados para atender a cada capricho de Carpathia. David tirou seu
telefonesigilosodobolsoediscouumnúmero.
— Cabo A. Christopher — ele disse ao telefone. — Diretor Hassid chamando. — David
cobriuofonecomamãoedirigiu-seaMac.—OnovochefedecargasnoCondor.
—Euoconheço?
David encolheu os ombros, movimentou a cabeça negativamente e voltou a falar ao
telefone.
—Sim,caboChristopher.OcompartimentodoCondorestá livre?...Excelente.Prepare-se
para nos receber... Bem, nã o posso fazer nada, cabo. Você pode falar com o Departamento de
Pessoal,masentendoquenãohánadaquevocêpossafazer.
Davidafastouotelefonedorostoedesligou-o,dizendo:
—Bateramotelefonenaminhacara.
—Ningué mgostadeserresponsá velpelacargado216-disseMac.—Quasenã ohá nada
parafazer.Vocêconfianessesujeito?
—Nãotenhoescolha—respondeuDavid.
Buckhaviatransferidotemporariamenteseucomputadorparaamesadacozinhaeestava
digitando um artigo para sua revistaA Verdade quando Rayford retornou de sua caminhada
matinal.
—Ei—disseBuck.
Rayfordacenoucomacabeçaeparounotopodaescadaquedavaacessoaoporã o.Buck
quasedesistiudeseuintento.
—Qualéaprogramaçãoparahoje,Ray?
— A mesma de sempre — resmungou Rayford. — Temos de começar a levantar as
paredes do abrigo. E depois temos de deixá -lo invisı́vel. Nã o pode haver nenhuma pista. Onde
estáFloyd?
—Eunãoovi.Hattieestáno...
— No outro lado da casa, claro. Sem dú vida treinando para uma maratona. Ela vai levar
todosnósàmorte.
—Ei,pai—disseBuck—tenteverascoisaspeloladopositivo.
Rayfordnãolhedeuatenção.
—Ondeestáorestodopessoal?—eleperguntou.
— Tsion está lá em cima. Chloe está trabalhando no computador na sala de visitas, e
Kennyestádormindo.EujálhedisseondeHattieestá.Floydausentou-sesempermissão.Talvez
eleestejanoporão,maseunãoovidescer.
—Nãodigaqueeleseausentousempermissão,Buck.Nãoacheigraça.
Rayfordnãotinhaocostumedeseragressivocomele,eBucknãosabiacomoreagir.
— Eu só quis dizer que ele nã o está por aqui, Ray. A verdade é que ultimamente ele
parecenãoestarbem,eontemseuaspectoerahorrível.Talvezeleestejadormindo.
—Atéomeio-dia?Oqueestáhavendocomele?
—Viqueseusolhosestãoumpoucoamarelados.
—Eunãonoteinada.
—Láembaixoémuitoescuro.
—Ecomovocêviu?
—Sópercebiissoontemànoite.Chegueiafazerumcomentáriocomele.
—Eoqueeledisse?
— Fez uma brincadeira dizendo que os gansos selvagens sempre acham seus irmã os
estranhos.Eunãoquisdizermaisnada.
—Omédicoéele—disseRayford.—Deixequeelecuidedesimesmo.
Aquele, pensou Buck, era o momento ideal. Ele poderia dizer a Rayford que estava
estranhandoseumododeser.MasomomentopassouquandoRayfordpartiuparaaofensiva.
—Qualéasuaprogramação,Buck?Trabalharnarevistaounoabrigo?
—Vocêéquemmanda,Ray.Oqueeudevofazer?
—Eudiriaqueémelhorvocêtrabalharnoabrigo,masfaçaoquequiser.
Bucklevantou-se.
Macpousoudelicadamenteascaixasnopavimentodoladolestedohangarqueabrigavao
Condor216.Aportadohangarestavaaberta,deondesepodiaavistaroimensocompartimento
de carga do Condor. David saltou do helicó ptero antes que as hé lices parassem de funcionar e
apressou-se para desatrelar a carga do cabo de aço. Do lado de fora do hangar, apareceu uma
empilhadeira que puxou a carga, inclinando-a levemente em cı́rculo até colocá -la dentro do
hangar.QuandoMacaproximou-sedeDavideambosfecharamaportadohangar,ooperadorda
empilhadeira já havia fechado o compartimento de carga do Condor e estava conduzindo a
empilhadeiraparaocanto.
— Cabo Christopher! — gritou David, e o cabo, que estava a uns 30 metros de distâ ncia,
virou-se.—Parasuasala,já!
—Elenã oparecianadasatisfeito—disseMacenquantoamboscaminhavamemdireçã o
ao escritó rio de paredes de vidro dentro do hangar. — Nã o cumprimentou, nã o reagiu.
Demonstroumávontade.Vocêvaiterproblemaspelafrente?
—Ocaboémeusubordinado.Soueuquemdáascartas.
—David,você precisarespeitarparaserrespeitado.Enã opodemoscon iaremningué m.
Vocênãovaiquererqueumdeseusprincipaisfuncionários...
— Con ie em mim, Mac. Está tudo sob controle. Algué m havia mudado o nome que
constavanasalavizinhaàdeMac:"CCCCC."
—Oquesignificaisto?—perguntouMac.
—CaboChristopher,ChefedeCargadoCondor.
—Oraessa!—disseMac.
David fez um gesto para que Mac entrasse com ele na sala do cabo. Depois de fechar a
porta,elesesentouatrásdamesaeapontouumacadeiraparaMac.Opilotopareciarelutante.
—Oqueestáhavendo?—perguntouDavid.
—Eassimquevocêtrataumsubordinado?
Davidcolocouospésemcimadamesa,assentiucomacabeçaedisse:
—Principalmenteumnovato.Eleprecisasaberqueméochefe.
—Euaprendique,quandoagenteusaapalavrachefediantedeumsubordinado,é sinalde
quejáperdeuaautoridade.
Davidencolheuosombros.
— Isso era no tempo da Idade Mé dia — ele disse. — Em tempos de desespero, medidas
desesperadas...
O ruı́do de passos do lado de fora da sala cessou, e algué m girou a maçaneta da porta.
Davidgritou:
—Esperoquevocêbatanaportadasalaondeseencontramseuchefeeseupiloto,cabo.
Aportafoiabertaalgunscentímetros.
—Fecheaportanovamenteebata,cabo!—gritouDavid,comasmã osatrá sdacabeça,
semtirarospésdecimadamesa.
Aportafoifechadacomumpoucodeforça.Depoisdeumalongapausa,elesouviramtrê s
batidassecasnaporta.Macbalançounegativamenteacabeça.
—Atéasbatidasdessesujeitosãosarcásticas—elesussurrou.—Masvocêmereceisso...
—Entre—disseDavid.
Mac arrastou a cadeira e levantou-se empertigando o corpo diante da presença de uma
jovemtrajandouniformedeserviço.Seuscabelosescuroscortadosrentes,quasecomoosdeum
homem, apareciam por baixo do boné . Ela era elegante, tinha olhos grandes e escuros, dentes
perfeitosepeleimpecável.
Mactirourapidamenteoquepe.—Madame.
— Pare com isso, capitã o — ela disse, dirigindo-se em seguida a David com ar de
reprovação.—Seráquesouobrigadaabaterparaentraremminhasala?
Davidpermaneceunamesmaposição.
—Sente-se,Mac—eledisse.
—Sódepoisqueadamasesentar—disseMac.
— Eu nã o estou dando permissã o para que ela se sente -retrucou David, e a cabo
Christopher fez um gesto para que Mac se sentasse. — Capitã o Mac McCullum, esta é a cabo
AnnieChristopher.Annie,esteéMac.
Macfezmençãodelevantar-senovamente,masAnnieoimpediu,estendendo-lheamão.
—Nã ohá necessidade,capitã o.Seiquemvocê é ,eseumachismodaIdadedaPedra icou
evidente.Sevamostrabalharjuntos,paredemetratarcomoseeufosseumadondoca.
MacolhouparaelaedepoisparaDavid.
—Talvezvocêatratedojeitoqueelamerece—eledisse.Davidempinouacabeça.
—Conformevocê disse,Mac,agentenuncasabeemquempodecon iar.Equantoaesta
sala, cabo, saiba que tudo o que é seu també m é meu enquanto você estiver sob o meu
comando.Esteespaçolhefoidestinadoparafacilitaroqueeuvoulheordenar.Entendido?
—Comtodaclareza.
— Cabo, eu nã o sou militar, mas sei que um subordinado nã o pode icar com a cabeça
cobertanapresençadeseusuperior.
Annie Christopher deu um longo suspiro e curvou os ombros enquanto tirava o boné . Ela
passou a mã o pelos cabelos curtos, caminhou até a parede divisó ria de vidro entre a sala e o
restantedohangarefechouaspersianas.
—Oquevocê está fazendo?—perguntouDavid. — Nã o há ningué m lá fora e eu nã o lhe
deipermissãopara...
— Ora, vamos, diretor Hassid. Desde quando eu preciso de sua permissã o para fazer
algumacoisa?
David tirou os pé s da mesa e sentou-se irme na cadeira assim que Annie se aproximou
dele.—Paradizeraverdade,precisasim.
Eleabriuosbraços,eelasentou-seemseucolo.
—Comovai,meuamor?—eladisse.
—Euestouótimo,meubem,masachoqueMacestáprestesaterumataquecardíaco.
Macsentou-senabeiradacadeiraeinclinou-separaafrente,comoscotovelosapoiados
nosjoelhos.
—Seusengraçadinhos!—eledisse.—Comlicença,Srta.Christopher,masprecisoverseu
selonatesta.
— As ordens — ela disse, inclinando-se por cima da mesa para que ele pudesse enxergar
melhor.—Davideeutambémfizemosissonodiaemquenosconhecemos.
Mac segurou a cabeça de Annie por trá s com uma das mã os e passou o polegar da outra
mã o no selo da testa dela. Em seguida, segurou o rosto da moça com as duas mã os e beijou-a
carinhosamentenotopodacabeça.
— Irmã , você tem idade para ser minha ilha — ele disse. Annie sentou-se na outra
cadeira.
— Devo dizer-lhe, capitã o McCullum, que eu nã o suportaria trabalhar para nenhum de
você s.ODepartamentodePessoaltemumpedidomeu,solicitandoqueeusejatransferidapara
outrosetor.Odiretordemeudepartamentoé insuportá velemetidoaimportante,eocapitã o
doCondoréummachista.
— Mas — disse David -, eu informei ao Departamento de Pessoal que ela nã o deve ser
transferida. Annie criou problemas em todos os departamentos nos quais trabalhou, e esta é a
recompensaqueelarecebeu.Elesadoraram.
Macolhoudeesguelhaparaela,edepoisparaDavid.
—Malpossoesperarparaouvirashistóriasdevocêsdois—eledisse.
BuckadiouaconversafrancaqueteriacomosogroquandoRayfordabriuasplantassoba
lâ mpada do porã o e perguntou qual era sua opiniã o para impedir que algué m descobrisse a
entrada.
— Pensei que você nunca me perguntaria — disse Buck. — De fato, eu tenho ruminado
algumasidéias.
—Soutodoouvidos.
—Vocêconheceaquelefreezerdacasageminadaaesta?
—Aquelequetemumcheiroforte?
Buck assentiu com a cabeça. Eles haviam jogado fora toda a comida estragada, mas o
maucheironointeriorpersistia.
— Minha idé ia é trazer ofreezer para cá e abastecê -lo com alguma coisa que se pareça
comcomidaestragada.Omaucheirocontinuará .Vamoscolocarbandejasdealimentonofundo
dofreezer. Qualquer pessoa que abri-lo sentirá repulsa por causa do mau cheiro e nã o vai
examinar aquela comida estragada. Ningué m vai pensar em levantar as bandejas. Quem izer
isso, encontrará um fundo falso que dará acesso à escada para o abrigo. Nesse meio-tempo,
podemosconstruirumaparedecobrindoaatualentradaparaoporão.
Rayfordpô samã onatestacomosebuscasse,nofundodamente,algumapossı́velfalhano
plano.Emseguida,encolheuosombros.
—Gostei.MasprecisamosdarumjeitodeesconderissodeHattie.
Buckolhouaoredor.
—Então,euestavacerto?Floydnãoestáporaqui?
ObipdeMactocou.
—ÉFortunato—eledisse.—Ótimo!Possousarseutelefone,cabo?
— Esse telefone nã o é meu, senhor — respondeu Annie. — Ele só foi destinado a mim
para...
MacligouparaoescritóriodeFortunato.
— Aqui é Mac McCullum retornando a ligaçã o dele... Sim, madame... Sexta-feira?...
Quantos convidados?... Nã o, madame. Diga a ele que houve uma confusã o com aquele
embarque. Ele terá de conversar com o diretor de compras... Nã o, aqueles nã o estavam
disponı́veis para ser entregues no palá cio... Talvez depois que retornarmos de Botsuana, sim,
madame.
A porta do quarto do Dr. Floyd Charles estava fechada. Buck avistou Tsion no quarto ao
lado,trabalhandonocomputador,apoiandoacabeçanamão,comocotovelonamesa.
—Vocêestábem,Tsion?
—Cameron!Entre,porfavor.Sóestavadescansandoosolhos.
—Orando?
Orabinosorriucomardecansaço.
— Incessantemente. Nã o temos escolha, temos? Como vai, meu amigo? Continua
preocupadocomseusogro?
—Sim,masvouconversarcomele.Vocêviuomédicohoje?
— Normalmente tomamos o café da manhã juntos, bem cedo, conforme você sabe. Mas
hoje tomei o café sozinho. Nã o ouvi a voz dele no porã o, e confesso que nã o pensei mais nisso.
Estou escrevendo sem parar. Cameron, nã o temos idé ia do tempo que durará esta calmaria
entre o quinto e o sexto ais. Estou tentando descobrir se a visã o que Joã o teve foi real ou
simbólica.Comovocêsabe...
—Desculpe-me,Dr.Ben-Judá.Euprecisosaberse...
—Sim,claro.ÉmelhorvocêtentarencontrarFloyd.Conversaremosmaistarde.
—Eunãotiveaintençãodesergrosseiro.
— Você nã o precisa se desculpar, Cameron. Vá . Conversaremos depois. Se precisar de
mim,meavise.
Buckaindanã oseacostumaraaoprivilé giodemorarnamesmacasacomohomemcujas
mensagensdiá riaseramcomooarquemilhõ esdepessoasdomundointeirorespiravam.Apesar
de Tsion trabalhar no andar de cima da casa, muito perto do restante do grupo, quando ele
estavaatarefadooucansadodemaisparaconversar,osmoradoresdacasaliamsuasmensagens
pela Internet. A melhor parte de morar com o rabino era que ele se empolgava com suas
mensagens tanto quanto seus leitores. Trabalhava a manhã inteira e muitas horas à tarde
preparando-se para transmitir as mensagens pouco antes do anoitecer. Tradutores do mundo
inteiro convertiam suas palavras para os idiomas de seus respectivos paı́ses. Os crentes que
conheciam informá tica mais a fundo trabalhavam duro para catalogar as informaçõ es do Dr.
Ben-Judáetorná-lasacessíveisaosnovatosnafé.
Quando Tsion se deparava com alguma revelaçã o estarrecedora em seus estudos, Buck
ouviaseugritodejúbiloesabiaque,emseguida,eleaparecerianotopodaescada.
—Sealguémestivermeouvindo—elegritava-,presteatençãonoquevoudizer!
Seus conhecimentos da linguagem bı́blica faziam os comentá rios sobre determinada
passagempareceremnovidade,mesmoperanteosolhosdosmaisastutosestudiososdaBíblia.
Buck mal podia esperar para saber o que Tsion estava escrevendo sobre a profecia do
sexto ai, mas por ora sua preocupaçã o era com o mé dico. Ele bateu levemente na porta do
quarto.Depoiscommaisforça.Girouamaçanetaeentrou.Já estavanomeiodatarde,eosol
daprimaverabrilhavaaltonocé u.Masoquartoestavaà sescuras,comascortinasfechadas.E
oDr.Charlescontinuavadeitado,semsemovimentar.
—VoupartirparaaAfricasexta-feira—disseMac.—Fortunatoconcordoucomopedido
de Mwangati Ngumo. Claro que Ngumo está pensando que vai ter um encontro pessoal com
Carpathia. Aposto que Ngumo está querendo saber quando Carpathia vai cumprir suas
promessas.
AnnieChristophersemicerrouosolhos.
— Imaginem o que o potentado deve ter prometido só para poder tomar o lugar que ele
ocupavacomosecretário-geral.
—Vamossabernasexta-feira—disseMac.—Pelomenoseuvousaber.
Annievirou-separaMac.
—Elespermitemquevocêparticipedestetipodereunião?
—elaperguntou.
MacolhouderelanceparaDavid.
—Vocênãocontouaela?
—Podecontar—disseDavid.
—Venhacomigo,cabo—disseMac.ElaeDavidoacompanharam.
— Vou continuar a chamá -lo de Capitão ouSr. McCullum, mesmo em particular — disse
Annie. — Deixei que você visse meu selo e me beijasse na cabeça. Mas, de agora em diante,
podemechamardeIrmã.
—Nã osei—disseMac.—Emelhormanterasformalidadesparaqueeunã ocometaum
deslizenafrentedealguém.Elaoacompanhouatéacabinadecomando.
— Doutor? — disse Buck, aproximando-se da cama. Ele nã o notou nenhum movimento.
Nãoqueriaassustá-lo.
Imaginando que a lâ mpada produziria menos claridade que a luz do Sol, Buck apertou o
interruptor e deu um suspiro de alı́vio. Pelo menos o mé dico estava respirando. Talvez ele
tivesse demorado a pegar no sono e estava recuperando as horas perdidas. Floyd resmungou e
virou-senacama.
—Vocêestábem,doutor?—perguntouBuck.Floydsentou-se,comardesurpresa.
—Eureceavaisso—eledisse.
—Sintomuito—disseBuck.—Eusó...
Floyd saiu de debaixo das cobertas. Sentou-se na beira da cama trajando um roupã o de
veludocompridoquedeixavaàmostrasuasroupas—camisadeflanela,calçajeansebotas.Ele
haviatranspiradoanoitetoda.
—Anoiteestavaassimtãofria?—perguntouBuck.
—Abraascortinas,porfavor.
Floydcobriuosolhosquandoaluzdosolpenetrounoquarto.
—Qualéoproblema,Floyd?
—Oseucarroestáemordem?
—Claro.
—Leve-meaoYoungMemorial.Meusolhoscontinuamamarelados?
EleolhouparaBuck,queseinclinouparavermelhor.
—Oh!Floyd—disseBuck.—Eupreferiaqueestivessemamarelados.
—Estãoinjetados?
—Injetadoséumapalavrasuave.
—Nãohánenhumapartebranca?Buckbalançouacabeçanegativamente.
—Oproblemaégrave,Buck.
CAPÍTULO3
David, Mac e Annie Christopher sentaram-se na luxuosa sala de estar do Condor, seis
metrosatrásdacabinadecomando.
—Então—disseAnnie-,essatalcoisareversível...
—Dispositivodeintercomunicaçãoreversível—corrigiuMac.
— ... permite que você ouçatudo o que passa no aviã o? Mac assentiu com a cabeça. —
Saladeestar,poltronas,aposentos,sanitários,tudo.
—Incrível.
—Demais,vocênãoacha?—disseMac.
—Incrívelvocêaindanãotersidopego.
—Você está brincando?Seelesdescobrirem,vounegartudo.Nã otenhonadaavercom
isso, Rayford nã o me contou que havia um dispositivo aqui e nunca vi o tal botã o. Eles o
consideramumtraidor.Nemelesnemnóssabemosondeeleestá,nãoéverdade?
Anniecaminhouatéumsofáatrásdeumamesademadeiramuitobrilhante.
—ÉaquiqueochefãoassisteàTV?
David acenou a irmativamente com a cabeça. Ela virou-se para Mac com ar de quem
acabaradepensaremalgumacoisa.
—Vocênãoseimportaemmentir?
Macbalançouacabeçamostrandoquenãoligavaparaisso.
— Para o anticristo, você quer dizer? Minhavida toda e uma mentira para ele. Se ele
desconfiassedealgumacoisa,euseriatorturado.SeeleimaginassequeseiondeRayfordestá,ou
ondesuafilhaegenroestão,euseriamorto.
—Ofimjustificaosmeios?—perguntouAnnie.
Macdeudeombros.—Sópossolhedizerquedurmobemànoite.
— E eu vou dormir melhor — ela disse — sabendo que você manté m Carpathia sob
vigilância.
— Pelo menos quando ele está a bordo — disse Mac. — Na verdade, Leon me diverte
mais.Eleéumapeçarara.
—Eugostariadeviajarcomvocê—disseAnnie.
—Eutambé m—disseDavid.—Masnã oterı́amoscondiçõ esdeouvirnada,amenosque
viajá ssemos na cabina de comando. E por falar nisso, Mac, você continua preocupado com
aqueleseuco-pilotoquenãolargadoseupé?
—Deixeidemepreocuparcomele—respondeuMac.—Euopromovi.Agoraelevaiser
pilotodoPomposoPontífice.
Annieriu.—Adoreiotı́t ulo!Já tiveproblemaporteresquecidopartedotı́t ulodele.ESua
ExcelênciaSumoPontíficePeterSegundo,não?
Macencolheuosombros.—ParamimeleéPete.
— Você precisa conhecer o aviã o que ele encomendou -disse David. — Nicolae e Leon
estãoloucosderaiva.
—Émelhorqueesteaqui?—perguntouMac.
— Muito melhor. Cinqü enta por cento maior e custou o dobro. Pertenceu a um xeique.
Estouaguardandoaentregaparadaquiaumasemana.
—Elesaprovaramacompra?
—Elesestãodandocordaparaeleseenforcar—disseDavid.
—Seráqueotalpilotovaisaberpilotaresseavião?
—Eleécapazdepilotarqualquercoisa—respondeuMac.
— Gostei dele. E muito habilidoso, mas totalmente leal a Carpathia. Por mais que eu
quisesse me aproximar dele para conversar sobre religiã o, nã o tive coragem de me abrir. Mas
elejáestásendotrabalhadoporumcrentedosetorC.
—Osetordemanutenção?—perguntouAnnie.—Eunãosabiaquehaviacrenteslá.
—Nã ohá mais.Meuchefeotiroudelá .Teriafeitoomesmocomigo.Deusvaialcançá -lo
deoutramaneira.
David levantou-se, apertou um botã o no painel de um enorme aparelho de TV e ligou-o.
TirouosomeficouapenasobservandoasnotíciascontroladasporCarpathia.
—Arecepçãoéexcelente,mesmodentrodestaestruturademetal—eledisse.
—Nadamaismesurpreende—disseMac.—Aumenteosom.
Onoticiá riorelatavahistó riasdasgrandesrealizaçõ esdeCarpathia.Opotentadoapareceu
natela,serenoecharmosocomosempre,elogiandoumgovernoqualquere ingindohumildade
aofalardeseuprojetodereconstrução.
"E para mim um privilé gio ter a oportunidade de servir a cada membro da Comunidade
Global",eledisse.
— Olhe ali, Mac — disse David, apontando para o piloto que se encontrava em segundo
plano enquanto Carpathia saudava outro ex-paı́s do Terceiro Mundo que se bene iciara de sua
generosidade. — E o novo piloto do Peter. Você vai dar um jeito de arrumar um crente para
substituí-lo?
—SeeuconseguirdriblaroDepartamentodePessoal.
—Alguémqueeuconheço?
—Umjordaniano.Ex-pilotodeaviõesdecaça.AbdullahSmith.
OLandRoverdeBucksacolejavarumoaPalatine.FloydCharlesestavadeitadonobanco
traseiro.
—Oquehouve,doutor?—perguntouBuck.
—Souumgrandeidiota—disseFloyd,sentando-selogoatrá sdeBuck.—Fazmesesque
percebioqueestavaacontecendo,masdisseamimmesmoqueerapuraimaginaçã o.Quandoa
visã o começou a piorar, eu deveria ter entrado em contato com o Posto de Saú de. Agora é
tardedemais.
—Nãoestouentendendo.
— Digamos que eu descobri o que quase matou Hattie. Foi ela que me contaminou. Em
termosleigos,écomosefossecianetoquevaisendoliberadocomotempo.Podesedesenvolver
durantemeses.Quandoagentesedá conta,já foi.Seé issoquetenho,nã ohá nadaafazerpara
interromperociclo.Trateidossintomas,masdenadavaleu.
— Nã o fale assim — disse Buck. — Se Hattie sobreviveu, por que você també m nã o vai
sobreviver?
—Porqueelarecebeucuidadosdiáriosdurantemeses.
—Vamosorar.LeahRoseconseguiráoquevocênecessita.
—Tardedemais—disseomé dico.—Sou um tolo. O pior paciente de um mé dico é ele
próprio.
—Equantoaorestantedogrupo?Corremosperigo?
— Nã o. Se você s nã o apresentaram sintomas, estã o livres. Acho que fui contaminado
quandocuideideladuranteoaborto.
—EquantoaLeah?
—Temosdeesperarparaver.
OtelefonedeBucktocou.
—Ondevocêestá?—perguntouChloe.
—PrestandoumpequenofavoraFloyd.Nãoquisincomodarvocê.
—Oquemeincomodaé saberquevocê saiusemmedizeraondeestavaindo.Prestando
umpequenofavoremplenaluzdodia?Papainã oestá nadafeliz.Eletinhaaintençã odevisitar
Tnoaeroportohoje.
—ElepodeusarocarrodeKen.
— O carro dele é muito manjado, mas o problema nã o é este. Ningué m sabia me dizer
aondevocêsforam.Tsionestápreocupado.
Bucksoltouumlongosuspiro.—Floydnã oestá sesentindobemenã ohá tempoaperder.
EstamosacaminhodoYoungMemorial.Maistardeeumecomunicocomvocê.
—Oquehouve...
—Maistarde,querida.Estábem?
Elahesitou.—Tomecuidado,edigaaFloydqueestaremosorandoporele.
— Nã o devemos ser vistos juntos com freqü ência — disse Mac. David e Annie
concordaram.—Anãoseremsituaçõesnormais.Alguémsabequevocêestáaquiagora?
Anniemeneouacabeçanegativamente.—Tenhoumareuniãoàsdezdanoite.
—Euestoulivre—disseDavid.—Nã ohá maisnenhumtrabalhonormal,casovocê ainda
nãotenhapercebido.
— Eu gostaria de ouvir as histó rias de você s, David — disse Mac. — Sei que sua famı́lia
moraemIsrael.Deondevocêé,Annie?
— Canadá . Eu estava voando de Montreal para cá quando aconteceu o terremoto. Perdi
todaaminhafamília.
—Vocêaindanãoeracrente?
— Nã o. Acho que só fui à igreja para assistir a casamentos e enterros. Nã o nos
importá vamos que nos chamassem de ateus, mas era assim que vivı́amos. Pre iro dizer que
é ramosagnó sticos.Parecemaistolerante,menosdogmá tico.Eramospessoasequilibradas.Boa
gente.Melhoresdoquemuitosreligiososqueeuconhecia.
—EvocênãosentiacuriosidadedeconheceraDeus?
— Comecei a pensar nisso depois dos desaparecimentos, mas logo em seguida nos
tornamos admiradores de Carpathia. Ele parecia ser a voz da razã o, era um homem de
bondade,amorepaz.Candidatei-meatrabalharparaeleassimque iqueisabendoqueonome
da ONU fora mudado e que a sede seria transferida para cá . O dia em que fui aceita foi o mais
felizdeminhavidaedeminhafamília.
—Oqueaconteceu?
—Amortedelesmudoutudo.Fiqueiarrasada.Eujá tinhalevadoumsustomuitogrande
antes, é claro. Conhecia algumas pessoas que desapareceram e outras que morreram em
conseqü ência dos desaparecimentos. Mas nunca havia perdido uma pessoa da famı́lia. De
repente, perdi minha mã e, meu pai e dois irmã os menores no terremoto. Metade de minha
cidadefoidestruídaenquantoeuvoavafeliznaqueleavião.AterrissamosnasareiasdoAeroporto
de Bagdá e vimos outros aviõ es descerem ali. Fiquei sabendo que a sede da CG desabou.
Finalmente fui parar em um abrigo subterrâ neo, onde vi as ruı́nas de meu pequeno bairro pela
CNN.Foramdiasediasdedesespero.Euchoravaeoravaparanãoseiquem,imploravaparaque
o serviço de comunicaçõ es me desse notı́c ias de minha famı́lia. Como a busca que eles faziam
pelaInterneteramuitolenta,resolviprocurarporcontaprópria.Encontreiumadúziadenomes
depessoasconhecidasqueconstavamdalistademortos.Eunã oqueriaverossobrenomesque
começavamcomaletraC,masnãopuderesistir.Anniemordeuolábio.
—Vocênãoprecisafalardesteassuntose...
— Eu quero falar, McCullum. Parece que tudo aconteceu ontem. Tentei voltar para
reconheceroscorpos,cuidardosfunerais.Masnã ofoipossı́vel.Houvecremaçõ esemmassapor
motivosdesaúdepública.Nãosobrouninguémparachorarcomigo.Euqueriamematar.
DavidcolocouamãonoombrodeAnnie.
—ConteaeleoquevocêdescobriunaInternet.
—Você deveimaginar—disseAnnie, itandoMaccomosolhosú m idos.Eleassentiu.—
VitodasaquelasmensagensdoDr.Ben-Judávindasdoabrigo.Issofoiantesdeeudescobrirosite
dele.QuandoaCGcomeçouafazertodoaquelebarulhoparaproibiroacessoà quelesite, achei
que deveria entrar nele. Eu ainda era uma militante faná tica, mas Carpathia pregava a
liberdade individual e, ao mesmo tempo, a negava. Aquelas oraçõ es me assustaram. Eu nunca
havia parado para pensar em Deus. Naquele momento, eu queria que Ele me acudisse. Eu nã o
tinhaninguémmaisnavida.
—FoiaíquevocêencontrouTsion.
—Encontreiapá ginainicialdositedele.Eunã opodia acreditar. O nú m ero que aparecia
nocantodatela,quevocê devetervisto,mostravaquantaspessoasestavamentrandonaquele
siteacadasegundo.Penseiquefosseumexagero,masderepentecomeceiaentenderporquea
CG estava contra ele. Algué m com capacidade para atrair um nú m ero tã o grande de pessoas
eraumaameaça.CliqueiemalgunslugaresdositeeliamensagemdoDr.Ben-Judá paraaquele
dia.Eumelembreidequandoeledeclarousuaconversã oaomundointeiropelaTV.Masnã ofoi
isso o que me impressionou. També m nã o compreendi quase nada do que ele estava
comunicandoaquelediapelaInternet.EramcoisasdaBı́bliaquenã omediziamrespeito,maso
tom de voz dele era muito cordial. Parecia que ele estava sentado a meu lado conversando
comigo,contandooqueaconteciaeoqueviriadepois.Eusabiaque,selhefizesseperguntas,ele
as responderia. Foi entã o que eu vi os arquivos.Jáexistemarquivos?, pensei. Há quanto tempo
existiaaquelesite?
— Cliquei em algumas listas — prosseguiu Annie -, surpresa ao ver que ele já havia
incluı́do uma mensagem para cada dia das semanas seguintes. Quando vi aquela mensagem
intitulada"ParaAquelesQueChoram",quasedesmaiei.Sentiumaondadecalorpercorrermeu
corpo, e depois um arrepio. Tranquei a porta e torci para que a CG nã o tivesse começado a
monitorar nossoslaptops. Tive uma enorme sensaçã o de bem-estar. Eu sabia que aquele
homem tinha alguma coisa para mim. Imprimi a mensagem e carreguei-a comigo durante
mesesaté odiaemqueDavideeunosconhecemos.Elemeavisouqueeunã odeveriaserpega
comaquelamensagem.Resolvimemorizá-laantesdedestruí-la.
Macolhouparaelacomardedúvida.
—VocêmemorizouumamensageminteiradeBen-Judá?
—Quasetoda.Vocêquerouviroprimeiroparágrafo?
—Claro.
— Ele escreveu: "Meu caro amigo enlutado, talvez você esteja chorando a perda de um
ente querido que desapareceu no Arrebatamento ou foi morto no caos que resultou dos
desaparecimentos.EstouorandoparaqueapazdeDeusoconforte.Seioquevocê está sentindo
porque perdi minha famı́lia de uma maneira indescritı́vel. Mas quero que estas palavras lhe
transmitam esta grande certeza: Se seus queridos estivessem vivos hoje, eles insistiriam para
que você tivesse certeza absoluta de que está preparado para morrer. Existe uma ú nica
maneiradefazerisso."DavidpercebeuqueMacestavacomovido.
—ODr.Ben-Judá explicouoquesigni icavamDeus,Jesus,oArrebatamentoeaTribulaçã o
demaneiratã oclaraquesentiumdesejoenormedeacreditar.Eupreciseilerosensinamentos
anteriores do Dr. Ben-Judá para compreender que ele estava certo sobre as profecias bı́blicas.
Atéentão,elehaviapreditocadaumdosjulgamentos.
Macassentiu,sorrindo.
— E claro que você conhece tudo isso — ela disse. — Retornei a uma mensagem
arquivadaeaprendicomoorar,comodizeraDeusqueeueraumapecadoraequenecessitava
dele.Ajoelhei-mecomorostonacamae izisso.Eusabiaquehaviaconhecidoaverdade,mas
nã otinhaidé iadoquefazeraseguir.Passeiorestododiaetodaanoitelendotudooquepude
sobre os ensinamentos do Dr. Ben-Judá . Logo icou claro em minha mente por que a CG fazia
oposiçã oà quelehomem.Eletomavaocuidadodenã omencionaronomedeNicolae,masera
evidentequeanovaordemmundialrepresentavauminimigodeDeus.Eunã oentendiamuitoa
respeito do anticristo, mas sabia que tinha de ser diferente dos demais funcioná rios da CG. Lá
estavaeu,umacrente,noabrigodoinimigodeDeus.
—Foiaíqueeuapareci—disseDavid.—Annieachouqueeuestavaflertandocomela.
—Nã opuleumapartedahistó ria—disseAnnie.—Quandomemistureicomorestante
dosfuncioná riosdaCG, iqueicommedodeparecer crente. Eu imaginava que todas as pessoas
comasquaisconversavasabiamqueeutinhaumsegredo.Euqueriacontaraalgué m,masnã o
conhecianingué memquemcon iar.Chegueiemmeioaocaosemeindicaramondeseriameu
dormitó rio. Deram-me um uniforme e disseram-me que eu ia trabalhar no setor de
Comunicaçõ es.MeucargoerabeminferioraodeDavid,maspercebiqueeleolhavaparamim.
Aprincípio,elepareceuassustado,masdepoissorriu.
—Eleviuoseloemsuatesta—disseMac.
—Everdade,masveja,eunã otinhameaprofundadonosensinamentosdeTsionaté esse
ponto.Davidmemandourecadosporintermé diodevá riossupervisoresdizendoquequeriafalar
comigo."Pessoalmente?",perguntei.
— Assim que entrei naquela sala e a porta foi fechada, ele disse: "Você é crente!" Quase
morri de medo. Eu disse: "Nã o, eu... sou crente em quê ?" Ele disse: "Nã o negue! Posso ver em
seurosto!"Acheiqueeleestavatentandodescobriralgumacoisa,enegueioutravez.Eledisse:
"SevocênegaraJesusmaisumavez,vaiserigualaPedro.Cuidadocomogalo."
— Eu nã o tinha idé ia do que ele estava falando — prosseguiu Annie. — Nã o sabia que
Pedro foi um discı́pulo e muito menos que ele negou a Cristo. Achei que David devia ter
adivinhado meu segredo, e mencionando algué m chamado Pedro, falando em galos, só estava
querendo me confundir. Mesmo assim, eu nã o podia fazer nada, e disse: "Nã o estou negando a
Jesus."
—Eleperguntou:"Oquevocêquerdizercomisto?"
—Eurespondi:"Estoutemendoporminhavida."
—Eledisse:"Bem-vindaaoclube.Tambémsoucrente."
—Euperguntei:"Comovocêficousabendo?"
—Elerespondeu:"Estáescritoemvocê."
—Euperguntei:"Como?"
— E ele respondeu: "Deus escreveu isso literalmente em sua testa." Foi aı́ que eu quase
desmaieidesusto.
Assim que Buck e Floyd Charles entraram no Young Memorial, a recepcionista
adolescentechamouemvozalta:
—Srta.Rose,seusamigosestãoaqui.
—Nã oprecisagritar!—disseLeah,saindoapressadadesuasala.—Cavalheiros,achoque
nãohánadaqueeupossafazerparaajudá-loshoje.Qualéoproblema?
Floydsussurroualgumacoisaaoouvidodela.
—QueDeusnosajude—eladisse.—Poraqui.Segure-sebem.
— Você apresentou algum sintoma? — perguntou Floyd. Ela sacudiu a cabeça
negativamente. Buck apoderou-se de uma cadeira de rodas para Floyd e empurrou-a atrá s de
Leah. Ela os conduziu por uma pequena rampa, passou pelos elevadores principais e chegou ao
elevadordeserviço.Paraabri-lo,elausouumachavequefaziapartedeumenormechaveiro.
—Seencontrarmosalguém,vireorosto—eladisse.—Nãodeixeninguémperceber.
—Éclaroqueninguémvaiperceber—respondeuBuck.Leaholhoufirmeparaele.
— Sei que o senhor conhece a gravidade do caso, Sr. Williams, por isso gostaria que nã o
subestimasseminhasadvertências.
—Desculpe-me.
Elesentraramnoelevador,easportassefecharam.Leahtrancou-onovamenteeapertou
obotãodosextoandar.
— Nã o sei se vai dar certo — ela disse. — No outro elevador, a gente pode passar pelos
outrosandaressemparar.Bastagirarachaveemanterobotãoapertado.
Nã o deu certo. O elevador parou no segundo andar. Buck ajoelhou-se diante do mé dico
comoseestivesseconversandocomele.Naquelaposiçã o,ningué mteriacondiçã odeverorosto
deles.
—Sintomuito—disseLeahaquemaguardavaoelevador.—Emergência.
—Droga!—dissealguém.
Aconteceuamesmacoisanoquintoandar,eelesouviramoutrasreaçõessemelhantes.
—Issonã oé bom—disseLeahquandoasportassefecharamnovamente.—Preparemseparaencontrarmaispessoasnosaguãodosextoandar.Vamosseguiràesquerda.
Felizmente, eles passaram despercebidos enquanto Leah conduzia os dois até um quarto
vazio.Elafechouaportaetrancou-a.Emseguida,cerrouascortinas.
—Coloque-onacama—eladisseaBuck-,etireasroupasmolhadasdele.Você dormiu
destejeito,doutor?
Floydrespondeuafirmativamentecomacabeça,comardecansaço.
BucknãogostounadadeveracorvermelhaquetomavacontadosolhosdeFloydaoredor
daspupilasescuras.
—Oquehádeerradocomele,Leah?
Sem dizer nada, ela pegou uma espé cie de camisola de um armá rio e atirou-a em sua
direção.
—Seeleprecisarusarobanheiro,quesejaagora.Éprovávelqueelenãopossalevantar-se
dacamanovamente.
—Porquantotempo?—perguntouBuck.
—Parasempre—balbuciouomédico.—Elasabeoqueestáacontecendocomigo.
Leah apertou o botã o do telefone instalado na parede e continuou a falar enquanto
trabalhava.
—OPostodeSaúdefezumaentregadeantitoxinaontem.Tragadoisfrascosparao6204.
—Éurgente?—perguntouarecepcionista.
Leahfezumacareta.—Sim,éurgente!Éparajá.
—Háumaligaçãoparavocê.
— Você acha que tenho condiçõ es de atender a uma ligaçã o? Urgente foi palavra sua,
menina.Porfavor,rápido!
— Está bem — disse a garota. — Nã o me culpe depois por eu nã o ter avisado sobre a
ligação.
LeahsegurouBuckpelamangadacamisaepuxou-oparapertodoleitodomédico.
— Eu preciso fazer algumas perguntas a ele. Quando a garota bater na porta, pegue
rapidamenteomedicamentoefecheaporta.
Buckassentiucomacabeça.
—Vamoslá,doutor—eladisse.—Quandosurgiramosprimeirossintomas?
—Hápoucotempo—eleresmungou.
—Poucotemponãosignificanada.Quando?
—Souumidiota.
—Nósdoissabemosdisso.Quantotempodepoisdevocêtercuidadodaqueleabortoaqui?
—Talvezunsseismeses.
—Evocênãotomounenhumaprovidência?
Elebalançouacabeçanegativamente.—Fiqueiesperandoquenadaacontecesse.
—Oquetenhoaquinãovaifuncionar.
—Foiporissoquenãofiznada.
— Você sabe que o ú nico antı́doto que o Posto de Saú de tem disponı́vel é a antitoxina, e
ninguém...
—Dequalquerforma,étardedemais.LeaholhouparaBuckcomardesolado.
—Eletemrazã o—eladisse.—Aantitoxinanã ovaiservirnemparaeleterumamorte
maistranqüila.
—Oquevocêestádizendo?—perguntouBuck.—Elenãotemnenhumachance?
Omédicobalançouacabeçadeumladoparaooutroefechouosolhos.
—Adosagemmá ximadeantitoxinaserá comoumpingod'á guanooceano—disseLeah.
—Vocêconsegueenxergar,doutor?
—Quasenada.
Leahmordeuoslábios.
Algué m bateu na porta. Buck abriu-a e estendeu a mã o para pegar o medicamento. A
garotanãoquisentregar-lhe.Comumgestobrusco,eleotomoudasmãosdela.
— Srta. Rose — a garota gritou por cima dos ombros de Buck. — Aquela ligaçã o era da
CG!
Buckfechouaporta,masLeahpassouporele,abriu-aechamouamoça.
—CGdeonde?
—DeWisconsin,acho.
—Oquevocêdisseaeles?
—Quevocêestavaocupadacomumpaciente.
—Vocêdissequemeraopaciente?
—Eunãoseiquemeleé.Sóseiqueéummédico.
—Masvocênãodissenada,disse?
—Eudeveriaterdito?
—Fiqueesperandoali.
—Sintomuito,nãoposso.
—Ésóporalgunsinstantes.
Leahvoltouaentrarnoquarto,encheurapidamenteduasseringascomomedicamentoe
injetou-asnasnádegasdeFloyd.Elenãofeznenhummovimento.
—Peçaaelaqueentre—disseLeahaBuck.
Ele abriu a porta e fez um sinal para a garota. A princı́pio, ela hesitou, mas depois
aproximou-selentamente.
—Vamos!—eledisse.—Ningué mvaimachucarvocê .Assimqueagarotapô sacabeça
novãodaporta,Leahdisse:
—Tragaminhabolsaaquiomaisrápidoquepuder,porfavor.
—Claro,mas...
—Urgente,meubem.Urgente!Agarotasaiucorrendo.
—Oqueestáacontecendo?—perguntouBuck.
—Pegueseucarroeestacione-onosfundosdohospital.Há umasaı́dapeloporã o.Voume
encontrarcomvocêlá.
—Mas,seeleestámorrendo,comovocê...
Leah agarrou-o pelos braços. — Sr. Williams, o Dr. Charles e eu nã o estamos brincando.
Estehomempodemorrerantesdeconseguirmoslevá-loatéocarro.Seosenhorquiserenterrálo, cremá -lo ou fazer outra coisa qualquer sem que ele seja visto aqui, me espere na porta dos
fundos. A CG de Wisconsin nã o lhe diz alguma coisa? Era lá que ele trabalhava, o senhor se
lembra?Foidelá queelesaiusempermissã o.Elesestã oatrá sdeleportodaparte,observando
tudo, imaginando que ele está nesta regiã o, e poderá aparecer aqui a qualquer momento. Eles
nã osabem,pelomenosdeminhaboca,queelejá esteveumavezaqui.Tenhomentidootempo
todo.Seelesoencontraremaqui,vivooumorto,nóstodosestaremosperdidos.Agoravá!
—Existealgumachancedesalvaravidadele?
—Pegueocarro.
—Sómedigaseémelhorelesairdaquiou...Leahsussurrouemtomdedesespero.
— Ele vai morrer. E só uma questã o de tempo. A palavra onde é irrelevante neste
momento.Omelhorqueeupodiafazerporelefoifeito.Opiordetudoseriaalgué mencontrá -lo
aqui.
Macconsultouseureló gio.—Tenhotempoparavocê smecontaremcomocomeçarama
namorar.
—Achoquevocêjáouviudetalhessuficientes,capitão.
—Vamos!Eusouumvelhoromântico.
—Nãofoinadafácil—disseDavid.—EunãoqueriaquevocêeRayfordsoubessem.
—Tudobem,masporquê?
—Naépoca,achávamosquequantomenospessoassoubessem,melhor.
—Precisamosentraremcontatocomtodososcrentesquepudermos.
—Eusei—disseDavid.—Mastudoeramuitonovoparanó s,enã osabı́amosemquem
confiar.
—Sevocêsqueremsaber,Rayeeununcadesconfiamosdenada.
— Foi um bom treinamento, se é que estou usando a palavra certa. O que vai acontecer
quandoosmanda-chuvascomeçaremaprocurarumamarcaquenãotemos?
—Ninguémmaispoderáseesconder,crianças.
Depois de pegar o elevador principal e chegar ao primeiro andar, Buck se deu conta de
que, para sair, precisaria passar pela recepcionista. Ele nã o queria, por nada deste mundo, que
elavisseseuRover.Buckpensouemdistraı́- la ingindoumcasodeemergê ncia,mas,aoentrar
no saguã o para dirigir-se à porta principal, ele avistou uma senhora robusta, de meia-idade,
ocupando o lugar da garota. Claro! A garota estava levando para Leah a bolsa que ela pedira.
Leahhaviafeitoaquiloparaafastá-ladarecepção.
Buckcaminhouapressadoaté ocarro.Enquantoodirigia,contornandoalateraldoedifı́c io
rumoà entradadosfundos,eleavistouasubstitutaempé pertodajanela,olhandoparafora.Ele
só esperava que a garota nã o tivesse pedido à sua substituta que descobrisse aonde seu carro
estavaindo.
Buckpisounofreiocomforça,fazendoocarroderraparnapistaasfaltadaquedavaacesso
à saı́dadosfundos.ElesaltoudoRovereabriuaportaenquantoLeah,comumasacolasobreos
ombros,empurravaumamaçaondeFloydCharlesestavadeitadocomumlençolcobrindo-lhea
cabeça.
—Eleestámorto?—perguntouBuck,semacreditar.
—Não!Masaspessoasestãolongedaqui,eninguémvaiidentificá-lo,vai?
—Sóarecepcionista.
Buckabaixouoencostodobancotraseiro,eLeahempurrouamaçaparadentrodocarro.
—Vocêestásurrupiandoestamaça?—eleperguntou.
—Eucoloqueialgumascoisasnabolsaquevalemmaisdoqueestamaça—eladisse.—
OsenhorquerdiscutiréticaoupreferelutarcomopessoaldaCG?
— Nem uma coisa nem outra — ele disse, enquanto ambos sentavam-se nos bancos da
frente.—Masagorasomoscúmplices,não?
— Nã o sei quanto ao senhor, Sr. Williams, mas estou envolvida nisso até o pescoço. Este
hospital está sendo dirigido pela CG há anos. Por quanto tempo eu ia conseguir trabalhar para
Carpathiasemestamparamarcadabesta?Euseriaaprimeiraamorrer.
—Semdúvida—disseBuck.
—Bem,eusómeaproprieideumamaçaedeuma
boaquantidadedemedicamentosdoinimigo.Seosenhorvê problemanisto,sintomuito.
Eunãovejo.Estamosemguerra.Valetudo,conformesediz.
—Nãotenhoargumentosparacontestar.Mas...paraondeestoulevandovocê?
— Para onde o senhor acha? Vire à esquerda, e eu lhe indicarei o caminho. Ningué m da
recepçãovaiverosenhorpassar.
—Edepois,paraondevamos?
—Meuapartamento.
—EseopessoaldaCGestiverlá?
—Continuaremosrodando.
—Seelesnãoestiverem,vocêvaicuidardeFloydno...
—Osenhornãoestápensando...
—Vamospararcomasformalidades,Leah.Já quevocê pô sumamigomoribundodentro
demeucarro,émelhorcontar-meoquetememmente.
— Ilido bem — ela disse. — Se conseguirmos chegar ao meu apartamento antes da CG,
vou pegar minhas coisas e volto em um minuto. Você sabe que eles estã o a caminho e virã o
atrásdemimassimquedescobriremquefugidoYoung.
—Eparaondevoulevá-ladepois?
—Ondevocêmora?
—Ondeeumoro?
—Acertou,Buck.Euprecisomeesconder.Você eseupessoalsã oosú nicosqueconheço
quetêmumlugarparaseesconderem.
—Masnãopodemoscontaraninguémonde...
—Ah!sim,você podeevaimecontar.Senã opudercon iaremmimdepoisdetudooque
aconteceu,nã ovaipodercon iaremningué m.EuoajudeiatirarRitz,aqueleseuamigopiloto,
do hospital. Ajudei o mé dico a fazer o aborto do bebê nã o sei de quem. A propó sito, como vai
aquelamoça?
—Estámelhorando.
—Queironia!Omé dicotratoudoenvenenamentodela,eessemesmovenenovaimatá lo.
—NósperdemosRitz.
—Perderam?
—ElefoimortoemIsrael.Éumalongahistória.
De repente, Leah mergulhou em silê ncio. Limitou-se a indicar o caminho enquanto Buck
segurava irme o volante do carro que rodava por cima de barrancos, mudando de marcha o
tempotodoatéficarcomobraçoquaseamortecido.
—Eugosteidaquelesujeito—eladissefinalmente.
—Todosnósgostávamosdele.Detestamosestasituaçãoemqueestamosvivendo.
—Masvocêvaimelevaratésuacasa,cowboy.Vocêsabedisso,não?
—Eunãopossodecidirsozinho.
Leah olhou irme para ele. — O que você pretende fazer? Deixar-me na esquina de olhos
vendadosenquantovocê eseuscompanheirosfazemumavotaçã o?Você medeveestefavore
sabe disso. Eu nã o costumo me convidar para morar na casa dos outros. Arrisquei a vida por
vocêsenãotenhoninguémmaisaquemrecorrer.
Omédicocomeçouaagonizar.SuarespiraçãoroucaecrepitantecomoveuBuck.
—Émelhorpararocarro?—eleperguntou.
— Nã o — ela respondeu. — Nã o há nada que eu possa fazer agora a nã o ser aplicar-lhe
umadosedemorfina.
—Issovaiajudar?
—Sóvaialiviarosofrimentoetalveznocauteá-loantesdemorrer.
—Façaalgumacoisa!—gritouFloydcomumgemido.-Qualquercoisa!
Leah virou-se para trá s, ajoelhou-se no banco e começou a vasculhar sua sacola. Buck
reduziuamarchainvoluntariamente,tentandoveroquesepassava.Acenaeraterrı́vel.Floyd
ia morrer enquanto Buck estivesse dirigindo o carro! Sem despedidas, sem oraçã o, sem
nenhuma palavra de conforto. Buck mal conhecia aquele homem, apesar de estar morando na
mesmacasaqueelepormaisdeumano.
— Olhe para a frente — ela disse a Buck. — Isto vai acalmá -lo, mas ele nã o sairá vivo
destecarro.
Soluçossubiamà gargantadeBuck.ElequerialigarparaChloe,contaraelaeaosoutroso
queestavaacontecendo.Mascomocontartudopelotelefone?Queomé dicoestavamorrendoe
que ele levava uma enfermeira no carro para morar com eles? Por outro lado, entrar na casa
secreta sem que ningué m visse, carregando o corpo de Floyd e levando uma nova moradora
tambémnãoseriafácil.MasBucknãotinhaalternativa.
As ruas pró ximas ao apartamento de Leah — e o que restara das casas vizinhas —
estavam apinhadas de veı́c ulos da CG. A mor ina havia acalmado Floyd. Leah escondeu-se
debaixo do painel, e Buck desviou da rua em que ela morava. Dirigiu o carro para Monte
Prospect, na esperança de que Floyd pudesse, ao menos, ter o privilé gio de morrer na pró pria
cama.
CAPÍTULO4
No inal daquela noite, David Hassid acompanhou Mac McCullum até o apartamento do
pilotonaalaresidencialanexaaopaláciodaCG.
—ExistemcoisasquenãoconteinemmesmoaAnnie-disseDavid.
— Eu sabia que você tinha algo mais a me contar, garoto. Caso contrá rio, teria
acompanhadoAnnie,não?
—Estamostentandonãoservistosjuntos.Nemseiseareuniãodelajáterminou.
— O que está havendo? — perguntou Mac quando ambos chegaram à porta de seu
apartamento.
— Você sabe que eu estive trabalhando no palá cio ajudando o pessoal a instalar um
sistemaparadetectarescutaclandestina.
—Sei,mascomovocêconseguiuserdesignadoparafazeressetipodetrabalho?
—ConverseidiversasvezescomLeondizendo-lhequantoeuachavaimportantequeeles
tivessemtotalprivacidadenas
comunicaçõ es.Eume izpassarporumidealistasonhador,eaté hojeelesmeconsideram
assim.Vocêsabealgumacoisasobreainstalação?
Mac assentiu com a cabeça. — Sei que é o melhor sistema que existe no mundo, essas
coisas.
—Éverdade,maseleprecisaserconstantementemonitorado.
—Claro.
—Eumecandidateiparaessafunção,etodosgostaramdaidéia—disseDavid.
—Estououvindo.
—Éissoqueeusou.
—Éoquê?
— Eu monitoro o sistema que detecta escuta clandestina nos escritó rios de Carpathia e
Fortunato.
—Continue.
—Minhafunçã oé descobrirsealgué mestá naescuta.Eusouoresponsá velepossoouvir
qualquercoisaquequiser,quandoeuquiser.
Macbalançouacabeça,admirado.
— Eu nã o fazia questã o nenhuma de saber disso. David, você está sentado em cima de
umabomba.
—Eeunãosei?Masninguémtemcondiçõesdesaberqueeuouçoasconversas.
—Garantido?
—Porumlado,é simples.Poroutro,trata-sedeummilagredatecnologia.Aconversaé
gravada em um disco em miniatura embutido na unidade de processamento central do
computadorquecomandatodasasatividadesnaNovaBabilônia.
—AquelecomputadorquecostumamchamardeBesta.
—Sim,porqueeleconté minformaçõ essobretodasaspessoasdestemundo.Masnó sdois
sabemosqueaBestanãoéumamáquina.
Maccruzouosbraçoseencostou-senaparede.
—Umadascoisasqueaprendiarespeitodessetipodemonitorizaçã oé queagentenunca
devefazercópiasdenada.Elaspodemcairemmãoserradas.
—Eusei—disseDavid.—Vou-lhecontarcomoprocedoparameproteger.
—Vocêachaqueestamossegurosaqui?—perguntouMacolhandoaoredor.
— Ei! Sou o responsá vel pelo sistema. O que estamos conversando pode estar sendo
gravado em meu disco, mas ningué m vai ter condiçõ es de ouvir. Eu mesmo nã o ouço nada, a
nã o ser quando é necessá rio. E quando ouço, tudo ica catalogado por data, hora e local. A
fidelidadeéimpressionante,nãoexistenadaigual.
Macdeuumassobio.—Alguémdeveterfabricadoesseaparelhoparavocê.
—Exatamente.
—Alguémemquemvocêconfiadecorpoealma.
—Vocêestáolhandoparaele.
—Então,comovocêtemtantacertezadequeninguémvaidescobrir?
—Nã oestougarantindonada.Estoudizendoqueelesnuncavã osercapazesdeteracesso
aqualquercoisaquesejagravada.Odiscotemmaisoumenosdoiscentı́m etrosdediâ metro.E,
por causa da tecnologia digital por supercompressã o, ele pode armazenar quase dez anos de
conversasgravadas24horaspordia.Everdadequenã ovamosprecisardetantotempoassim,
vamos?
—Não.Maselesdevemterumsistemaquecontrolatudooquesepassaporaqui.
—Elestêm.Masnãovãoencontrarnada.
—Eseencontrarem?
David encolheu os ombros. — Digamos que algué m descon ie de mim e comece a
examinarosdispositivos.
Eles vã o localizá -los na Unidade Central de Processamento, esmiuçar tudo e encontrar o
disco. O disco é criptografado de uma maneira tã o complicada que, se eles tentarem fazer
combinaçõ es ao acaso a uma mé dia de dez mil dı́gitos por segundo durante mil anos, mal
chegarã o ao começo. Você sabe que um nú m ero de 15 dı́gitos tem trilhõ es de combinaçõ es,
mas, teoricamente, teria condiçõ es de ser decifrado. Como algué m poderia tentar fazer uma
combinaçãodenúmeroscriptografadoscontendo300milhõesdedígitos?
Maccocouosolhos.—Eunasciemoutraé poca.Comovocê s,jovens,conseguemchegar
aessesnúmerosmalucos?Ecomovocêpodeteracessoaseudiscoseeleestácriptografado?
Davidfalavasobreoassuntocadavezcommaisentusiasmo.
—Eaı́ queestá amaravilhadetudo.Euconheçoafó rmula.Seioqueopidamilioné sima
partedeumdı́gitotemavercomeleeseitambé mqueadataeotemporelacionadosà quele
exato instante sã o usados como fator de multiplicaçã o. Sei que esses nú m eros oscilam para a
frente e para trá s, dependendo de vá rios fatores. O nú m ero que serve para decifrar agora é
diferente do nú m ero que vai ser decifrado no instante seguinte, e ele nã o progride de maneira
ló gica. Digamos que algué mconseguisseesmiuçarmeudiscoapontodechegarà ú ltimaetapa
parafazeracombinaçã odecó digos,oquejá seriaummilagre.Mesmoqueeledescobrisse qual
éonúmero,somenteumcomputadorcomavelocidadedaluz,trabalhandodurantemaisdeum
ano,conseguiriadecifrar.
—Eoquevocêouviuatéagoracompensoutodoessetrabalho?
—EleseráútilaoComandoTribulação,vocênãoacha?
—Comovocê conseguetransmitirasinformaçõ esaopessoaldoComandosemprejudicar
asuasegurançaouadeles?
Davidsentou-senochãocomascostasapoiadasnaparede.
—Tudoaquilotambé mestá criptografado,masnã oapontodeeleslevaremavidainteira
para descobrir. Até agora, fomos capazes de nos comunicar por telefone e pela tecnologia
celular-solaridealizadaporCarpathia,usandofaixasderá diocodi icadasqueningué mconsegue
detectar. E claro que ele está constantemente me inquirindo para descobrir maneiras de
monitorartodososcidadãos.
—Paraobemdele,éclaro.
—Oh!não.Opotentadosepreocupamuitocomamoraldesuafamíliaglobal.
—Mas,David,umatransmissãoqualquernãopodeserinterceptada?
David encolheu os ombros. — Gosto de acreditar que sou capaz de grampear tudo.
Coloqueimeuaparelhoà provaetenteirastreá -lo.Descobriquenã ohá condiçõ es,anã oserque
eu deixe algumas pistas. A decodi icaçã o aleató ria e a mudança de canal combinadas com
miniaturizaçã oevelocidadefazemcomqueas ibrasó pticaspareçamumbarcoaremo...mas
nadaagorapareceserimpossível.
Macesticouocorpo.
— Você já parou para pensar nestas coisas? Conforme o Dr. Ben-Judá diz, Sataná s vai
tornar-se prı́ncipe e dono de todo o espaço aé reo. As transmissõ es por meio do espaço e todo
aquele...
—Eumorrodemedo—disseDavid,aindasentado.-Signi icaqueestounalinhadefrente
nabatalhacontraele.Quandomeconverti,eunã osabiaqualamissã oquemeseriadesignada,
masacabeiindopararnolugarcerto,não?Étardedemaisparamudardeopinião.Pisoomesmo
chã oqueoanticristoebrinconoespaçocomodemô nio.Tomocuidado,masamarcadabesta
vai mudar tudo. Nã o poderá havernenhum crente trabalhando aqui, a menos que a gente
descubraummododefalsificaramarca.Equemgostariadefazeristo?
— Eu nã o — disse Mac, girando a chave na fechadura da porta de seu quarto. — Mais
cedo ou mais tarde, vamos todos parar na casa secreta ou em outro lugar parecido. Espero
morarnomesmolugarquevocê.
Davidficoutãocomovidocomaqueleelogioquenãoconseguiudizermaisnada.
—Tenhoumlongovô onasexta-feira—complementouMac.—Precisodescobrirquem
estáandandocomLeonesepossotrazerAbdullahatéaquiatempodeelenosajudar.
Atensã odotrabalho,pormaisexcitantequefosseaumjovem,pesavasobreDavid.Mas
eledirigiu-seaseuquartocompassosligeiros.
Floyd estava calmo. A mor ina devia estar produzindo efeito. A uma distâ ncia de pouco
mais de um quilô m etro da casa secreta, Buck reduziu a velocidade e olhou pelo espelho
retrovisor.Ninguémoseguia.Seutelefonetocou,assustando-o.
—AquiéBuck—eledisse.
—Vocêprecisamecontaroqueestáacontecendo—disseChloe.
—Jáestouchegando.Daquiaalgunsminutos.
—Floydestácomvocê?
—Sim,maselenãoestábem.
—Hattieeeutrocamosasroupasdacamadeleearejamosoquarto.
—Ótimo.Elevaiprecisardeajuda.
—Comoeleestá,Buck?Evocê?
—Conversaremosquandoeuchegaraí,querida.
—Buck!Estátudobem?
—Porfavor,Chloe.Jáestamoschegando.
—Estácerto—eladisseemtomdedesagrado.
Eledesligouotelefoneecolocou-onobolso.Emseguida,olhouparaLeaheperguntou:
—Elevaiatravessarestanoite?
—Sintomuito,Buck.Eleestámorto.
Buck pisou com força no freio e ambos quase bateram a cabeça no vidro. O Rover
derrapounaterra.
—Oquê?
—Sintomuito.
Buck virou-se para trá s. Leah cobrira novamente o rosto de Floyd, mas a freada brusca
atiraraocorpodelecontraoencostodobancodafrente.
—Você sabequemé estehomem?—perguntouBuck,assustadocomotomdesesperado
desuavoz.
—Seiqueeleeraumbommédicoeumhomemcorajoso.
—ElearriscouavidaparamedizerparaondeaCGlevouChloe.Ajudou-aafugir.Cuidou
de Hattie durante dias. Salvou a vida dela durante o aborto, quando a criança nasceu morta.
Nuncaseachouimportantedemaisparafazertrabalhospesados.
—Sintomuitíssimo,Buck.
Buck afastou o lençol do rosto de Floyd. No escuro, ele quase nã o conseguiu ver nada.
Acendeualuzinternadocarroeteveumsobressaltoaoveramá scaradamorte.Osdentesde
Floydestavamàmostra,olhosabertosaindainjetadosaoredordaspupilas.
—Oh!doutor!—eledisse.
Leah virou-se para trá s e vasculhou sua sacola à procura de luvas de lá tex. Ela fechou os
olhoseabocadeFloydemassageousuasbochechas,deixando-ocomaparê nciadeestarapenas
dormindo.
—Ajude-meacolocá-loemposiçãomaisadequada—eladisse.
BuckpuxouFloydporumdosombros,eLeah,pelooutro,eambosarrumaramseucorpo
nobancoparaqueele icasseemposiçã oderepouso.Buckcontinuouadirigiremmarchalenta,
desviandodeburacoselombadas.
QuandoBuckchegouà casasecreta,acortinafoientreabertaeeleavistouChloeespiando
pela fresta. Ela estava amamentando Kenny. Buck contornou a lateral da casa e parou no
quintal.
—Aguardeumpoucoaqui—eledisseaLeah.—Vocênãoseimportadeficarcomele...?
—Vá—disseLeah.
Chloe abriu a porta dos fundos com uma das mã os, segurando Kenny com a outra,
aconchegando-oaoombro.
— Quem está com você ? — ela perguntou. — Eu nã o vi Floyd. Buck sentia-se arrasado.
Ele inclinou-se para a frente para beijar Chloe no rosto. Em seguida, fez o mesmo com Kenny,
noexatomomentoemqueobebêarrotou.
—Vocêpodecolocá-lonoberço?—elepediu.
—Buck...
—Porfavor—eledisse.—Precisoconversarcomtodosdacasa.Osoutrosoaguardavam
nacozinha.Chloefoicolocarobebê noberçoeretornourapidamente.Rayfordestavasentadoà
mesa. Suas roupas demonstravam que ele havia passado horas trabalhando no porã o. Hattie
estava sentada na ponta da mesa. Tsion, com ar triste de quem já sabia de tudo, estava
encostadonageladeira.
Buck sentiu di iculdade para falar. Chloe aproximou-se dele e passou o braço ao redor de
suacintura.
—Temosumnovomá rtir—eledisse,econtoutodaahistó ria,inclusivequeLeahestava
nocarroaguardandoaoladodocorpodeFloyd.
Tsionabaixouacabeça.
—QueDeusoabençoe—eledissecomvozrouca.
Hattiepareciaabalada.
—Elemorreuporminhacausa?Euocontaminei?ChloeabraçouBuckechoroucomele.
—Alguémdenóspodeestarcontaminado?
— Nã o — disse Buck. — Já terı́amos apresentado algum sintoma. Floyd apresentou os
sintomas,masnãonoscontounada.
Buck olhou de relance para Rayford. Todos estavam acostumados a recorrer a ele.
Enquanto Tsion encarregava-se de orar, Rayford deveria orientá -los a respeito de Leah, do
sepultamento, de tudo en im. Mas ele nã o esboçou nenhuma reaçã o. Continuou sentado, sem
nenhuma expressã o no rosto, com os braços apoiados na mesa. Quando os olhos de Rayford se
cruzaram com os seus, Buck notou no semblante de seu sogro um ar de indagaçã o, como se
quisessedizer:"Oquevocêsesperamqueeufaça?"
OndeestavaRayford,olíder,ocomandantedogrupo?
— Nó s... nã o devemos deixar Leah esperando muito tempo lá fora — disse Buck. — E
precisamostomarprovidênciasemrelaçãoaocorpo.
AoverqueRayfordcontinuavaencarando-o,Buckdesviouoolhar.Será queelehaviafeito
algumacoisaerrada?Queoutradecisã oelepoderiatertomado,anã oserlevarFloydà spressas
paraohospitaletrazê-lodevolta,acompanhadodeLeah?
—Papai?—disseChloecomdelicadeza.
—Oquefoi?—perguntouRayfordsecamente,virando-separaafilha.
—Eusó...Euestou...querendosaber...
— O quê ? O quê ? Você está querendo saber o que devemos fazer neste momento? —
Rayfordlevantou-se,empurrandoacadeirabruscamentecontraaparede,fazendo-atombarde
ladonochã o.—Tudoeu!—Bucknuncaoouviralevantaravozdaquelamaneira.—Tudoeu!
—berrouRayford.—Comovamospoderagüentartudoisso?Atéquepontovamossuportar?
Rayfordpegouacadeiraeendireitou-acomtantaforçaqueelatombounovamente.Elea
chutou de encontro à parede, mas ela voou por cima da mesa. Hattie desviou o corpo para
proteger-seecaiunosbraçosdeTsion.
—Rayford—disseTsionemvozbaixa.
Acadeiranã oatingiuHattie.Bateunapontadamesaegirou,indopararpertodeRayford.
Elesentou-secomraivanacadeiraebateucomasduasmãosfechadasnamesa.
TsionsoltouHattie,quetremiadesusto.
—Achoquedeveríamos...—elecomeçouadizer,masRayfordointerrompeu.
— Perdoem-me — ele disse, ainda furioso, sem conseguir olhar para ningué m. — Traga
Leahaqui.Depoisvamosenterrarocorpo.Tsion,vocêpoderiadizeralgumas...
—Claro.EmelhortrazermosLeahparacá a imdedeixá -lamaisconfortá vel.Depoisdo
sepultamento,conversaremoscomela.
Rayford concordou. — Perdoem-me — ele disse mais uma vez. Buck foi até o Rover,
conduziuLeahparadentrodecasaeapresentou-aatodos.
—Lamentomuitoaperdaquevocê ssofreram—eladisse.-Eunã oconheciamuitobemo
Dr.Charles,mas...
—Antesdetudo,vamosorar—disseTsion.—Maistarde,vocênoscontasuahistória.
—Claro.
Quando Tsion ajoelhou-se no chã o, os outros izeram o mesmo, menos Hattie, que
permaneceuempé.
SenhorDeus,nossoPai,disseTsion,comvozfracaetrê mula.Confessamos que estamos no
limite de nossas forças quando nos dirigimos a ti em tempos terríveis como estes, quando
perdemosmaisummembrodenossafamília.Édi ícildeaceitarisso.Nãosabemosatéqueponto
teremos condições de suportar tanto sofrimento. Tudo o que podemos fazer é con iar em tua
promessa de que, um dia, veremos novamente o nosso querido irmão, onde a tristeza se
transformaráemcânticosdealegria,ondenãohaverámaislágrimas.
QuandoTsionterminouaoração,Buckdirigiu-separaaescadadoporão.
—Aondevocêvai?—perguntouRayford.
—Pegaraspás.
—Tragaumasó.
—Éumtrabalhopesado,Ray.Duasmãosamais...
—Tragaumasó,Buck—eledisse.Emseguida,dirigiu-seaLeah.—Srta.Rose,queroque
você me esclareça uma coisa. Floyd morreu por causa do veneno que Carpathia usou para
tentarmatarHattie,estoucerto?
—Éoqueeuacho.
—Queroumarespostadireta,madame.
— Senhor, eu só sei o que o Dr. Charles me contou. Nã o iquei sabendo como Hattie foi
envenenada,mastudomelevaacrerqueFloydfoicontaminadoporela.
— Entã o, Nicolae Carpathia é responsá vel por esta morte. Buck icou impressionado
diantedaatitudedeLeah,quenãosesentiunaobrigaçãoderesponder.
—Houveumassassinato,pessoal—complementouRayford.—Puroesimples.
—Rayford—disseTsion-,CarpathianuncaouviufalardoDr.Charles.Emborapossamos
dizercomsegurançaqueeletentoumataraSrta.Durham...
—Eunã oestoufalandodeumtribunaldeculpa—disseRayford,comorostovermelho.
—EstoufalandoqueovenenoqueCarpathiamandouprepararparamataralguémmatouFloyd.
Tsionencolheuosombrosdemaneiraresignada.
—Buck—disseRayford,dirigindo-seaseugenro-,ondeestáminhapá?
—Porfavor,deixe-meajudar—disseBuck.Rayfordlevantou-secomocorpoereto.
—Poupe-mededizeralgumacoisadaqualeuvámearrependeramanhã,porfavor,Buck.
Estamissãoéminha.Éumacoisaqueeuprecisofazer,estábem?
—Masacovaprecisaterumaprofundidadedemaisdedoismetros,vai icarmuitoperto
dacasae...—Bucklevantouasduasmã osemsinalderendiçã oaoveroardeimpaciê nciano
rostodeRayford.Elefoiatéoporãoetrouxeamaiorpáqueencontrou.
Enquanto Rayford trabalhava no quintal, Leah conversou com o pessoal sobre a melhor
maneira de preparar o corpo para ser enterrado. Sem ter condiçõ es de encontrar cal para
revestirotúmulo,elainventouumsubstitutofeitodeprodutosusadosnacozinha.
—Buck—eladisse-,vamosenvolverocorpocomplásticoresistenteeàprovad'água.
Leahdistribuiuluvasatodososqueteriamcontatocomocorpoeprescreveuumasoluçã o
paradesinfetaroRovereamaça.
Buck icousurpresodiantedoqueRayfordconseguirarealizar,depoisdetertrabalhadoo
dia inteiro no abrigo. Abriu uma cova de dois metros de comprimento, um metro de largura e
dois metros e meio de profundidade. Ele precisou de ajuda para sair, com o corpo coberto de
lama. Os trê s homens colocaram na cova o corpo de Floyd envolvido no plá stico, e Rayford
permitiuqueosdoisoajudassemaenchê-lanovamentedeterra.
O grupo todo, exceto o bebê que dormia, icou em pé ao redor da sepultura, onde havia
apenasumafracaclaridadevindadacasa.Chloe,HattieeLeahseajuntaramparaproteger-se
do ar frio da noite. Os homens, que transpiravam por causa do trabalho pesado, també m
começaramatremerdefrio.
Bucksurpreendia-secadavezmaiscomaeloqüênciadeTsion.
— Preciosa é aos olhos do Senhor a morte dos seus santos — ele disse. — Floyd Charles
era nosso irmã o, um membro importante e querido de nossa famı́lia. Se algué m desejar falar
algumacoisasobreele,queofaçaagora.Emseguida,vamosorar.
—Querodizerqueelefoiummédicovocacionadoeumcrentecorajoso—disseLeah.
— Todas as vezes que eu pensar nele, vou pensar em nosso bebê e na saú de de Chloe —
disseBuck.
— Eu també m — complementou Chloe. — Ele nos deixou muitas lembranças em tã o
poucotempo.
Hattie tremia, e Buck notou que Rayford a estava itando, como que esperando que ela
dissesse alguma coisa. Ela olhou para ele. Em seguida, desviou o olhar, balançando
negativamenteacabeça.
—Nada?—perguntouRayford.—Você nã otemnadaadizersobreohomemquesalvou
suavida?
—Rayford!—disseTsion.
— Claro que tenho! — disse Hattie, com voz embargada. -Nã o consigo acreditar que ele
morreuporminhacausa!Eunãoseioquedizer!Esperoqueelesejarecompensado.
—Deixe-medizer-lhemaisumacoisa—prosseguiuRayford,comraivanavoz.—Floyda
amava,Hattie.Vocêotratavacomoseelefosseumobjeto,maseleaamava.
— Eu sei — ela disse, em tom de lamento. — Sei que todos você s me amam à sua
manei...
— Eu estou dizendo que ele a amava.Amavavocê. Preocupava-se com você , queria que
vocêsoubesse.
—Vocêquerdizerque...?Vocênãopodiasaberdisto.
—Elemecontou!Achoqueelequeriaquevocêsoubesse.
— Rayford — disse Tsion, colocando a mã o no ombro dele -, você tem alguma coisa a
maisparadizersobreFloyd?
— Esta morte precisa ser vingada. Da mesma forma que a de Ken, a de Amanda e a de
Bruce.
—AvingançapertenceaoSenhor—disseTsion.
—SeaomenosEletivessemeincluídonessalista—disseRayford.
Tsion olhou irme para ele. — Tome cuidado ao desejar coisas que realmente você nã o
querqueaconteçam.Vamosencerrarestacerimôniacomumaoração.
Buck nã o conseguiu ouvir as palavras de Tsion. Rayford havia começado a chorar. Sua
respiraçã o foi icando ofegante, e ele cobriu a boca com a mã o. De repente, nã o conseguindo
conter os soluços, ele caiu de joelhos no chã o, e seus gemidos ecoaram na noite. Chloe
aproximou-sedeleeoabraçou.
—Está tudobem,papai—eladisse,ajudando-oalevantar-seeconduzindo-oparadentro
dacasa.—Estátudobem.
Rayford afastou-se dela e subiu correndo a escada. Buck segurou Chloe nos braços, e a
lamaquehaviasidotransferidadeseupaiparaasroupasdelatambémsujouassuas.
Empé debaixodochuveironacasasecreta,Rayfordsentia-seagradecidopelopoçoepela
á guaquentequeogeradorlheproporcionava.Seusmú sculoscomeçaramarelaxar.Quedia!A
raiva inexplicá vel que o izera caminhar a passos irmes sob o ar fresco da manhã vinha sendo
acumulada havia meses. O trabalho no porã o nã o servira para abrandá -la, principalmente por
ter trabalhado sozinho o dia todo. A notı́c ia terrı́vel sobre Floyd havia sido a gota d'á gua para
fazê -lo explodir de uma forma que nã o lhe era comum desde 15 anos atrá s, durante suas
discussõ esacaloradascomIrene.Eaquelasdiscussõ eseramconseqü ênciadeexcessodebebida
alcoó lica. Embora ele se sentisse mal por ter sido grosseiro com os outros, havia alguma coisa
em sua raiva que parecia justa. Seria possı́vel que Deus plantara em seu coraçã o essa
intolerâ ncia por injustiça com o ú nico propó sito de prepará -lo para matar Carpathia? Ou ele
estaria enganando a si pró prio? Rayford nã o queria pensar que estava enlouquecendo. Ningué m
entenderia um homem como ele tentando justi icar um assassinato, mesmo que fosse o
assassinatodoanticristo.
Rayford girou o controle do chuveiro para esquentar a á gua até a temperatura má xima
suportá vel e deixou que ela caı́sse sobre sua cabeça. Suas oraçõ es haviam se transformado em
sú plicas para que Deus lhe permitisse executar um ato impensá vel. Por quanto tempo um
homemteriacondiçõ esdesuportartantosofrimento?Elefoioculpadopelaperdadesuaesposa
e ilho.Poderiateridoparaocé ucomelessetivessesidoumhomemdefé ,enã oorgulhoso.E
quanto à perda de Bruce, de Amanda, de Ken e do mé dico? Mas por que ele deveria estar
surpreso? A vida agora nã o passava de um jogo. Será que ele esperava estar entre aqueles que
presenciariamoGloriosoAparecimento?Certamentequenã o,seacertasseumtiroemNicolae
Carpathia. Mas, provavelmente, ele nã o sobreviveria até lá de jeito nenhum. Talvez fosse
fuzilado.
Rayford saiu do chuveiro, jogou uma toalha sobre os ombros e olhou sua imagem no
espelho embaçado. Assim que o vapor se dissipou e seu rosto icou mais nı́t ido, ele mal se
reconheceu. Um ano atrá s, ele se sentia muito bem, e Amanda se impressionara com sua boa
aparê nciaparaumhomemmaduro.Agora,apalavramaduroseriaelogio.Elepareciaesentiase muito mais velho do que sua idade. Acontecia o mesmo com todos, evidentemente, mas
Rayfordacreditavaqueenvelheceramaisdepressadoqueorestodopessoal.
Seu rosto estava magro e marcado por rugas, havia bolsas sob os olhos, e sua boca
demonstravatristeza.Elenuncasepreocuparamuitoemficardeprimidoaoatravessarperíodos
detristezaouabatimento,masagorahaviachegadoomomentodepararparapensar.Estaria
ele deprimido? Clinicamente deprimido? Este era o tipo de conversa que ele deveria ter tido
comFloyd.E,aopensarnonomedele,sentiuumapunhaladanocoraçã o.Aspessoasaseuredor
estavam morrendo e continuariam a morrer até que Jesus retornasse. Isto seria maravilhoso,
mas ele duraria até lá ? Se estava reagindo daquela maneira em relaçã o a Floyd, que ele mal
conhecera,comoseriase...se...Rayfordnã oqueriapensarnesteassunto.Chloe?Obebê ?Buck?
Tsion?
Equantoà quelaenfermeiradohospitalchamadaLeah?Valeriaapenaconversarcomela?
Talvez com uma pro issional, uma pessoa totalmente estranha, ele se sentisse mais à vontade
parafalardecoisasquenã odiriaaningué mdacasa.Pormaisesquisitoqueparecesse,Hattieo
conheciatã obemquantoosoutros,maselacontinuavaaserumaestranha,maisdesconhecida
quearecém-chegada.ElejamaisrevelariaseuspensamentosíntimosaHattie.
Evidentemente, Rayford també m nã o contaria nada a ela sobre seus planos para matar
Carpathia,mastalvezpudesseconseguiralgumaajuda.Talvezelajá tivesselidadocompessoas
deprimidasouconhecessemédicosespecializadosnestaárea.
Enquantoenxugavaoscabelos,Rayfordadmitiuquenã oreconheceraohomemdiantedo
espelhonem o homem que havia dentro dele. Os pensamentos que rondavam sua mente nã o
faziam parte do Rayford Steele que ele pensava ser. Imagine só o que Chloe diria se soubesse.
Maselasóconheciametadedeseusplanos.
Suaagressividadenã oescaparaaosolhosdosdemaisintegrantesdoComandoTribulaçã o.
Eles se perdoaram mutuamente um sem-nú m ero de vezes por coisas insigni icantes. Todos,
menos Tsion. Ele nunca ofendia ningué m, nunca precisava ser perdoado. Algumas pessoas
tinham o dom de viver em estado de graça, mesmo em condiçõ es adversas. Tsion era uma
delas.
Rayford,poré m,haviaexageradoemseucomportamentoegoı́stadentrodeumambiente
tã o restrito. Havia ameaçado ostatus quo, o modo de vida naqueles tempos tã o difı́c eis. Ele
deviaserolı́der.Sabiaquedeviaocuparessepostodamaneiracomofaziaosupervisordeum
time de beisebol. Tsion era aquele que vencia todos os jogos. Mas era Rayford quem deveria
exercerumpapelvital,terumaposiçã odeautoridade,umespı́ritodeliderançacomosefosse
umpresbíterodentrodeumaigreja.
Seráqueeleaindaeradignodessaposição?Porumlado,eletinhacertezadequenão,mas
por outro, se ele realmente tinha sido escolhido por Deus para fazer parte de um assassinato
planejadohaviamuitosséculos,eleeraalguémmuitoespecial.
Rayford saiu do banheiro vestido com um enorme roupã o.Ou sou um homem ungido pelo
Senhorousouummegalomaníaco.Ótimo.Quemvaimedizeroquesou?OvelhoRayfordSteele
lutava consigo mesmo para ser racional, enquanto o irado, indignado, sofredor, deprimido,
frustradoeenclausuradomembrodoComandoTribulaçã ocontinuavaanutrirpensamentosde
grandeza.Ou,pelomenos,devingança.Souumhomemdoente, ele disse a si mesmo. Ele ouviu
vozesnopavimentoinferior.Eramorações.
Mac McCullum fazia sua caminhada matinal com passos irmes enquanto o sol surgia no
horizonte,iluminandoaradiantecidadedaNovaBabilô nia!Abelezadaquelelocaleoprivilé gio
de poder contemplá -lo seriam indescritı́veis se ele estivesse ali em outras circunstâ ncias.
Supermoderna, majestosa, exuberante — eram adjetivos que vinham à mente quando algué m
falavadessareluzentemegalópole.
Poré m, por ter a oportunidade de ouvir secretamente as conversas, Mac tornara-se um
espiã o, um subversivo, um rebelde. Os tempos de treinamento militar, autodisciplina, voz de
comandoe iloso iado"umportodosetodosporum"con litavamcomseusideaisdomomento.
Depois de ter alcançado o posto mais alto em sua carreira de piloto de aeronaves de grande
porte,eleagorafaziausodosestratagemaseartimanhasqueaprenderaparaservirà causade
Deus.
Asatisfaçã odepoderfazerissoerasemelhanteà queelesentiaporaindaterfô legopara
caminhardezquilô m etrospordia,apesardesuaidade.Paraalgumaspessoas,suascaminhadas
eramimpressionantes.Paraele,umanecessidade.Eleestavalutandocontraotempo,contraa
forçadagravidadeecontraumasé riedeproblemasfı́sicosquesurgemcomopassardosanos.
Era assim que ele se sentia em relaçã o a seu trabalho. Devia sentir-se realizado, mas tinha
como patrã o o inimigo de Deus. Por mais importante que fosse essa sua posiçã o, ele devia
exultarpelofatodesaber,semsombradedúvida,queestavadoladocerto—doladovencedor.
Mas o medo encobria qualquer sentimento de jú bilo. No minuto em que começava a
relaxareapreciarsuafunçã odepiloto,logopercebiaoquantosuaposiçã oeravulnerá vel.Ofato
de viver na corda bamba, saber que um ú nico deslize poderia ser o ú ltimo, roubava-lhe toda a
alegriadetrabalhar.Haviaumcertograudesatisfaçã oporsaberqueeleerabomnoquefazia,
tanto o icialmente como à s escondidas. Mas a tensã o constante pela qual passava, imaginando
serdescobertoaqualquermomento,nãofaziapartedoidealdevidadeumserhumano.
Enquantoosolclareavaohorizonteeosuorcomeçavaaescorrerpelacabeçaepelorosto
deMac,imaginavaqueseutrabalhocomoespiã oseriadescobertoantesquepudesseperceber.
Esse era o preço a ser pago. Ele nã o sabia nemquando nemse seria descoberto, poré m uma
coisaeracerta:eleseriaoú ltimoasaber.PorquantotempoCarpathia,Fortunatoouqualquer
um deles lhe permitiria fazer o que bem entendesse e ainda continuasse a ocupar uma funçã o
tã o importante, depois de conhecerem toda a verdade? Será que eles o forçariam a falar,
comprometer os companheiros a quem ele amava e servia, arruinar a precá ria segurança do
grupoqueeletentavaproteger?
Talvez até já tivesse sido descoberto. Como saber? O im de um traidor é como o im de
uma estrela — o resultado só é visto apó s o evento ter ocorrido. Ele deveria icar atento aos
sinais.Será quealgoindicariaomomentocertodecorrer,fugirparaacasasecreta,enviarum
SOSparaoComandoTribulaçã onosEstadosUnidos?Ouserá queelejá estariamortoquandoo
pessoaldoComandotomasseconhecimentodasituação?
Quandofaltavaumquilô m etroemeioparaterminaracaminhada,elefezaú ltimacurva.
Agora o sol batia-lhe nas costas. Sua ú ltima mensagem criptografada a Abdullah Smith havia
colocado o jordaniano no mesmo barco que Mac: "O Departamento de Pessoal fará uma
pergunta direta sobre sua lealdade à causa, à Comunidade Global, ao potentado. Lembre-se,
você é umguerreirodalinhadefrente.Digaoqueelesdesejamouvir.Useosmeiosquequiser
paraconseguiroemprego.Vocêestaráemposiçãodeajudaraimpedirosesquemasdodemônio
everáhomensemulheresaceitaremaCristo,apesardetudo.
"Sevocê nã osouberoquedizer,comoseexpressar, injacomoeu.Diga,semhesitar,que
tem a mesma opiniã o de Mac McCullum a respeito da Comunidade Global e que aceita tanto
quantoeleaspolíticaseasorientaçõesdolíder.Jamaisconteaverdade.
"Nã o estou dizendo que será fá cil. O salá rio é exorbitante, conforme já é de seu
conhecimento,masvocê nã ovaiusufruirdenenhumcentavodele.Osvaloresdasgrati icaçõ es
sã o altos demais, mas você vai sempre sentir que está recebendo um dinheiro sujo, que
necessita ser puri icado. Você será puri icado por Deus porque estamos a serviço do TodoPoderoso. O trabalho vai ser por pouco tempo, porque Tsion Ben-Judá está certo: quando a
marcadabestaforexigidaparacomprarevender,será necessá rioostentá -laparacontinuara
fazer parte da folha de pagamento daqui. Passaremos de funcioná rios de alto nı́vel a fugitivos
internacionais,dodiaparaanoite.
"Euprecisodevocê ,Abdullah,é tudooquepossodizer.Você ,Rayeeutrabalhamosjuntos
nopassado.Nã ovaisertã odivertido,masnã ohaverá umsó instantedesossego.Aguardocom
ansiedade o momento de estar mais uma vez na cabina de comando ao lado de um piloto
respeitáveledeumirmãoemquemconfio.Tudodebomparavocê.Mac."
BuckestavasentadoaoladodeChloenosofá,pertodeTsioneLeah.Láestavaela,recémchegadaà casaejá participandodeumareuniã odeoraçã opelolı́derdogrupo.Buckoravacom
uma certa hesitaçã o, demonstrando sentimento de culpa. Nã o teria sido melhor enfrentar
Rayford? Seria justo estar falando dele pelas costas, mesmo em um momento espiritual como
aquele?CertamenteTsionconversariacomRayfordnomomentoapropriado.
CAPÍTULO5
Rayford detestava sentir-se isolado dos outros. Com seu sonho de eliminar Carpathia
(mesmo que temporariamente), ele passou, ironicamente, a ter mais coisas em comum com
Hattiedoquecomqualqueroutrapessoa.Aculpaeradeleporterperdidoocontroleeassustá los. Mas o que estaria se passando no pavimento inferior à meia-noite? Rayford gostava muito
quandoelesoravamjuntos.Masestariahavendoumareuniã odoComandoTribulaçã osemsua
presença?Eledeveriasentir-seofendido?
Evidentemente, eles eram livres para reunir-se com os irmã os e irmã s que desejassem.
Comandaraquelegruponã oeraomesmoquedirigirumaempresa.Oqueestavaacontecendo
com ele? Desde quando ele passara a se importar com coisas insigni icantes? Rayford desceu a
escadanapontadospésparanãodesviaraatençãodeles.Realmente,ogrupoestavasentadono
sofáenascadeirasdasaladevisitas,decabeçabaixa,orando.Todosestavamlá,menosHattie.
Rayford comoveu-se e, de repente, sentiu o desejo de reunir-se a eles. Mas seus motivos
nã o eram puros. Ele queria reconciliar-se com o grupo sem ter de pedir desculpas mais uma
vez.Ofatodeparticipardeumareuniã odeoraçã oaoladodelesjá seriaumagrandecoisa...Ele
poderiaatéorarepedirperdãoporseuacessoderaiva...
Assim que entrou na sala de visitas, Rayford sentiu doer a consciê ncia. Que tolice! Que
mesquinharia! Ser tã o abençoado por Deus mesmo diante de todo aquele sofrimento e, de
repente,quererusaraoraçã oparamanipular...Elequaseretrocedeu,masagoraqueriareunirseaogrupopormotivoscertos.Nã oqueriaoraremvozalta.Só queriaestaremcomunhã ocom
elesdiantedeDeus,fazerpartedaquelegrupo,daquelaigreja.Elesabiaquesó sesentiriadigno
devoltaraserolı́derquandocompreendessequenãoeradignosevivesseafastadodagraçade
Deus.
Omotivodaoraçãoeraele.Primeiroum,depoisoutro,todosmencionandoseunome.Eles
oravam suplicando força, paz e conforto em sua dor. Eles oravam suplicando para que tivesse
umcontentamentosobrenatural,quandoissoerahumanamenteimpossível.
Rayford poderia sentir-se ofendido por estarem falando dele em oraçã o. Mas estava
envergonhado. Ele havia sido pior do que imaginava. Rayford ajoelhou-se em silê ncio. De
repente,aemoçã oeofervordasoraçõ esodeixaramtã oquebrantadoehumilhadoqueelenã o
teve forças para sufocar os soluços. Ajoelhou-se e inclinou o corpo para a frente, apoiando os
cotovelos no chã o, e chorou alto. Ele lamentava muito, muito mesmo, e estava agradecido
porqueelesconsideravamquevaliaapenaoesforçoparafazê-lovoltaraonormal.
Chloe foi a primeira a correr na direçã o de Rayford, mas, em vez de levantá -lo, ela
ajoelhou-seaoladodeleeoabraçou.RayfordpercebeuqueBucktentoucolocaramã oemsuas
costas. Ele queria dizer a seu genro para nã o se preocupar, que seu apoio moral signi icava
muitacoisa.Tsioncolocouafetuosamenteamã onacabeçadeRayfordeinvocouapresençade
DeusparaqueEle"ajudasseRayfordaatravessaresseperı́ododesofrimento,omaisdifı́c ilque
alguémjátevedesuportar".
Rayfordsedeucontadequeestavachorandopelasegundaveznaquelanoite,só quedesta
vezseuchoronã oeradedesesperança.Elesentiu-seenvolvidopeloamordeDeusepeloapoio
de sua famı́lia. Ainda nã o desistira da idé ia de que Deus poderia usá -lo no merecido castigo a
NicolaeCarpathia,masaquilonã oera—pelomenosnaqueleinstante—tã oimportantequanto
a posiçã o que ele ocupava dentro do grupo. Eles entenderiam que ele nã o podia ser forte
sempre.Ficariamaseuladoquandoeleagissecomoumserhumano.Elesoapoiariam,mesmo
quandoeleerrasse.Comoseriapossívelexpressaressesentimento?
RayfordperceberaqueLeah,apesardenã oconhecê -loosu icienteparatocá -lo,també m
orou por ele. Ela nã o ingiu conhecer o problema. Limitou-se a dar a entender que ele se
descontrolaraequenecessitavadeumtoquedeDeus.
Quando,finalmente,asoraçõescessaram,Rayfordsóconseguiubalbuciar:
—Obrigado,Senhor.
Tsion começou a entoar um câ ntico conhecido. Primeiro Chloe, depois os outros se
juntaramaele.AbençoadossãooslaçosqueunemnossoscoraçõesnoamordeCristo.Acomunhão
comosirmãosquenelecrêemésemelhanteaisto.
Osquatrolevantaram-seeretornaramaseuslugares.Rayfordpuxouumacadeira.
—Penseiquevocêsestivessemvotandoparameexcluirdoclube—eledisse.
Tsiondeuumarisadinha.
—Mesmoquevocê pedissedemissã o,nó snã oaaceitarı́amos—eledisse.—Eugostaria
desaber,Leah,sevocê nã oseimportariadeaguardaraté amanhã paranoscontarsuahistó ria.
Acho que todos nó s tivemos um dia muito cansativo, e gostarı́amos de lhe dar toda a atençã o
quevocêmerece.
—Euiasugeriramesmacoisa—eladisse.—Obrigada.
— Você teria alguma objeçã o em ocupar o quarto em que Floyd costumava dormir? —
perguntouRayford.
— Nã o, a menos que algué m se oponha — ela disse. -Sei que meu pedido talvez pareça
estranho,masnã ovouconseguirdormirsemconhecerorestantedacasa.Será queeupoderia
darumrápidogiroporaqui,sóparasaberondeestãoascoisas?
— Chloe e eu icaremos felizes em mostrar-lhe a casa — disse Rayford, na esperança de
iniciarumentrosamentoentreelesquefacilitasseaconversa.
— Vou ver como está o bebê — disse Buck. Tsion levantou-se, exausto. — Boa noite a
todos.RayfordficouimpressionadoaoverqueChloefoiesperta
osu icienteparanã omostraroporã oaLeah.Elacomeçoupelosfundosdacasa,poronde
Leahentrara.
— Nã o há nada na casa geminada — ela disse. — Sua estrutura foi muito atingida. Você
passouporestasaletaaqui.Elafoireconstruída.Umaárvoretombounestelugarquandohouveo
terremoto e esmagou a esposa do proprietá rio. O marido dela estava em nossa igreja naquele
momentoemorreuquandootemplodesabou.
—Aseguir,vemacozinha—prosseguiuChloe.—Asaladevisitas icaà esquerda.Estaé
asaladejantar,ondenó snunca izemosasrefeiçõ es,só trabalhamos.Depoisdaescada,há um
banheiroeoquartodafrente,ondeBuckeeudormimoscomobebê.
Nopavimentosuperior,elamostrouaLeahooutrobanheiroeosquartosdeRayford,Tsion
eFloyd.
—Obrigada—eladisse.—ERitz?Ondeeledormia?RayfordeChloeentreolharam-se.
—Ah!—eledisse.—EunãosabiaquelhecontaramqueRitzmorouaqui.
—Qualéosegredo?
—Acasatodaéumsegredo.
— Eu nã o deveria saber que ele morou aqui? Fiquei sabendo que o Dr. Charles, o Sr.
WilliamseHattiemoravamaqui.
— Eu imaginei que você nã o soubesse, só isso — disse Rayford. — Desculpe-me se
demonstreialgumadesconfiança.
Leah parou. — Descon iança do quê ? Você quer examinar meu selo na testa? Você teve
con iançaemmimparameenvolveremtodosostiposdeemergê nciapossı́veis.Seeunã ofosse
dignadeconfiança,teriaarriscadoavidaporvocêstodos?
—Lamentomuito,eu...
— Francamente, Sr. Steele. Se eu estivesse trabalhando para a CG, teria avisado o
potentadoquandoHattieabortouo ilhodeleenquantoeuaatendia.Eupoderiaterdenunciado
oDr.Charlesquandoeleincinerouofeto,emvezdeseguirosprocedimentoslegais.Eupoderia
teravisadoasautoridadesquandoseugenromeforçoualiberarRitzcomumferimentoaberto
nacabeça.Você achaqueeunã osabiaquemvocê serameporqueningué mpodiasaberonde
vocêsmoravam?
—Srta.Rose...
— Sou Sra. Rose. Imaginei que Ritz morava aqui porque eu sabia que o aeroporto havia
desabado completamente. E, caso você nã o se lembre, você s e ele estavam juntos quando
levaramHattieaohospital.Será queeudeveriasuporquevocê saiudeseuesconderijoeelefoi
aoseuencontro,partindodeoutrolugar?
—Vocêtemrazão.Eusó...
— Haverá gente que se in iltrará aqui, Sr. Steele. Nã o sei como eles vã o fazer, mas acho
queaCGé capazdetudo.Mas,enquantoelesnã oinventaremumaré plicaperfeitadoseloque
só nó spodemosverunsnosoutros,pensoque ningué m vai ser tã o tolo a ponto de Vir espionar
aqui.Podemesubmeteraointerrogató rioquequiser,masagradeçosevocê nuncamaisadmitir
quedescon iademimsó porqueconheciumhomemquemoravaaqui,cujoprimeironomenem
sequermelembro.
Rayfordolhouparaelacomardedesculpa.
—Seeulhedisserquetiveumdiaterrível,issoserviriadedesculpa?
—Eutambé mtiveumdiaterrı́vel—eladisse.—Digaquenã oestá comreceiodemim,
senãoireiembora.
—Nãoestou.Sintomuito.
—Eutambém.Perdoe-mesefuigrosseira.
Porhoje,chegadeentrosamento,pensouRayford.
—Nãovamosmaisfalardesteassunto—eledisse.
—Querdizerquevocêconfiaemmim?
—Sim!Agoravádormir.Nóstambémvamosfazeromesmo.Sinta-seàvontadeparausar
obanheiroantesdenós.
— Você disse que con ia em mim, nã o disse? Rayford percebeu que até Chloe já estava
perdendoapaciênciacomLeah.
—Estouexausto,Sra.Rose.Jámedesculpei.Jámeconvenci.OK?
—Não.
—Não?—estranhouChloe.—Euprecisodormir.
—Vocêachaquesoucega,idiotaoucoisaparecida?-perguntouLeah.
—Comoassim?—perguntouChloe.
—Ondeficaoabrigo?
Rayford teve um sobressalto. — Você me pergunta sobre o abrigo e nã o quer que eu
desconfiedevocê?
—Nãoexisteumabrigoaqui?
—Porquevocêestáperguntando?Leahbalançouacabeça,aborrecida..
—Istoépiordoqueserconsideradasubversiva.Vocêsachamquesouumatola.
— Eu nã o acho — disse Chloe. — Se você me disser como descobriu que há mais um
cômodoaqui,euomostrareiavocê.
— Obrigada. Se eu estivesse escondida em uma casa secreta, imaginaria que, um dia,
algué miriadescobri-la.Ouvocê stê mumlugarparafugiremcasodeemergê ncia,ouestelugar
vai virar de cabeça para baixo. E mais: isto é tã o ó bvio que eu nem deveria ter perguntado.
DevosuporqueHattiedormeforadacasa?
—Hattie?—disseRayford.
—Sim.Vocêseesqueceudela?Nãovioseloemsuatesta,maselaandaporaquienquanto
vocêstratamdeassuntosespirituais.Ondeeladorme?
Chloedeuumlongosuspiro.
—Vádormir,papai.Voumostraroabrigoaela.
—Obrigada!
Asduascaminharamemdireçãoàescada.Rayfordnãopôderesistirefezumcomentário.
—Vocêtemodomdeserirritante,Leah,sabia?
—Papai!—disseChloe,decostasparaele.—Merecemostudoissoevocêsabeporquê.
Leahparoueencarou-o.
—Eurespeitotodosdestacasa—eladisse.—Masseucomentáriofoimachista.Podeme
chamardefeminista,masvocê nã oteriaditoaumhomem,queestivessetã oofendidoquanto
eu,queareaçãodelefoiirritante.
—Provavelmenteteria.Eudisseoquepensava.
— Obrigada por me fazer perceber que agi como uma pessoa estú pida — disse Leah. —
Hoje, falei com seu genro de um modo que nã o costumo falar com ningué m. E agora fui
grosseiramaisumavez.Nãoseioqueestáacontecendocomigo.
Rayfordsentia-seexatamentedamesmamaneira,masnãoquisadmitir.
—Prometaqueamanhãvocêmedaráumatrégua—eledisse.
—Prometido.
As mulheres desceram a escada, e Rayford, inalmente, foi para seu quarto. Depois de
pendurar o roupã o, ele deitou-se de costas no lençol frio, sentindo os mú sculos doloridos por
causa do trabalho no porã o e no quintal. Ele cruzou as mã os atrá s da cabeça e já estava
começandoaadormecerquandoouviupassosnaescadae,emseguida,umabatidanaportade
seuquarto.
— Eu estava mostrando o porã o a Leah — disse Chloe -, onde Hattie dorme. Só que ela
nãoestálá.
—Hattie?
— Onde ela poderia estar? Nã o está na casa. Nem lá fora, pelo menos até onde eu pude
enxergar.Etemmais,papai.Ascoisasdelanãoestãoaqui.Elalevoutudo.
Rayfordlevantou-seevestiuoroupã o,imaginandoseteriaforçasparaenfrentarmaisum
problemasemdesfalecer.
—Dê umaolhadanoabrigoeveri iqueseocarrodeKenestá lá .VejaseodeBuckainda
está noquintal.Elanã opodeteridomuitolongeapé .Buckpegará ocarrodele,eeu,odeKen.
Vamosatrásdela.
—Papai,nã osabemosquandoHattiesaiu.Elapodetersaı́dodaquilogodepoisdoenterro.
Eunãoavidesdeentão.Evocê?
Elesacudiuacabeça.
—Nãopodemosdeixá-lairlongedaqui.Elasabedemais.
—Vamospensarnopior.Seelaconseguiualgué mparalevá -laaalgumlugar,você nunca
vaiencontrá-la.
Eles começaram a andar pelo local que um dia havia sido uma rua diante da casa, à
procura de marcas de passos. Agora, a rua nã o passava de um caminho empoeirado, cheio de
craterasenormesnoasfalto.Hattiepodiateridoparaqualquerdireçã o.Rayfordpegouocarro
de Ken Ritz e saiu em disparada. Buck pisou fundo no acelerador de seu Land Rover, deixando
atrásdesiumanuvemdepoeira.Buckseguiuparaonorte,eRayford,paraosul.
Quando icou evidente que Hattie nã o se encontrava na vizinhança, Rayford ligou para
Buck.
— Ela nã o está por aqui — disse Buck. — Estou com um mau pressentimento. Nã o
podemosdizeràpolíciaqueeladesapareceu.
—Tiveumaidéia—disseRayford.—Vamosvoltarparacasa.
RayfordligouparaPalwaukee.Atendeuumasecretáriaeletrônica.
— T, aqui é Ray. Se você estiver aı́, atenda, por favor. -Ele aguardou alguns instantes e,
emseguida,ligouparaocelulardeDelanty.
—Alô—eleatendeucomvozsonolenta.
—Desculpe,T.Euoacordei?
—Claroquesim.Oquehouve,Ray?Esperoquenãosejaumaemergência,mas,senãofor,
porquevocêestámeligandoaestahora?
Rayfordopôsapardetudo.
—Eusóqueriasaberseaquelesdoisfolgadosaindaestãozanzandoporaí.
— Ernie e Bo? Faz quase um ano que nã o vejo Ernie. Sinto falta daquele cara, apesar de
eleserumidiota.Ouvidizerqueelefoi para o oeste. Beauregard Hanson, o Bo, ainda está por
aquitentandoconseguiros5%destelugarqueeleachaquetemdireito.Porquê?
— Estou pensando que Hattie pode ter usado Bo para conseguir algué m que a levasse
emboradaquideavião.
— Eu parei de trabalhar à s seis da tarde. Deixei um funcioná rio na torre até à s nove.
Depoisdisso,elefechoutudo.
—Existeapossibilidadedeumaviãodegrandeporteterlevantadovôodaíestanoite?
— Ray, eu nã o posso chamar um sujeito a esta hora da madrugada para fazer esta
perguntaaele.
—Porquenão?Euchameivocê.
—Ah!sim,masvocêtinhacertezadequeeunãoficariacomraivadevocê.
—Nãomesmo?
—Émelhoreunãodizernada.Somosirmãos,vocêselembra?
— Por falar nisto, você é o ú nico irmã o "irmã o" que me restou, se é que entende o que
estoudizendo.
—Oquehouve?
Rayfordcontou-lhesobreFloyd.
—Oh!homem!Sintomuito,Ray.VocênãoestádesconfiandoqueHattie...?
Rayfordcontou-lhecomoFloydachavaquehaviasidocontaminadopeloveneno.
—Tenhomotivosmuitogravesparadescobrirondeelaestá—disseRayford.
—Vouverificarolivroderegistros.
—Vocênãovaiquerersairdaíaestahora.
— Posso veri icar daqui mesmo, irmã o. Aguarde um minuto. Rayford ouviu o rangido da
camadeTe,emseguida,osomdocomputadorsendoligado.Tvoltouaotelefone.
— Estou veri icando a listagem. Nã o houve muito trá fego esta noite. Quase todos eram
aviõespequenos,deempresas,doisdaCG.Humm.
—Oquê?
— Há um pouso estranho aqui. Um Quantum de tamanho exagerado, parecido com um
enormeLearjet,masdeoutrofabricante,chegouà s22h30só comopiloto.Partiuà s23h30com
o tanque cheio, sem carga, tendo a bordo apenas um passageiro nã o identi icado, destino
ignorado.
—Étudo?
— Bem, há uma coluna aqui para indicar se o vô o foi pago, se será cobrado depois ou se
estátudoOK.FoiassinaladoOKporBH,oBo.
—Eunã oconheçoasespeci icaçõ esdoQuantum—disseRayford.—Qualé avelocidade
eautonomiadevôo?
— Ah! a velocidade é a mesma de um aviã o pesado, mas provavelmente vai precisar
reabastecerseforatravessarooceano.Paraondevocêachaquesuafugitivaestáindo?
—Eunã oduvidodequeelapodeterpensadoementrarnoescritó riodeCarpathiaefazer
oserviço.Masnãoexistemeiodealcançarouinterceptaraquelaaeronave,existe?
—Não.Quehorassão?Quaseumadamadrugada?Aquelacoisaestávoandoháumahorae
meia, e, pelo que tudo indica, à velocidade má xima. Mesmo que a gente desconte 20 minutos
paraoaviã opousarnacostaleste,abastecerelevantarvô onovamente,aestahoraelejá deve
estarbemlonge.
— Você conseguiu informaçõ es su icientes para que eu possa passar uma mensagem via
rádioparaaaeronave?
—Penseumpouco,Rayford.0pilotodaqueleaviã osó vairespondersesouberquemestá
chamando.
— Talvez eu consiga inventar uma histó ria, insistir para que ele pouse na Espanha em
razã odealgumaanormalidadenocombustı́veloucoisaparecidaquepossateracontecidoaqui
ouemoutrolugarondeelereabasteceu.
—Vocêestásonhando,Ray.Eutambémgostariadeestarsonhando...
—Dequalquerforma,obrigado,meuamigo.
— Você vai ter de descobrir o paradeiro dela sozinho ou com a ajuda de algum de seus
contatosdelá.
—Eusei.Muitoobrigado,T.Voutentariraté aı́ amanhã paratratardealgunsassuntosda
cooperativa.
—Hoje,vocêquerdizer?
—Issomesmo—disseRayford.
— Talvez eu leve comigo duas pessoas daqui. Queremos cuidar desse negó c io da melhor
maneirapossível.
PeloqueRayfordsabia,Hattietambémseriacapazdeacabardevezcomacooperativa.
MacMcCullumteveumamanhãagitada.DepoisdecumprimentarAnnieChristophercom
umtoquedemã onaabadoquepeenquantopassavapelasaladelanohangar,elechegouà sua
sala, onde encontrou trê s recados. O primeiro era uma lista preparada pela secretá ria de Leon
Fortunato,mencionandoonomedaspessoasautorizadasavoarparaBotsuanadaliatrê sdias.O
supremo comandante, seu criado particular, um assistente, um cozinheiro e dois auxiliares
comporiam o contingente da CG. Dois assessores acompanhariam o presidente Ngumo, de
Botsuana. No recado, havia a seguinte observaçã o: "O Supremo Comandante ordena que a
aeronavefiqueestacionadaenquantoopessoaldeBotsuanaestiverabordo."
Alistatambé mincluı́aocapitã oeoco-piloto,comumasteriscologoapó sonomedeste
ú ltimo.Oasteriscono inaldapá ginamencionavaoseguinte:"OSupremoComandanteacredita
quevocêficarásatisfeitocomaresoluçãotomadaarespeitodesteassunto."
Mac icou contente. O segundo recado era do Departamento de Pessoal a respeito da
solicitaçã o para que Abdullah Smith ocupasse o posto de co-piloto do Condor 216. Alé m de ser
avaliadocomoumpilotoaltamentecapacitadoemtodososaspectosté cnicos,eletambé mfoi
considerado "um cidadã o digno, leal à Comunidade Global". A ú nica ressalva era quanto à sua
habilidadeparaseexpressar("Umpoucolacônico",diziaanota).
Fortunato escrevera por seu pró prio punho na margem: "Parabé ns pela maravilhosa
descoberta,Mac.Smithseráumhomemmuitoimportanteàcausa!S.C.L.F."
Elenãosabedenada,pensouMac.
OterceirorecadoparaMaceradeDavidHassid."Há umamensagemimportanteparao
senhor,capitão.Sópodesertransmitidapessoalmente."
MaceDavidtinhamaprendidoamanterumacondutaimpessoalepro issionaldiantedos
demais funcioná rios. A diferença de idade entre eles ajudava. O conjunto de edifı́c ios da CG,
emborafosseostensivamenteantimilitaremrazã odoreconhecidopaci ismodeCarpathia,era
pseudomilitaremsuaestruturaorganizacional.Macsentia-seconfortá velnopostodecomando,
poispassaragrandepartedesuavidausandofarda.EDavidgeralmenteacatavaosconselhosde
Mac por ter trabalhado em empresa particular antes de ser admitido na CG. Agora os dois
estavamempédeigualdade,trabalhandoemsetoresdiferentes,eseusencontrosocasionaisnão
atraíamaatençãodeninguém.MacfoiconduzidoàsaladeDavidporsuasecretária.
—Capitão—disseDavid,dando-lheumapertodemão.
—Diretor—disseMac,sentando-se.Asecretáriasaiudasala.
—Vejaisto—disseDavid,virandoseu laptopdemodoqueMacpudesseleroqueestava
escritonatela.
Ocapitã osemicerrouosolhoseleuorelatodeRayfordsobreasatividadesdodiaanterior
nacasasecretaemIllinois.
— Oh! nã o — disse Mac — aquele mé dico! A moça foi embora, o mé dico morreu. E o
cúmulo!
—Asituaçãoestápiorando—disseDavid.
Mac leu os detalhes sobre o desaparecimento de Hattie. Em seguida, recostou-se na
cadeira.
—Seráqueeleestárealmentepensando...
DavidfezumgestocomamãoparainterromperMac.
— Enquanto penso no assunto, vou me livrar disto aqui. — Ele apertou algumas teclas
para apagar o arquivo criptografado. — Que ela está vindo para cá ? Nã o acredito. Ela é um
tanto idiota, mas até aonde pensa que vai chegar? E um milagre essa moça ainda estar viva
depoisdetudooqueCarpathiafezparalivrar-sedela.SeelaapareceraquinaNovaBabilô nia,já
era.
Mac concordou com a cabeça. — Ela deve estar escondida em algum lugar, esperando
pegarohomemdesurpresa.
—Nãoacreditoqueelaconsigachegartãoperto.Macbalançouacabeçaconcordando.
—Eoqueeutambé macho.Seupessoalinstaloudoisconjuntosdedetectoresdemetalno
216nasemanapassada.
— O plano é usá -los até mesmo para dignitá rios. E claro que o principal motivo é a
suspeitaqueelestêmemrelaçãoaoPeteDois.
—Eujá sabia.Fortunatopreparouosdezreis...oumelhor,ossubpotentadosregionais...ou
seilá comoosantoNickvaichamá -los,nestasemana...parafazeroserviço.Tenhoaimpressã o
dequeFortunatoosestáforçandoatomaressaatitude.
— Até parece que aqueles sujeitos concordam com qualquer coisa — disse David. —
QuantosdelesvocêachaquesãoleaisaCarpathia?
Mac encolheu os ombros. — Mais da metade. Talvez uns sete. Conheço trê s que
tomariamolugardelesetivessemalgumachance.
—Vocêachaqueelesoderrubariam?
—Emquestãodeminutos.ÉclaroquePetetambém.
—Verdade?
Macinclinouocorpoparaafrenteejuntouaspalmasdasmãos.
—Euouviopró prioPetedizeristo.EleenfrentaCarpathiacomsuaarrogâ ncia,mas inge
ser prestativo. Carpathia se faz de bonzinho com ele o tempo todo, e um faz mesura para o
outro. Mas vou-lhe dizer uma coisa: se Leon nã o se livrar logo de Mathews, vai ter problemas
pelafrente.Existeumaordemclara,comosetivessesidoescrita.
Davidlevantou-se,pegoualgumaspastasdeumagavetaatrá sdeleeespalhouospapé isna
mesa.
—Ésóparadisfarçar,casoalguémestejanosobservando—eledisse.
Macesticouopescoçoparafingirqueestavalendo.
—Elesestãodecabeçaparabaixo,seubobo—disseMac,contendoumsorriso.
—Desculpeminhadistração—disseDavid.
—VocêsabeoqueRayfordandavaplanejando?
—Não,meconte.
— Provocar um acidente aé reo com Carpathia a bordo. David endireitou o corpo e
empinouacabeça.
—Istonã oé bı́blico,é ?Querodizer,seeleforquemnó simaginamos,só vaimorrerno42°
mês,certo?E,mesmoassim,nãovaipermanecermorto.
—Masoqueestoulhecontandoéaverdade.
— Nã o parece fazer parte do modo de ser do capitã o Steele. Ele sempre me pareceu
muitoequilibradoesensível.
—Eunãoqueriaestragaraimagemquevocêtemdele.
—Podeacreditaremmim,você nã oestragou.Nã opossonegarquetambé mjá imaginei
fazerisso.
Maclevantou-seedirigiu-separaaporta.
—Eutambém.
CAPÍTULO6
Os problemas emocionais desgastavam Buck tanto quanto o trabalho fı́sico. Geralmente,
apó s ter trabalhado o dia inteiro com Rayford e Floyd no abrigo subterrâ neo, ele sentia
di iculdade para dormir. Mas, agora, a di iculdade aumentara: ele sofria a perda de Floyd,
receava que Hattie pudesse pô r em perigo o Comando Tribulaçã o e estava assustado com o
estranho comportamento de seu sogro. A exaustã o de Buck havia ultrapassado os limites.
Deitado ao lado de sua abatida mas sempre animada esposa, ele lutava para permanecer
acordadoeouviroqueelaprecisavalhedizer.
Ele e Chloe quase nã o tinham mais tempo para conversar, apesar de passarem a maior
parte do tempo na mesma casa. Ela lamentava nã o poder ser tã o ativa como antes, em parte
porterde icarpresaemcasaporcausadobebê ,emparteporcausadosferimentossofridospor
ocasiãodoterremoto.
— Ningué m mais seria capaz de fazer o que você está fazendo com a cooperativa, meu
bem—elelhedisse.-Imagineosmilhõesdepessoasquedependerãodevocêparaviver.
—Maseuestouà margemdetudo—eladisse.—Passoamaiorpartedodiaconsolando
vocêepapaietomandocontadobebê.
—Nósprecisamosdevocê.
—Eutambémtenhominhasnecessidades,Buck.
Elepassouobraçoaoredordocorpodela.—QuerqueeucuidedeKennyparaquevocê
possaacompanharseupainavisitaqueelevaifazeraTamanhã ?Elesvã otratardeassuntosda
cooperativa.
—Euadoraria.
Buck imaginou ter resmungado alguma coisa. Mas quando Chloe afastou o braço dele e
virou-separaooutrolado,eleentendeuquehaviacochilado.Elahaviaditomaisalgumacoisa;
elesabia.Tentoureunirforçasparaabrirosolhos'
e desculpar-se, terminar a conversa. Mas quanto mais ele tentava, mais confusos seus
pensamentos icavam.Apesardeestardesesperadoporterperdidoumamagnı́ icaoportunidade
dedialogarcomsuaesposa,elemergulhouemsonoprofundo.
No inal da tarde, na Nova Babilô nia, David foi chamado à s pressas para comparecer ao
escritó rio do supremo comandante da Comunidade Global, Leon Fortunato. A luxuosa ala
reservadaaLeoncompreendiao17°andarinteirodonovopalá cio,apenasumandarabaixodo
ocupadoporSuaExcelência,opotentado.
Embora David se reportasse diretamente a Fortunato, os encontros entre eles haviam se
tornadoraros.OorganogramadaCG,conformeMacmencionaramaisdeumavez,tinhadedar
aidé iadeumatigeladeespaguete.Aparentemente,Carpathiatinhaapenasumsubordinado—
alé m de sua secretá ria e alguns lacaios tagarelas que o rodeavam o tempo todo -, e esse
subordinadoeraFortunato.Poré m,aalaadministrativainteiradopalá cioestavasemprecheia
debajuladoresquesevestiamcomoopotentadoeosupremocomandante,andavamcomoeles,
conversavamcomoeles,curvando-seefazendobajulaçõesnapresençadosdois.
David, o funcioná rio mais jovem do setor administrativo, parecia ter conquistado a
simpatiadeseussuperiorespormanterumacondutarespeitosaemrelaçã oà che ia,apropriada
àsuaposição.Mas,naquelemomento,eleestavaemumaencrenca.
Assim que a porta da sala de Fortunato foi fechada e antes que David pudesse sentar em
umadascadeirasluxuosas,Leondirigiu-serispidamenteaele.
—Querosaberondeestã oaquelescomputadoreseporquenã oforaminstaladosconforme
combinamos.
—Ohã...hã...embarque...
—Omaiorembarquedecomputadoresque izemosdesdequeequipamosocastelo...isto
é ,opalá cio—disseLeon,sentando-seemsuacadeiradecouro,queseassemelhavaaumtrono
em razã o de sua imensa estrutura. — Você sabe do que estou falando. Quanto mais você
pigarrear,maissuspeitas...
—Éclaroqueeusei,senhor.Recebemosacargaonteme...
—Ondeelaestá?
—...oscomputadoresnãotêmcondiçõesdeserlevadosdiretamentepara...
— O que há de errado com eles? — vociferou Leon, apontando-lhe inalmente uma
cadeira.
Davidsentou-se.—Trata-sedeumproblematécnico,senhor.
—Defeitodefabricação?
—Eum...problemadelocalização.Elesnãovãofuncionarnopalácio.
Leonfitou-odemaneirapenetrante.
—Elesprecisamsersubstituídos?
—Sim,éaúnicasolução,senhor.
—Então,substitua-os.Vocêentendeuoqueeudisse,não,diretorHassid?
—Sim,senhor.
—Entendeuoqueeuquerodizer?
—Comoassim?
—Quandoeumepreocupocomalgumacoisa,você entendequeapreocupaçã onã oé só
minha,certo?
—Certo,senhor.
—SuaExcelê nciaestá ansiosoparaqueeu...você ...paraqueagentecuidedesteassunto.
Sua Excelê ncia está con iante, porque eu lhe garanti que ele podia icar tranqü ilo, que você ia
tomarcontadetudo.
—Aqueleequipamentoseráinstaladoassimqueforhumanamentepossível.
Leon sacudiu a cabeça. — Nã o estou falando apenas dessa droga de instalaçã o! Estou
falandoderastrearnossosopositores.
—Claro.
—SuaExcelê nciaé umpaci ista,conformevocê sabe.Maseletambé msabequeopoder
de um homem de paz está baseado unicamente em informaçõ es. E por isso que ele monitora
aquelesdoispregadoresmalucosdeJerusalém.
O dia deles vai chegar. Eles já apareceram demais. Por mais condescendente que Sua
Excelê ncia seja em relaçã o a pontos de vistas diferentes dos dele, sabemos que uma facçã o
pequena, poré m in luente, tem a atençã o atraı́da por aqueles rebeldes à nova ordem mundial.
Vocênãoconcorda?
—Seeuconcordo,senhor?Fortunatopareciafrustrado.
—EstoudizendoqueSuaExcelênciatemmotivosparapreocupar-secomessetaldeBenJudáecomseuex-editor,queestácuspindopropagandacontraaCG!
—Ah!sim,concordoplenamente.Eumperigo.Querodizer,sehouvessepequenosgrupos
destes tipos por aı́, que mal poderiam fazer? Mas o nú m ero deles parece ter crescido sob a
bandeirado...
— Exatamente. E eles estã o protegendo a mã e do ilho de Sua Excelê ncia. Ela deve ser
encontrada antes de tentar fazer um aborto, ou pior, revelar informaçõ es que poderiam
prejudicar...—Leonnãocompletouafrase.—Dequalquerforma—eledisse-,substituaaquele
pedido,tenteencontrarumlugaradequadoparaoscomputadoresoucoisaparecida,epeçaao
pessoalquetrabalhenisso.
Buck icouagradecidoporterdespertadoantesdeChloe.Elebeijou-anorosto,ajeitouas
cobertas e deixou um bilhete na mesinha de cabeceira: "Peço desculpas por ter dormido
enquantovocêfalava.Acompanheseupai.Ficareiaquicuidandodobebê.Euaamo."
Dirigiu-se para a cozinha, onde Tsion estava sentado sozinho, ombros caı́dos, tomando o
cafédamanhã.
— Cameron! — ele murmurou. — Se eu soubesse que você estava acordado, teria lhe
preparadoalgumacoisa.
—Nãosepreocupe.Vouadiantarmeusartigose,aomesmotempo,tomarcontadobebê.
Buckserviu-sedeumcopodesucoedebruçou-senobalcãodacozinha.
—ChloevaivisitarTcomRayparaconversaremsobreacooperativa.
Tsionmovimentouacabeçaafirmativamente,comardetristeza.
— Sinto muita falta de Floyd. Eu sabia que havia alguma coisa errada quando ele nã o se
levantou para tomar o café comigo ontem. — Apó s um suspiro, prosseguiu. — O doutor tinha
umaboacabeça.Muitasperguntasemmente.
— Eu nã o tenho uma cabeça boa como a dele, mas tenho muitas perguntas. Você me
contouqueestavatrabalhandoemseuscomentá riossobreosegundoai,osextoJulgamentodas
Trombetas.
— E estou atrasado — disse Tsion. — Com tudo o que aconteceu, nã o tive meios de
transmitirmeuscomentá riosontem.Esperopoderfazeristohojecedoequeolapsodeumdia
nãotenhacriadopânicoentremeusleitores.
—Todosestã oorandoparaquevocê nã osejaimpedidodetransmitirsuasmensagenspela
Internet.
— David Hassid me garantiu que estamos adiante de Carpathia, tecnologicamente
falando. Mesmo assim, quando ele me explicou como faz para devolver nosso sinal de saté lite
para saté lite, de celular para celular, eu nã o entendi nada. Só espero em Deus que ele saiba o
queestáfazendo.
Buck lavou o copo de suco. — Ontem, você estava se esforçando para entender alguma
coisa.
—Eaindaestou—disseTsion.—Aolongodossé culos,osestudiososacreditavamquea
literaturaprofé ticaera igurada,abertaaumsem-nú m erodeinterpretaçõ es.Talvezaintençã o
de Deus nã o fosse esta. Por que Ele di icultaria tanto o nosso entendimento? Acredito que,
quando a Bı́blia diz que o escritor teve uma visã o, a linguagemé simbó lica. Mas, quando o
escritor diz que viu certas coisas acontecerem, eu as aceito literalmente. Até agora, tenho
provadoqueestoucerto.
— A passagem em que estou trabalhando — prosseguiu Tsion -, na qual Joã o tem uma
visãode200milhõesdecavaleiroscomo
poderdeexterminaraterçapartedapopulaçã orestante,pareceser igurada.Duvidoque
esses homens e animais aparecerã o literalmente, mas acredito que o resultado será uma
verdade incontestá vel. Eles vã o exterminar a terça parte da populaçã o. Buck semicerrou os
olhos,eTsiondesviouoolhar.
—Istoénovidadeparamim—disseBuck.—Éverdadequevocênãosabe?
Tsion meneou a cabeça. — Sinto uma grande responsabilidade perante os leitores que
Deusmecon iou.Nã oqueromeanteciparaEle,mastambé mnã oquerorecuardemedo.Tudo
oquepossofazeré serhonestoarespeitodoquantoestoumeesforçandoparacompreender.Já
étempodemuitoscrentescomeçaremainterpretaraBíbliasozinhos.
—Quandoessejulgamentoestáprevistoparaacontecer?
— Só sabemos ao certo que será o pró ximo cronologicamente falando, e deve ocorrer
antes da metade do perı́odo da Tribulaçã o. A menos que Deus tenha planos para apressar esse
julgamento,parecequeaindateremosalgumassemanaspelafrente.
Navé spera,Tsionhaviatransmitidoapenasapassagembı́blicaqueelecomentarianodia
seguinte. O texto em si atraiu a atençã o de um imenso pú blico virtual, o maior da Histó ria,
aguardandoostemíveiscomentáriosdoDr.Ben-JudásobreApocalipse9.15-21.
Foram,entã o,soltososquatroanjosqueseachavampreparadosparaahora,odia,omê s
eoano,paraquematassematerçapartedoshomens.
O nú m ero dos exé rcitos da cavalaria era de vinte mil vezes dez milhares; eu ouvi o seu
número.
Assim,nestavisã ocontempleiqueoscavaloseosseuscavaleirostinhamcouraçascorde
fogo, de jacinto e de enxofre. As cabeças dos cavalos eram como cabeças de leõ es e de suas
bocassaíafogo,fumaçaeenxofre.
Pormeiodestestrê s lagelos,asaber:pelofogo,pelafumaçaepeloenxofrequesaı́amdas
suasbocas,foimortaaterçapartedoshomens;poisaforçadoscavalosestavanassuasbocase
nassuascaudas,porquantoassuascaudassepareciamcomserpentes,etinhamcabeças,ecom
elascausavamdano.
Osoutroshomens,aquelesquenã oforammortosporesses lagelos,nã osearrependeram
dasobrasdassuasmã os,deixandodeadorarosdemô nioseosı́dolosdeouro,deprata,decobre,
depedraedepau,quenempodemver,nemouvir,nemandar,nemaindasearrependeramdos
seusassassínios,nemdassuasfeitiçarias,nemdasuaprostituição,nemdosseusfurtos.
David retornou à sua sala com os pensamentos em con lito. Temia o que Leon poderia
estarengendrandoe,aomesmotempo,estavaemocionadoporterconseguidoludibriaraquele
homemmaisumavez.Elepegouseulaptope,semfazercasodosinalavisandoquehaviauma
mensagem, fez um outro pedido de computadores, ordenando que deveriam ser entregues na
pistadepousodopalá cio.Nã ofaziasentidoatrairmaissuspeitas.Elepoderiadespistarqualquer
coisa que os té cnicos em informá tica detectassem, simplesmente implantando vı́rus no
equipamentoouconfundindoasinformaçõescolhidas.
Buck sentou-se ao lado dos companheiros para participar de uma reuniã o do Comando
Tribulaçã o à s 11 horas de terça-feira. Ele contou ao grupo que David acabara de informar que
AbdullahSmithhaviasidoaceitocomoco-pilotodeMac.
Rayfordlevantouamãofechadaemsinaldecomemoraçãoedisse:
— Tenho algumas observaçõ es a fazer. Estamos pedindo à s pessoas em quem con iamos
que iquem de olho em Hattie. Ela pode nos causar mais problemas do que imaginamos. Vou
interromper o trabalho no porã o por um dia. Chloe e eu vamos ter um encontro com T hoje à
tarde.Agora,Sra.Rose,apalavraésua.
Leahlevantou-separafalar,oquecausousurpresaaopessoal,tantoquantoanotı́c iadada
por Buck. Eles empurraram suas cadeiras para trá s a im de ter um â ngulo melhor para vê -la
falar. Sua voz era macia, e ela parecia mais con iante do que quando conheceu o pessoal na
noiteanterior.Aspalavras luı́amemtommonó t ono,comoseelaestivessetentandoocultara
emoção.
— Entendo que você s deviam ser pessoas razoavelmente normais antes do
Arrebatamento, poré m nã o eram crentes. Eu estava confusa. Cresci em um lar onde meu pai
era um alcoó latra e minha mã e, manı́aco-depressiva. As brigas de meus pais eram do
conhecimento de toda a vizinhança. Eles se divorciaram quando eu tinha 12 anos. Dali a trê s
anos,comeceiafumar,beber,dormirporaí,consumirdrogase,pormaisdeumavez,tenteime
matar. Fiz um aborto aos 17 anos e, em seguida, tentei afogar na bebida o horror daquele
momento. Abandonei a escola e fui morar no apartamento de uma amiga. Eu consumia mais
bebidasedrogasdoquecomida,echegueiaofundodopoçoquandomeviandandoaesmopelas
ruaseevacuandosanguenomeiodanoite.
—Eusabiaqueeraumacriaturadecaı́da—prosseguiuLeah.—Seeunã o izessealguma
coisapormimmesma,logoestariamorta.Eunã oqueriaqueissoacontecesseporquenã otinha
idé ia do que viria depois. Eu orava quando estava em alguma encrenca sé ria, mas, na maior
parte do tempo, nem sequer pensava em Deus. Fui parar em um centro de reabilitaçã o
municipaleduvidavaquemeuorganismoresistiriasemdrogaesembebida.Quando inalmente
comecei a raciocinar com ló gica, as pessoas de lá perceberam que eu tinha cé rebro e izeram
umtestecomigo.MeuQIeraalto,bemalto,cominclinação...ouseiláoque...paraciências.
— Fiquei muito grata à quelas pessoas. Aquela gratidã o despertou em mim algum dom
latente para cuidar dos necessitados. Voltei para a escola e me diplomei um ano depois com
notadezemquasetodasasmaté rias.Parapoderpagarafaculdade,comeceiatrabalharcomo
auxiliar de enfermeira e professora de linguagem de sinais para alunos surdos. Conheci meu
marido na faculdade. Ele me conseguiu uma vaga em uma escola do governo e me inscreveu
em um programa de enfermagem. Como eu nã o podia ter ilhos, adotamos dois meninos apó s
seisanosdecasados.
Assim que tentou dizer o nome das crianças, o rosto de Leah icou sombrio e ela mal
conseguiafalar.
— Pedro e Paulo — ela murmurou. — Meu marido havia sido criado em lar religioso.
Apesar de nã o freqü entar igreja durante muitos anos, ele sempre quis dar estes nomes a seus
ilhos.Querı́amosquenossos ilhostivessemumaeducaçã oreligiosa,portantocomeçamosairà
igreja.Aspessoasdelá erambondosas,masaigrejaseassemelhavamaisaumclubedecampo.
Haviamuitasatividadessociais,masnãonossentíamospertodeDeus.
— Um dos capelã es do hospital onde eu trabalhava tentou me converter. Embora ele
parecessesincero,eumesentiofendida.Adiretoradacrecheondemeus ilhos icavamdurante
odiamedeuumfolhetosobreJesus.Eudisseaelaqueéramosfreqüentadoresassíduosdaigreja.
Fiquei furiosa quando meus ilhos trouxeram para casa livros de histó rias da Bı́blia. Eu disse à
mulher que as crianças freqü entavam a Escola Dominical e que ela deveria limitar-se a cuidar
deles.AvozdeLeahestavaroucadeemoção.
—Encontreiascamasdemeus ilhosvaziasnamanhã seguinteaoArrebatamento.Foio
piordiademinhavida.Acheiqueeleshaviamsidoseqüestrados.Apolícianãopôdefazernada,é
claro, porque todas as crianças desapareceram. Eu nã o tinha ouvido falar do Arrebatamento,
mas logo em seguida os noticiá rios o consideraram como uma das possibilidades. Liguei para o
capelã o do hospital. Ele havia desaparecido. Liguei para a creche. A diretora també m havia
desaparecido. Corri até lá , mas ningué m sabia me informar nada. Na sala de espera, encontrei
maisfolhetossemelhantesaosqueadiretoraderaameus ilhos.Umdeles,cujotı́t uloera"Nã o
SejaDeixadoparaTrá s",diziaque,umdia,oscrentesverdadeirosdesapareceriamparamorar
nocéucomJesus.
—Aquelefolhetoestavaemminhabolsaquandovolteiparacasaeencontreimeumarido
dentrodagaragemcomaportafechadaeomotordocarrofuncionando.—Leahfezumapausa
pararecompor-se.—Elemedeixouumbilhete,dizendoquelamentavamuitoportertomado
uma atitude tresloucada, que nã o conseguia viver sem os meninos e que nã o podia fazer nada
paraaliviarmeusofrimento.
Leahparou,comoslábiostrêmulos.
—Vocêquerfazerumapausa,minhasenhora?—perguntouTsion.
Elabalançouacabeçanegativamente.
— Tentei me matar. Tomei todos os comprimidos que havia no armá rio e iquei muito
mal. Deus nã o queria que eu morresse, porque, aparentemente, grande parte dos comprimidos
queingericontra-atacouoefeitodosoutros.Acordeihorasmaistardecomumadordecabeça
muitoforte,dordeestô m agoeumgostohorrı́velnaboca.Arrastei-meaté ondeestavaminha
bolsa para pegar algumas balas de hortelã e vi aquele folheto outra vez. Agora, o que estava
escritoalifaziasentido.
— Ele predizia o que aconteceu e advertia o leitor a estar preparado. A soluçã o... bem,
todosvocê ssabem...erabuscaraDeus,dizeraElequeeuerapecadoraequenecessitavadele.
Talvez fosse tarde demais para mim, mas orei. Nã o sei como encontrei forças, mas assim que
consegui sair de casa, fui à procura de outras pessoas como eu. Encontrei-as em uma igreja
pequena.Apenasalgunscrenteshaviamsidodeixadosparatrá s,etodossabiamporquê .Agora,
há cerca de 60 deles que se reú nem secretamente. Vou sentir falta dessa gente, mas eles nã o
vã o se surpreender quando souberem que desapareci. Eu lhes contei o que estava se passando,
quecuideideumafugitivadaCG.
— Vamos avisá -los de que você está em lugar seguro — disse Rayford, visivelmente
emocionado.
— Você disse que eu estou? — perguntou Leah, sentando-se, com um sorriso triste no
rosto.—Possoficar?
—Nóssemprevotamos—disseTsion.—Masachoquevocêencontrouumnovolar.
Noinı́c iodanoitenaNovaBabilô nia,Davidestavasentadoemsuasalaapó soexpediente,
sentindo a falta de Annie. Ficar a só s com ela seria muito arriscado, portanto eles dialogavam
por meio de telefones sigilosos e computadores. David instalou um programa em seu
computador que podia apagar a conversa dos dois, caso Annie se esquecesse de apagar a dela.
Nenhum dos dois podia deixar evidê ncias nos computadores sobre seu relacionamento e,
principalmente,sobreaféqueprofessavam.
"Talvez fosse melhor revelarmos nosso amor", ela digitou. "Pela polı́t ica da CG, eu seria
forçadaatrabalharemoutrodepartamentoforadesuasupervisã o,maspelomenospoderı́amos
nosversemlevantarsuspeitas."
David digitou em resposta: "Nã o é má idé ia, e poderı́amos usar mais um par de olhos em
outros departamentos. No entanto, a posiçã o que você ocupa é estraté gica, porque ela nos dá
condiçõ esdecontrabandearmoscoisasdaquiparaoscrentesdeoutrospaı́ses.Vamoscontinuar
pensandonoassunto.Nãosuportomaisficarlongedevocê."
Derepente,osaparelhosdeTVdodepartamentodeDavid—todos—foramligados.Isto
acontecia apenas quando a che ia da CG achava que havia uma notı́c ia de que todos os
empregadosdeviamtomarconhecimento.Namaioriadasvezes,ateladaTVexibiaCarpathia
ou Fortunato fazendo um pronunciamento ao mundo, independentemente de haver ou nã o
alguémtrabalhandonaquelesetor.OndehouvesseumaTV,elaserialigada.
David girou sua cadeira e encostou a cabeça no espaldar para ver a notı́c ia. Um
apresentador da CNN-CG estava noticiando um acidente aé reo. "Nem o aviã o, que dizem ser
uma aeronave particular de grande porte, nem o piloto, nem o passageiro foram encontrados,
mas há notı́c ias de que o mar levou alguns objetos pessoais para uma das praias de Portugal.
Ouçamestepedidodesocorro,gravadoporváriastorresdecontroledaquelaregião."
Socorro!Socorro!Quantumzero-sete-zero-oitoperdendoaltitude!Socorro!
"Oaviã odesapareceudastelasdoradarlogoemseguida,eaequipederesgatevasculhou
aá rea.Foramencontradosobjetospessoaisemalasdeduaspessoas,umhomemeumamulher.
As autoridades calculam que nã o levará muito tempo para que a fuselagem e os corpos sejam
encontrados. Os nomes das vı́t imas estã o sendo resguardados até que sejam noti icados aos
parentesmaispróximos."
David olhava para a tela, perguntando a si mesmo por que a che ia da CG achou que
valeria a pena transmitir essa notı́c ia antes de informar o nome das vı́t imas. Em seguida,
apareceuaseguintelegendanatela:
ATENÇAO!PESSOALDOPALACIODACG!ASPROVAVEISVITIMASDESTEACIDENTE,
DE ACORDO COM AS AUTORIDADES QUE COMANDAM O RESGATE, SAO AS SEGUINTES:
PILOTO SAMUEL HANSON, DE BATON ROUGE, LOUISIANA, ESTADOS UNIDOS; E HATTIE
DURHAM, NATURAL DE DES PLAINES, ILLINOIS, ESTADOS UNIDOS. A SRTA. DURHAM
TRABALHOU PARA SUA EXCELENCIA, O POTENTADO, COMO SUA ASSISTENTE PESSOAL.
NOSSASCONDOLÊNCIASATODOSQUEACONHECERAM.
DavidligouparaMac.
—Euvi—disseMac.—Estánacaraqueéumafarsa!
— E verdade — disse David. — O piloto deve ter recebido uma imensa bolada da
companhiadeseguros,eHattiedeveestaremalgumlugardaEuropa.
—Talvezestejamquerendoencontraroutrostrouxas—disse
Mac.—DevemosacreditarqueCarpathiaeFortunatocaíramnesta?
— Claro que nã o — disse David. — Eles podem ter engendrado um acidente. Talvez
tenham encontrado Hattie e a mataram, e agora estã o encobrindo tudo. E melhor que
apareçamlogocomafuselagemouoscorpos.
Davidouviuumsinalavisandoquehaviaumanovamensagem.
—Falocomvocêmaistarde,Mac.—eledisse.
Rayford e Chloe estavam sentados no escritó rio de T localizado na base da torre do
Aeroporto de Palwaukee, acompanhados de T e dois homens da igreja que funcionava na casa
dele.Chloedescreveucomoplanejavaestabelecerumaligaçã oentreosprincipaisassociadosda
rededacooperativaecomeçarafazerumtesteantesdepô remprá ticaosistemadecomprae
venda.
— Temos de manter tudo em segredo desde o inı́c io — ela disse. — Caso contrá rio,
passaremos a fazer parte de todos os outros corretores de mercadorias e icaremos sob a
vigilânciadaCG.
Osoutrosconcordaram.OtelefonedeRayfordtocou.EraBuck.Rayfordriualtoenquanto
Bucklhecontavaaestranhanotíciaqueacabaradeouvir.
—Ligueatelevisão,T—eledisse.
Os comentaristas da CG falavam da tragé dia em tom de tristeza, embora os nomes nã o
tivessemsidoreveladosforadaNovaBabilô nia.Elesdiziamqueaté aquelemomentonã ohavia
sidoencontradonenhumdocumento,sóobjetospessoais.
— Um dia, Fortunato, ou quem está por trá s disto tentando tirar vantagem — disse
Rayford-,vaisemeteremumaenrascadaparaorestodavida.Chloepuxouopaipelamanga
dacamisaecochichou:
—Pelomenos,podemostercertezadeque,porenquanto,Hattieestábem.
— A questã o — ele disse assim que a reuniã o terminou -, é onde ela está . Ela nã o é tã o
espertaassimapontodefazeralgué macreditarqueafundounaqueleaviã o.Será queelateria
capacidadedesurpreenderCarpathia?
Depois que os dois homens saı́ram, Rayford, Chloe e T subiram correndo a escada para
inquirirofuncioná riodatorresobreovô odas23h30danoiteanterior.Eleeragordoecalvo,e
estavalendoumlivrodeficçãocientífica.
— Eu nã o cheguei a vê -lo, mas, pelo rá dio, ele parecia ter sotaque do sul — disse o
funcionário.—Boassinouoformulárioliberandoadecolagem.
—Eleestavaaqui?—perguntouT.
— Nã o, ele me ligou por volta das 8 horas da noite, aprovando antecipadamente a
decolagem.
—Eunãovionúmerodoaviãonocomputador.
—Euoanotei.Aindaestá aqui.—Ofuncioná riovasculhouumapilhadepapé is.—Zerosete-zero-oito—eledisse.—VocêjádevesaberqueeraumQuantum.
—Hámeiosdesaberemnomedequemoaviãoestáregistrado?—perguntouRayford.
— Claro que sim — respondeu o funcioná rio. Ele digitou rapidamente alguma coisa no
tecladodeseucomputadore icoutamborilandocomosdedosnojoelhoenquantoaguardavaa
informaçã o.—SamuelHanson—eledisse-,deBatonRouge.EledeveserparentedeBo,nã o?
BonãoédeLouisiana?
CAPÍTULO7
OencontrocomAbdullahSmithfoireconfortanteparaMac.Eleconheceuojordanianoe
ex-piloto de aviõ es de caça nos tempos em que trabalhava como co-piloto do capitã o Rayford
Steele.AbdullahperdeuoempregoquandoCarpathiacon iscoutodooarmamentointernacional
e,rapidamente,tornou-seumdosprincipaisfornecedoresdomercadonegrodeRayford.
A vida de Abdullah sofreu uma reviravolta quando sua esposa se converteu quatro anos
antes do Arrebatamento. Ele se divorciou dela e lutou até conseguir a custó dia dos dois ilhos
menores,ummeninoeumamenina.Quandoelefoiobrigadoapassarmesesviajandoaserviço
daforçaaéreajordaniana,acustódiafoisuspensaeelepassouamorarnabaseaérea.
Apesar de ser um homem de poucas palavras, certa ocasiã o Abdullah revelou a Mac e
Rayfordqueficoutãodeprimidoapontodequerersuicidar-se.
—Eucontinuavaaamarminhaesposa—eledissecomumsotaqueacentuado.—Elae
as crianças eram o meu mundo. Imaginem só a esposa de você s converter-se a uma religiã o
professadaemumpaı́smisteriosoemuitodistante.Trocá vamoslongascartas,masnenhumde
nó s convenceu o outro. Para minha vergonha, eu nã o era muito dedicado à minha religiã o e
passeiaterumavidadesregrada.Minhaesposadiziaqueoravapormimtodososdiasparaque
euaceitasseJesusCristoantesquefossetardedemais.Euaamaldiçoavaemminhascartas.Em
umadessascartas,euimploreiparaqueelarenunciasseà religiã oevoltasseparaohomemque
a amava. Na seguinte, eu a acusei de ser traidora e a chamei de nomes horrı́veis. Ela me
respondeu dizendo que ainda me amava e me fez lembrar que fui eu quem deu inı́c io ao
processodedivórcio.Irado,maisumavezaagredimoralmente.
— Ainda guardo as cartas nas quais ela me advertia que eu poderia morrer antes de
encontrar o ú nico e verdadeiro Deus, ou que Jesus retornaria um dia para buscar aqueles que o
amavam e que eu seria deixado para trá s. Fiquei furioso. Recusei muitas vezes visitar meus
ilhos, só para me vingar dela, mas hoje compreendo o quanto magoei as crianças e a mim
mesmo.Sintoumaculpaenormeporqueelesnuncavãosaberquantoeuosamava.
Maclembrou-sedoqueRayforddisseraaAbdullah:
—Vocêpoderádizerissoaelesumdia.
Abdullahlimitara-seaconcordarcomacabeça,olhandoparaumpontodistantecomseus
olhosescuros.
Abdullah converteu-se por ter guardado as cartas da esposa nas quais ela explicava
detalhadamenteoplanodasalvaçã o,escreviaversı́c ulosbı́blicoselhediziaqueestavasempre
orandoparaqueeleaceitasseaCristo.
— Por diversas vezes, amassei as cartas e atirei-as contra a parede do quarto — disse
Abdullah.—Masalgumacoisameimpediaderasgá-las,queimá-lasoujogá-lasnolixo.
Quando soube que sua esposa e ilhos haviam desaparecido, Abdullah caiu prostrado no
chãoemseuquartoemAmã,comascartasdaesposaespalhadasdiantedesi.
—Aconteceuconformeeladizia—eleexplicou.—ClameiaDeus.Eunã otinhaescolha,
anãoseracreditar.
Emrazã odeteraaparê nciadeumhomemnascidonoOrienteMé dioedesuapredileçã o
porusarturbante,botasdeaviadoreumpanoamareladocobrindodesalinhadamenteacalçada
farda camu lada, aquele jordaniano de compleiçã o miú da jamais poderia levantar suspeitas de
quefosseumcristã o.Antesdaconversã odas144.000testemunhasjudaicasdomundointeiroe
dos milhõ es de convertidos de todas as nacionalidades, a maioria das pessoas acreditava que
poderia identi icar um cristã o. Agora, evidentemente, apenas os crentes verdadeiros sabiam
identificarumaooutro,porcausadoseloqueeravisívelsóentreeles.
Abdullah, um jordaniano magro, de pele morena, semblante bondoso e expressivo, era
homem de poucas palavras, conforme Mac se lembrava. Ele agiu de maneira estritamente
formal diante das outras pessoas, sem deixar transparecer que ele e Mac eram irmã os na fé e
velhos amigos. Nã o ingiu que nã o se conheciam, porque Mac havia forjado um antigo
relacionamentomilitarentreeles.Osdoissó seabraçaramquando icaramsozinhosnasalade
Mac.
— Há algué m que eu quero que você conheça — disse Mac, chamando Annie à sua sala.
Elabateunaportaeentrou,comumsorrisonorosto.
— Você deve ser o famoso Abdullah Smith — ela disse. — Tem um selo na testa, tı́pico
dosjordanianos.
AbdullaholhouparaMaccomardeindagação.Emseguida,olhouparaatestadeAnnie.
—Eunãopossoveromeu—eledisse.—Nãoéigualaoseu?
—Estoubrincandocomvocê —eladisse.—Equeoseu icamaisvisı́velporcausadacor
desuapele.
—Entendi—eledisse,comoserealmentetivesseentendido.
—Nãoleveasérioosensodehumordosamericanos-disseMac.
—Sensodehumorcanadense—corrigiuAnnie,abrindoosbraçosparaabraçarAbdullah,o
queodeixouconstrangido.Eleestendeuamã oeapertouadela.—Bem-vindoà famı́lia—ela
disse.
NovamenteAbdullaholhoucomardeindagaçãoparaMac.
— Ela é o membro mais novo da famı́lia — disse Mac. -Está lhe dando as boas-vindas a
estadivisãodoComandoTribulação.
Abdullah deixou uma parte de seus pertences em sua sala atrá s da de Mac. Dois
funcioná rios do Departamento de Operaçõ es o ajudaram a levar o restante para seus novos
aposentos.Enquantoosdoisamigosacompanhavamosfuncionários,Macdisse:
— Assim que você tiver arrumado suas coisas, arregace as mangas e comece a fazer o
roteiro de nossa viagem para Botsuana na sexta-feira. Vamos sair daqui à s 8 horas da manhã .
Elesestãoumahorananossafrente,portanto...
—VamosseguirparaJoanesburgo,suponho—disseAbdullah.
—Nã o,paraonortedelá .VamosnosencontrarcomMwangatiNgumoemGaborone,na
antigafronteiradeBotsuanacomaÁfricadoS...
— Perdoe-me, capitã o, mas acho que você nã o esteve lá recentemente. Só helicó pteros
podementraresairdeGaborone.Oaeroportofoidestruídonograndeterremoto.
—Mascomcertezaaantigabasemilitar...
—Destruídatambém—disseAbdullah.
—OprogramadereconstruçãocomandadoporCarpathianãochegouaBotsuana?
—Nã o,masdepoisqueo...hã ...potentadoregionaldosEstadosUnidosdaAfricapassoua
moraremJoanesburgo,emumpalá cioquasetã ograndequantoeste,onovoaeroportodelá foi
reconstruídoeficouespetacular.
Macagradeceuaosfuncioná rioseabriuaportadoapartamentodeAbdullah.Ojordaniano
arregalouosolhosaoveroscômodos.
—Tudoistosóparamim?—eleperguntou.
—Vocêvaidetestarestascoisas—disseMac.
Depoisdefecharaporta,Abdullaholhouparaasparedesnuasecochichou:
—Podemosconversaraqui?
—Davidmegarantiuquesim.
— Espero conhecê -lo logo. Oh! capitã o, eu quase chamei o potentado africano de rei!
Precisosermuitomaiscuidadoso.
—Nóssabemosqueeleé umdosreis,masaquelesdoisnã osabemdenada.Penseiqueo
potentadoRehoboth...qualéoprimeironomedele...?
—Bindura.
— Correto. Pensei que ele ia mudar a capital para um local mais central, mais perto de
suaterranatal...Chade,éisto?
— Sudã o. Foi o que ele disse, mas parece que preferiu Joanesburgo. Ele vive no meio de
tantariquezaquevocênempodeacreditar.
—Todososreisvivemassim.
—Oquevocêachadisto,capitão?—perguntouAbdullahquasecochichando.—Carpathia
conseguiuacooperaçãodeles?
Macencolheuosombrosebalançounegativamenteacabeça.
—NãohouveumaespéciedecontrovérsiaentreRehobotheNgumo?
— Ah! sim, houve! Quando Ngumo era secretá rio-geral da ONU, Rehoboth fez uma
tremendapressã osobreeleparaconseguirfavoresparaaAfrica,principalmenteparaoSudã o.
E,quandoNgumofoisubstituídoporCarpathia,Rehobothelogioupublicamenteatroca.
—Eagoraumévizinhodooutro.
—ERehobothéoreidele—disseAbdullah.
No imdanoitedequinta-feira,emIllinois,Rayford icouasó scomLeahRosenacozinha.
Elaestavasentadaàmesadiantedeumaxícaradecafé.Eledespejoucaféemsuaxícara.
—Vocêestáseajeitandoaqui?—eleindagou.
Ela ergueu a cabeça. — Eu nunca sei o que você está querendo dizer. Ele apontou para
umacadeira.—Posso?
—Claro.
—Oqueeupoderiaestarquerendodizer?—eleperguntoudepoisdesentar-se.
—Queeunãodeveriaestarmesentindoàvontade.
— Nó s votamos a seu favor! Foi unâ nime. Até o presidente da mesa votou, e ele nem
precisariatervotado.
—Setivessehavidoempate,comoseráqueopresidentevotaria?
Rayfordendireitouocorponacadeira,segurandoaxícaracomasduasmãos.
—Está havendoummal-entendidoentrenó sdesdeoinı́c io—eledisse.—Tenhocerteza
dequeaculpafoiminha.
—Vocênãorespondeuàminhapergunta.
— Pare com isso. A votaçã o para aceitar uma nova irmã jamais empataria. Hattie icou
aquidurantemeses,eelanemsequerécrente.
—Estaéaconversadetréguaqueteríamosouvocêestáapenassendoeducado?
—Vocêquerumatrégua?—eleperguntou.
—Vocêquer?
—Eupergunteiprimeiro.
Elasorriu.—Averdadeé queeuqueromaisdoqueumatré gua.Nã opodemosmorarna
mesmacasasendoapenascordiais.Temosdeseramigos.
Rayfordnãotinhatantacerteza,masdisse:
—Estoudispostoacorrerorisco.
—Então,tudoaquiloquevocêdisse...
—...mostrouquantoeusouranzinza,éisso?—eledisselevantandooqueixo.
Ela concordou com a cabeça. — Considero isto um pedido de perdã o implı́c ito. Rayford
nãohaviapedidoperdão.
—Equantoamim?—elaperguntou.
—Oquê?
—Eutambémprecisoserperdoada.
—Não,vocênãoprecisa—eledisse,dandoaentenderqueestavasendomaisgenerosodo
quesesentianaquelemomento.—Tudooquevocêfaloufoiporqueeu...
Leahpousouamã onobraçodele.—Nemeumereconheci.Nã opossojogartodaaculpa
em você . Agora, se vamos começar tudo de novo, temos de começar do zero. Esquecer o que
aconteceu.
—Daminhaparte,tudobem—eledisse.,—Tenhoalgumdinheiro—eladisse.
—Vocêsempremudadeassuntoassimtãorápido?
—Emespé cie.Precisamosirbuscá -lo.Está nocofredentrodeminhagaragem.Nã ovou
emprestardinheirodegraça.Querofazeralgumacoisa,equeropagarminhaestadaaqui.
—Você é especialistaemmedicina.Quetalvocê cuidardenossasaú deemtrocadecasa
ecomida?
—Possocuidardevocê s,masnã osouespecialistaemmedicina.Nã otenhocondiçõ esde
substituirFloyd.
—Somosagradecidosportervocêaqui.
—Masvocêstambémprecisamdedinheiro.Quandopodemosbuscá-lo?
RayfordapontouparaaxícaradeLeah.Elabalançouacabeçanegativamente.
—Dequantodinheiroestamosfalando?—eleperguntou.Quandoelalhecontou,elelevou
umsusto.
—Emnotasdequanto?
—Devinte.
—Tudoissoemumcofre?
—Estácompletamentecheio—eladisse.
—Você achaqueodinheiroaindaestá lá ?ACGdeveterrevistadocadacentı́m etroà sua
procura.
— O cofre está tã o escondido que até nó s sempre tı́nhamos de nos lembrar onde ele
estava.
Rayfordlavouasxícaras.—Vocêestácomsono?
—Não.
—Querirbuscarodinheiroagora?
Mac e Abdullah encontraram-se com David na manhã de sexta-feira. Deixando as
apresentaçõ es de lado, David perguntou se algum deles tinha idé ia do local em que os 144
computadores guardados no compartimento de carga do Condor poderiam ser usados em prol
dacausa.
—Estoupensandoemmuitoslugares—disseMac.—MasnenhumestánarotadaÁfrica.
— Eu conheço um — disse Abdullah. — Existe um grupo muito grande de crentes
clandestinosemHawalli.Muitossãoprofissionais,eelespoderiam...
—Hawalli?—perguntouDavid.—NoKuwait?
—Sim.Tenhoumcontatonosetordecargas...
—Esselocalficaaleste.Vocêsestãovoandoparasudoeste.
—Sóumpoucoaleste—disseAbdullah.—Precisamosdeummotivoparadescerlá.
—Olocalficarelativamentepertodopontodedecolagem-disseMac.—Issovailevantar
suspeitas.—Depoisdealgunsinstantesdesilêncio,elevoltouafalar:—Amenosque...
DavideAbdullaholharamparaele.
—Qualadistânciadenossovôo?—perguntouMac.
—DaquiatéoKuwait?—perguntouAbdullah,pegandoseuroteiro.
—Não,atéaÁfrica.
—Maisoumenos6.500quilômetros.
— Entã o vamos precisar de tanque completamente cheio para voar sem escala. Como
queremos economizar o dinheiro daCG, vamos fazer um rá pido desvio para reabastecer a um
bompreço.
— Excelente — disse David. — Vou negociar imediatamente. Se eu conseguir alguns
centavosdedescontoporlitronopreçodocombustível,odesviovaleráapena.
—Oqueomeucontatovaiprecisarparareceberacarga?—perguntouAbdullah.
—Umaempilhadeiragrande.Umcaminhãogrande.
— Por que você precisou deixar um bilhete? — perguntou Leah a Rayford quando eles
partiramnoLandRoverrumoaPalatine.—Comcertezaestaremosdevoltaantesquealgué m
acorde.
—Eunã o icariasurpreso—eledisse-,sealgué mjá andoulendoobilhete.Ouvimostudo
naquelacasa.Nacaladadanoite,ouvimossonsnasparedes,sonsvindosdefora.Tivemossorte
até agora. Esperamos que algué m nos avise para podermos nos esconder antes que nos
descubram.Sempredizemosatodosaondevamos.Bucknã ofezissonodiaemquelevouFloyd
paraquevocêcuidassedele,masfoiumaemergência.Todosficaramaborrecidos.
Rayfordpassouos40minutosseguintesdesviandoocarrodosescombroseprocurandoum
caminho mais suave. Ele gostaria de saber quando o trabalho de reconstruçã o propagado por
Carpathiacomeçariaaserfeitonascidadesmenores.
LeahfezmuitasperguntasarespeitodecadamembrodoComandoTribulaçã o,comoeles
seconheceram,comosetornaramcrentes,comosereuniram.
—Forammuitasperdasemtã opoucotempo—eladissedepoisqueRayfordrespondeua
todasassuasperguntas.-Depoisdetodoessesofrimento,nã oseicomovocê saindatê mforças
paratrabalhar.
— Estamos tentando nã o pensar nisso. Sabemos que a situaçã o vai piorar. Parece uma
frase muito batida, mas a gente precisa pensar no futuro, e nã o no passado. Se deixarmos o
sofrimentotomarcontadenós,nãovamosconseguirnada.
Leahpassouamãopeloscabelos.
—Asvezesnã oseiporquedesejoviveraté oGloriosoAparecimento.Aı́, meuinstintode
sobrevivênciaprevalece.
—Eporfalarem...—disseRayford.
—Noquê?
—Nada,nã oestouacostumadoaumtrâ nsitocomoeste.Elaencolheuosombros.—Esta
regiã onã ofoitã oatingidaquantoasua.Nã ohá ningué mescondidoaqui.Todomundoconhece
todomundo.
ElesconcordaramqueRayforddeveriaestacionaraalgunsquarteirõ esdedistâ nciaeque
caminhariamporentreassombrasaté acasadeLeah.Rayfordabriuoporta-malasdoRovere
pegouumasacolagrandedelonaeumalanterna.
Quandochegarampertodacasa,Leahparou.
—Elesnemsequertiveramotrabalhodefecharaporta-eladisse.—Olocaldevetersido
saqueado.
— Se a CG nã o levou tudo, os saqueadores levaram — disse Rayford. — Assim que eles
souberamquevocêfugiu,suacasapassouaserdedomíniopúblico.Vocêquerdarumaolhada?
Ela balançou a cabeça negativamente. — E melhor a gente entrar e sair rá pido da
garagem.Meusvizinhospodemouviraportaabrindo.
—Existeumaentradalateral?
—Sim.
—Vocêtemachave?
—Não.
— Eu posso arrombar a porta. Os vizinhos nã o vã o ouvir, a nã o ser que estejam à sua
espera.
Quando Mac se encontrou com Abdullah no hangar para lhe falar sobre a velocidade do
Condor216,Anniejáestavalá,supervisionandoopessoalencarregadodecuidardascargas.
—Mais,cabo?—perguntouMac.
—Sim,capitã o.OdiretordoDepartamentodeCompraspediuquetransportá ssemosesta
grande quantidade de gê neros alimentı́c ios excedentes para o Kuwait. Ele conseguiu com o
pessoal de lá um desconto excelente no preço do combustı́vel. Enquanto você s estiverem
reabastecendo,poderãodescarregarestamercadoria.
Abdullah icou em silê ncio dentro do aviã o até o momento em que eles entraram na
cabinadecomandoeMaclhemostrouobotãosecreto.
—Imagineoqueelesvãofazerconoscoquandodescobrirem—disseMac.
Quando faltavam dez minutos para as oito horas, Mac e Abdullah terminaram a
conferê nciapreliminardetodosositensdovô oeentraramemcontatocomatorredopalá cio.
Trêspessoastrajandoaventaisbrancoscorreramemdireçãoaoavião.
— E o pessoal da cozinha — disse Mac. — Eles podem entrar. Abdullah abriu a porta e
desceu a escada. O cozinheiro, um homem de meia-idade, com dedos curtos e grossos e rosto
molhadodesuor,carregavaumapanelafumegantecobertacompapel-alumínio.
—Saiadafrente,saiadafrente—elediziacom
sotaque escandinavo. — Ningué m me avisou que o supremo comandante queria tomar o
desjejumabordo.
Abdullahafastou-seenquantoocozinheiroedoisajudantespassaramapressadosporele.
—Comovocêficousabendo?—perguntouAbdullah.
O cozinheiro entrou rapidamente na cozinha e começou a dar ordens aos gritos. Ao
perceberqueAbdullahestavaporperto,elevirou-se.
—Suaperguntafoiretórica,sarcásticaousincera?
—Nãoseioquesignificamaspalavrasretóricaesarcástica—disseAbdullah.
O cozinheiro curvou-se sobre o balcã o com ar de quem nã o podia acreditar que estava
perdendotempoporterderesponderaumaperguntadoco-piloto.
— Eu quis dizer — explicou o cozinheiro, como se estivesse conversando com uma
criança -, que ningué m me avisou antes, que só iquei sabendo agora pela boca do pró prio
supremo comandante. Se ele está querendo comer Ovos Benedict [ovos cozidos combacon e
molhoholandê s,servidossobreametadedeumbolinho]logoapó soaviã olevantarvô o,é istoo
quevoulheservir.Maisalgumapergunta?
—Sim,senhor.
OcozinheiroolhouespantadoparaAbdullah.
—Qualé?
—Vocênãoquercausarumaboaimpressãoaosupremocomandante?
—Seeunã oquisesse,nã oteriacorridoaté oaviã ocarregandoumapanelaquente,você
nãoacha?
—ConheçoocomandanteFortunatoeseique,quandoeledizlogo após o avião levantar
vôo,nãoébemassim.
—Sério?
—Veja,vamosfazerumabreveescalanoKuwaitpoucodepoisdadecolagem,ealiseriao
momento ideal para você servir-lhe o desjejum. Um lugar mais tranqü ilo, mais descontraı́do,
semperigodealgumacoisaespirrarnaroupadele.
—NoKuwait?
—Poucosminutosdepoisdadecolagem.
—Ei,pessoal!—gritouocozinheiroparaseusajudantes.
—Mantenhamasvasilhasquentes.VamosservirodesjejumnoKuwait.
Conforme Rayford esperava, a porta lateral que dava acesso à garagem da casa de Leah
pô de ser arrombada sem muito esforço. Poré m, quando ele entrou e pediu a ela que lhe
apontasse o cofre, percebeu que estava sozinho. Rayford, conteve-se antes de chamá -la, pois
nã o queria complicar a situaçã o caso houvesse algum problema. Ele virou-se lentamente e
caminhounapontadospésatéaporta.
A princı́pio, Rayford nã o enxergou Leah, mas ouviu sua respiraçã o ofegante. Ela estava
ajoelhadapertodelenagramaúmida,arfando,comdificuldadepararespirar.
—Eu...eu...eu...—elamurmurava.
Eleajoelhou-seaoladodela.—Oquefoi?Vocêestábem?Viualguém?
Na escuridã o, com medo de erguer a cabeça, Leah apontou para um local atrá s de
Rayford. Ele acendeu a lanterna e iluminou o local para ver se havia algué m se aproximando.
Nãohavianinguém.
—Oquevocêviu?—eleperguntou.
Leahchoravabaixinho,semconseguirfalar.
— Vou levá -la para dentro — ele disse, ajudando-a a > levantar-se e arrastando-a até a
garagem como se ela fosse uma criança sonolenta. — Leah! Por favor, coopere comigo. Você
estáemlugarseguro.
Ela sentou-se no chã o, abraçando os joelhos dobrados contra o peito. — Eles ainda estã o
lá?Tranqueaporta,porfavor.
—Euarrombeiaporta—eledisse.—Quemestáláfora?
—Vocêtemcertezadequenãoosviu?
— Quem? — ele perguntou em um sussurro. Ela estava tremendo. — Você precisa
levantar-sedestechãofrio.
Rayfordestendeuamãoparaajudá-laalevantar-se,maselaoafastou.
—Nã otenhoforçasparasairdaqui—eladisse,cobrindoorostocomosdedostrê mulos.
—Vocêvaiterdetrazerocarroatéaqui.Elenãoesperavaqueelaoferecessetantaresistência.
—Éarriscadodemais.
—Eunãoposso,Rayford!Sintomuito.
—Então,vamospegarodinheiroeirembora.
—Esqueçaodinheiro.Eunãotenhocondiçõesdeabrirocofre.
—Porquenão?
Elaapontounovamenteparafora.
— Leah — disse Rayford da maneira mais suave que podia -, nã o há ningué m lá fora.
Estamosseguros.Vamospegarodinheiro,correrparaocarroevoltarparacasa,estábem?
Elabalançouacabeçanegativamente.
— Nó s vamos, sim! — ele disse, segurando-a pelo cotovelo para erguê -la do chã o. Leah
tinhadificuldadeparamovimentar-se.Rayfordalevouatéaparedeeendireitouocorpodela.—
Conte-meoquevocêviu.
— Cavalos — ela disse. — Enormes, escuros, logo atrá s da casa, bloqueando todo o
horizonte. Nã o pude distinguir os cavaleiros, porque os cavalos expeliam fogo e fumaça pela
boca. Mas havia centenas de cavaleiros, talvez mais, montados nos cavalos. Eram grandes
demais,horrı́veis.Ascabeçasdoscavalos,Rayford,eramiguaisacabeçasdeleõ es,comdentes
enormes!
—Espereaqui—disseRayford.
—Nãomedeixesozinha!—gritouLeah,agarrando-opelospulsosefincando-lheasunhas.
Rayfordlivrou-sedasmãosdela.—Vocêestáprotegidaaqui.
—Nãoseaproximedeles!Elesestãoflutuando.
—Flutuando?
—Ospésdelesnãoestãoapoiadosnochão!
—DeacordocomTsion,elesnãodeviamserreais—disseRayford.
—Tsionosviu?
—Vocênãoleuamensagemdelesobreisto?
—Eunãotenhomaiscomputador.
—ElesdevemseroscavaleirosdescritosemApocalipse9,Leah!Nãovãonosatacar!
—Vocêtemcerteza?
—Oquemaispoderiaser?
Leah começou a respirar com mais facilidade, mas, mesmo sob a iluminaçã o fraca da
lanterna,Rayfordviuqueelaestavapálida.
—Vouatéláparaverificar—eledisse.—Tentelembrarqualéosegredodocofre.
Ela fez um movimento a irmativo com a cabeça, mas nã o saiu do lugar. Rayford correu
atéaporta.
— Olhe para o leste — ela murmurou. — No horizonte. Mesmo sabendo que estava em
segurança, ele olhou em direçã o ao horizonte pela fresta da porta. A noite estava fria e
silenciosa. Ele nã o avistou nada. Abriu a porta, deu alguns passos e subiu em uma pequena
elevaçã o de terra para enxergar melhor por entre as casas vizinhas. Seu coraçã o batia com
força,masele icoudesapontadopornã otervistonadadoqueLeahlhecontou.Teriasidouma
visão?Porquesóelaviu?
Rayford voltou para perto de Leah. Ela havia se afastado da parede, mas continuava
olhandoparaochão.
—Vocêosviu?—elaperguntou.
—Não.
—Elesestavamlá,Rayford!Eunãoestavasonhando!
—Euacreditoemvocê.
—Acreditamesmo?
—Claro!Mas,deacordocomTsion,elesnãoseriamvisı́veis.Elevai icarsatisfeitoquando
souber.
—Paraondeelespodemterido?Erammuitosparateremseafastadotãodepressa.
— Leah — disse Rayford, escolhendo as palavras com cuidado -, estamos falando de um
fatosobrenatural,daguerraentreobemeomal.Nã oexistemregras,pelomenosdopontode
vistahumano.Sevocê viuoscavaleirosprofetizadosnolivrodeApocalipse,talvezelestenham
poderesparaapareceredesaparecer.
Elacruzouosbraçosecomeçouabalançarocorpoparaafrenteeparatrás.
—Sobreviviaoterremoto.Viosgafanhotos.Vocêviu?Rayfordfezquesimcomacabeça.
—Vocêchegoubempertodosgafanhotos,Rayford?
—Teeuvimosumbemdeperto.
—Entãovocêsabe.
—Claroquesei.
—Foiacoisamaishorrı́velquejá vi.Eunã ovioscavalostã odeperto,maselespareciam
monstros.Possodizerqueelesestavampertodohorizonte,maseramtã ograndesqueconsegui
enxergarosdetalhes.Elesnãotêmpermissãoparanosatacar?
—Tsiondizqueelestêmpoderparamataraterçapartedapopulação.
—Masnãooscrentes?
—Não.Elesvãomataraquelesquenãosearrependeramdeseuspecados.
—Seeunãomearrependiantes,estoumearrependendoagora!—eladisse.
Comocozinheiro,seusajudantes,Fortunatoedoisdeseusassessoresabordo,Mactaxiou
paraforadohangarrumoà pistadedecolagemsuldopalá ciodaComunidadeGlobal.Assimque
o aviã o levantou vô o, ele cumprimentou os passageiros pelo interfone, informando-lhes sobre a
rá pida escala no Kuwait e que, em seguida, voariam quase 6.500 quilô m etros até Joanesburgo.
Apósalgunsinstantes,alguémbateucomforçanaportadacabinadecomando.
—DeveserLeon—disseMac,fazendoumgestoparaqueAbdullahabrisseaporta.—Já
erahoradevocêconhecê-lo.
LeonpassouporAbdullahsemlhedaratençãoedirigiu-seaMac.
— Que histó ria é esta de fazer uma escala no Kuwait, capitã o? Eu tenho uma agenda a
cumprir!
—Bom-dia,Comandante—disseMac.—Nossonovoco-pilotomegarantiuque,mesmo
pousandolá,osenhorchegaráatempoparasuareunião.AbdullahSmith,esteéoSupremoCo...
—Nãoqueroatrasos—disseFortunato.—PorquefazerescalanoKuwait?
—Vamosmatardoiscoelhoscomumasó cajadada,senhor—disseMac.OdiretorHassid
conseguiuumó t imodescontonopreçodocombustı́vel,enossanovachefedecargascombinou
algumas entregas lá , uma vez que ı́amos voar naquela direçã o. Com isso, economizamos um
bomdinheirodosetoradministrativo.
—Nãodiga!
—Éverdade,senhor.
—Qualémesmooseunome,jovem?
—AbdullahSmith,senhor.
—Euestoufaminto.VocêaceitariacomerOvosBenedictestamanhã,co-pilotoSmith?
—Não,obrigado,senhor.Jámealimentei.
—Capitã oMcCullum,eugostariadeserinformadoantecipadamentesobremudançasde
rota.
—Conformeeulhedisse,senhor,nã oé bemumamudança'derota.Apenasumpequeno
desvio...
Aportafoifechadacomforça.AbdullaholhouparaMaccomatestafranzida.
—Charmosoele,não?—disseAbdullah.
Mac apertou o botã o secreto sob sua poltrona para ouvir o que se passava na cabina de
passageiros.
— Karl, quando você vai me servir os ovos? Você preparou o su iciente para todos nó s,
inclusivevocê?
— Sim, senhor Supremo Comandante. Vou servi-los em terra... ou melhor... vou servi-los
quandoestivermosparadostemporariamentenoKuwait.
—Euestoufamintoagora,Karl.
—Desculpe-me,senhor.Algué mmedissequeosenhorpreferiasealimentarduranteum
momentotranqüilo,semsolavancos,enquantoestivéssemosreabastecendo.
—Quemlhedisseisto?
—Oco-piloto,senhor.
—Onovoco-piloto?Elenemsequermeconhece!
—Bem...
—Conversaremosdepoissobreesteassunto.
Mac desligou o botã o, apertou outro botã o que lhe permitia conversar com Abdullah por
meiodosfonesdeouvidoecontou-lherapidamenteodiálogoentreLeoneocozinheiro.
—Obrigado—disseAbdullahenquantoalguémbatianaportaoutravez.
—Qualéoseunome,co-piloto?—perguntouLeon.
—Smith,senhor.
— Foi você quem disse ao cozinheiro para servir o desjejum no Kuwait e nã o enquanto
estivéssemosvoando?
— Eu apenas o informei sobre o pequeno desvio de rota e mencionei que o senhor talvez
preferisse...
—Entãofoiidéiasua.Vocêlhedisseoqueeupreferia,apesardenãomeconhecer.
—Euassumoaresponsabilidade,senhor.Sefoiumafalhaminha,eu...
— Você acertou em cheio, Smith. Só nã o sei como você sabia que eu detesto comer um
pratocomoestecomoaviã obalançandodeumladoparaooutro.Eunã oquisofendê -lo,Mac...
istoé,capitão.
Macfoitentadoachamá -lodeLeonedizer-lhequenã o icaraofendido,maslimitou-sea
fazer um gesto de positivo. O Condor voava praticamente sozinho, mas Mac gostava de dar a
impressão,conformeRayforddizia,de"manterosolhosnaestradaeasmãosnovolante".
—Então,comovocêsabiadisto,co-pilotoSmith?—inquiriuFortunato.
—Eusó imaginei—elerespondeu.—Eunã ogostariadecompareceraumareuniã otã o
importantecomacamisamanchadadegemadeovoemolhoholandês.
Apó s alguns instantes de silê ncio, Mac virou-se para ver se Fortunato havia ido embora.
Aindanã o.Elepareciaatô nito.Tombouotroncoparatrá s,comabocaabertaeosolhosquase
fechados.Derepente,voltouàposiçãonormal,rindoetossindoaomesmotempo,edeuumtapa
tãofortenoombrodeAbdullahqueofezafundarnoassentodapoltrona.
—Essafoiboa!—disseFortunatoemmeioaumagargalhada.—Gostei!—Enquantosaía
dacabinadecomando,fechandoaportaatrá sdesi,elerepetiu:—Camisamanchadadegema
deovoemolhoholandês!
Macapertouobotãosecretonovamente.
—Eunãotiveaintençãodecomplicaravidadoco-piloto—Karldisse.
—Bobagem!Foiumaboaidéia!SirvaodesjejumnoKuwait.Quantotempofalta?
—Apenasalgunsminutos,senhor,peloqueentendi.
— Otimo. Assim, vou poder participar da reuniã o com a camisa limpa. Você deveria ter
pensadonisto,Karl.
CAPÍTULO8
O cofre de Leah estava escondido em cima de uma plataforma suspensa, atrá s de uma
casinha de cachorros embolorada que pertenceu aos ilhos dela. Rayford a ajudou a subir em
umaescadaeaguardouaté queelaafastasseacasinhaeoutrasbugigangas.Elesubiunaescada
atrá sdeLeahe icouapontandoalanternaporcimadoombrodelaparailuminarafechadurado
cofre.
—Comovocê conseguiutrazerestacoisaaté aqui?—elecochichou.—Devepesaruma
tonelada.
— Nã o querı́amos que os vizinhos soubessem — ela disse, com a voz ainda trê mula. —
Meumarido,Shannon,pediuqueocofrefosseentregueemumacaixasimples,eelealugouum
andaimehidrá ulico.Umvizinhoperguntouparaqueserviriaoandaime,eShannonlhedisseque
queriasubstituiralgumastelhasdagaragemqueestavamquebradas.Aparentemente,ovizinho
ficousatisfeitocomaresposta.
—Edaí?Depoisquevocêsergueramocofre,foidifícilcolocá-lonolugar?
—Achamosqueaplataformanãoiaagüentar.
Ocofretinhacercade90cmdealturapor60cmdelargura,eLeahnã oestavabrincando
quandodissequehaviamuitodinheiroali.Assimqueaportafoiaberta,eladisse:
—Tivemosdeguardarosoutrosobjetosdevalornocofredobanco.
Ocofreestavaabarrotadodemaçosdenotasde20dólares.
—Podíamosusaristonacasasecreta—disseRayford.
—Époristoqueestamosaqui.
— Estou falando do cofre. Jamais poderı́amos aceitar todo este dinheiro. Nã o haverá
temposuficienteparagastá-lo.
— Bobagem. Você s vã o precisar de mais veı́c ulos, e nã o sabem quantas pessoas podem
passaramorarlá.
Elesencheramrapidamenteasacolacomodinheiro.
— A sacola vai icar pesada demais para ser carregada — disse Rayford. — Ajude-me a
empurrá-laparaqueelacaianochão.
Depoisdemuitoesforço,elesconseguiramarrastarasacolaaté abeiradaplataforma.Os
maçosdenotassemisturaramdentroeelacaiunochã o,comumbaquesurdo,levantandouma
nuvemdepoeira.Rayfordapagoualanternaeprendeuarespiração.
—Vocêestámevendo?—elecochichou.
—Maisoumenos.
RayfordfezumsinalparaqueLeahdescessedaescadaatrá sdele.Adescidafoitã odifı́c il
quantoasubida.Quandoelechegouaochão,ajudou-aadescerosúltimosdegraus.
—Vocêestáseachandoumcavalheiroporter-meajudadoadescer—elacochichou.
—Sósevocêforumadama.
Elesviraramasacolaepassaramamãonelanoescuroparaversetudoestavaemordem.
Umfeixedeluzbrilhounorostodeles.
—VocêéLeahRose?—inquiriuumavoz.
Leah deu um suspiro e olhou para Rayford. — Sim — ela disse em voz baixa. — Sinto
muito,R...
—Nãofalemeunome!—eledisseentreosdentes.—Enãofinjaseroutrapessoa.
—VocêéounãoéLeahRose?—soouavoznovamente.
— Eu respondi que era, certo? — ela disse, sem muita segurança, como se estivesse
mentindo.Rayfordsurpreendeu-sediantedarapidezcomqueelaserecompôs.
—Evocê,quemé?—perguntouodesconhecido.
—Eu?—perguntouRayford.
—Seunome.
—Quemestáquerendosaber?
—ForçasPacificadorasdaCG.
—Ah!quealı́vio!—disseRayford.—Nó stambé msomos.OcomandanteSullivanpediume que eu desse uma olhada aqui. A casa foi saqueada depois que seu pessoal saiu. Ele queria
queverificássemosagaragem.
Alguémapertouuminterruptor,acendendoumalâmpadadeluzfracaacimadacabeçade
Rayford. Ele semicerrou os olhos e viu quatro policiais da CG armados, trê s homens e uma
moça.
— O que você estava fazendo no escuro? — perguntou o lı́der. Na farda dele, havia a
insígniadetenente.
Rayfordolhouparacima.Alâmpadaestavaàdistânciadeumbraço.
—Ouvimosumbarulholáforaeapagamosaluz.
—Humm—disseapolicial,aproximando-se.—Precisoversuascarteirasdeidentidade.
ApolicialolhouparaRayfordcomardedúvida.Umdoshomensolhouparaaplataforma.
— Eu sou Pa ko — disse Rayford, tentando desesperadamente lembrar-se em que bolso
elecolocarasuacarteiradeidentidadefalsa.—Andrew.Aquiestá.
—Evocê,madame?
—ElasechamaFitzgerald.
—Meusdocumentosestãonocarro—eladisse.
—Tenente!—chamouooutropolicial.—Háumcofreabertoaliemcima.
OtenentedevolveuacarteiradeidentidadeaRayford.
—Vocênãoestavaplanejandolevaralgumacoisadaqui,estava,Pafko?
—Vouprestarcontasdecadacentavo.
—Hum—disseopolicialvirando-separaamoça.—'Veri iquecomaCentral.Andrew
Pa ko, da divisã o de Des Plaines. E Fitzgerald. Qual é o seu primeiro nome, madame, e a que
divisãopertence?
— Pauline — respondeu Leah. — També m de Des Plaines. A moça pegou o telefone que
estavapresoaumatiraemseuombro.
Rayford se assustou. O telefonema poria tudo a perder. Eles seriam facilmente
identi icados, talvez torturados e mortos, se nã o revelassem os nomes dos outros membros do
ComandoTribulação.Elemereciaissopornãotersidomaiscuidadoso,masLeahnão.
—Nãohánecessidade,tenente—disseRayford.—Antesqueasededoquartelsaibaonde
estamos, nã o seria melhor a gente dar um tempo e esquecer que nó s seis estivemos aqui esta
noite? Sou tã o leal à causa quanto o senhor, mas nó s dois sabemos que a Sra. Rose era uma
militanterebelde.Setodoestedinheiroeradela,agoraénosso,não?
O tenente hesitou, e a policial afastou a mã o do telefone. O tenente ajoelhou-se perto da
sacola.
— O senhor está acreditando nisto? — perguntou a policial ao tenente. — Acha mesmo
queeleédaCG?
O tenente olhou para ela. — Como ele poderia saber o motivo de estarmos atrá s da Sra.
Rose?
Ela encolheu os ombros e começou a examinar o cofre. Os outros dois policiais
caminharamaté aporta,talvezparaveri icarsehaviaalgumcuriosoporperto.Rayfordpassou
amãopeloscabelos.Seráqueelehaviaconseguidoquatrocúmplices?
Ele olhou irme para Leah como que pedindo para que ela deixasse o assunto por conta
dele.Leahestavatã opetri icadaquantonomomentoemqueviraoscavalos.Rayfordpostou-se
demaneiracasualentreotenenteeaporta.Leahoacompanhou.
Otenenteviuodinheiroedeuumassobio.Osoutrosdoispoliciaiseamoçaaproximaramse para ver. Enquanto eles concentravam o olhar na sacola, Rayford e Leah dirigiram-se mais
parapertodaporta.Leahpoderiater-seesgueiradosemservista,masRayfordnã opodiafazer
nada,portantoelanãosaiudolugar.
—Há umaboaquantiaparatodosnó s—disseumdospoliciais.Otenenteassentiucoma
cabeça,masRayfordpercebeuqueamoçaolhava irmeparaLeah.Elapegoualgunspapé isdo
bolsotraseiroefolheou-os.Emseguida,parouevoltouaolharparaLeah.
—Tenente...—disseamoça.
— Deixe-me mostrar-lhes uma coisa — interrompeu Rayford, en iando a mã o dentro da
sacolaeretirandoummaçodenotasde20dó lares.—Calculemquecadamaçotenha50notas
de20dólares.—Elesegurouasacolaporumdosladosedeixouqueosmaçosdenotasrolassem
para o outro. A moça fez um gesto para pegar a arma. Rayford levantou o maço de notas. —
Nã o seria ó t imo dividirmos tudo e... sumir daqui? Agora? — Ele deu uma pancada na lâ mpada
comodinheiroeagaragemficouàsescuras.
Rayford virou-se rapidamente e correu atrá s de Leah, que fugia pela porta lateral. Ele
ouviu um tiro e ruı́do de madeira estalando, e percebeu que o tenente havia acendido uma
lanternapossanteatrásdeles.EnquantoRayforde
Leah corriam pelo piso escorregadio, ele calculou que as possibilidades de chegarem ao
Land Rover antes dos policiais seriam mı́nimas. Mas Rayford nã o queria icar ali e ser preso.
Algué m acionou o botã o automá tico da garagem, e Rayford ouviu a porta levantando-se. Ele
olhou furtivamente para trá s e viu os quatro policiais correndo em sua direçã o, com as armas
engatilhadas.
—Rá pido!—Rayfordgritouaovirar-separaverondeLeahestava.Maselahaviaparado.
Elecorreunadireçãodela,eosdoissechocaramviolentamente,rolandosobreagrama.
Alguma coisa tinha acontecido. Será que sua perna estava quebrada, ou ele havia
esmagado a dela? Por que Leah parará de repente? Ela estava se saindo tã o bem! Eles ainda
tinhamumachance.OLandRoverestavaà vista.Será queaCGatirarianeles?Ouosprenderia?
Rayfordpreferiairparaocéuapôremriscoavidadeseusqueridos.
— Deixe que eles atirem — ele disse com a voz rouca, tentando levantar-se. Mas Leah
estavadequatronagrama,olhandoparaocarroporentreos iosdecabeloquecaı́amsobreseu
rosto.
Rayfordolhouparatrá s.Ospoliciaistinhamdesaparecido.Eleolhouparaopontoemque
Leah tinha os olhos cravados. Lá estavam os cavalos, a menos de trê s metros dele -enormes,
monstruosos,duasvezesmaioresdoquequalqueroutroqueelejá vira.Leahtinharazã o,ospé s
dos cavalos nã o estavam apoiados no chã o, mas, mesmo assim, eles se movimentavam para a
frenteeparatrásegiravamocorpo.
Chamassaı́amdesuasbocasenarinas,fazendosubirumaespessafumaçaamarela.Ofogo
iluminava suas cabeças grotescas, iguais a cabeças de leõ es com enormes dentes caninos, e
caudas movimentando-se para cima e para baixo. Rayford levantou-se lenta e penosamente.
AgoraelecompreendiaocomportamentodeLeahquandoelaosvirapelaprimeiravez.
—Elesnãovãonosatacar—eledisseesperançosamente,comvozfracaeofegante.
Rayfordtremia,tentandogravaracenanamemó ria.Atrá sdaprimeira ileiradecavalos
haviacentenasdeoutros,agitadosemovimentando-sesempararcomoseestivessemansiosos
paraatacarecorrer.Oscavaleiroseramenormes,detamanhoproporcionalaodoscavalos.Eles
pareciam seres humanos, mas tinham cerca de trê s metros de altura e deviam pesar mais de
200quilos.
Rayford engoliu seco, com o peito arfando. Ele queria ver como Leah estava, mas nã o
podia desviar o olhar. O cavalo diante dele, a menos de trê s passos de distâ ncia, começou a
rodaremcı́rculos.Rayfordviuquesuacaudanã otinhapê los.Eraumaserpentesecontorcendo,
cujacabeçatinhaodobrodotamanhodopulsodele.Aovirar-se,elaarreganhouaspresas.
Os cavaleiros pareciam estar com o olhar ixo a quilô m etros de distâ ncia, bem acima da
cabeça de Rayford. Cada cavaleiro possuı́a uma couraça que, iluminada pelas chamas, reluzia
em tons amarelos, azuis e vermelhos. Apesar de serem fortes e terem braços e bı́c eps
musculosos,oscavaleirostinhamdificuldadeparacontrolaroscavalos.
Rayfordnã oouvianenhumruı́dodaspatasdoscavalos,nã osentiaocheirodeles,nemdo
fogoedafumaça.Elesó sabiaqueelesgemiameresfolegavamporcausadofogoedafumaça.
Nãohaviasonsderédeas,selaseescudos.Mesmoassim,oscavalos-leõeseseuscavaleiroseram
maisbrilhantesdoquequalqueroutracoisaqueelejávira.
Finalmente, Rayford olhou para Leah. Ela parecia catatô nica, olhos arregalados, boca
escancarada.
—Respirefundo—elelhedisse.
Será que Deus havia providenciado aquelas criaturas para protegê -los? Certamente os
policiais deviam ter corrido para se salvar. Rayford virou-se novamente e, a princı́pio, nã o viu
nadaentreeleeagaragem.Mas,derepente,eleavistouosquatropoliciaisestendidosnochã o,
imóveis.
Ele ouviu sirenes, viu helicó pteros vasculhando a á rea com holofotes, ouviu guardas
correndo,gritando.
— Precisamos ir embora, Leah — ele disse. — Podemos caminhar por entre os cavalos.
Elesnãosãocavalosverdadeiros.
—Vocêsdoisaí!
Rayford virou-se. Dois guardas cutucaram os quatro policiais com suas botas enquanto
gritavamparaRayfordeLeah.
—Fiquemondeestão!
Eles aproximaram-se com cuidado. Finalmente, Leah desviou o olhar dos cavalos, olhou
paratrásporcimadosombrosemurmurou:
— Acho que quebrei uma costela. — Ela voltou-se na direçã o dos guardas com os olhos
semicerrados.—Seráqueelesnãoestãocommedodoscavalos?
O que havia de errado com os guardas? Assim que se aproximaram — dois homens com
pouco mais de 20 anos -, eles apontaram as armas para Rayford e Leah. Rayford sabia que os
cavalosestavamatrásdeleporcausadoreflexodaschamasquebrilhavamnorostodosguardas.
—Oquevocêssabemsobreaquelespoliciaismortos?-perguntouumdeles.
— Nada — respondeu Leah, ainda de quatro sobre a grama. -O que você acha de nosso
exército?
—Levante-se,madame.
—Elesnãopodemvê-los—disseRayford.
—Nãopodemosverquem?—inquiriuoguarda.—Venhamconosco.
—Vocênãoestávendonada—disseRayfordsecamente.
— Eu lhe disse para levantar-se, madame! — gritou o outro guarda. Assim que ele
caminhounadireçãodeLeah,Rayfordointerceptou.
—Filho,precisoadverti-lo.Se...
—Advertir-me?Possomatarvocêcomumtiroenãovouprecisarresponderporisto.
— Você está correndo perigo. Nó s nã o matamos aqueles poli... O guarda deu um grito
enquanto seu corpo transformava-se em chamas, rodando e iluminando a á rea como se fosse
dia.UmdoscavalospassouporRayfordedeuumgirorá pido,atingindoooutroguardanatesta
com sua cauda. O guarda foi atirado longe como se fosse uma boneca de pano. Sua cabeça foi
esmagadacontraumaárvoreatrêsmetrosdedistância.
Aos poucos, Leah conseguiu icar em pé . O suor corria-lhe pelo rosto até o queixo. Ela foi
aoencontrodeRayfordcomoseestivessecaminhandoemcâmeralenta.
—Nós...vamos...morrer—elabalbuciou.
—Nó snã o—disseRayford,recuperandoofô lego.—Ondeestá doendo?Aperteapalma
damãosobreolocal.
Ela segurou irme a caixa torá cica do lado direito, e Rayford passou o braço ao redor da
cinturadela,ajudando-aadirigir-separaocarro.Elesemicerrouosolhosporcausadaschamas
ecaminhouatravé sdoscorposdoscavaloscomoseestivesseatravessandoumholograma.Leah
enterrouorostonoombrodele.
—Elesestãoemoutradimensão?Oqueéisto?
— Uma visã o — ele disse, sabendo pela primeira vez que eles nã o seriam atingidos. —
Tsionestavacerto.Elesnãotêmcorposfísicos.
Agora eles estavam no meio da tropa, e Rayford nã o conseguia enxergar onde ela
terminava, sentindo-se como uma criança cercada de uma multidã o de adultos. Finalmente,
elesatravessaramaúltimafileiradecavaloseavistaramoRovera30metrosdedistância.
—Vocêestábem?—eleperguntou.
—Sim,masparecequeestousonhando—elarespondeu.
—Amanhã,nãovouacreditarnoquevi.Nemagoraestouacreditando.
Rayfordapontouparaumadistânciadequaseumquilômetroaoesteondemaisumgrande
nú m erodecavalosferozesseagrupava.Leahapontouparaooutrolado,ondehaviaoutrogrupo.
Osdetráspareciamdirigir-seàcidadeondeLeahmorava.
Eles entraram no carro, e Rayford seguiu pela rua da casa de Leah, coisa que nã o havia
ousado fazer antes. A fumaça preta e amarela que saı́a das bocas dos cavalos afugentou os
guardasdaCG.Muitosestavamcaı́dosnochã ocomosetivessemsidomortosnoato.Aspessoas
saı́am das casas no meio da fumaça que se espalhava pela á rea, falando, tossindo, caindo ao
chão.Emvárioslugares,oscavalosexpeliamfogosuficienteparaincinerarascasas.
RayforddeumarchaaréeparoudiantedagaragemdeLeah.
—Espereaqui—eledisse.
—Rayford!Não!Vamosembora!
Elesaltoudocarro.—Nãovoudeixartodoaqueledinheiro...
—Porfavor!—elagritou.
Rayfordpassouporcimadoscorposeentrounagaragem.Fechouasacolacomozı́pere
colocou-a em cima do ombro. Mesmo caminhando atravé s da fumaça e das chamas, ele nã o
sentiu nenhum cheiro. Depois de colocar a sacola no porta-malas do Rover, ele sentou-se ao
volante.Enquantosaíadali,eleolhouparaLeah.
— Bem-vinda ao Comando Tribulaçã o — ele disse. Ela balançou a cabeça, segurando
firmeascostelas.Rayfordacelerourumoàcasasecreta.
—Emelhorapertarocintodesegurança—eledisse,virando-separaLeah.
MacpassoudespercebidoporFortunatoeseusconvidadosenquantoelestomavamocafé
da manhã e desceu do aviã o para supervisionar o reabastecimento de combustı́vel. Do local
ondeseencontrava,podiaobservarodesembarquedacarga.AssimqueAbdullahabriuaporta
docompartimentodecarga,vá riasempilhadeirascomeçaramarodarsobreapistaeentraram
no aviã o, subindo pela rampa de alumı́nio. Enquanto Fortunato saboreava seu desjejum, 144
computadores e mais de uma tonelada de gê neros alimentı́c ios estavam saindo
clandestinamente do Condor 216 e cairiam nas mã os dos inimigos da CG antes do pô r-do-sol.
Brilhante, Abdullah, pensou Mac.Nada como uma refeição para distrair a atenção do supremo
comandante.
BuckdespertounomomentoemqueChloeatendeuaotelefone.
—Quehorassão?—eleperguntou.
Chloeapontouparaorelógioquemarcavameia-noiteemeia.
—Silêncio—eladisse.—Éopapai.
—ObilhetedizqueeleeLeah...Novamente,Chloepediu-lhesilêncio.
— Lá fora? — ela estava dizendo. — Por quê ?... Tudo bem! Vou fazer isso... Tsion? Você
estáfalandosério?Querqueeuváacordá-lo?...Estábem,cheguelogo!
Eladesligou.
—Levante-se,Buck.
—Oquê?Porquê?
—Vamos.PapaiquerquevocêacordeTsioneolhepelajanela.
—Oqueé...
—Rápido!EleeLeahestãovoltandoparacasa.
—Oqueelequerqueagenteveja?
—Os200milhõesdecavaleiros.
—Já?Vocêconseguiuvê-los?
—VáacordarTsion.
Depoisdadecolagem,MacpediuaAbdullahqueassumisseocomandodaaeronave.
— Quero ver se Leon vai começar a falar sobre estraté gia. Ele estendeu a mã o para trá s
para veri icar se a porta da cabina de comando estava fechada, desatou o cinto de segurança,
recostou-se na poltrona, fechou os olhos e apertou o botã o secreto. Um dos assessores de
Fortunatoestavatentandoimpressioná-lo.
— Vai ser bom demais quando ele descobrir que Carpathia nã o veio e que só você está
aqui.
—Eununcaouvivocêreferir-seaopotentadopelosobrenome...
— Desculpe-me, comandante. Eu quis dizer Sua Excelê ncia, o potentado. Será ó t imo
quando Ngumo descobrir que o potentado Rehoboth, alé m de ter tomado conhecimento desta
reunião,tambémfoiconvidado.
Ooutroassessorintrometeu-senaconversa.
—Então,estamosfazendoestaviagemsóparaosenhorpôrNgumoemseudevidolugar?
—Aperguntaé vá lida—disseLeon.—Ingê nua,poré mvá lida.Estavaiserumamaneira
muitointeligentedefazerascoisas.Nã osetratadeumsimplesinsulto;é uminsultoparacalar
fundo.Apesardenossossorrisoseatitudessubservientes,eleperceberá claramentequesetrata
de um tapa na cara. Ele nã o vai reunir-se com Sua Excelê ncia. Nem sequer vai icar frente a
frente com o supremo comandante em particular. Ele nã o receberá nada do que pediu e vai
icarsabendoporquê .Eupoderiaterfeitoissoportelefone,masasatisfaçã onã oseriaamesma.
Dequalquerforma,trata-sedeumamissãoparaestabelecermosumacoalizão.
—ComRehoboth?
— Exatamente. E muito importante que Sua Excelê ncia con ie em seus potentados
regionais.BastaacertarmaisalgunspontoscomBinduraeconquistaremosdevezsualealdade.
Existem boatos de insurreiçã o, mas temos certeza absoluta de que podemos contar com seis
potentados e 90% de certeza quanto a Rehoboth. Os trê s restantes passarã o para o nosso lado
quando chegar o momento de resolver o problema de Jerusalé m; caso contrá rio, serã o
substituídos.
—ProblemadeJerusalém?
— Nã o me decepcione. Você tem trabalhado tã o pró ximo de mim durante todo este
tempoenãosabeoqueestouquerendodizerquandomerefiroaoprob...
—Asduastestemunhas.
— Bem, sim... nã o! E assim que aqueles rebeldes se autodenominam. Eles també m se
referemasimesmoscomocandeeiros,árvoresoucoisasdogênero,coisasbíblicas.Nãoserenda
aostermosdeles.Sãodoispregadoresmalucos,doisturrões,dois...
Estas ú ltimas palavras levaram os assessores a caı́rem na gargalhada, o que serviu para
Leon começar a fazer uma sé rie de comentá rios que ele considerava engraçados. Para ouvir
seus bajuladores, ele tinha subestimado seus dons de comediante. Mac estava balançando a
cabeça de um lado para o outro diante dos absurdos que ouvia quando Abdullah o assustou
dando-lheumtapanopeito.
Macendireitou-senapoltronacomosetivessesidoatingidoporumatoalhamolhada.
—Desculpe-me—gritouAbdullah—masolhe!Olhe!Oh!Estavaali!
—Oquê?—perguntouMac.
Osolestavasepondonohorizonteatrá sdeles,à esquerda,eocé usemnuvensquehavia
pela frente estava in initamente azul. Mac nã o viu nada. Naquele momento, Abdullah també m
nãovianada.
—Euvialgumacoisa,capitão.Garantoquevi.
—Nãoestouduvidandodevocê.Oquefoi?
—Vocêvaiduvidardemimseeulhecontar.—Osolhos
de Abdullah continuavam arregalados. Ele inclinou-se para a frente e olhou em todas as
direções.
—Tentemecontar.
—Umexército.
—Comoassim?
—Umacavalaria,querodizer.
—Abdullah,vocênemsequerestavaolhandoparaosolo.
—Eunãoteriaacordadovocêsetivessevistoalgumacoisanosolo!
—Eunãoestavadormindo.
—Seriamelhorseeutivessevistocavalosnosolo!
—Vocêviucavalosnocéu?
—Cavalosecavaleiros.
—Nãovejonadanocéu,nemnuvens.
—Eudissequevocênãoacreditariaemmim.
—Euacreditoquevocêpensaqueviualgumacoisa.
—Achoquevocêtambémvaimechamardementiroso.
— Jamais. Está na cara que você pensa ter visto alguma coisa. Você nã o estava
cochilando.Ouestava?
— Alé m de ser um mentiroso, també m durmo em serviço? Mac riu. — Se você está
dizendoqueviualgumacoisa,euacredito.
—Nãopareciahaver200milhões,mas...
—Ah!vocêandalendoasmensagensdeTsion...
—Claro.Equemnãoanda?
Mac empinou a cabeça. — Foi um devaneio, você devia estar meio acordado, meio
dormindo. Nã o me olhe deste jeito. Estou dizendo que foi durante uma fraçã o de segundo
enquantovocêpensavanamensagemdoDr.Ben-Judá...
—Vocêvaimeofendersecontinuarafalarassim,capitão.
—Desculpe-me,irmã o—disseMacdandoumabatidadelevenoombrodeAbdullah.—
Vocêtemdeadmitirqueexisteestapossibilidade.
AbdullahempurrouamãodeMac.—Vocêtemdeadmitirqueexisteapossibilidadedeeu
tervistocavalosecavaleiros.
Mac sorriu. — O que eles estavam fazendo? Uma apresentaçã o? Preparando-se para o
grandedesfile?
—Capitão!Vocêestámeofendendo!
— Vamos, Abdullah! Tsion diz que os cavalos e os cavaleiros vê m do abismo, da mesma
formaqueosgafanhotos.Oqueelesestariamfazendoaquinoalto?
Abdullahpareciaestaraborrecidoevirou-separaooutrolado.
—Vocêachaqueeutiveaintençãodeofendê-lo?-perguntouMac.
Nenhumaresposta.
—Acha?
Abdullahcontinuoucalado.
—Agoravocêvaificardebeiço...
—Nãoseioquesignificaficardebeiço.
—Apesardenãosaberoquesignifica—disseMac-,vocêémuitobomnisto.
— Se isso signi ica que estou bravo com uma pessoa que eu imaginava ser meu amigo e
irmão,entãoestoudebeiço.
Macriualto.—Verdade?Possochamarvocê debeiço?Esteaquié omeuirmã oeamigo
beiço!
AntesqueMactivessetempodepiscar,cavalosecavaleirosescureceramocé u.Abdullah
puxou bruscamente os controles, e o aviã o quase empinou, imobilizando Mac na poltrona. Ele
ouviu ruı́dos de batidas e solavancos na cozinha e na sala de descanso. Em seguida, Leon
começouagritar.
Assim que Mac se deu conta de que ia se arrepender por nã o ter apertado o cinto de
segurança, Abdullah fez uma outra manobra, e o aviã o baixou rapidamente de altitude. Mac
bateu a cabeça com força no teto. No exato momento em que virou o rosto, foi ferido no lado
esquerdodacabeça.Osbotõ esdocontrolequebraram,abrindoumcorteefurandosuaorelha.O
sangueespirrounopára-brisaenopaineldecontrole.
Finalmente,Abdullahconseguiuaprumaroaviãoeficouolhandofirmeparaafrente.
— Eu nã o iz isto para me vingar de você — ele disse, com a voz trê mula. — Sinto
muitı́ssimo se você nã o viu por que eu precisei desviar o aviã o daquela maneira tã o brusca.
Esperoqueseuferimentonãosejagrave.
—Euvinitidamenteoscavaloseoscavaleiros—disseMac,comocoraçã oaospulos.—
Nuncamaisvouduvidardevocê .Precisofazeralgumacoisaparaestancarosangue.Sevocê os
vir novamente, nã o tente desviar deles. Mantenha a aeronave na posiçã o. Eles estã o lutuando
noespaço.Vocênãovaiatingi-los.
—Peçomildesculpas.Foiinstintivo.
—Euentendo.
—Vocêestábem,capitão?
—Maisoumenos.Oferimentofoisuperficial,tenhocerteza.
—Otimo—disseAbdullah.Emseguida,elecomeçouaimitarumacomissá riadebordo:
— Mantenha sempre o cinto apertado quando estiver em sua poltrona, mesmo que a luz de
avisotenhasidoapagada.
Macrevirouosolhos.
—Agoraévocêquemvaificardebeiço?—perguntouAbdullah.
Maclevantou-seedirigiu-separaaporta,noexatomomentoemquealguémaesmurrava
doladodefora.
CAPÍTULO9
BuckpediumilhõesdedesculpasaTsion,explicandoomotivodetê-loacordado.
—RayfordeLeahforamaté acasadelaparapegaralgumacoisa.Elesacabaramdeligar
pedindoqueagenteolhepelajanela.
Tsion, com os cabelos desalinhados, pegou um roupã o e desceu a escada atrá s de Buck.
Chloe,comKennynocolo,estavaempédiantedajanelaolhandoparaooeste.
—Talvezsejanecessárioapagarasluzes—eladisse.—Nãoestouvendonada.
—Oquevocêsestãoquerendover?—perguntouTsion.
—Os200milhõesdecavaleiros—elarespondeu.
Tsioncaminhouapressadoatéajaneladafrentedacasaeafastouacortina.
— Eu nã o icaria desapontado se Deus antecipasse o Glorioso Aparecimento em alguns
anos—eledisse.—Océudeveestarnublado.Nãoháestrelas.Ondeestáalua?
—Aquiatrás—disseBuck.
— Acho que Rayford nã o estava falando sé rio — disse Tsion, aproximando-se de Buck e
Chloe.
—Eleestavaempolgadodemais—disseChloe.—Assustado.Buckcaminhouaté aporta
dosfundoseolhouparaoleste.
Nohorizonte,haviaumclarãovermelho.
—Eugostariadesaberoqueéaquilo—eledisse,chamandoopessoal.
—Devehaveralgumacoisaqueimandoemalgumlugar-disseTsion,comvozcansada.—
MasacasadaSra.Rosenãoficanadireçãooposta?
—Émelhoreupegarocarroeseguirnaqueladireçãoparaveroqueé—disseBuck.
Chloe nã o gostou da idé ia. — Vamos esperar para ver. Se for só um incê ndio, nã o vale a
penaarriscar-se.
O telefone tocou. Chloe passou o irrequieto Kenny para os braços de Buck e correu para
atender.
—Nã o,papai—eladisse.—Podeserumincê ndionoleste...Você temcertezadequejá
começou?...FalecomTsion.
AssimqueMacdestravouaportadacabinadecomando,Leonentroucambaleando,com
oscabelosdesgrenhados,praguejando.
—Umapequenaturbulência—disseMac.
— Turbulê ncia? E o que signi ica esta fumaça, este cheiro? Mandei veri icar, e Karl me
disse que um dos funcioná rios dele está inconsciente! Precisamos aterrissar, homem! Vamos
morrersufocados!Evocêestásangrando!
Mac acompanhou-o até a sala de descanso, onde um dos assessores de Leon massageava
freneticamenteopeitodooutro.Karlgritoudacozinha:
—Vamostodosmorrer!
Leoncobriuabocacomumlenço,falandocomdificuldade,tossindo.
—Enxofre!Deondeestá vindo?Evenenoso,nã o?Vainosmatar?Macnã osentianenhum
cheiro.Elefoiverificaropaineldecontrole.OCondorpossuíaalarmessupersensíveiscontrafogo
efumaça.Nenhumdispositivohaviasidoacionado.Macsabiaquepoderialevantarsuspeitasse
nãoestivessesentindonada.Elecobriuabocacomamão.
—Vouligarosistemadeventilaçã o—eledisse,enquantoKarlarrastavaseufuncioná rio,
retirando-o da cozinha. — Leve os dois que estã o passando mal para os aposentos de dormir.
Temosoxigêniosuficienteparatodos.
—Nãoháumlugarporpertoparapousarmos?—perguntouLeon.
—Vouverificar—respondeuMac.
—Rápido!
Macentroucorrendonacabinadecomandoetrancouaporta.
—Oqueestáacontecendo?—perguntouAbdullah.—Vocêestáperdendomuitosangue.
—Euestoubem—disseMac.—Aquelescavalostê mpoderparaentraraqui,até mesmo
dentrodacabinapressurizada.Todosestã osentindocheirodeenxofre,estã osufocados,usando
oxigênio,desmaiando.Leonquerqueagenteaterrisse.
—PrecisamosseguirdiretoparaJoanesburgo—disseAbdullah,ajudandoMacaveri icar
cadadispositivo.—Oqueestá acontecendocomelesnã ovemdesteaviã o.Vaiserpiorseeles
estiverememterra.
— Eles poderiam receber tratamento mé dico. Abdullah olhou para Mac. — Você , sim,
masseelesestã osendoatacadospelos200milhõ esdecavaleiros,nã ohaverá mé dicoquepossa
salvá-los.
—Qualéohorárioprevistodechegada?
—Aindatemosalgumashoraspelafrente.
Macsacudiuacabeça.Seuferimentoofezestremecer.
—Vamosterdepousar,senãoLeonvaidescobrirquesomosinvulneráveis.
AbdullahfezumgestoparaqueMacassumisseocontroledoaviãoetiroualgunsmapasde
suamaletadevôo.
—Elesvã ochegardentrodepoucosminutos—disseTsion,desligandootelefoneapó ster
conversadocomRayford.-Osflagelosdefogo,fumaçaeenxofrejácomeçaram.Eunãoesperava
quefosseagora,masoscavaleirosestã ovisı́veis,pelomenosparaalgumaspessoas.Rayfordea
Sra.Roseosviram.Osincrédulosestãosendoexterminados.BuckligouaTV.
—Socorro!Socorro!—Macouviupelorádio.
—AquiéoCondor,prossiga.
—Socorro!Meupilotoestá morto!Estousufocado!Acabinadecomandoestá repletade
fumaça.Quecheirohorrível!Nãoconsigovernada!Aaeronaveestádescontrolada!Caindo!
—Qualéasuaposição?
Mac, poré m, só ouviu um gemido fraco. Parecia o dia do Arrebatamento, só que agora
eramgritosdepilotosnão-crentescujosaviõesseperderiam,talvezaterçapartedeles.
Os pedidos de socorro congestionaram a freqü ência. Mac nã o podia fazer nada e estava
atordoado.Elemudouafreqüênciadorádioparaouvirasnotícias.
"Até o momento, ningué m tem uma resposta para a sé rie de incê ndios, fumaça e odor
terrı́vel de enxofre que está matando milhares de pessoas no mundo inteiro", dizia o repó rter.
"As equipes mé dicas de emergê ncia estã o completamente perdidas, tentando de todas as
maneirasdeterminaracausa.VamosouviroqueochefedaAssociaçã odeAtendimentoMé dico
deEmergênciadaComunidadeGlobal,Dr.JurgenHaase,temanosdizer."
"Sefossemeventosisolados,poderíamosatribuiraumfenômenodanatureza,umaruptura
emalgumafontedegá snatural.Masoacontecimentopareceseraleató rio,eafumaçaé letal.
Solicitamosqueoscidadã osusemmá scarascontragá setrabalhememconjuntoparaapagaros
incêndios."
Orepórterperguntou:"Qualéamaisperigosa,afumaçapretaouaamarela?"
Haase respondeu: "Acreditamos que a fumaça preta foi provocada pelo fogo, mas parece
nã oternadaavercomele.Podesermortal,masafumaçaamarelatemodordeenxofreetem
opoderdematarinstantaneamente."
O repó rter disse que acabara de receber um boletim, e sua voz parecia a de algué m
aterrorizado."Emboraexistamlugaresnosquaisnã osetemnotı́c iadefogo,fumaçaouenxofre,
em outros o nú m ero de mortes é alarmante, até agora estimado em centenas de milhares.
Nesta pró xima meia hora, Sua Excelê ncia, o potentado da Comunidade Global, Nicolae
Carpathia,falaráaomundoviarádio,televisãoeInternet."
Abdullah colocou um mapa bem na frente de Mac. -Estamos eqü idistantes de dois
aeroportoscompistasdepousoparaaeronavesdegrandeporte:Adis-AbebaeCartum.
—Leonéquemvaidecidir—disseMac.—Éelequedesejaaterrissar.
Abdullah assumiu o controle novamente. Mac saiu da cabina de comando e viu Leon
falandoaotelefone.Pegouumguardanapodepanonacozinha,molhou-ocomá guaesegurou-o
de encontro à orelha. Atirou outro guardanapo umedecido na cabina de comando para que
Abdullahlimpasseopára-brisaeopainel.
— Um momento, Excelê ncia — Fortunato disse -, o capitã o precisa de mim... Sim, vou
perguntaraele.—Leoncobriuofone.—SuaExcelênciaestámeperguntandoondeestamos.
—SobrevoandooMarVermelho.Podemosseguirpara...LeonfezumgestoparaqueMac
silenciasseevoltouafalarcomCarpathia.Emseguida,passouofoneparaMac.
—Opotentadoquerfalarcomvocê.
—Qualéoseuplano,capitão?Maclhecontouasopções.
—VocêtemcondiçõesderetornaraMecaouaalgumlugarnoIêmen?
—Essesaeroportosnãotêmpistasdepousoparaumaaeronavedesteporte,senhor.
—Adis-Abebaestá localizadaondeeraaEtió pia—disseCarpathia,parecendoconversar
consigomesmo.
—Correto—disseMac.—CartumficanoantigoSudão.
— Siga para lá . Vou entrar em contato com o potentado Rehoboth na Africa do S..., em
Joanesburgo,epediraelequeseupessoalnoSudã ofaçaomelhorquepuderporvocê s.Sevocê
tivercondiçõesdecompletarestaviagem,elaserádegrandebenefícioparaacausa.
—Osenhorpoderiameinformarcomoestáasituaçãoaí?
— Aqui? Perdemos algumas dezenas de pessoas, e o mau cheiro está insuportá vel. Estou
convencido de que se trata de uma guerra quı́m ica, mas nã o me surpreenderei se o pessoal da
oposiçãodisserqueéumfenômenosobrenatural.
—Eutambém...senhor.
—ADupladeJerusalémjáestádefendendoesteúltimoargumento.
—Como?
—Éonovonomequedeiaeles.Vocêgostou?
Mac nã o respondeu. Enquanto um grande nú m ero de pessoas morria no mundo inteiro,
Carpathiasedivertiacomjogodepalavras.
— E claro — prosseguiu Carpathia — que eles estã o se responsabilizando pelos
acontecimentos.Istofacilitameutrabalho.Odiadelesvaichegar,eomundomeagradecerá.
BuckestavasentadodiantedaTVemcompanhiadeTsioneChloe,aguardandoachegada
de Rayford e Leah. Dos paı́ses onde ainda era dia, chegavam imagens de fogo e de rolos de
fumaçasubindo,pessoassufocadas,ofegando,tossindo,caindoaochão.Pânicototal.
O telefone tocou. Era Mac querendo falar com Rayford. Buck lhe contou as novidades e
icouatô nitoaoouvirosrelatosdeMacedeAbdullah.MaclhecontouoapelidoqueCarpathia
deuàsduastestemunhas.
— Daqui a pouco, ele vai aparecer na TV — disse Buck. -Vou pedir a Rayford que ligue
paravocê.
Rayford e Leah chegaram no momento em que Carpathia estava sendo apresentado. O
Comando Tribulaçã o sediado nos Estados Unidos icou ali, sentado diante da TV, ouvindo uma
histó ria có smica. Tsion levantou-se e começou a andar de um lado para o outro assim que
Carpathia olhou solenemente para a câ mera. O potentado tinha o ar paternal de sempre,
garantindo ao povo aterrorizado que "a situaçã o em breve estará sob controle. Mobilizamos
todososrecursos.Nesseı́nterim,peçoaoscidadã osdaComunidadeGlobalquenoscomuniquem
qualquer atividade suspeita, em especial a fabricaçã o ou transporte de agentes nocivos.
Lamentavelmente, temos motivos para acreditar que esse massacre de vidas inocentes está
sendoperpetradopordissidentesreligiososaquemtemostratadocomcortesia..Apesardenos
afrontarsemprequepodem,temosdefendidoseudireitodedivergirdenossasopiniõ es.Mesmo
assim, continuam considerando a Comunidade Global como um inimigo. Acham que tê m o
direitodemanterumgrupodegenteintolerante,dementalidadetacanha,queexcluiqualquer
pessoaquenãoconcordecomeles.
"Você s tê m o direito a uma vida saudá vel, pacı́ ica e livre. Embora eu continue a ser um
paci ista, apelo para que eliminemos do mundo essa gente, começando com a Dupla de
Jerusalé m que, mesmo neste momento, nã o manifesta nenhum remorso sobre a perda de um
sem-númerodevidasresultantedesteataque."
—Você ssabem—disseTsion,sentando-senobraçodosofá pertodeChloe-,quevouter
depedirperdãopelaalegriaquesentireiquandochegarotempodeterminadodestehomem.
Carpathiaapertouumbotã o,fazendoaparecernatelaas igurasdeElieMoisé sdiantedo
Muro das Lamentaçõ es. Eles falavam em unı́ssono em voz alta e ameaçadora, que ecoava
muitoalémdoMontedoTemplo,semajudadealto-falantes.
As palavras apareciam na tela. "Ai dos inimigos do Deus Altı́ssimo!", eles diziam. "Ai dos
covardesquelevantaramospunhosparaameaçarseuCriadoreagoraestã osendoobrigadosa
fugirdesuaira!Suplicamosavó s,serpentesevı́boras,queconsidereiseste lagelomaisqueum
julgamento!Sim,eleé maisumatentativadeumDeusamorosoquedesejaalcançartodosvó s,
e Ele já está perdendo a paciê ncia. Nã o há mais tempo para serdes persuadidos. Deveis ouvir
atentamenteoseuapelo,saberqueElevosama.Voltai-vosparaoDeusdevossospaisenquanto
étempo.Porqueviráodiaemquenãohaverámaistempo!"
Carpathia voltou a aparecer na tela com um sorriso condescendente. "Virá o dia, meus
amigos,emqueestesdoisnãomaisespalharãoseuveneno.Elesnãomaispoderãotransformara
á guaemsangue,nemimpedirquechova,nemenviarpragasparaaTerraSantaeparaoresto
do mundo. Eu mantenho minha palavra de barganha, negociada com eles meses atrá s,
permitindoquedeterminadosdissidentesnã osejampunidos.Estaé arecompensaquerecebo.E
assimqueelesretribuemnossagenerosidade.
"Mas a sé rie de atos de bondade pá ra por aqui, leais cidadã os. Sua paciê ncia e
perseverançaserã orecompensadas.Chegará odiaemqueviveremosemummundouni icado,
teremosumasó fé ,seremosumasó famı́lia.Viveremosempazeharmonia,semguerras,sem
derramamento de sangue, sem mortes. Por ora, peço que aceitem minhas mais sinceras
condolê ncias pela perda de seus entes queridos. Eles nã o morreram em vã o. Continuem a
confiarnosideaisdaComunidadeGlobal,nosprincípiosdapazenaforçadeumaféuniversalque
acolhedevotosdequalquerreligião,mesmodaquelasqueseopõemanós.
"Daqui a quatro meses, faremos uma comemoraçã o na mesma cidade em que esses
pregadoresestã onosadvertindo,zombandodenó s.Aplaudiremosamortedelesefestejaremos
um futuro sem pragas, sem enfermidades, sem sofrimentos e sem mortes. Mantenham a fé
enquanto aguardam a chegada desse dia. Até lá , voltarei a fazer outro pronunciamento.
Enquantoisso,agradeçooapoiosinceroquetodosossenhorestêmdadoàComunidadeGlobal".
Duas ambulâ ncias aguardavam na extremidade da pista principal de pouso de Cartum,
equipadas com aparelhos da mais alta tecnologia em medicina. Apertando a orelha esquerda
comoguardanapomolhado,MacajudouAbdullahaabriraportaedesceraescada.LeoneKarl
desceramatordoados,seguidosporumassessoreumfuncioná riodacozinha,deixandoabordo
duas pessoas agonizando. A equipe de emergê ncia, usando luvas e má scaras contra gá s, subiu
rapidamenteaescada,carregandomaletasdeprimeiros-socorros.MaceAbdullah icaramem
pé napista,recusandoseratendidospelosmé dicosantesdaquelesqueestavamemestadomais
grave. Os outros quatro foram medicados nas ambulâ ncias. Logo a seguir, os componentes da
equipe de emergê ncia desceram do aviã o e voltaram a subir levando maças. Saı́ram de lá
carregandoduasvítimascobertasdacabeçaaospéscomlençol.
Fortunato estava parado fora da ambulâ ncia, sem paletó , com a gravata afrouxada e a
camisaensopadadesuor.Elepassouamãonatesta,respirandocomdificuldade.
— Medida de prevençã o? — ele perguntou à equipe de emergê ncia enquanto as vı́t imas
eramtransportadas.
Elesbalançaramacabeçanegativamente.
—Elesnãoestão...?
—Sim,estã o—respondeuumdeles.—As ixiados.Leonvirou-separaMac.—Vá cuidar
deseuferimentoe
veri iqueminuciosamenteaaeronave.Nã opodemospermitirqueaconteçaoutroepisó dio
comoeste.
Mac tinha trê s ferimentos no couro cabeludo e um corte profundo no pescoço, que
precisou levar 20 pontos, alé m de outro corte mais grave na orelha, que precisou levar 40
pontos.
—Vaidoerumbocadodepoisquepassaroefeitodaanestesia—disseram-lhe.
Doisjovensestavammortos,quatro,emestadogravíssimo,eomundosetransformaraem
umcaos.Macachouquepoderiasuportarador.
Nasprimeirashorasdamadrugada,Rayfordsentou-senasaladevisitasdacasasecreta.Os
outrosmoradoresjá haviamserecolhidoaosseusquartos.SeguidodeLeah,eletinhaentradona
casa molhado, com frio e o corpo todo dolorido. Podia imaginar a dor que ela sentia depois de
ter-sechocadoviolentamentecomele.Apreocupaçã oeaatençã odemonstradaspelogrupo—
inclusiveduranteopronunciamentodeCarpathia—ocomoveram.Defato,eleseramirmã ose
irmã s em Cristo e precisavam uns dos outros para sobreviverem. Depois que todos ouviram o
relato de Rayford e Leah e oraram agradecendo a Deus o dinheiro recebido, Tsion falou um
pouco a respeito da mensagem que seria transmitida no dia seguinte. Ele estava intrigado,
querendosaberporqueoscrentespodiamveroscavaloseoscavaleiros,easvı́t imasnã o.Até
mesmo as imagens da TV mostraram cenas de pessoas tentando escapar das mordidas das
serpentes, envoltas em nuvens de fumaça e sendo consumidas, aparentemente por um fogo
espontâneoprovenientedoarrarefeito.
— Eu imaginei que haveria um exé rcito monstruoso de cavaleiros cavalgando juntos —
disse Tsion. — Talvez eles ainda apareçam desta maneira. Mas, até agora, eles estã o surgindo
em vá rias localidades. Nã o sei até quando isso vai continuar a acontecer. Francamente, estou
desapontadopornãotervistooscavaleiros.
Aospoucos,todosforamsedirigindoparaosquartos,restandoapenasRayfordeChloena
sala.
—Vocênãovaidormir,papai?—elaperguntou.
— Daqui a pouco. Preciso dar um tempo para me desligar. Nunca passei um dia como
este.Nuncavinadasemelhante.Enãofaçoquestãodevernovamente.
Chloepostou-seatrásdeleecomeçouamassagear-lheopescoçoeombros.
—Vocêprecisadescansar—eladisse.
—Eusei.Vouficarbem—disseRayford,dandoumtapinhanamãodafilha.—Vádormir.
Vocêtemumfilhoparacuidar.
Agora, sentado sozinho na escuridã o, Rayford relembrava os acontecimentos dos ú ltimos
dias, querendo saber quanto mais poderia suportar. Aquele era apenas o começo, e ele achava
quenã oagü entariaosofrimentodosanosseguintes.Perderiaoutroscompanheiros,eemritmo
acelerado.
Sua indignaçã o nã o diminuı́ra, mas ele havia conseguido escondê -la em um
compartimento reservado de seu cé rebro. Mesmo desejando ter o privilé gio de ser usado para
matar Carpathia, ele tinha de admitir que se sentia agradecido pelo que presenciara naquela
noite.Nã ohaviameiosdenegarapresençapoderosadeDeusduranteaqueleperı́odo.Mas icar
frenteafrentecomoscavaleirosdoApocalipse,caminharnomeiodelessemsermolestado...
Será queoscavaleirostambé mtinhamsidoimpedidosdeenxergaroscrentes?Damesma
forma que os gafanhotos demonı́acos, eles també m eram agentes de Sataná s, que talvez
preferissemataroscrentesenãoosinimigosdeDeus.
RayfordaindanãotinhaumaopiniãoformadaarespeitodeLeah.Elaeraumapessoadifícil
de conviver, mas parecia jovem e ingê nua para sua idade. Ambos haviam passado momentos
terrı́veisjuntos,e,mesmoassim,aimagemdehomemexigenteeteimosoqueLeahtinhadele
ainda nã o desaparecera. Rayford se comovera ao ouvir a histó ria da conversã o dela e nã o
duvidava de sua sinceridade. Seria uma atitude machista repelir a franqueza dela? Estaria ele
simplesmenterepresentandoopapeldeumhomemcorajoso?Eleesperavaquenão.
Rayford avaliou seus ferimentos. Ele precisava de uma ducha longa e quente. Um dos
dedos do pé latejava. Talvez estivesse quebrado. O joelho esquerdo doı́a como daquela vez em
que precisou fazer uma cirurgia na faculdade. O cotovelo esquerdo estava sensı́vel. Um dos
dedos da mã o tinha sofrido uma torçã o. Rayford sentiu um calombo na parte posterior da
cabeça. També m pudera! Ele já estava chegando aos 46 anos. Colidir violentamente com
alguémerolarpelochãofaziapartedeumdiatípicodeumgarotodenoveanos.
Rayford emocionou-se ao pensar em seu ilho. Raymie tinha 12 anos quando desapareceu
no Arrebatamento. Apesar de ter conseguido muitas vezes conter-se para nã o repreender o
ilho,Raymiesempreodeixavairritado.Rayfordsentia-seculpadopelotempoperdido,pornã o
ter-seesforçadoparacompreendero ilho.Aslembrançasdosmomentosemqueelespassaram
juntosderam-lheumnónagarganta.
Rayfordlevantou-sedosofá eajoelhou-se,agradecendoaDeusavidadeIreneeRaymie,
grato por eles terem sido poupados destes tormentos. Ele també m agradeceu a Deus ter
conhecido Amanda, com quem conviveu por pouco tempo, mas que, sem dú vida, foi uma
bê nçã o em sua vida. Chloe, Kenny, Buck, Tsion, Mac, David, Bruce, Ken... todos vieram-lhe à
mente,trazendoemoção,arrependimento,gratidão,preocupação,esperança.
Rayfordorouparaquepudesseserolı́derdoComandoTribulaçã oqueDeusdesejava.Ele
també mmantinhaaesperançadequeissoincluı́sse,deumaformaoudeoutra,apossibilidade
deaproximar-sedeNicolaeCarpathiatrê sanosemeioapó soinı́c iodaTribulaçã o,daliaquatro
meses.Carpathiaacabaradecomunicarondeestarianaquelemomento.
Mac icou agradecido por Abdullah ter supervisionado a desinfecçã o e a inspeçã o da
aeronave. Sua cabeça latejava. Ele tinha de prosseguir a viagem, mas deixaria o comando nas
mãosdeAbdullah.
Todos,inclusiveelepró prio,pareciamapreensivos,comosolhosabertosparaenfrentaro
perigo.Macestavaatentoaqualquermovimentoaseuredor,naexpectativadeveroscavalos
gigantescoseseuscavaleiros.Abdullahpareciainquieto.
Apesar do trauma sofrido, Fortunato demonstrava ansiedade para voar novamente. Karl
andava de um lado para o outro, à s vezes chorando, à s vezes alvoroçado, cuidando para que
tudo estivesse em ordem. Enquanto Mac e Abdullah faziam o trabalho de rotina antes de
levantar vô o, Fortunato foi conduzido ao deslumbrante terminal do Aeroporto de Cartum. Saiu
de lá trajando outras roupas, com ar de quem havia tomado uma ducha. Sua aparê ncia havia
melhoradosensivelmente.Poré m,seusemblanteaindademonstravapreocupaçã o.Eleparouna
porta da cabina de comando para saber se Mac e o aviã o estavam em condiçõ es de seguir
viagem.
— Ao primeiro sinal de algum odor estranho, arrumem um jeito de pousar este aviã o —
eledisse.
As 13 horas na Nova Babilô nia, David Hassid inalmente conseguiu fazer uma pausa para
descansar depois de trabalhar na emergê ncia. Ele ajudara a transportar os corpos para o
necroté rio e conduzir os feridos para os hospitais. Apesar de nã o ter visto o que provocara a
catá strofe, começou a juntar os fatos quando os noticiá rios informaram que as mortes haviam
sido provocadas por fogo, fumaça e enxofre. Perto de um dé cimo dos funcioná rios da CG havia
sidoatingido,oquerepresentavacentenasdepessoasmortas.Elesabiaqueseuscompanheiros
nos Estados Unidos, pelo menos Rayford e um novo membro do Comando Tribulaçã o, tinham
visto os cavaleiros. Sentiu-se melhor ao saber que nã o foi o ú nico crente que nã o viu os
cavaleiros.
David estava muito preocupado com Annie. Ele nã o a via desde o momento em que o
primeiro alarme soara, mandando que todo o pessoal assumisse funçõ es de emergê ncia
predeterminadas. Ele nã o tinha condiçõ es de conversar com Annie por telefone nem por
computador,eningué msabianotı́c iasdela.Otrabalhodelanaemergê nciaeradigitarumasé rie
de nú m eros criptografados em uma unidade de controle remoto, que controlava o sistema de
segurança do hangar. Assim que o serviço estivesse terminado, ela devia prestar contas ao
pessoal do departamento de David. O hangar estava em segurança, mas David precisava
verificartudopessoalmente.
A missã o dele foi terrı́vel. Das 140 pessoas sob sua supervisã o, dez estavam mortas, duas
sendo tratadas por terem inalado fumaça, e faltava uma: Annie. Trê s das que morreram
pareciamter-seincendiadoespontaneamente.Duranteotrabalhonaemergê ncia,Davidchegou
a uma conclusã o. Se Annie tivesse sobrevivido, ele tornaria pú blico o amor que um sentia pelo
outro.Tomariaainiciativadepediratransferê nciadela,deacordocomapolı́t icadaCG,para
queambosnãofossemrepreendidosquandoanotíciaseespalhasse.
Assim que arquivou seu relató rio, David passou por dezenas de funcioná rios que estavam
agrupados,chorando,conversando,lamentando-se.Aqueleeraomomentocertoparaorarcom
eles,falardeDeusaeles.MasDavidaindanã osesentiapreparadoparasacri icarsuapotencial
vantagememfavordacausa.
Em razã o da posiçã o que ocupava, David conseguiu a chave dos aposentos de Annie. Ela
nã o estava lá . Desesperado, ele correu até o enorme hangar e digitou os có digos necessá rios
paraabrirtodasastravasdesegurança.Asgigantescasportaslateraisforamabertas,deixando
todo imenso interior do hangar à mostra, que parecia maior ainda porque todas as aeronaves
principais estavam fora, a serviço. Os helicó pteros e algumas aeronaves de pequeno porte nã o
eramsuficientesparapreencheroimensohangar.
DavidabriuasportasdassalasdeAnnie,deMacedeAbdullaheacendeuasluzes.Nada.
Derepente,ouviuumabatidacadenciadaabafada.Vinhadodepó sitodemateriaislocalizadono
canto oposto do hangar. Ele reconheceu as batidas do có digo Morse. Era um pedido de SOS.
Davidcorreunaqueladireção.
O depó sito tinha paredes de aço à prova de som para reforçar a segurança. Annie
manipularapelaprimeiravezosistemadesegurançadohangar.Talvezelanã osoubessequeo
depó sitosetrancavaautomaticamenteporforaeeraoú ltimolugaremquealgué mgostariade
ficarenquantoestivessetrancandooedifíciointeiro.Depoisdeacionadasastravasdesegurança,
acomunicaçã odedentroparaforatornava-seimpossı́vel.Otelefoneeaté mesmoaunidadede
controleremotonã otinhamcondiçõ esdeultrapassaroaço.Apessoasó sairiadalicomaajuda
dealguémdefora.
Davidchegouàporta.
—Quemestáaí?—elegritou.
—David!—soouavoznervosadeAnnie.—Tire-medaqui!
— Graças a Deus! — ele disse, destrancando a porta. Ela saltou em seus braços,
segurando-ocomtantaforçaqueelemalpodiarespirar.
—Hojevocêaprendeumaisumaliçãosobreodepósito?-eleperguntou.
—Penseiqueficariaaquiparasempre!—eladisse.
—Veri iqueiosmateriaisecomeceiadigitaroscó digosenquantosaı́a,semsaberqueas
portassefechamporfora.Aindatenhodeprestarcontasaoseupessoal.
—Jáfoifeito.
—Ótimo.Obrigadapormecontarsóagorasobreodepósito.
—Peçoquemedesculpe.Sentiumgrandealívioquandoencontreivocê.
—Você sentiu alívio? Eu estava morrendo de medo! Imaginei que levaria dias para você
pensaremmeprocuraraqui.
David percebeu que Annie estava realmente zangada com ele. — Mac é quem tinha a
responsabilidadedelhecontarsobre...
Elaolhoudeesguelhaparaele.—Nã ojogueaculpanosoutros!Tratava-sedeumacoisa
importantequevocêdeveriater-meavisado.
Davidnãotinhacomosedefender.
—Qualfoiagrandeemergência?—elaperguntou.—Outroalarmefalso?
—Vocênãoestásabendo?
— Como eu poderia saber, David? Quando ouvi o alarme, vi pessoas correndo e tossindo.
Vimdiretoparacá.
—Acompanhe-me—eledisse.
AmbossesentaramnasaladeAnnie,eelelhecontouahistóriatoda.
—Eupoderiaterajudado—eladisse.—Agicomoumacovarde,graçasavocê.
— Quase morri de preocupaçã o por você — disse David. -Pensei que eu soubesse o que
vocêsignificaparamim.
—Vocêpensou?
—Euestavaenganado.Oquemaispossodizer?Euprecisodevocê .Euaamo.Queroque
todossaibam.
Ela balançou a cabeça negativamente e desviou o olhar. -Você me amava tanto a ponto
dedeixarqueeumetrancassenodepósito...
AgorafoiavezdeDavid icarzangado.—Você nã oleuomanualdeinstruçõ es,conforme
erasuaobrigação?Estátudobemclaro.
—Achoquevoureceberumaadvertência.
—Provavelmente.Vaiserdifícilesconderqueeufizoseutrabalho.
—Eraomínimoquevocêpoderiaterfeito—eladisse.DavidatribuiuagrosseriadeAnnie
àclaustrofobiaefrustraçãoqueelasentira.
—Euaamomesmoquandovocêestádemauhumor—eledisse.
—Éumagrandecortesiadesuaparte.
Ele encolheu os ombros e levantou as mã os em sinal de rendiçã o. — E melhor eu ir
embora.Enquantonã otornarmospú blicoonossoamor,nã odevemosservistosjuntos.Alé mdo
mais,souresponsávelporseuparadeiro.
—Nãoerabemissooqueeuqueriaouvir.Elesacudiuacabeçaelevantou-se.
—Alguémdeviater-mecontado—eladisse.
—Eujámeexpliquei—disseDavid,semolharparaela.
—Só estoudizendoqueeupodiameafastardestafunçã oepedirtransferê nciaparaoutro
departamento.Evocêsabeoqueissosignificaria.
Elevirou-se.—Euteriaadoradoouvirissodezminutosatrá s.Assimpoderı́amosdeclarar
nossoamor,eeupassariamaistempocomvocê.
Davidpercebeuqueaofendera.
—Eagora?—elaperguntou.
—Eujádissequeaamomesmoquandovocê...
—Vocêsabequaléopreço,David.Queroomesmoquevocê,masoqueseriamelhorpara
oComandoTribulação?
—EunãopossosermuitoútilaoComando,vivendofrustradosemvocê.
—QuemmaistemacessoàchefiadaCGtantoquantovocê?
—Eusei.Então,estamosapaixonadosnovamente?Annieaproximou-sedeDavid,eosdois
seabraçaram.
—Peçoquemedesculpe—eladisse.
—Eutambém.
CAPÍTULO10
O ú ltimo vô o de Mac a Joanesburgo tinha sido antes do grande terremoto da ira do
Cordeiro. Do alto, a cidade fazia lembrar a Nova Babilô nia. O aeroporto reconstruı́do era um
centro importante para viagens internacionais. No palá cio do potentado regional Rehoboth,
moravamsuasmulheres,filhosenetos,alémdoscriadoseassessores.
Macsentiaqueoladoesquerdodesuacabeçaestavaduasvezesmaiordoqueodireito.A
cadabatidadocoraçã o,umadoragudanosferimentosocastigava.Adi iculdadeeragrandeaté
mesmoparacolocarosfonesdeouvido,porqueelescomprimiamagazequeprotegiaospontos.
Assimqueoaviã opousasse,MaceAbdullahdeviamabriraportaedesceraescada.Eles
teriam liberdade para sair do aviã o, descansar em seus aposentos ou icar na cabina de
comando,desdequenã oatrapalhassemareuniã o.Karleseuajudantepermaneceriamabordo
paraservirarefeiçã o.MacdisseaLeonqueeleeAbdullahprovavelmente icariamdescansando
em seus aposentos, dentro do aviã o. E claro que eles permaneceriam na cabina, de onde Mac
ouviuaconversaentreFortunatoeumdeseusassessores.
— Clancy — disse Leon -, eu gostaria que você telefonasse para Ngumo na sala VIP do
aeroporto, que ica na extremidade do terminal. O nú m ero é este. Provavelmente ele nã o vai
atender,mas,porviadasdúvidas,ligueoviva-vozparaeupoderouvir.
Mac queria tomar nota do nú m ero do telefone, mas nã o podia correr o risco de ser
encontradocomele.Teriadememorizá-lo,oquenãoseriafácilporcausadadorquesentia.Ele
ouviu Clancy digitar lentamente cada nú m ero. A voz que atendeu era a de uma senhora de
meia-idade.
—AquifalaasecretáriadeMwangatiNgumo.Possoajudá-lo?
— Pode sim, senhora, obrigado. Sou Clancy Tiber, assistente pessoal do supremo
comandantedaComunidadeGlobal,LeonFortunato.Tenhoasatisfaçã odecomunicar-lhequeo
supremo comandante está pronto para receber o Sr. Ngumo e dois assessores a bordo do
ComunidadeGlobalUm.
— Obrigada, Sr. Tiber. Eles estarã o aı́ em cinco minutos. O Sr. Ngumo aguarda
ansiosamenteoencontroqueterácomopotentadoCarpathia.
Clancydesligouedisse:
—Adoreiestahistória.Vaicontinuarassimtãodivertida?
—Vocêaindanãoviunada,meufilho.
A limusine com a bandeira de Botsuana parou a uns 15 metros do aviã o. Mac icou
observando, sem muito interesse, a chegada dos trê s dignitá rios. Abdullah desatou o cinto de
segurançaeencostouonariznopára-brisa.
—VocêachaqueaquelealiéoNgumo,Mac?
—Oquê?
—NãoéoNgumo.
—Eunãochegueiaconhecê-lo.
—Nemeu,masestenã oé osujeitoquevinaTV,amenosqueeletenhaemagrecidomais
de20quilos.Edesdequandoumhomemtãoimportantecomoelecarregaumamaleta?
Mac retirou os fones de ouvido e inclinou-se para a frente, mas os homens já haviam
desaparecido de seu campo de visã o. Ele deu um pulo quando Fortunato esmurrou a porta da
cabinacomtantaforçaqueelaseescancarouindobaternaparede.
—Rápido!Rápido!—gritouFortunato.—Levantevôoimediatamente!
—Osmotoresestãodesligados,Leon.
—Então,ligue-os!Já!Aqueleshomensestãoarmados!
—Aportaestáaberta,Leon!Nãohámaistempo!
—Façaalgumacoisa!
— Engate trê s e quatro — disse Mac, e Abdullah apertou diversos botõ es. — Acelere o
maisquepuder!Já!
Os dois motores do lado direito do aviã o começaram a girar, fazendo um ruı́do
ensurdecedor.QuandoMacacionouoscontrolesfazendooaviã openderparaaesquerda,eleviu
ostrêssupostosassassinossendoatiradosnapistaporcausadojatoquentequefoiexpelido.
—Vocêéumgênio!—disseLeon.—Vamosdaroforadaqui!
Com muito esforço, os homens se levantaram, pegaram seus ri les poderosos e correram
emdireçãoàlimusine.Abdullahcorreuparalevantaraescadaefecharaportadoavião.
—Vamos!—gritouLeon.—Vamosembora!
—Estamoscompoucocombustível.Vamosterdevoltarparacáafimdeabastecer.
—Elesestãovindoemnossadireção!Vamosembora!
Mac iniciou a seqü ência de manobras, sabendo que o aviã o nã o estava preparado para
fazer uma nova decolagem tã o rá pida. Os motores do lado esquerdo foram ligados, mas, se os
outrosdispositivosnã oentrassememaçã oimediatamente,ocomputadordebordoabortariaa
decolagem.SeMacacionasseosistemadeprevençãocontrafalhas,correriaoriscodeprovocar
umacidente.
Ele virou a lateral traseira do jato na direçã o dos homens, mas eles contornaram
rapidamenteoavião,apontandosuasarmas.
—Nã odê atençã oaeles!—gritouLeon.—Vamosembora!Oshomenssaı́ramdocampo
de visã o de Mac e abriram fogo. Os pneus estouraram, produzindo um ruı́do quase tã o forte
quantoodostiros.OCondorestavaavariado.Commaisdametadedospneusemfrangalhos,a
imensaaeronavebalançavadeumladoparaooutrosobreapista.Macnã otinhacondiçõ esde
rodar,emuitomenosdeganharvelocidadeparalevantarvôo.
Por mais estranho que pudesse parecer, nã o havia nenhum outro aviã o à vista. Toda
aquelaconfusã o,quedeveriatersidopresenciadapelopessoalresponsá velpelotrá fegoaé reoe
de terra, nã o havia atraı́do a atençã o da equipe de emergê ncia. Mac se deu conta de que nã o
haveria saı́da. Morreria ali mesmo. Ele e Abdullah estavam nas mã os daquele bando de
assassinos. Quem quer que fossem, evidentemente contavam com a cooperaçã o do regime de
Rehoboth.
Os projé teis atravessaram a fuselagem. Mac e Abdullah saltaram das poltronas e
acompanharamodesvairadoLeon,passandopelacozinhaepelasaladedescanso,indopararna
cabinadepassageiros.
—Vãoparaomeiodaaeronaveedeitem-senochão!-gritouMac.
Aparentemente, os assassinos haviam decidido nã o deixar nenhum sobrevivente. Os
projé teisatravessavamasjanelaseaestruturadoaviã o.Macpercebeuquehaviaapenascinco
homensdeitadosnochã o.Abdullah,Leon,Clancy,oajudantedeKarleeleestavamcomocorpo
encurvadosobosbancos,protegendoacabeçacomasmãos.
—OndeestáKarl?—gritouMac.Ninguémsemexeu.
Mac ouviu o som de passos. Ao levantar um pouco a cabeça, ele viu o cozinheiro
cambaleandopelocorredor,encharcadodesangue.
—Karl!Abaixe-se!
Ocozinheirocaiunochã ocomosolhosarregalados.Umburaconatestaevidenciavaque
elehaviasofridoumferimentomortal.
—Vocêtemumaarma?—gritouLeon.
—Seupatrãoproibiuousodearmas,Leon!—disseMac.
—Mas,comcerteza,você à svezesdesacataasordensdele!Sevocê conseguiruma,nã o
serápunido!Nãotemossaída,Mac!
Havia duas pistolas no compartimento de cargas.Sim, pensou Mac,às vezes eu desacato
as ordens dele. Mas como ir buscá -las, e o que ele poderia fazer diante de armamento tã o
pesado?
—Façaalgumacoisa!—implorouLeon.—Vocêtemumtelefone?
Mac desatou o celular do cinto e atirou-o na direçã o de Leon. O supremo comandante
começouadigitarfreneticamenteumcódigoespecial,estremecendoacadarajadadebalasque
atravessavaoavião.
—MegalertaCG,aquié LF999,linhasigilosa!InformeSuaExcelê nciaqueoCG Um está
sendo metralhado no Aeroporto Internacional de Joanesburgo. Ponha-me imediatamente em
contatodiretocomopotentadoRehoboth!
Mac ouviu o telefone da sala de descanso tocando. Será que ele deveria atrever-se a ir
atendê -lo?Sefosseumdosatiradoresfazendoexigê ncias,talvezvalesseapena.Arrastando-see
passandoporcimadocorpodeKarl,conseguiuchegarà saladedescanso.Aoagarrarofone,a
basedoaparelhocaiunochão.
—Fale!—eleberrou.
Eraavozdamulherqueeleouvirapelaescutaclandestina.Elaestavahistérica.
—OSr.Ngumonadatemavercomesteataque!Elefoipegodesurpresapelos...oh,nã o!
Oh...—UmarajadadetirosensurdecedoraobrigouMacaafastarofonedoouvido.Quandoele
voltou a ouvir, a mulher estava gritando. — Eles o mataram! Nã o! Por favor! — Mais tiros, e
Macouviuosomdotelefonedelacairnochão.
Elearrastou-sedequatroatéacabinadecomandoegritoupelorádio:
— Socorro! Pista de Joanesburgo!CGUm sendo metralhado! Mac ouviu Leon falando aos
gritospelotelefone:
— Foi você , Bindura? Por quê ? Carpathia nã o está aqui neste aviã o! Estou-lhe dizendo a
verdade!Mandeseupessoalparardeatirar!Porfavor!
Se Rehoboth estivesse por trá s daquele atentado, todos eles morreriam. O homem devia
terpensadoemtudo.Macgritoupelorádio:
—Socorro!Joanesburgo!Crentesabordo!
Se, por acaso, houvesse um piloto cristã o naquela á rea, talvez ele ou ela pudesse fazer
algumacoisa.
Mac foi atingido no rosto pelos estilhaços de uma bomba, e um cheiro de fumaça tomou
contadoavião.
—Fogo!—gritaramLeoneClancy.
Abdullahcorreuparaapartedafrentedoaviãoegritou:
— Pode ser que eles nos acertem, Mac, mas precisamos saltar daqui! O aviã o está em
chamas!
MaceAbdullahabriramaportadacabinadepassageirosevitandoseralvodosatiradores.
Leon arrastou Clancy, cujas pernas estavam rı́gidas de medo. Ele chorava sem conseguir
equilibrar-se. Assim que Abdullah abaixou a escada, Leon colocou o corpo trê mulo de Clancy
diantedesi,comoescudo.OcorpodeClancyfoidilaceradopelasbalas,eLeon icouparalisado
no topo da escada. Ele só se deu conta do perigo a que estava exposto quando uma bomba
explodiu na sala de descanso. Mac e Abdullah deram um salto e o agarraram, rolando com ele
pelosdegraus,enquantoestrondoscontinuavamvindodointeriordoavião.
Mac achou que nã o conseguiria chegar vivo à pista. Ele perdera toda a esperança e só
saltaradoaviã oparafugirdaschamas.AsrajadasdebalaaoredordeleedoCondorzuniamde
maneira ensurdecedora. Ele apertou os olhos com tanta força que parecia que suas bochechas
tocavam a testa. Com uma das mã os agarrada ao pulso de Abdullah e um joelho apoiado nas
costas carnudas de Fortunato, Mac teve a certeza de que, quando abrisse os olhos, estaria no
céu.
Masnãofoiissooqueaconteceu...
Leon caiu de quatro na pista, apoiado nas mã os e nos joelhos. Abdullah foi atirado ao ar,
passandoporcimadele.MacdesabousobreascostasdeLeon,forçando-oaesticar-sedebruços
no asfalto. Um projé til atravessou o ombro direito de Mac e outro atingiu sua mã o direita. As
rajadas de bala de uma arma a uns cinco metros de distâ ncia dele passavam zunindo por sua
orelhaesquerda.
—Oh!Deus!—gritouLeon,comocorposobodeMac.-Oh,Deus,ajuda-me!
Mac achou que sua cabeça seria o pró ximo alvo e que seu sofrimento seria
misericordiosamenteterminado.
Escuridão.
Silêncio.
Nada.
Apenasumcheiroegostoruimnabocaemuitador.
Macnã oviunadaporter icadodeolhosfechados.Oú nicosomqueeleescutavaagoraera
odarespiraçãoofegantedeLeon.
O cheiro que sentia era de pó lvora e de material metá lico; o gosto, de sangue, e a dor,
profunda, lancinante. O buraco aberto pelo tiro no ombro doı́a muito mais que o ferimento na
cabeça. Sua mã o estava pior ainda. Ele nã o queria abrir os olhos. Nada do que visse naqueles
ferimentososurpreenderia.Suamãodeviaestardespedaçada.
Leon tentou levantar-se para respirar melhor, mas nã o conseguiu por causa do peso do
corpo de Mac sobre ele. Mac rolou pelo pavimento caindo à esquerda de Leon. Seus olhos
continuavam fechados, sua mente girava. Será que tudo havia terminado ou ele veria os
assassinosempéaseuladoquandoabrisseosolhos?Fortunatoteriasidoatingido?EAbdullah?
Decepcionado por nã o estar no cé u, Mac forçou-se a abrir um olho. A fumaça era tã o
densa e escura que ele nã o conseguia enxergar um palmo adiante do nariz. Levou a mã o
machucadaparapertodorostoparapoderenxergaroqueaconteceraesentiuumadorterrı́vel
no ombro. Sua mã o tremia tanto que chegava a balançar o corpo todo, e espirrava sangue em
seurosto.
Mac segurou a mã o machucada com a outra para fazê -la parar de tremer e viu que nã o
perdera nenhum dedo, mas eles apontavam para direçõ es diferentes. Uma bala havia
atravessado a palma da mã o. Seu corpo inteiro tremia, e ele receava entrar em estado de
choque.
Quando a fumaça começou a se dissipar, ele conseguiu sentar. Leon ofegava a seu lado,
com os olhos abertos, dentes à mostra. Um pouco mais adiante, estava o corpo sem vida de
ClancyTiber.
—Abdullah?—Macchamoucomvozfraca.
—Estouaqui—respondeuAbdullah.—Fuiatingidoporumabalanacoxa.Evocê?
—Pelomenosduasmeatingiram.Oqueaconteceucom...
—Vocêviuoscavalos?
—Eumalestouconseguindovervocê.
—Esperoqueelesfiquemmaisumpoucoparaquevocêpossavê-los.
—Eutambém...
Na manhã de sá bado, Rayford despertou na casa secreta pouco depois das nove. Ele
poderiaterdormidomaisalgumashoras,depoisdetudooqueacontecerananoiteanterior,mas
seu sono havia sido interrompido por um ruı́do estranho. Continuou deitado, com os olhos
abertos,naesperançadequeseucorpotivessetidotempoderecuperarasforçasedequesuas
dorestivessempassado.
Umsomritmado,comosealgué mestivesseesfregandoasmã osintermitentemente,ofez
sentar-se na cama. Depois de ouvir com mais atençã o, ele imaginou que poderia ser algué m
fungandoouchorandobaixinho.0somvinhadoquartoaolado,ondeTsiondormiaetrabalhava.
Odescansohaviasidobomparaamenteeespı́ritodeRayford,mastambé mservirapara
enrijecersuasjuntasemú sculosdoloridos.Elegemeualto,vestiuoroupã oeespiounoquartode
Tsionpelafrestadaporta.
A princı́pio, Rayford nã o enxergou Tsion. A cadeira diante da tela do computador estava
vazia. A cama també m. O som, poré m, vinha daquele quarto. Rayford deu uma batida de leve
na porta e empurrou-a um pouco mais. Tsion estava estendido no chã o, debaixo da janela que
icava perto da cama, cobrindo o rosto com as mã os. Seus ombros arfavam enquanto ele
choravaamargamente.
—Vocêestábem?—perguntouRayfordemvozbaixa,masTsionnãorespondeu.
Rayfordaproximou-sedeleesentou-senacamaparaqueTsionvissequeeleestavaali.O
rabino orava em voz alta:Senhor, se for Hattie, tem piedade de sua alma. Se for Chaim, quero
muitolevá-loàtuapresença.Seforalguémdestacasa,protegeessapessoa,defende-a,dá-lheos
instrumentosdequeelanecessita.Pai,seforumdosirmãosouirmãsrecém-convertidos,alguém
queeuaindanãoconheço,peço-tequeoprotejasetenhasmisericórdiadele. Agora, ele chorava
maisaindaegemia.Deus,ensina-mecomodevoorar.
RayfordpousouamãonoombrodeTsion,eelevirou-se.
—Rayford,oSenhorincutiurepentinamenteemmeucoraçã oumdesejoprofundodeorar
por algué m que corre perigo. Eu estava escrevendo a minha mensagem, que també m está
pesando sobre mim. Provavelmente é a mais difı́c il que já precisei escrever. Pensei que, como
lı́der, minha missã o fosse orar por meus leitores, mas o que senti parecia ser mais especı́ ico,
maisurgente.OreiparaqueoSenhormedissessequemprecisavadeoraçã o,mas,derepente,
fuidominadoporumdesejodeorarimediatamente.Quandomeajoelhei,parecequeoEspı́rito
deDeusmepuxouparaochã oeminhaalmasentiuumdesejoardentedeorarporalgué mque
estivessenecessitandodeminhaoraçã o.Euaindanã oseiquemé ,mas,mesmoassim,nã oposso
afastarasensaçãodequenãosetratavaapenasdeimaginação.Vocêorariacomigo?
Rayford ajoelhou-se desajeitadamente, com o corpo todo dolorido por causa da noite
anterior,semteridé iadoqueacrescentarà oraçã odeTsion. Senhor,eleorou,concordocomas
palavrasquemeuirmãodirigiuati.Nós,seres initos,nãosabemosnosexpressarnempedircoisa
algumaquevenhaaexercerin luênciasobreaquiloquetu,queésumDeusin inito,desejasfazer,
mas con iamos em ti. Tu nos disseste que devemos orar, que devemos nos aproximar de ti sem
temor.Sealguémqueconhecemoseamamosestiveremperigo,oramosparaquetuprotejasessa
pessoacomoteuadmirávelpoder.
RayfordficoucomovidocomaemoçãodeTsionenãoconseguiuprosseguir.
—Muitoobrigado—disseTsion,apertando-lheamã o.Elesselevantaram.Tsionsentousediantedeseucomputadoreenxugouosolhos.
—Eunã oseidoquesetratava—eledisse-,maspareidequestionardequeformaDeus
secomunicaconosco.
Depoisdeserecompor,TsionpediuaRayfordquelesseasuamensagemdodia.
—Voumelhorá-laantesdeenviá-laestatarde,masapreciariaouvirseuscomentários.
— Eu adoraria ler a sua mensagem — disse Rayford -, mas nã o sei o que eu poderia
acrescentaraela.
Tsion levantou-se e ofereceu sua cadeira a Rayford. — Vou procurar alguma coisa para
beber.Voltoemseguidaparaomeuposto.
Mac sabia que, se permanecesse na pista cheia de fumaça do aeroporto de Joanesburgo,
morreria. Os ferimentos na orelha e no couro cabeludo sangravam por baixo dos curativos, e o
efeito do anesté sico já havia passado. Seu ombro parecia ter sido esmagado por um martelo
incandescente.Suamã ojamaisseriaigualaoqueera.Omelhorqueelepodiaesperarerasalvar
osdedos,quecertamentejamaisvoltariamamovimentar-secomoantes.
Depoisqueafumaçasedissipoucomoventoquentedatarde,MacavistouAbdullahauns
cinco metros de distâ ncia, à sua esquerda. O jordaniano estava ajoelhado, com o turbante
desenrolado e uma expressã o de medo e fadiga no rosto. Em sua coxa direita havia um corte
profundoquesangrava.Eleapontouparaumpontodistanteedisse:
—Elesaindaestãoaqui.
Mac havia tido apenas um vislumbre da cavalaria fantasmagó rica de homens e animais
assustadoresnomomentoemqueAbdullahtentoudesviardelesnoar.Agora,haviaumalegiã o
reunida a uns 30 metros alé m da pista, soltando fumaça, fogo e enxofre pela boca e açoitando
comsuascaudas—verdadeirasserpentes—asvítimasquenãopodiamvê-los.
Por onde passavam, os cavalos-leõ es deixavam corpos estendidos no chã o. Algumas
vı́t imas apresentavam sintomas de convulsã o antes de caı́rem estateladas no chã o. Outras se
debatiamemchamasaté queamortelhestrouxessealı́vio.Ouassimelaspensavam,disseMac
consigo mesmo. Um dos falsos dignitá rios fugiu correndo pela pista. Outros dois estavam
estiradosmortos,pertodoavião.Dali,elespoderiamtermatadoMac,secontinuassemaatirar.
Apesardadistâ nciaemqueseencontrava,Macpodiaverqueoscavaloseseuscavaleiros
eramfigurasmedonhas.
Apesar de lutuarem alguns centı́m etros acima do chã o, eles galopavam, trotavam,
marchavam e empinavam o corpo como se fossem cavalos comuns. Seus cavaleiros os
instigavam,espalhandopânicoentreaspessoasedestruindoedifícioseveículos.
Leon Fortunato, que parecia completamente atordoado, rolara na direçã o de Mac,
agarrando-lheorostocomambasasmãos.Macquasegritoudedor.
—Vocêsalvouminhavida,Mac!—gritouLeon.
—Protegeu-mecomseucorpo!Vocêfoiatingido?
—Duasvezes—disseMac,afastandoasmã osdeLeoneapontandoparaoscavalos.—O
queosenhorestávendonaqueladireção?
—Corposamontoados—disseLeon,comosolhossemicerrados.—Fogo,fumaça.Eum
cheiromedonho,igualaoquesentinoavião.Argh!
—Precisamosnosafastardoavião—disseMac.Aschamassaíampelasjanelas.
—OlindoCondor...—disseLeon.—OorgulhoeaalegriadeSuaExcelência.
—OsenhorgostariadearrastarocorpodeClancyparatirá -lodocaminho?—perguntou
Mac.
Leonlevantou-secommuitoesforço,cambaleando,tentandoequilibrar-se.
—Nã o—eledisse,agoracomvozmaisforte.—Deveestarfaltandosepulturasnomundo
inteiro.Teríamosdecremá-lo.Vamosdeixarqueocorpodelesequeimeaqui.
Leonvirou-selentamente.
—Penseiquetivéssemosmorrido—eledisse.—Oqueaconteceu?
—Osenhororou.
—Comoassim?
—OsenhorpediuaDeusqueoajudasse—disseMac.
—Eumeconsideroumhomemreligioso.
—Tenhocertezaquesim.Deusdeveterrespondido.
—Porqueoshomenspararamdeatirar?
Macestremeceu,desejandoqueelestivessemparadodeatirarmuitoantes.
—Comopodemossaber?Umdelescorreu.Osoutrosdoisestãoimóveisatéagora.
LeoneMacseguraramAbdullah,umdecadalado,ecaminharamlentamenteemdireçã o
aoterminal.
ParaRayford,foiumprivilégioteraoportunidadedelerumamensagemantesdosmilhões
deleitoresdomundointeiro.Tsionhaviaescritooseguinte:
MeusqueridosirmãoseirmãsemCristo:
Dirijo-me a você s hoje com o coraçã o pesaroso, o que nã o é nenhuma novidade durante
esteperı́ododaHistó riaqueestamosatravessando.Emboraos144.000evangelistasescolhidos
por Deus estejam vendo milhõ es de pessoas aceitando a Cristo, a religiã o mundial uni icada
continuaatornar-secadavezmaispoderosae—porquenãodizer-maisabominável.Preguem
aseguintemensagemnoaltodasmontanhasenosvales,meusqueridos:Há umsó Deuseumsó
MediadorentreDeuseohomem,oHomemCristoJesus.
Os implacá veis gafanhotos demonı́acos profetizados em Apocalipse 9 desapareceram há
maisdeumanoemeio,depoisdeteremtorturadomilhõ esdepessoas.Poré m,muitasdelasque
forampicadasduranteoú ltimomê sdesse lagelosó chegaramao imdesuaagoniatrê smeses
atrás.
Embora grande nú m ero de pessoas tenha-se convertido depois daquele terrı́vel
julgamento, a maioria tornou-se ainda mais arredia. O lı́der da Fé Mundial Enigma Babilô nia
deve ter visto os devotos de sua religiã o sofrendo no mundo inteiro. Mas nó s, os crentes em
Cristo,os"dissidentes"—osinimigosdatolerânciaedainclusão-fomospoupados.
Nossos amados pregadores em Jerusalé m, apesar da ferrenha oposiçã o e da perseguiçã o
que enfrentam, continuam a profetizar e ganhar almas para Cristo naquela ex-cidade santa,
agora compará vel ao Egito e a Sodoma. Em razã o disto, temos motivos para ser agradecidos
nestestemposdeafliçãocrescente.
Você s já estã o sabendo que o sexto Julgamento das Trombetas, o segundo ai (Apocalipse
9), começou. Aparentemente, eu tinha razã o quando achei que os 200 milhõ es de cavaleiros
eram seres espirituais e nã o materiais, mas estava errado ao considerar que eles seriam
invisı́veis.Pessoasqueconheçoeemquemcon ioviramessesseresmatarempormeiodefogo,
fumaça e enxofre, conforme as profecias bı́blicas. Mesmo assim, os incré dulos nos acusam de
estarmentindo,vendocoisasqueelesnãoconseguemver.
Eimportantequevocê ssaibamqueoatual lagelosedesencadeouquandoforamsoltosos
quatroanjosqueseencontravamamarradosjuntoaoRioEufrates.Sabemosqueelessã oanjos
caı́dos,porquenã ohá outrotrechonaBı́bliaquemencionequeosanjosbonsforamamarrados.
Aparentemente,osquatroforamamarradosporqueestavamansiososparaprovocardestruiçã o
sobreaTerra.Agoraqueforamsoltos,elesestã olivresparafazeroquedesejam.Naverdade,a
Bíblianosdizqueelesestavampreparadosparaatacaremhora,dia,mêseanoespecíficos.
E signi icativo saber que os quatro anjos, provavelmente amarrados durante sé culos,
estavamjuntoaoRioEufrates.EoriodemaiordestaquenaBı́blia.BanhavaoJardimdoEden.
Era um marco de delimitaçã o para Israel, Egito e Pé rsia, muitas vezes citado na Bı́blia como
sı́m bolodosinimigosdeIsrael.Pertodesserio,oprimeirohomempecou,oprimeiroassassinato
foicometido,aprimeiraguerraeclodiu,foiconstruídaaprimeiratorreparadesafiaraDeus,efoi
edi icada Babilô nia. Foi na Babilô nia que se originou a idolatria, que se espalhou pelo mundo
inteiro.Os ilhosdeIsraelforamexiladoslá comoescravos,eé lá queopecado inaldohomem
culminará.
Apocalipse 18 prediz que Babilô nia será o centro do comé rcio, da religiã o e do governo
mundial,masqueelacairáemruínas,porqueforteéoSenhorDeusqueajulgará.
ABı́bliamencionaqueo lageloatualresultará noextermı́niodaterçapartedapopulaçã o
que restou apó s o Arrebatamento. Um simples cá lculo matemá tico nos leva a um resultado
terrı́vel.Aquartapartedapopulaçã oquerestouapó soArrebatamentojá morreuemrazã ode
pragas, guerra e acidentes naturais. Sobraram, evidentemente, 75%. A terça parte de 75% é
25%,portantoamortandadeatualdeixaráapenas50%daspessoasquenãoforamarrebatadas.
Devoesclarecerqueoquevoudizeraseguirnã opassadeespeculaçã o.Depoisdeestudar
os idiomas originais e os inú m eros comentá rios sobre esta profecia, cheguei à seguinte
conclusã o: Deus continua tentando persuadir a humanidade a chegar-se a Ele, sim, mas esta
destruiçã odemaisumaterçapartedosincré dulosremanescentespodeteroutropropó sito.Em
suapreparaçã oparaabatalha inalentreobemeomal,é prová velqueDeusestejadesistindo
devezdaquelesincorrigı́veis,pertencentesà sforçasdomal,equeEle,emsuaonisciê ncia,sabe
quejamaisseconverterão.
ABı́bliapredizqueosincré dulossobreviventesserecusarã oaabandonaramaldade.Eles
insistirã o em continuar a adorar ı́dolos e demô nios e a participar de assassinatos, feitiçarias,
imoralidades sexuais e roubos. Até mesmo os noticiá rios de emissoras de propriedade da
Comunidade Global mencionam que o nú m ero de assassinatos e roubos está em ascensã o. A
novasociedade,toleranteemexcesso,aplaudeaadoraçã oaı́dolosedemô nios,bruxariaesexo
ilícito.
Lamentavelmente,esteú ltimojulgamentoantesdasegundametadedaTribulaçã odurará
mais quatro meses até que o acordo entre a Comunidade Global e a naçã o de Israel complete
trêsanosemeio,oquecoincidirácomofimdoministériodasduastestemunhas.Aseguir,viráo
períodoemqueoscrentesserãomartirizadosemnúmeromuitomaiordoqueaquelesqueestão
morrendoagora.
Muitos de você s tê m escrito perguntando-me por que um Deus de amor e misericó rdia
impõ e esses terrı́veis julgamentos sobre a Terra. Deus é mais do que um Deus de amor e
misericó rdia.ABı́bliadizqueDeusé amor,sim,mastambé mdizqueEleé santo,santo,santo.
DizaindaqueEleé justoequemanifestouseuamoroferecendoseuFilhoparaanossaredençã o.
Mas,serejeitarmosessadádiva,seremossubmetidosaojulgamentodeDeus.
Seiquecentenasdemilharesdeleitoresdeminhasmensagensdiáriasvisitamestesitenão
comocrentes,masembuscadaverdade.Portanto,peçopermissã oparamedirigiravocê ,que
nã oseconsiderameuirmã oouirmã emCristo.Façoumapelo,comonunca izantes,paraque
você receba Jesus Cristo como o dom de Deus para a salvaçã o. Os pecados dos quais os
incré dulos obstinados nã o se arrependerã o (ver acima) se alastrarã o de maneira incontrolá vel
duranteaúltimametadedaTribulação,àqualaBíbliadáonomedeGrandeTribulação.
Imaginem como será este mundo depois que metade de sua populaçã o desaparecer. Se
você s acham que a situaçã o atual é triste por termos perdido milhõ es de pessoas, inclusive as
crianças, no Arrebatamento — o que gerou sé rios problemas nos serviços pú blicos -, tentem
visualizar a vida depois que metade dos pro issionais civis for morta. Bombeiros, policiais,
operá rios,executivos,professores,mé dicos,enfermeiros,cientistas...alistaé enorme.Estamos
caminhandoparaumperíodonoqualnosocuparemosotempotodolutandoparasobreviver.
Eu nã o gostaria de estar aqui na Terra sem saber que Deus está comigo. Quero estar do
lado do bem e nã o do mal, sabendo que, no inal, seremos vencedores. Orem neste momento.
Digam a Deus que reconhecem seus pecados e que necessitam de perdã o e de um Salvador.
AceitemaCristohojeepassemafazerpartedagrandefamíliadeDeus.
Cordialmente,TsionBen-Judá
CAPÍTULO11
Mac e Leon ajudaram Abdullah a caminhar até o caó t ico terminal do Aeroporto de
Joanesburgo.
— Rehoboth estava por trá s deste atentado — disse Leon. — Ele pró prio me contou.
Imaginou que Sua Excelê ncia estivesse a bordo. Precisamos buscar ajuda e readquirir a
autoridadeaquisemcolocarnossasvidasemrisco.
— Nã o é um pouco tarde para isso? — perguntou Mac. — O senhor nã o poderia ter dito
antesaelequeCarpathianãoestavanoavião?
—TínhamosmotivosparadeixarqueoSr.NgumoacreditassequeSuaExcelênciaestavaa
bordo. E assim que você deve referir-se a ele, capitã o. O potentado regional Rehoboth foi
convidado,masnãosabíamosqueeleeraumsubversivo.
— Acho que o senhor vai encontrar Ngumo e sua secretá ria mortos — disse Mac,
contandoaLeonsobreotelefonemaqueeleatendeu.
—ÉmelhorencontrarmosRehobothmorto—disse
Abdullah.—Elenãopermitiriaquesaíssemosvivosdaqui.Leonparou,comorostopálido.
— Quando conversei com Rehoboth, imaginei que ele estivesse no palá cio. Ele nã o viria
paracá,viria?
— Precisamos nos apressar — disse Mac, prestes a desmaiar. — Se Rehoboth quiser nos
matar,bastadarumaordemaumdestesguardas.
Os guardas, poré m, estavam tã o assustados quanto qualquer outra pessoa, falando com
di iculdade,tossindo,cuidandodoscompanheirosferidos.Ouviam-segritosportodooterminal,
ondehaviacorposestendidosnochã o,malasespalhadasportodososlados.Osbalcõ esestavam
vazios,eosterminais,apagados.
Assimqueelesentraramnoterminal,MacouviuozumbidodeumjatoSuperJ.Omodelo
aprimorado de um caça daGulfstream era preto, reluzente e tinha uma aerodinâ mica incrı́vel
—comgrandeautonomiadevô oeamploespaçointerno.Foiaprimeiraaeronavequepousou
emJoanesburgodepoisdoCondor.Acimadeseuprefixo,haviaodesenhodabandeiraaustraliana
eolemaTrabalhoHonesto.Assimqueoaviã opousounapista,desceramopilotoeumamulher.
Ambosdirigiram-seapressadosparaoterminal.
—Ei!—gritouohomememtomagudo,fazendocomquemuitaspessoassevirassem.—
Alguémpediusocorrocomcrentesabordo!
Eleeraalto,loiroesardento.Falavacomumsotaqueaustralianotã oacentuadoqueMac
imaginou que pudesse ser um truque. A mulher era quase tã o alta quanto ele. Tinha cabelos
escuros,espessos.
MaceAbdullahentreolharam-se,eFortunatovoltou-selentamente.
—Fuieu—disseMac,aoverosselosnatestadeambos.
O australiano també m viu o dele. — Eu estava desesperado. Pensei que meu pedido
pudessepersuadiralguémadesceraqui.Valeu?
—Claroquesim,cara—disseopiloto,olhando irmeparaatestadeAbdullah.—Somos
crentes e nã o nos envergonhamos disso, mesmo que você tenha usado um artifı́c io para nos
enganar. Pode me chamar de Dart. O primeiro nome nã o é importante. Esta é Olivia, minha
esposa.
—Liv—eladisse.—Evocêsestãoprecisandodecuidadosmédicos.
—Quemévocê?—perguntouDart,dirigindo-seaFortunato.
—SouoSupremoComandanteLeonFor...
—Foioqueimaginei—disseDart.—Aindaé cedoparaseupatrã omorrer,portantonã o
vouperguntarseeleestavaabordodaquelaboladefogoali.
—Felizmentenão—disseFortunato.
—Entãooqueaconteceu?Oscavaleirospegaramvocês?
—Oh,vocêéumdeles?—perguntouFortunato.—Vocêtambémconseguiuvê-los?
—Claroquesim.
—Dart—disseLivcarinhosamente-,precisamosajudá-los.
—Sim,achoqueé melhor—eledisse.—Maseunã omeimportodedizerquemesinto
como se estivesse ajudando o inimigo. Por mim, eu deixaria que você s morressem, mas Deus
aindavaialcançarvocês.LeiamoLivro.Nósvencemos.
Fortunatovirou-separaele.
—Vocêpoderiaserpresopordirigir-sedesrespeitosamentea...
—Apropó sito,Sr.F,seiquevocê nã ovaiseimportarqueeuochamedeSr.F,porqueé
assimquevouchamá-lo.Qualéoseuproblema?Vocêpareceestarandandobem.
—AleiexigequevocêmechamedeSupre...
—Euvoulhedizerumacoisa,Sr.F.Eunã oestoumaisdebaixodesuasleis.Eurespondoa
Deus.Você nã opodemefazernadasemapermissã odele,porissoaproveiteaoportunidadeque
está tendo. Este homem aqui transmitiu um pedido de socorro ingindo que havia crentes em
perigo.Minhaesposaeeu icamosintrigados,querendosaberporquehaviacrentesabordodo
aviãodepropriedadedoanticristo...
—Anticristo?!ComovocêpodechamarSuaExcelência,opotentadoNic...
— Você ainda nã o entendeu, F? Acho que ele é o anticristo, e você sabe o que isso
representaparavocê.
—Nãoestudoessasbobagens,masaconselhovocêa...
— Eu nã o preciso de seu conselho, cara, mas posso conseguir atendimento mé dico para
você s. Parece que seu maior problema nã o passa de alguns rasgos na calça e uns poucos
arranhõesnasmãos.Esteshomensaquiéqueestãonecessitandodeatendimentomédico.
—Francamente,eu...
—Háumpostomédiconaquelaalaaliatrás,e,comseuprestígio,vocêdeveriadarordens
paraquealguémretirasseosferidosdomeiodasoutrasvítimas.
Umavozsoou,vindadosistemadeavisoaopúblico.
"Atençã o! Atençã o, por favor! Supremo comandante da Comunidade Global, Leon
Fortunato,dirija-se,porfavor,aosescritóriosdasForçasPacificadorasdaCGnaAlaB."
Depoisqueocomunicadofoirepetido,Dartdisse:
— A Ala B ica à direita, logo depois da enfermaria, Sr. F. Se o senhor quiser ir, vá . Nó s
podemoslevarseuscompanheirosatéopostomédico.
—Eudeviamandarprendê-lo,seu...
—Seestaforsuaprioridadenestemomento,vá emfrente.Mas,seeufossevocê ,correria
para um lugar seguro e deixaria que eu cuidasse destes dois. Haverá muito tempo para você
mandaralguématrásdenós.
Osanguesubiuà cabeçadeFortunatoque,vermelho,pareciaprestesaexplodirderaiva.
Elevirou-separaMacedisse:
—NãohádúvidadequeSuaExcelênciaconseguiuatendimentoparanós.
— O senhor deve ir na frente, Supremo Comandante — disse Mac. — Descubra o que
houvecomRehoboth,verifiquecomCarp...,comopotentado.
—Eunãoconfionessehomem.
—Ora,vamos,Sr.F—disseDart.—Soutã oinofensivoquantoumapomba.Pormaisque
eutenhavontadedematardoisfuncioná riosseus,prometonã ofazernadadisso.Voulevá -losa
umlugarondepossamseratendidoseseguireimeucaminho.
DartafastouFortunatodeAbdullahcomcuidadoepassouacabeçaporbaixodobraçodo
jordaniano.LivsegurouMacpelocintocomumadasmãoseseucotoveloesquerdocomaoutra,
deixandoFortunatolivreparasairdali.
—Você —disseFortunato,enquantoseafastavacomrelutâ ncia—é umavergonhapara
aComunidadeGlobal.
—Issoparanóséumahonra,nãoémesmo,Liv?
—Ora,Dart—eladisse.
—Obrigadopornãonosdenunciar—disseMacdepoisqueLeonseafastou.
—Santosin iltrados!—disseDart,agoracomsotaquedosuldosEstadosUnidos,parecido
comodeMac.—Eumalpudeacreditar!Quaseestragueitudo.Quandovioselonasuatestae
na de seu companheiro, pensei que o outro homem també m fosse dos nossos. Mas assim que
fixeioolharnele,percebiquemeraetivedefingir.
—Vocêfoibrilhante!—disseMacapresentando-see,emseguida,apresentandoAbdullah.
—VocêgostoudosnomesDarteOlivia?—perguntouDart.
—Quasecoloqueitudoaperder—disseLiv.
—Vocêfoiperfeita,querida—disseDart.—OapelidoLivfoigenial.
ElesseapresentaramcomoDwayneeTrudyTuttle,deOklahoma.
— Eu troco a bandeira e o lema naquele aviã o quase todos os dias. Somos alemã es,
noruegueses, britâ nicos, qualquer coisa. Fazemos parte da Cooperativa Internacional de
Mercadorias.Jáouviufalar?
—Sualínguacompridaaindavaiacabarconosco—disseTrudy.
— Nunca pensei que teria a chance de dizer na cara do Falso Profeta o que eu pensava
dele.
—OFalsoProfeta?—disseMac.—Leon?
—EledizqueCarpathiaoressuscitou,nã oé mesmo?Eleadoraosujeito,chama-odeSua
Excelê ncia.Espereparaverseelenã ovaiviraroFalsoProfeta.Masqualé ahistó riadevocê s?
VocêsseinfiltraramnaCGouencontraramJesusdepoisqueestavamtrabalhandolá?
Buck olhou-se no espelho. Mesmo depois de um ano, as cicatrizes em seu rosto ainda
estavam vermelhas e vivas. O cirurgiã o que ele encontrou em uma clı́nica improvisada em
Jerusalé m talvez tivesse sido melhor do que ele esperava, mas modi icou sua isionomia. Chloe
apareceudetrásdeleepôsKennyemseusbraços.
—Paredepensarnisto—eladisse.
—Pensarnoquê?
— Nã o se faça de bobo. Você está achando que pode tirar vantagem de sua nova
aparência.
—Claro!—disseBuck.
Eleseperguntouseestanã oseriaamaneiraqueChloeusavaparaprendê -loemcasa:pô r
Kennyemseusbraços.Elesjá haviampassadoporsituaçõ essemelhantes.Chloeseconformara
comaidé iadequesuasviagensextravagantesaoredordomundohaviamterminado.Pormais
quegostassedeaventuras,elanã oqueriaexporumbebê aoperigo.Suafunçã onaCooperativa
deMercadoriaseradesumaimportâ ncianã oapenasparaoComandoTribulaçã o,mastambé m
paraosmilhõesdenovoscrentesqueembrevenãoteriamcondiçõesdecomprarouvender.
Chloe dissera a Buck que gostaria que ele se contentasse em trabalhar nos bastidores,
contra-atacandoosartigosdoSemanárioComunidadeGlobalcomsuarevistavirtual,A Verdade.
Poré m, em razã o da nova tecnologia proporcionada por David Hassid, Buck poderia fazer seu
trabalho em qualquer lugar do mundo sem ser rastreado. A ampliaçã o do porã o estava quase
terminada,eBucksentiaquesuapresençaeranecessáriaemmuitosoutroslugares.
O casal já havia discutido a responsabilidade que ele tinha em relaçã o ao bebê .
Evidentemente,Kennyseriaeducadodemaneiradiferentedanormal,porque,quandochegasse
à faseadulta,Cristojá teriaestabelecidoseureinoaquinaTerra.Mesmoassim,eraimportante
queacriançacontassecomapresençadopaiedamã eamaiorpartedotempopossı́vel.Buck
haviaargumentadoquecadaausê nciasuadeduasoutrê ssemanasseriacontrabalançadapelas
24horasqueelepassariaemcasaquandonãoestivesseviajando.
—Trata-sedeumacompensação—eledissera.—Eupassariaomesmonúmerodehoras
comKennyseestivessetrabalhandoforadiariamente.
Bucklevouobebêatéacozinha,eChloeoseguiu.
—Você está novamentecomaquelebrilhonosolhos—eladisse.—Daquiaalgunsdias,
ninguémvaiconseguirsegurá-loaqui.Paraondevocêvai?
—Vocêmeconhecemuitobem—eledisse.—AverdadeéqueTsionquerqueumdenós
retorne a Israel para ver como Chaim está . Tsion está animado com ose-mails que eles tê m
trocado,masachaquealgué mprecisaconversarpessoalmentecomChaimantesqueeletome
umadecisão.
Chloeacenouafirmativamentecomacabeça.
— Eu gostaria de discordar, mas nã o posso. Papai nã o pode arriscar-se a fazer essa
viagem. Ele pô s na cabeça que precisa descobrir o paradeiro de Hattie antes que ela revele
nosso esconderijo ou seja assassinada por algué m. Tsion nã o pode sair daqui de jeito nenhum.
Nã o sei o que seria do mundo sem suas mensagens. Sei que Deus tem o controle de todas as
coisas e acho que Ele poderia escolher outra pessoa para substituı́- lo, como fez no caso de
Bruce,mas...
— Eu sei. Precisamos contratar seguranças armados para impedir que ele seja visto por
alguém.
—Quandovocêvaipartir,Buck?
Chloetinhaumjeitotodoespecialdeprovocarumarespostadireta.
— Tsion quer conversar com você sobre isto — disse Buck. Ela sorriu. — Você parece
umacriança,querendoqueumamigoconvençaseuspaisalhedarpermissã oparafazeralguma
coisa.Tsiondeveacharqueeunãorecusariaumpedidodele.
—Evocêrecusaria?
Eladeuumlongosuspiro.
— Nã o consigo recusar nenhum pedido seu. Mas se, por acaso, você morrer, vou odiá -lo
pelorestodavida.
—PenseiemfazerumavisitaaZekedepoisdeescurecer.Chloeestendeuosbraçospara
pegarKenny.
— Eu estava pensando nisso. Precisamos fazer algumas compras para o bebê . Vou
preparar uma lista també m de outras coisas que estã o em falta. Fale com Leah. Ela disse que
estamosnecessitandodealgunsmantimentos.
Naquelanoite,Buckparouemumpostodegasolinasemidestruı́do,localizadoondeumdia
havia sido o centro da cidade de Des Plaines. Nesse posto, os crentes abasteciam seus carros e
compravammantimentoseoutrosgê nerosdeprimeiranecessidade.Zekeadministravaolocal
com a ajuda de Zeke Jr. — conhecido como Z -, um rapaz de cerca de 25 anos, cabelos
compridos e vá rias tatuagens no corpo. Antes, ele ganhava a vida fazendo tatuagens,
desenhando iguras na lataria dos carros e na carroceria de caminhõ es, e pintando caras de
monstrosemcamisetas.Chegouapintarumapaisagemnalateraldeumcaminhã ode18rodas!
Aquelaprofissão,éclaro,deixaradeexistirhaviamuitotempo.
Zeke perdera a esposa e duas ilhas adolescentes em um incê ndio resultante dos
desaparecimentos. Zeke e seu ilho foram levados a Cristo por intermé dio de um motorista de
caminhã o. Eles freqü entavam agora uma igreja que se reunia secretamente em Arlington
Heights, tomando extremo cuidado para nã o divulgar sua fé aos incré dulos e, assim, poder
fornecer mercadorias e serviços aos irmã os crentes. Z havia sido um jovem drogado, cujo
trabalhoesporá dicodefazertatuagensedesenharserviaapenaspara inanciarseuvı́c io.Agora,
eleeraumartistaemotivoedefalamansa,quefalsi icavacarteirasdeidentidadeparacristã os
dalocalidade,afimdequepudessemsobreviver.
ZekeestavaenchendootanquedoRoverdeBuckeobservandoatentamentesehaviapor
alialgumapessoaestranhaouclientesemoselodeDeusnatesta.
—Precisocompraralgumascoisas—disseBuck.—EtambémutilizarosserviçosdeZ.
—Tudobem—disseZeke.—Eleestá alivendoTVefazendoosestudospedidosporBenJudá.Deixesualistacomigo.Eulevoseucarroatéagaragemecolocotudolá.
QuandoBuckdesceuparaentrarnoescritóriodoposto,umcarroparouatrásdodele.
—Dáparaencherotanque?—gritouohomem.—Ouocombustívelestáracionadohoje?
— Vou ver o que posso fazer — disse Zeke. — Estou terminando um serviço e já vou
atenderosenhor.
Buck compreendia muito bem a tensã o diá ria de viver uma mentira somente para
manter-se vivo. Ele entrou no escritó rio, que, aos olhos de uma pessoa qualquer, parecia um
tı́pico posto de gasolina ensebado, com calendá rios pendurados na parede, pô steres de carros,
uma lista telefô nica manchada de ó leo e sujeira por toda parte. Poré m, o quadro de força que
havia no minú sculo banheiro era, na verdade, uma saı́da secreta, onde estava escrito: Perigo.
AltaVoltagem.NãoToque.Sealguémduvidasseeencostasseodedo,receberiaumlevechoque.
O perigo, no entanto, acabava ali. Se a pessoa soubesse o local certo para empurrar, o
quadroseabriaparaumaescadademadeiraqueconduziaaoabrigodeZeke,escavadodebaixo
doposto.Napartedosfundosdoabrigo,ZekepegariatodasasmercadoriasdalistadeBuckeas
transportaria por uma escada estreita até a garagem. Dali, as mercadorias seriam transferidas
para o Rover. Em uma sala ú m ida e desprovida de janelas, onde havia uma enorme abertura
paraventilaçã o,estavaocorpulento Z, usando botas pretas estilocowboy,jeans preto e colete
preto, deixando à mostra os braços e o peito. Conforme Zeke dissera, Z estava assistindo ao
noticiá rio enquanto rabiscava alguma coisa em um caderno espiral cheio de "orelhas", com o
laptopabertodiantedesi.
—Ei,Buck—disseZ,sementusiasmo.Eleafastousuascoisaselevantou-selentamente.
—Eaí?Estáprecisandodemim?
—Precisodeumanovaidentidade.
Zabaixou-seatrá sdeumsofá verde,velhoeembolorado,eabriucomforçaaportadeum
arquivobarulhentodeduasgavetas,queestavamforadealinhamento.Elepercorreuaspastas
comosdedoseretiroudez.Aoverqueaportanã ofechavadireito,Zdeuumpontapé nela.Os
papéisficarampresosnagavetaemperrada,eZsorriutimidamenteparaBuck.
—Escolhaaidentidadequequiser—eledisse,espalhandoaspastasnosofá.
Bucksentou-seeexaminoupastaporpastasobumalâ mpada.OsistemadearquivodeZ
talvez fosse desorganizado, mas ele sabia tudo o que havia lá . Cada pasta continha estatı́sticas
importantessobrehomensbrancos,maisoumenosdoporteeidadedeBuck.
—Aquantidadeestáaumentando—disseBuck.
ZassentiucomacabeçaevoltouafixarosolhosnaTV.—Estescavalosfumacentosestão
deixandocorposportodocanto.Vocêviuopovosaqueando?
—Aindanão.Deveserterrível.
— E mesmo. Mas é fá cil. Tudo o que eu preciso fazer é pegar a carteira de documentos
antesqueaCGsemandelevandoocorpo.Tenhofotografiaspratodososgostos.
— Escolhi este cara aqui — disse Buck, colocando uma pasta aberta em cima da pilha e
mostrando-aaZ.
Zatirouasoutraspastasparatrá sdosofá ,examinouaqueestavadiantedeleepreparou
suacâmaradefotosinstantâneas.Bucksentou-sediantedeumfundoazuleposoudefrenteede
perfil.
— Pensei em você quando vi este cara — disse Z. — Carteira de motorista, passaporte,
certidãodecidadania,maisalgumacoisa?
—Sim,mefaçaumaidentidadedemembrodaFé MundialEnigmaBabilô nia.Equeseja
doadordeórgãos.Porquenão?
—Semproblema.Vocêtempressa?
—Podeserdaquiadoisdias?
—Tudobem.
QuandoBuckavistouZekeesaiupelagaragem,elesabiaqueZjá estavatrabalhandosob
uma luz forte no outro cô m odo. Da pró xima vez que aparecesse em pú blico, Buck estaria
portando velhos documentos de identidade que pareciam autê nticos, com sua foto no lugar da
dofalecidoGregNorth.
Macnuncareceberaumatendimentomé dicotã oe iciente.EmboraJoanesburgoestivesse
aparentemente destroçada, com milhares de cidadã os mortos ou agonizando, o prestı́gio de
Fortunatoabriatodasasportas.AsForçasPaci icadorasRegionaisdaCGinvadirametomaram
conta do palá cio de Rehoboth a mando de Carpathia. Rehoboth foi encontrado morto em seu
escritórioaoladodemaisdeumadúziadefuncionários.
Mac e Abdullah foram examinados e cuidados na enfermaria do aeroporto e depois
transportadosparaopalácio,ondeseriamoperados.Leonlhesdisse:
— Você s també m vã o ouvir falar que a famı́lia de Rehoboth foi morta pela praga da
fumaçaefogo,masocheirodotiroteiodaCGaindapermanecenoar.
EnquantoMaceAbdullaheramconduzidosaopalá cioemcadeirasderodas,oscorposdas
váriasfamíliasdeRehobothestavamsendotransportadosparafora.
—Osnoticiá riosvã odizerqueatentativadeassassinatoengendradaporRehobothfalhou
— disse Leon -, mas nó s vamos a irmar que a famı́lia dele morreu em conseqü ência da praga.
Nossosinimigosconhecerãoaverdade.
—ENgumo?—perguntouMac.
—Ora,está morto,claro.Esuasecretá riatambé m,conformevocê mecontou.Rehoboth
idealizou e pô s seu plano em prá tica diretamente de seu palá cio. Com Ngumo eliminado e os
assassinos/impostoresdeRehobothcolocadosemseusdevidoslugares,Rehobothestavapronto
paraassumirolugardeSuaExcelênciatãologoelefosseassassinado.
Macpassouporumacirurgiaquedurouhoras,feitaporummé dicoespecialistaemmã os.
Seu ombro foi reconstituı́do, e os mé dicos també m prenderam o couro cabeludo no lugar e
cuidaramdosferimentosnaorelha.Depoisdevá riashorassobefeitodeanestesia,eledespertou,
deitado do lado esquerdo, de frente para o leito de Abdullah. O co-piloto estava com a perna
enfaixada e elevada. Abdullah apontou para uma vasilha de vidro na mesinha de cabeceira de
Mac,ondehaviaumabalaestilhaçadaretiradadeseuombro.
—Causouumestragoenorme—disseAbdullah.—Masnãochegouaameaçarsuavida.
O ombro de Mac, muito bem enfaixado, ainda estava anestesiado. Sua mã o direita,
enfaixadacomumagazegrossa,pareciaumrevólverapontandoparaalgumlugar.
UmmédicodaCG,nascidonaíndia,entrounasaladerecuperação.
—Disseramquevocê estavaacordado—elefalou.—Ascirurgiasnostrê slugaresforam
umsucesso.Osferimentosemsuacabeçaforamcuidadosporú ltimo,masvã osararprimeiro.O
ombro vai icar com uma cicatriz grande. Sobraram alguns fragmentos da bala que ainda
precisam ser retirados, mas nã o houve danos na estrutura do ombro. Alguns nervos icarã o
insensı́veis, e sua mobilidade talvez ique um pouco restrita. Sua mã o foi salva, e os dedos
també m. Mas você sentirá dores durante vá rias semanas, e talvez sejam necessá rias algumas
sessõ es de isioterapia para reaprender a usar a mã o. Os dedos anular e mé dio perderam os
movimentos. Nó s os curvamos e eles vã o icar nessa posiçã o de initivamente. O dedo mı́nimo
nã o terá nenhuma serventia. E prová vel que você só possa usar o indicador, mas ainda é cedo
parafazeralgumapromessa.Opolegarnãopoderáserdobrado.
— Se eu puder segurar os controles só com um dedo, apertar botõ es e mudar as chaves,
vouvoarnovamente—disseMac.
— Concordo — disse o mé dico. — Você teve muita sorte. Fortunato chegou para visitá los.
—Você sdoisvã o icarsatisfeitosemsaberquereceberã oamaisaltacondecoraçã ocomo
heró isconcedidapelaComunidadeGlobal—eledisse.—OCı́rculoDourado,prê miopeloqualo
potentadotemmuitoapreço,será concedidoavocê sporSuaExcelê nciacomoagradecimento
porteremsalvoaminhavida.MaceAbdullahnãodisseramnada.
— Bem, sei que você s estã o satisfeitos e que, por modé stia, nã o se sentem dignos dessa
condecoraçã o. Agora descansem. Você s icarã o aqui para se recuperarem o tempo que for
necessá rio. Depois serã o transportados para a Nova Babilô nia pelo seu ex-co-piloto no novo
GlobalUm.
— Quanto tempo levará para que ele ique pronto? -perguntou Mac, sabendo que
Fortunatonãotinhaidéiadotemponecessárioparaconstruirumavião.
— Ele será pintado amanhã — respondeu Fortunato. -Peter Segundo concordou em
oferecê -lo a Sua Excelê ncia. Os assuntos de interesse do governo nã o serã o interrompidos por
esteepisódiolamentável.OnovopotentadoregionaldosEstadosUnidosdaÁfrica—umhomem
lealescolhidoadedoporSuaExcelência—seráempossadodentrodeumasemana.
___________
Buckseguiudevoltaparacasacomocarrolotadodemantimentos,otanqueabastecido
de combustı́vel e preocupado com Mac e Abdullah. O rá dio nã o parava de dar notı́c ias sobre a
rebeliãoemortedeBinduraRehoboth.AlistadaCGmencionavaamortedeumcozinheiroede
dois ajudantes, mas os relatos sobre a destruiçã o doComunidade Global Um deixaram Buck
apreensivo. Ele ligou para casa e icou satisfeito quando Rayford lhe contou que havia sido
informadoporDavidqueseuscompanheirossofreramgravesferimentos,masestavamvivos.
Umasemanadepois,DavideAnnieestavamnoDepartamentodePessoalquefuncionava
nopaláciodaComunidadeGlobal.OdiretortinhaemmãosomemorandodeDavid.
— Pelo que estou entendendo, Sr. Hassid, o ponto principal é que a Srta. Christopher
transgrediuumadasregrasdaCGeosenhorassumearesponsabilidade,éisso?
Davidassentiucomacabeça.
—Eudeviatermencionadoaelaalgunsprocedimentosbásicos.
— Talvez sim. Talvez nã o. Por que o chefe do departamento precisa assumir a
responsabilidadeseosubordinadorecebeuummanualdeprocedimentos?
Davidsemexeunacadeira.
—Annie...istoé ,aSrta.Christopherteveaatençã odesviadaporqueumdeseuscolegas
detrabalhoseapaixonouporela.
Odiretorolhouparaeleporcimadosóculos.
— E verdade — ele disse, mais a irmando que perguntando. — Mas isso nã o é desculpa
para o descumprimento de uma regra. Você está interessada em levar adiante esse
relacionamento,Srta.Christopher?
—Muito.
—Eessecolegatrabalhaemseudepartamento?
—Osenhorestáolhandoparaele—disseDavid.
— Brilhante. Bem, vejamos... Na icha da Srta. Christopher, constam alguns atos de
desobediê ncia insigni icantes, insubordinaçã o e coisas do gê nero. Mas nã o vou rebaixá -la de
cargo por causa desse tipo de transgressã o, desde que ela concorde em ser transferida para
outrosetorondepossasermaisútil.
Anniehesitou.
—Paraondeeuiria?
—Paraosetoradministrativo.Perdemosmaisdeumadúziadeanalistasnestacatástrofe.
Seuperfilmostraquevocêfariaumexcelentetrabalhoali.
—Quaisseriamminhasresponsabilidades?
Odiretorvirouumapáginaeleurapidamente:
— Organograma do setor administrativo: Potentado, Supremo Comandante, Diretor do
Serviço de Inteligê ncia, Diretor do Departamento de Aná lise, Funcioná rio. Principais deveres e
responsabilidades:examinareinterpretardadosprovenientesdefontescontráriasàComunidade
Global,blá,blá,blá.AnalistadoServiçodeInteligência,aceitaounão?
—Aceito.
—Etomecuidadoparanãosetrancaremsuasala.
Assim que eles saı́ram do Departamento de Pessoal, David segurou a mã o de Annie. A
liberdade que ele sentia era enorme! Em seguida, ele avistou Leon Fortunato caminhando em
direçãoaoelevador.PeterSegundoseguiaatrásdelefalandoemvozalta.
— Eu nã o quero ter uma reuniã o pessoal comvocê, Leon. Fortunato apertou o botã o e
virou-separaele.
—Paravocê,eusouSupremoComandante,Peter.
—Entãofaça-meofavordeusaromeu...
—Sósevocêmechamarpelomeutítulo—disseLeon.
—Estábem,Comandante!MasnãovoupermitirqueCarpathiaseapropriedemeu...
—SuaExcel...
—Está bem!Maseleprecisamedarumaexplicaçã oantesdeseapropriardemeuaviã o
e...
Quandoelesestavamentrandonoelevador,Leondisse:
—SevocêpensaqueopotentadodaComunidadeGlobalvailhedarexplicações...
—Queroouvirestaconversa—disseDavid.—Depoiseuligoparavocê,Annie.
—Tomecuidado—eladisse.
David dirigiu-se apressado para seus aposentos, trancou a porta, ligou seu computador e
acionou o sistema de escuta clandestina instalado no escritó rio de Fortunato. Peter Segundo
estavanomeiodafrase:
—...enãovoumesentar,porquenãoécomvocêqueeuquerofalar.
—Éomáximoquevocêvaiconseguir.
— Por que Sua Excelê ncia se esquiva de falar comigo, Comandante? Você proclamou ao
mundo inteiro que ofereci meu aviã o, o que eu gostaria muito de ter feito. Mas nã o fui
consultado,nãotiveaoportunidadede...
—Tudooquevocê temveiodasmã osdopotentado.Você achaqueaFé MundialEnigma
Babilô nia é independente da Comunidade Global? Acha que deve satisfaçõ es a algué m que nã o
sejaSuaExcelência?
—Euexijovê-lonesteinstante!
— Você exige? Você está me fazendo uma exigê ncia? Sou um cã o de guarda, Sumo
Pontífice.Seuacessoestávetado,nãopodeterumaaudiênciacomSuaExcelência.Entendeu?
—Eujuro,Leon,quevocêvaisearrependerdeter-meinsultadodestamaneira.
—Eujálhedisseparanãomechamarde...
—Vouchamarvocê dojeitoqueeuquiser.Você temestaautoridadearti icialnã oporter
feitoalgumatolouvá vel,masporquedominaaartedebajularopatrã o.Eunã obajuloningué m,
equeroqueelemeouça.
Houveumlongosilêncio.
— Talvez você consiga — disse Leon. — Mas nã o hoje. David ouviu sons de passos e a
portasendobatidacomforça.Emseguida,avozdeLeon.
—Margaret?
—Sim,senhor—foiarespostapelointerfone.
— Veja se o potentado tem um minuto para conversar comigo. Você pode dizer a ele o
nomedapessoaquesaiuintempestivamentedaqui.
—Poisnão,senhor.
Davidacionouosistemadeescutaclandestinainstaladonoescritó riodeCarpathiaeouviu
aconversa.SuasecretáriatransmitiuorecadodeFortunato.
—Oqueeledeseja?—perguntouCarpathia.
—Asecretáriadeledissequeeleacabadeterumareuniãocomosumopontífice.
—Digaaelequepodevir.
CAPÍTULO12
Mac teve condiçõ es de levantar-se e caminhar muito antes de Abdullah e estava ansioso
pararetornaraNovaBabilô nia.Pormaisesforçoquetivessefeito,a isioterapianã oservirapara
aliviar suas dores. Ele deveria sentir-se satisfeito por estar sendo mimado no palá cio de
Joanesburgo,masseusferimentosnã olhedavamtré gua.Entreumanalgé sicoeoutro,seucorpo
pareciaestaremchamas.Asdosesministradasserviamapenasparaaliviarumpoucoador.Ele
nãoqueria,dejeitonenhum,ficardependentededrogas.
Mac icou aborrecido consigo mesmo por causa de duas gafes que ele cometera. Avisara
pelo ar que havia crentes a bordo doGlobal Um. Felizmente, Dwayne Tuttle, de codinome
"Dart", havia conseguido consertar a situaçã o. Mas, no aviã o, Mac havia passado seu celular a
Leon,aúltimapessoanomundoquepoderiaficarcomseutelefonesigiloso.
Ele era quase duas vezes mais pesado do que um celular comum por incluir muitos
dispositivos de avançada tecnologia de segurança. Aparentemente, Leon nã o dera atençã o a
esse fato, mas, e se algué m ligasse para Mac enquanto o celular estivesse nas mã os daquele
homem?Seessapessoanã oreconhecesseavozdeLeonouseaconexã onã oestivesseperfeita,
elapoderiacomprometeroComandoTribulaçãointeiro.
O que mais preocupava Mac era que nenhuma das duas gafes havia sido provocada por
pâ nico ou desespero, e sim por falta de fé . Ele acreditou sinceramente que ningué m do aviã o
sobreviveriaaoatentado,masquediferençaissofazia?
Felizmente,elehaviasidoprudenteaoescolherseunovoco-piloto.Abdullaholivraradas
preocupaçõ esarespeitodotelefone.Naprimeiranoitequepassounasaladerecuperaçã o,Mac
despertouassustadoeacordouAbdullah.
— Leon está com o meu telefone — ele disse. — Se um dos nossos ligar para mim,
estamosperdidos.
—Durmaempaz,meuamigo—disseAbdullah.—Esteseucompanheiroé umbatedor
decarteiras.
—Comoassim?
—EnquantovocêeLeonestavammeajudandoaentrarnoterminal,enfieiamãonobolso
deleepegueiseutelefone.
—Otelefoneépesado.Comoelenãopercebeu?
—Eleestavaassustadodemais.Aproveiteiaoportunidade.Otelefoneestácomigo.
—Quehorassão?
Abdullahconsultouseurelógio.
—Duashorasdamadrugada.
—QuehorassãonosEstadosUnidos?
—NaNovaBabilô nia,adiferençaé denovehorasamais.Aquiadiferençadeveserdeoito
horas.
—Dê-meotelefone.
MacligouparaRayfordelhecontousobreosTuttles,quepartiramlogoapósteremlevado
MaceAbdullahatéaenfermaria.
— Eu nã o tive a chance de falar a eles sobre a nossa ligaçã o com a cooperativa — disse
Mac-,mas,comcerteza,suafilhajáouviufalardeles.
RayforddescobriuqueChloeconheciaasatividadesdosTuttles.
— Eles estã o cuidando de uma á rea enorme nos Mares do Sul para nó s — ela disse. —
TalveztenhasidoummilagreelesestaremtãopertoparaouviropedidodesocorrodeMac.
—FoiDeusquemosenviou—disseRayford.—Sevocê puderabrirmã odotrabalhodos
dois,eugostariaqueelesmelevassemàEuropa.
—Porquevocênãoquerviajarpilotandooavião,papai?
—Eunã oquerovoarsozinhoedepoisterdemevirarparapassarincó gnito.Querodividir
ocomandodoaviãocomDwayne.PodemosvoarcomoSuperJdeleoucomoGulfstream.
—Vocêjásabeparaondevai?
—BeauregardHansonvaimedaradicadapró ximavezqueapareceremPalwaukee.T
vaiusarumpretextoparasegurá -lolá ,eeu vou ter de esfregar algum dinheiro no nariz de Bo
paraelecomeçarafalar.Maseleaindanãosabedenada...
Sentado diante de seu computador e com o fone de ouvido ligado, David escutava,
petri icado, a conversa entre Carpathia e Fortunato. — Leon, você nã o precisa sentir-se
obrigado a fazer mesuras todas as vezes que estiver diante de mim. Em pú blico, tudo bem,
mas...
—Peçomilperdões,Excelência,mas...
—E,quandoestamosasó s,você també mtemaliberdadededirigir-seamimdemaneira
informal.Temosumrelacionamentodelongadatae...
— Oh, mas eu nã o poderia. Nã o agora. Nã o depois de tudo o que presenciei e senti. O
senhor deve entender, potentado, que eu nã o faço estas coisas a nã o ser por sincera devoçã o.
Apesar de me sentir extremamente honrado pelo senhor me considerar um amigo a ponto de
mechamarpelonome,perdoe-memasnãopossofazeromesmo.
— Está bem, Leon. Agora me fale sobre seu encontro com o homem que seria nomeado
rei.
David ouviu Fortunato relatar os fatos. Apó s ter icado alguns momentos em silê ncio,
Carpathiadisse:
—OPeternã osabedenada,certo?Elenã ofazidé iadequeeusabiadesuaaliançacom
Rehoboth.Eleacreditaquepodeseparar-medemeuspotentadosregionaisemevencer.
—Tenhocertezadequeelepensadestamaneira,Excelência.
—Queidiota!—disseCarpathia.
—Devemospermitirqueelenosfaçacairnasmã osdemaisumoudoissubversivosoua
horadelejáchegou?
Davidouviuummovimento,comoseCarpathiativesseselevantado.Suavozestavamais
longe,eDavidimaginouqueeleestivesseandandodeumladoparaooutro.
— Meses atrá s, eu quase perdi a paciê ncia com você por ele nã o ter sido eliminado —
disse Carpathia. — Mas, no inal das contas, foi melhor assim. Alé m de ter-nos levado até
Rehoboth, ele emitiu um recente comunicado que foi muito esclarecedor e talvez possa ter
relaçãocomaquelesnossosdoisamigos.
—ADupladeJerusalém?
—Exatamente.Vocêgostoudonome,não?
—Foigenial,senhor.Sóque...
—Eupediaelequeordenasseaseusteó logosquevasculhassemtodosaquelesmisteriosos
manuscritos do passado, desde Nostradamus até os escritos sagrados antigos, para saber se
existealgumamençã oarespeitodavulnerabilidadedaquelesdois.SeiqueosseguidoresdeBenJudá acreditam que eles sã o as duas testemunhas profetizadas nas Escrituras cristã s. Se, por
acaso,elesforem,Mathewsmedissequeficarãovulneráveisdaquiaquatromeses.Elespróprios
jádisseramváriasvezesqueestãoprotegidosdoperigoatéotempodeterminado.
— Mas, senhor — choramingou Fortunato -, as mesmas pessoas que dizem que esses
homenssãoasduastestemunhasdizemtambémqueosenhoréoanticristo.
—Eusei,Leon.Nósdoissabemosqueeuestousimplesmentecumprindominhamissão.
— Mas se existe um tempo determinado para eles, deve també m existir para o inimigo
deles!
—Leon!Pareepense.Euajocomoumanticristo?
—Claroquenão,Excelência!
—Então,quemvocêachaqueeusou?
— O senhor sabe muito bem que acredito, no fundo do coraçã o, que o senhor deve ser o
próprioCristo.
— Eu nã o faria tal a irmaçã o, meu iel amigo. Pelo menos por enquanto. Só quando icar
evidenciadoaomundoquetenhopoderesdivinoséquepodereifazeressaafirmação.
—Jádivulgueiamplamenteahistóriadequeosenhormeressuscitou...
— Fiquei agradecido e tenho certeza de que muitas pessoas acreditaram. Mas sua
ressurreiçã o nã o foi testemunhada por ningué m, portanto a dú vida persiste. Nã o fui capaz de
conterosdoispregadores,eissoafetouminhacredibilidade.Porém,euadoroumadivindadeque
será o deus acima de todos os deuses, que se sentará acima dos cé us, que se transformará em
umserperfeitoeeterno.Comopossofalhar,seestoucomprometidocomele?
—Damesmaformaqueeuestoucomprometidocomosenhor,Excelência.
Pelo som, David imaginou que Carpathia havia voltado a sentar-se a sua mesa, onde a
fidelidadedomicrofoneeramelhor.
— Vamos dar um tempo a Peter — ele disse. — Você nã o acha que a maioria dos
potentadosjáestáperdendoapaciênciacomele?
— Sim, acho, senhor. Embora o potentado Rehoboth tenha me enganado, acredito que
quasetodososoutrosestã osendosinceros.Alé mdemegarantiremqueapó iamaeliminaçã ode
Peter,elestambémmanifestaramodesejodeparticiparpessoalmentedoatentado.
— Leon, já trabalhei muito tempo com governadores para saber que a palavra deles nã o
valenada,amenosquesejamcon irmadasporaçã o.DevemospermitirquePeteracrediteque
existem mais potentados regionais desleais a mim. E claro que o objetivo dele é tomar o meu
lugar.RehobothteriasidooFortunatodele,casoatentativadeassassinatotivesselogradoêxito.
Certamente, Peter deve acreditar que conta com a con iança dos outros. Vamos usar isso a
nossofavor.
—Dareiminhatotalatençã oaesseassunto,senhor.Emaisumavezobrigadoporter-me
cercadodeproteçãoemJoanesburgo.
—Nãopensemaisnisto.Quandoospilotosvãoretornarparaquepossamoscondecorá-los?
—Brevemente,senhor.
—Opovoadoraostentação,não?
Leonconcordouemvozalta,masCarpathiaprosseguiu:
—Emrazã odasrecentestragé dias,nã otivemosmuitasoportunidadesdehomenagearos
cidadãosexemplares,osheróis.
— Nossa força-tarefa está exaurida, Excelê ncia, mas com criatividade podemos
aproveitar a oportunidade e transformar o retorno deles a Nova Babilô nia em um evento
inigualável.DavidimaginouCarpathiafalandocomoseestivessevisualizandoacena.
— Sim, sim — ele disse. — Gostei da idé ia. Gostei muito! E veja se algué m consegue
descobrirqualé otempodeterminadodaDupladeJerusalé m.OsseguidoresdeBen-Judá dizem
que o tempo determinado ocorrerá na metade do perı́odo de nosso acordo com Israel. Quero
saberadataexata.
O coraçã o de David deu um salto quando ele ouviu o tom empolgado de Carpathia. O
potentadolevantouavozecomeçouafalarcommaisrapidez.
—Vamoscaprichar,meuamigo!Vamospromoverumeventoinigualá vel!Enganeosdois.
Pegue-osdesurpresa.Dê umatré guaaelesaté odiadoevento.Deixequetenhamonú m erode
admiradores que eles acham que merecem. Tire da frente todos os empecilhos, Leon. Quero
coberturamundialpelaTV.Planejeumgrandeacontecimento.Digaqueestareipresente.
— Sim — prosseguiu Carpathia -, estarei em Jerusalé m, o coraçã o do paı́s com o qual
assineiumpactosolene.Comemoraremosofatodeestarmosnomeiodotratadodepazquefoi
assinado lá . Apresente os dignitá rios. Peter deve estar presente com todos os seus trajes
ridı́c ulos. Meu velho amigo Rosenzweig deve ser um convidado de honra. Agiremos da mesma
formaqueessestaissantoserenovaremosnossoscompromissos.Voudedicar-memaisumavez
a proteger Israel! Os olhos do mundo inteiro estarã o cravados lá , e eu me responsabilizarei
pessoalmente pelo im dos pregadores. Os cidadã os de Jerusalé m vã o adorar o im das pragas,
dos discursos bombá sticos, da seca, da fome, da á gua transformada em sangue! Tome nota do
que estou falando, Leon. Instigue os potentados para estimular Peter em seu esquema contra
mim.Façacomqueospotentadosolevemaacreditarqueestã odoladodele,quesã ounânimes
na antipatia que sentem por mim. Que elesquerem Peter como chefe. Ele deve ir a Jerusalé m
acreditandoquepodecontarcomalealdadedecadaumdospotentados.
—Fareiomelhorquepuder,senhor.
— Temos apenas alguns meses pela frente. Este assunto deve merecer prioridade.
Reuniõ es con idenciais, de alto nı́vel, sempre e onde quer que sejam necessá rias. Use todos os
recursos.Aquelemomentodeverá seronossomaiororgulho,umaapresentaçã operfeita.Será o
im da insurreiçã o, o im da oposiçã o, o im da Fé Mundial Enigma Babilô nia tentando usurpar
minhaautoridade,ofimdosseguidoresdeBen-Judá,sempregadoresemJerusalémparaadorar.
—MasBen-Judáaindacontacomumaenormeaudiência...
—AtéeledesanimaráquandoficarclaroqueexisteumsópodernaTerraequeessepoder
residenaNovaBabilônia.Convide-o!Convideseusseguidores!Elesficarammuitoentusiasmados
quando me constrangeram e tentaram me matar lá , no ano passado. Convide-os a voltar e
observeareaçãodeles!
—Osenhorébrilhante,Excelência.
— Se você gostou do que falei, Leon, pense nisto. Vai exigir o melhor que você tem a
oferecer.ComecefazendoconfidenciasaPeterdequeascoisasnãoandambementrenós.
—Mas,Excelência,eugostomuito...
—Eusei,Leon.
—Osumopontı́ icesabedisto.Nã oseicomopodereiconvencê -lodequeminhalealdade
absolutaderepente...
—Claro!Nãopodeserassimtãoderepente.Deixequeelelhedêaidéia!Comcerteza,ele
sempreencontracoisasnegativasameurespeitoparameteremsuacabeça,nã oé mesmo?Ele
jámecriticou?
—Certamente,maseusempredefendoosenhore...
—Dapró ximavez,hesite,Leon.Deixequeelefaçavocê icarpensativopelomenosuma
vez. Eu conheço Peter. Ele vai agarrar essa oportunidade. Acredita que é capaz de convencer
algué m sobre qualquer coisa. Que petulâ ncia acreditar que dez potentados o admiram, quando
sabemos,semsombradedú vida,queamaioriadelesquermatá -locomaspró priasmã os!Você
fariaissopormim,Leon?
—Voutentar.
—Tenhomuitacon iançaemvocê .Dentrodequatromeses,consolidaremostodoopoder
eautoridadeedeixaremosaoposiçã ocompletamenteconfusa.Sintoumagrandeenergiasó em
pensar nisto! Agora vá , meu amigo. Nã o hesite em pedir o que for necessá rio. Todos os meus...
nossos...recursosestãoàsuadisposição.
—Obrigado,Excelência.Obrigadopeloprivilégiodepoderservi-lo.
— Que bom ouvir isso de você — disse Carpathia. David sentiu dor de cabeça por ter
icado ouvindo atentamente a conversa por muito tempo. Ele estava prestes a desligar o
computador quando escutou algué m entrar no escritó rio de Carpathia. A secretá ria conversou
com ele por alguns instantes. Em seguida, ele pediu a ela para segurar todas as ligaçõ es e nã o
permitiraentradadeningué maté segundaordem.Davidouviuaportasendofechadae,logoa
seguir, um clique, como se Carpathia a estivesse trancando. Ele aguardou para saber se
Carpathiafariaumaligaçãotelefônicaimportante.
David ouviu um rangido da cadeira de Nicolae e, depois, um ruı́do como se ela estivesse
rodandonochão.Finalmente,opotentadocomeçouafalaremvozbaixa:
—OLú c ifer, ilhodamanhã !Eutenhoteadoradodesdeainfâ ncia.—Davidestremeceu,
com o coraçã o aos pulos. Carpathia prosseguiu: — Como sou grato pela criatividade que me
inspiras,ó leã odegló ria,anjodeluz.Eutelouvoportuasidé iascriativasquenã oparamdeme
causarespanto.Tumedesteasnações!Prometestequesubireiaocéucontigo,queexaltaremos
nossos tronos acima das estrelas de Deus. Con io em tua promessa de que subirei acima das
nuvens. Serei igual ao Altı́ssimo. Farei tudo o que me propuseste para que eu possa reivindicar
tuas promessas de que reinarei sobre o universo a teu lado. Tu me escolheste e permitiste que
eu izesseaterratremereenfraquecesseosreinos.Tuagló riaserá aminhagló ria,e,comotu,
jamais morrerei. Aguardo ansiosamente o dia em que poderei manifestar o teu poder e a tua
majestade.
Rayfordrecebeuumtelefonemananoitedesexta-feira.
—Eleestá aqui—disseT.—Conteiaelequealgué mestavavindoparacá a imdefazer
umapropostainteressanteemuitolucrativa.Elemordeuaisca,pelomenosporenquanto,mas
eunã ooviadesdequesuaamigasumiu.Tenhoquasecertezadequeeleestá esperandoqueeu
toquenoassunto.
— Vou até aı́. Nã o deixe que ele perca o interesse. Rayford sentou-se ao lado de Leah e
perguntouseelepodiaesfregarumpoucododinheirodeladonarizdeBoHansonparaverseo
rapazconcordavaempassar-lhealgumasinformaçõessobreoparadeirodeHattieDurham.
— Bem — ela disse, com certo ar de superioridade -, faz dias que você mal me dirige a
palavra, nã o pergunta como estou, nem mesmo quer saber se a lesã o em minhas costelas
melhorou.Agoravematrásdemim,sóporqueestáprecisandodealgumacoisa...
Rayford nã o sabia o que dizer. Ele nã o gostou nada do tom de voz nem da atitude dela,
massentia-seculpado.
—Tenhosidoomisso—eledisse.
—Arrisqueiminhavidacomvocêedoeiodinheirodemeumaridoeminhaseconomiasde
umavidainteiraaoComandoTributaçã o,evocê metratacomoseeufosseumaintrusa.Eisso
oquevocêchamadeomissão?
—Parecequecometiumatoimperdoável—eledisse.
— Parece? Você diz isso como se eu estivesse achando que você nã o tem uma desculpa
paradar.
Rayfordlevantou-se.
— Por favor — disse Leah -, nã o seja tã o grosseiro a ponto de me deixar aqui falando
sozinha.
—Existemmaneirasmaisfáceisdedizernão.Vocênãoteriaoutra?
—Eunãomenegueialhedarodinheiro.
—Vocêestámefazendodebobo.
—Euadorodeixarvocênervoso.
—Quebomsaberquevocêgostadefazeristo.
—Porfavor,Rayford.Eu iqueimagoadaporvocê meevitar,masentendoseusofrimento.
Você perdeumuitaspessoasqueridas,inclusiveduasesposasnoperı́ododetrê sanos.Nã oespero
que se sinta confortá vel a meu lado. Mas pensei que já havı́amos esquecido nossas desavenças
iniciais.Eoquepassamosjuntos,nãoconta?
Rayfordvoltouasentar-se.
—Eunã oseimuitacoisasobresuavida,Leah,masesseassuntoquevocê abordoumexe
muito comigo, inclusive quando me lembro do momento em que encontrei o corpo de minha
esposa no fundo do rio Tigre. Nã o quero pensar e muito menos continuar a falar dessas coisas.
Istonã oé desculpa,mastalvezvocê tenhalevantadooassuntoparamefazerlembrardomeu
maucomportamento.
—Exatamente.Masvocê é oresponsá velporestacasa,eeuprecisofazeralgumacoisa.
Passe uma tarefa para mim, chefe. Estou pronta a oferecer meus serviços como enfermeira,
mas nã o quero trabalhar apenas quando algué m está machucado ou doente. Tenho tentado
ajudar Chloe a cuidar do bebê e da cooperativa, mas ela é escrupulosa demais para me pedir.
Souforçadaainsistircomela.Sevocêmeencarregardisso,elavaisesentirmaisàvontade.
—Estábem,voupensarnoassunto.
—Conversecomela.
—Vouconversar.
— O pessoal desta casa é tã o politicamente correto que ningué m sequer insinua que eu
devo fazer alguma tarefa domé stica. Sou boa cozinheira e gosto de tudo o que se refere a
culiná ria.Planejarocardá pio,cozinhareaté mesmolavaralouça.Será queeupoderiacuidar
dacozinhaparaquevocêsseconcentremnaquiloqueestãoempenhadosemfazer?
—Vocêfariaisso?Ajudariamuito.
—Eumesentiriaú t il.Esqueçaoassuntododinheiro.Você nã oprecisavamepedir.Eulhe
disse, desde o inı́c io, que ele estava sendo doado à causa, e falei sé rio. Se as circunstâ ncias
mudaremeeuforemboradaquiamanhã,nãovoureivindicarumsócentavo.Podemosesquecer
oassunto?
—Issoestámuitoalémeacima...
—Nãoprecisameagradecer.Colocamosemcimadamesaoquepossuímos,enenhumde
nósémaisimportantequeooutro.TalvezTsionseja.
—Querdizerquevocêtemsidoríspidacomigosóporque...?
— Você mereceu. Devia ter demonstrado mais interesse por meus ferimentos. Eu nã o
pergunteisobreoseujoelho?
—Váriasvezes.
— Nã o foi por cortesia. Fui responsá vel pelo machucado em seu joelho. Eu nã o sabia que
você nã o estava me vendo, mas, de qualquer maneira, eu nã o devia ter parado na sua frente.
Você é um homem extraordiná rio. Estava machucado. Eu me preocupei. Perguntei. Você me
deuumarespostamachistaeencerrouaconversa.Eutambé mestavamachucada,evocê foio
responsável.Estavameseguindopertodemais,correndomaisrápidodoquedevia.
Rayfordsacudiuacabeça.
—Suascostelasestãomelhorando?
—Paradizeraverdade,estã omelhorandomuitolentamente.Devoterquebradomaisde
umacostela.Sintodoresotempotodoe,quandofaçoummovimentobrusco,tenhovontadede
gritar.
—Sintomuito.Esperoquevocêmelhorelogo.Elalimitou-seaolharparaele.
—Estoufalandosério—eledisse.
— Eu sei. Com tantos problemas para resolver, você nã o tem tempo para preocupar-se
commeusproblemas.
—Vocêestásendobemtratadaaqui?
—Muito.Nãotenhodoquemequeixar.
—Souaúnicaovelhanegra?
—Agoraqueconseguiatrairsuaatençã o,você pensariaemalgoparaeufazerquandome
recuperartotalmente?Souá gil.Souesperta.Corroriscos,como izcomvocê smaisdeumavez
no hospital. Nã o tenho famı́lia, nã o tenho nada a perder. Se você precisar que eu vá a algum
lugar,façaentregas,retiremercadorias,mecomuniquecomalgué m,contecomigoparaessas
tarefascorriqueiras.ConcordoquequasecoloqueitudoaperderdiantedaCGnaquelanoite...
— Você estava desistindo cedo demais, foi tudo. Mas se recuperou a tempo e disfarçou
muitobem.
—Nã oseesqueçadetudooqueeudisse.Asmulherestê mmaisfacilidadequeoshomens
de nã o ser reconhecidas. Basta tingir os cabelos e mudar a maquiagem. A CG nã o vai deixar
minhafotogra iacirculandopormuitotempo.Providencieumacarteiradeidentidadefalsapara
mimemearrumeumtrabalho.
—Tudotemsuahoracerta.Porenquanto,estoumuitoanimadoporvocê sepronti icara
tomarcontadacozinha.
—Euacheiqueiamearrependerdeterfeitoaquelaproposta.
Rayfordlevantou-se.Odedodopé eojoelhoaindaestavamdoloridos.Chloeaproximou-se
deles,vindodoquartodafrente.
— Má s notı́c ias, papai. Tenho tentado falar com Nancy, a irmã de Hattie. Eu queria que
ela soubesse que temos certeza de que Hattie está viva. Pois bem, eu a encontrei. O nome de
Hattieapareceuemumalistadepessoasmortasporinalaçãodefumaça.
Rayfordolhouparaochão.
—Bem—eledisse,comardetristeza-,maisummotivoparaeudescobriroparadeiro
deHattie.
MaceAbdullahestavamprogramadospararetornaraNovaBabilô nianamanhã desextafeira a bordo do novoComunidadeGlobalUm, conduzido pelo ex-co-piloto de Mac. O nome do
aviã o tomado de Peter II foi mudado deII Um paraFênix 216. Leon Fortunato viria de Nova
Babilôniaparalevarosheróisferidos.MacmalpodiaesperarparafalarcomDavideAnnie.Seria
necessá rio instalar um aparelho de escuta clandestina no novo aviã o, e David tinha um
assunto a tratar com ele que nã o podia ser mencionado por telefone. E, quando o té cnico de
segurança em comunicaçõ es do lı́der mundial nã o podia mencionar alguma coisa por telefone,
erasinaldequesetratavadeassuntomuitosério.
Poucodepoisdas16horas,enquantoarrumavasuamala,Macrecebeuumtelefonemade
Rayford.
—EstouseguindoparaPalwaukee.Queropressionaraquelesujeitodequemjá lhefalei,o
taldeBo.Emseguida,vouparaaEuropaeprecisodealgumascoisas.Albieaindapodecooperar
conosco?
—Claroquesim.Doquevocêestáprecisando?
—Oh!...ah!...prefirofalardiretamentecomele.Vocêtemonúmerodotelefonedele?
—Nãoaquicomigo.Esperoestaremcasahojeànoite.Vocêpodeesperaratélá?
—Talvez.VocênãopodepediraDavidquelocalizeonúmeroparamim?
—Estáemmeucomputador.Algumashorasamaisvãofazermuitadiferença?
—Achoquenão.
Com sua nova aparê ncia e documentos que pareciam autê nticos, Buck pegou um vô o
comercial para Tel-Aviv. Ele espantou-se com o nú m ero reduzido de vô os que havia. O lagelo
dofogo,fumaçaeenxofrecontinuavaadevastaraTerra,etudooquesereferiaàvidatinhasido
afetado. O Arrebatamento mudara a face da sociedade, e a vida jamais voltara a ser a mesma
desde o grande terremoto, mas Buck sabia que a situaçã o iria piorar. Praticamente nã o havia
ninguémquenãotivesseperdidoumentequerido.
Foidifı́c ilpartirsemChloeeobebê .Eleestavavivendocomafamı́liahaviamaisdedez
meses, desde o momento do nascimento de Kenny. Buck nã o podia imaginar que icaria tã o
ligado a seu ilho e que sentiria tanta saudade de segurá -lo no colo. Ele sabia o que signi icava
estarlongedeChloe,eessesofrimentoquasechegavaaenlouquecê -lo.PareciaquecomKenny
asaudadeseriamaiorainda.
No aviã o, havia uma mulher asiá tica sentada algumas ileiras atrá s dele carregando um
bebê no colo, talvez poucos meses mais novo que Kenny. Buck lutou para nã o sair do lugar
quandoomeninocomeçouachorarduranteadecolagem.Assimquefoipossı́vel,eledirigiu-seà
mulhereperguntouseelafalavainglês.
—Umpouco—eladisse.
—Qualéonomedobebê?
—Li—elarespondeu.
—Oi,Li—eledisse.Obebêcravouosolhosnele.—Temquantosmeses?
—Sete.
—Éumbelogaroto.
—Muitoobrigada,senhor.
—Seráqueeupoderiacarregá-loumpouco?
—Comoassim?
Buckestendeuosbraçosparapegarobebê.—Posso?Amulherhesitou.—Eucarrego.
—Tudobem—eledisse.—Compreendo.Eunã opermitiriaqueumestranhocarregasse
meufilho.
—Vocêtemumfilhopequeno?
Buck mostrou-lhe uma fotogra ia de Kenny. Ela murmurou alguma coisa e mostrou-a a
seufilho,quetentousegurá-la.
—Eumbelomenino.Sentesaudadedele?
—Muita.
ElafezumgestoparaqueBuckpegasseLi.Buckestendeuosbraços,eLiinclinouocorpo
para a frente. Mas, assim que Buck o segurou, Li fez uma careta e manteve os olhos ixos na
mãe.
—Elanãovaifugir—disseBuckaobebê.—Mamãeestáaqui.
Li,poré m,começouachorar,eamã evoltouasegurá -lo.Buckestendeuamã oà mulher,
eelaaapertoutimidamente.
—MeunomeéGregNorth—eledisse.
—Muitoprazer,Sr.Greg—eladisse,semmencionarseunome.
Maistarde,depoisdeterterminadosuarefeiçã o,Buck icouemocionadoquandoajovem
mã e lhe pediu ajuda. Ele a vira caminhando pelo corredor, com Li no colo, até o bebê
adormecer.
—Osenhorpoderiacarregá-loenquantoeucomo?—elaperguntou.
O bebê continuou dormindo nos braços de Buck durante quase 20 minutos, até a mã e
voltar.Eledetestouterdedevolvê-lo.
DepoisdedesceremTel-Aviv,Bucktentoulocalizaralgué mquetivesseoselonatesta.A
ú nica pessoa que ele viu foi um homem que estava sendo interrogado. Buck resolveu nã o
abordá-loparanãosecomplicar.
O reló gio marcava nove horas da manhã em Israel quando Buck jogou a sacola por cima
dos ombros e saiu do terminal do Aeroporto Ben-Gurion, a im de ligar para a casa de Chaim
Rosenzweig.Avozdeumajovematendeuemhebraico.Buckrefletiuporalgunsinstantes.
—Inglês,porfavor—eledisse.
—ResidênciadoDr.Rosenzweig—eladisse.—Possoajudar?
—Hannelore?
—Sim—elarespondeu.—Porfavor,quemé?
— Eu vou dizer quem sou, mas você nã o pode pronunciar meu nome em voz alta,
entendeu?
—Quemé,porfavor?
—QuerofazerumasurpresaaChaim,tudobem?
—Quem?
—Hannelore,éBuckWilliams.
—Buck!—elamurmurouentusiasmada.—Nãoháninguémporperto.Ondevocêestá?
—NoBen-Gurion.
—Vocêpodeviratéaqui?OdoutoreJacovvãoficarmuitocontentes!
—Querorevertodosvocês.
—Espereaí.VoumandarJacovbuscarvocê.
—Elenã opodedizeromeunome,Hannelore.Seeleprecisarfalarcomigo,estouusando
onomedeGregNorth.
— Greg North. Ele vai chegar aı́ logo, Buck... isto é , Greg. Nã o vou contar nada ao Dr.
Rosenzweig.Elevaificartão...
—ComovaiJonas?
— Oh! Buck, sinto muito. Ele faleceu. Esperamos em Deus que esteja no cé u. Vamos lhe
contartudodepois.
CAPÍTULO13
Rayford pegou a sacola com o dinheiro e subiu apressado a escada da torre do Aeroporto
de Palwaukee. Ao ver dois carros no estacionamento, ele teve a certeza de que T conseguira
ganhartempoparaqueBoHansonnã osaı́ssedali.Quandofaltavamalgunsdegrausparachegar
aofimdaescada,ojoelhodeRayfordprotestou,eeleterminouasubidamancandoatéaporta.
Rayford já havia estado vá rias vezes naquela torre e sabia que qualquer pessoa que
estivessealiteriaouvidoosomdeseuspassos.Testavasentadoasuamesaeacenou-lhepara
que entrasse. Bo, sentado em uma cadeira ao lado da mesa, ergueu os olhos ao perceber que
algué m estava entrando na sala. Rayford nunca considerara Bo um rapaz muito inteligente,
apesar de ter tido uma criaçã o privilegiada. Seus cabelos eram descoloridos, cortados à
escovinhaepenteadoscomgel,eeledeuumlongosuspiro,prendendoumpoucoarespiraçã o.
Rayfordimaginouqueelequisesseexibirseusmú sculos.Apose,poré m,nã oserviuparadisfarçar
seumedo.
—Fazumbocadodetempoquenãonosvemos,Bo.
—Éverdade,Sr.Steeles.
—Steele—corrigiuRayford.
—Sintomuito.
—Oquevocêandafazendo,Bo?
—Nadademuitoimportante.Evocê?
—Recentementeperdiumamigodequemeugostavamuito.Aliás,perdidois.
Rayfordsentou-se,colocandoasacolapertodospés.
—Dois?—perguntouBo.
—Umdeleserameumédico.Vocêoconheceu.
—Ah!sim.Doqueelemorreu?
—DealgumacoisaqueelepegoudeHattie.
—Oh!Eusoubeoqueaconteceucomela.Quepena.
—Oquevocêouviufalar?
—Saiuemtodososnoticiá rios—disseBo.—Desastredeaviã o.AchoquefoinaEspanha.
Eutambémperdiumamigo.ErniemorreuqueimadoumdiadessesnaCalifórnia.
—Sintomuito.
—Obrigado.Eutambémsintomuitoaperdade...Hattie.
—Quantoelalhepagou,Bo?—inquiriuRayford.
—Pagou?
—Paravocêajudá-laafugirdaquideavião,inventarumahistória,simularamortedela.
—Eunãoseidoquevocêestáfalando.
—Você aprovouovô o.Suasiniciaisestã ona icha.Você nã opensouemmudaropre ixo
doavião.Emboraopilotonãosetenhaidentificado,oaviãolevouasautoridadesatéirmãoSam,
emBatonRouge.
—Ele...eu...eucontinuosemsaberdoquevocêestáfalando.
—Vocêsejulgaumhomemdenegócios,Bo?
BoolhouparaT.—Eutenhoumapartenesteaeroporto.Façotudodireitinho.
—Cincoporcento—esclareceuT.
Bopareciaaflito.
—Tenhooutrosnegócios,outrosinteresses,outraspreocupações.
— O quê ! — disse Rayford. — Suas palavras me impressionaram. Algumas dessasoutras
coisastêmnome?
—Têm—disseBo.—Umadelaschama-seNãoÉdaSuaConta.Rayfordolhouderelance
para T e voltou a concentrar-se em Bo, cujo peito estava arfante. A pulsaçã o em seu pescoço
eravisível.
—Voufingirqueacredito,Bo.NãoÉdaSuaConta?
—Eissomesmo,meunegó c ioé esse.Chama-seNã oEdaSuaConta.Entendeu?Ah!Nã o
ÉdaSuaConta!
— Entendi, Bo. Boa escolha. Seria por causa disso que você precisa receber dinheiro de
umajovemquedesejadesaparecer?
—Eujádissequenãoseidoquevocêestáfalando.
—Nãosabemasnegou.
—Negueioquê?
—QuevocêpôsHattieDurhamnoQuantumdeseuirmãoparaelafugirdaqui.
—Eunegoisso.
—Vocênega?
—Claroquesim.Nãotivenadaavercomesseassunto.
—Aconteceu,masvocênãoparticipoudenada?
—Correto.
—Então,agoravocêsabedoqueestoufalando.
—Nãosei.Sóimagino.Eunemsequerestavaaqui.
—Porquesuasiniciaisestãonaficha?
—Ocaradatorreligouparamim.DissequeumsujeitoqueriareabastecerumQuantum.
Euconcordei.Seerameuirmão,eunãosabia.SeapassageiraeraHattie,eutambémnãosabia.
Eujálhedisse.Eunãoestavaaqui.Nãocoloqueininguémdentrodenenhumavião.
— Mas você tem uma excelente memó ria. Lembra-se de todos os detalhes do vô o que
aprovounanoiteemquenãoesteveaqui.
—Então,prove.
—Provaroquê?
—Proveoquevocêacaboudedizer.Rayfordsacudiuacabeça.
—Vocêquerqueeuprovequevocêtemboamemória?
—Nãosei.Vocêestázombandodemimoucoisaparecida,eatéagoraeunãoentendi.
Rayfordinclinou-separaafrenteedeuumtapadelevenapernadeBo.
— Vou dizer-lhe uma coisa, Bo. També m sou um homem de negó c ios. Que tal se eu lhe
disserquenãotenhonadacontraHattiefugirparaaEuropaousefingirdemorta?
Boencolheuosombros.
—Tudobem.
—Elaéumamulheradulta,temdinheiro,nãoprecisadaautorizaçãodeninguém.Elanão
medevesatisfaçõ es.Equeeumepreocupocomela.Hattienã oestá bem.Nã oandatomando
decisõescertasultimamente,masavidaédela,nãoémesmo?
Boassentiusolenementecomacabeça.
—Mas,entenda,euprecisoencontrá-la.
—Nãopossoajudarvocê.
— Nã o fale assim. Preciso conversar com ela, dar uma notı́c ia que ela precisa ouvir
pessoalmente.Oquepossofazer,Bo?Comopossoencontrá-la?
—Seilá!Eujálhedisse.
—Você mecontouqueé umhomemdenegó c iosequefaztudodireitinho.Quantocusta
paravocê serumhomemdenegó c ios,Bo?Istoé su iciente?—perguntouRayford,curvando-se
eabrindoozíperdasacola.
Bo inclinou-se para a frente e olhou dentro da sacola. Em seguida, olhou para Rayford e,
depois,paraT.
—Vamos—disseRayford.—Pegueumdosmaços.Édinheiroverdadeiro.Podepegar.
Bopegouumapilhaamarradadecédulasde20dólaresefolheou-ascomopolegar.
—Gostou?—perguntouRayford.
—Claroquegostei.Quantovocêtemaqui?
—Vejavocêmesmo.
Bopegouasacolaeaescancarou,semnenhumconstrangimento.
—Eugostariadeterumpoucodestedinheiro.
—Umaquantiasuficienteparavocêmecontaroqueprecisosaber?
Bocontinuavamexendoasacola.
—Nãohánadamelhordoquecheirodedinheiro.Oquevocêprecisasaber?
— Quero voar para a Europa amanhã . Uma hora depois de pisar no chã o de lá , quero
constatarqueHattieDurhamestávivaecomsaúde.Vocêconhecealguémquepossameajudar
afazerisso?
—Talvez.
Rayfordpegoualgunsmaçosdasacolaecomeçouacolocá -losnamesa,umdecadavez.
Depoisdecolocaroterceiromaço,eledisse:
—Istoésuficienteparavocêmepassarasinformaçõesdequepreciso?
—Algumas.
—Porexemplo?
—França.
—Cidade?
—Maisum.
Rayfordcolocououtromaçonamesa.
—Litoral.
—Vocêédifícildeserconvencido.Norteousul?
—Sim.
Acadapergunta,Rayfordcolocavamaisummaçodedinheironamesa.
Finalmente,BomencionouonomedeumacidadenoCanaldaMancha:
—LeHavre.
—Você conseguiuganharummontededinheirosemsairdaqui—disseRayford-,masas
notasvã ovoltarparaasacolaseeunã o icar sabendo qual é o endereço exato, com quem ela
estáeoquepoderiamecausarsurpresa.Anotetudo.VoudeixarodinheirocomT...
—Ei,vocêestámepassandoparatrás!
—...e,quandoeuencontrarHattie,voudizeraele,evocê receberá abolada.Masvocê
precisameinformarporescrito.
—Já está escrito—disseBo,tirandoumpapeldacarteira.TudooqueRayfordprecisava
estava escrito à mã o com letras miú das. — Você vai me deixar fora disso, nã o vai me
complicar,certo?
—Prometo—disseRayford.—Agoravamostratardaquestãodosilêncio.
—Silêncio?
—Vocêprovouquenãoémuitobomnisto,certo?
—Achoquenão.
—Eutambémnãosou.
—Vocêdissequemedeixariaforadisso.
—SuponhoquevocênãoqueiradizeronomedequemestácomHattieoufalardela.
—Exatamente.
—Masmeusilênciocompletopodesercompradoporalguém.
—Compradoporquem?
— Pela CG, claro. De acordo com as leis da Comunidade Global, fraudar uma companhia
desegurosportersimuladoumamorteouforçarumaequipedesalvamentoafazerbuscassob
falsasalegaçõeséumdelitointernacionalClasse
X,consideradomuitograve,punı́velcomprisã operpé tua.Comocidadã o,tenhoodeverde
relatarqualquertipodedelitodemeuconhecimento.
—Euvounegar.
—Tenhoumatestemunha.—RayfordolhouparaT,quetinhaosolhosfixosnamesa.
— Você está do lado dele, Delanty? Você é um canalha. T disse: — Este assunto é entre
vocêe...
—Esqueça—disseBo.—Voutomarminhasprovidê ncias.Istoé umaex...extor...,uma
chantagem.
— Bo — disse Rayford -, pegue aquele telefone. E melhor você relatar esta extorsã o.
Deixebemclaroqualé achantagemqueestoufazendo.Você cometeuumdelitograveesabe
disto.
Bobufouecruzouosbraços.
—Ah,vocêjáfezaligação?—perguntouRayford.—Euprecisorelatarumcrime.
—Vocênãoteriacoragem.Viveescondido.
— Eles aceitam denú ncias anô nimas, nã o aceitam, T? — T nã o respondeu. — Vamos
descobrir.—Rayfordpegouofoneecomeçouaapertarosbotões.
—Tudobem!Desligue!
—Querdizerquevoltamosaserhomensdenegócios,Bo?Prontosparanegociar?
—Sim!
— Que tal facilitar as coisas para você ? Que tal eu nã o cobrar de você um dinheiro que
vocêaindanãotem?Quetal?
Boencolheuosombros.
— Por exemplo, você ainda nã o tem este dinheiro — disse Rayford, colocando todo o
dinheirodevoltanasacoladeumasóvez.
— Otimo! Vou contar essa histó ria a quem acho que devo contar, e você jamais vai
encontrarHattieDurham.
—Veja,Bo,já penseinisto.Você nã oestá raciocinandobem.Agoraquemdá ascartassou
eu. Seja lá qual for omotivo que levou Hattie a ir embora daqui, você é um fugitivo
internacional. Pode acreditar em mim. Tenho vivido nessa situaçã o, e você nã o vai querer
passarporisso.—RayfordestendeuamãoparaBo.-Foiumprazernegociarcomvocê,Bo.
EBeauregardHanson,deinteligênciatacanha,apertouamãodeRayford.
—Ei—eledisse,recolhendoamã o.—Nã ofoiprazernenhumnegociarcomvocê ,seu...
seuidiota!
Bo saiu batendo a porta com força, desceu a escada com passos irmes, bateu a porta da
torre, bateu a porta do carro e saiu do estacionamento queimando os pneus, atirando poeira e
cascalho por todos os lados. Assim que ele passou pelo portã o, o carro parou por falta de
combustível.Rayfordviu,doaltodatorre,Boacenandoparapedirumacarona.
Jacovestacionounomeio-fiodoAeroportoBen-GurionesaltoudoMercedes.
— Greg! — ele exclamou exultante, abraçando Buck. Assim que eles entraram no carro,
eledisse:—Comovocêestá,meuirmão?
—PreocupadocomChaim.Eansiosoparasaberdetodosvocês.
—HannelorelhecontousobreJonas?
—Sim.Oqueaconteceu?
—Antes,meconteumacoisa.Vocêviuoscavaleiros?
—Não.
— Ainda bem que você nã o os viu, pode acreditar em mim. Criaturas medonhas. Eles
andaramprovocandoestragosemnossavizinhançaenquantoJonasestavadeguardanacabina
devigia.Vocêconheceolocal.
—Claro.
—Umacasadooutroladodaruafoiqueimadaeumhomemquepassavadecarroporlá
icou sufocado pela fumaça. Ele morreu ao volante, e o carro colidiu com a cabina. Foi um
choque muito grande para Chaim. Ele nã o queria acreditar que a gente podia ver as criaturas.
Ainda acha que estamos mentindo, mas lamenta a morte de Jonas. Meu patrã o nã o pá ra de
dizer:"Penseiqueelefosseumdevocê s.Penseiqueeleestariaprotegido."Agora,elepassoua
estudar as mensagens do Dr. Ben-Judá diariamente, chora o tempo todo, de dia e de noite,
dizendo: "Nada disso é verdade. E tudo mentira, nã o é ? Tudo mentira." E tem mais, Buck. Ele
temfeitocoisasestranhas.Sabemosqueeleé idosoeexcê ntrico,apesardecontinuaraserum
homemmuitointeligente.Elecomprouumacadeiraderodas.Motorizada.Muitocara.
—Eleestáprecisandodeumacadeiraderodas?
— Nã o! Ele já se recuperou das ferroadas dos gafanhotos. Agora, sente muito medo das
pragas atuais e parece estar possuı́do por um espı́rito maligno. Fica sentado perto da janela,
olhandoafumaça.Nã osaimaisdecasa.Passaamaiorpartedotempoemsuao icina.Você se
lembradolocal?
—Sim.Eacadeira?Paraqueserve?
— Ele anda pela casa toda de cadeira de rodas. Quando se cansa de icar no pavimento
inferior, ele pede a minha ajuda e a de um criado, e temos de transportá -lo para o pavimento
superior,evice-versa.Émuitopesado.
—Qualéomotivodetudoisso?
— Parece que ele está treinando a andar nela, Buck. A princı́pio, ele teve um pouco de
di iculdade,estavasempredandotrombadanosmó veis.Nã osabiacomorodarparatrá s,virar.
Quandoacadeiraenrascavaemalgumlugar, icavazangadoenoschamavaparaajudá -loasair
dali.Agoraelejáestácraqueemlidarcomacadeira.Sabeirparaafrenteeparatrás.Passapor
espaçosestreitos,dá meia-voltaemlugaresapertados.Aprendeuasevirarsozinhoemqualquer
pavimentodacasa.Achoqueelesedivertecomisso.
—Oqueelefaznaoficina,Jacov?
—Ninguémsabe.Elesetrancaládurantehoras,enósouvimososomdelimadesbastando
algumacoisa.
—Metal?
— Isso mesmo! Nó s vemos minú sculas peças limadas, mas nã o chegamos a ver o objeto
inteiro. Ele nunca teve habilidade com as mã os. E um homem inteligente, criativo, analı́t ico,
mas nã o costumava passar horas fazendo trabalhos manuais. Ele ainda lê assuntos sobre
botânicaeescreveparaperiódicosespecializados.EestáestudandoaBíblia.
Elesjá estavamchegandoà ruaondeChaimmorava,eBuckolhouparaJacovcomarde
incredulidade.
—Vocêestáfalandosério?
—Claro!ElecomparaostextosdaBı́bliacomosensinamentosdeTsion.EleeTsiontê m
trocadocorrespondência.
— Eu sei. E por isso que estou aqui. Tsion está muito preocupado com Chaim. Acredita
queeleestápertodeaceitaraverdade.
—Eutambé mpensei,Buck.Nó s icamosaoladodeledepoisquevocê spartiram.Sempre
queelevê ostelejornais, icamuitodesapontadocomCarpathia.Achaquefoitraı́do,queIsrael
foitraído.ElenãoconseguefalarcomNicolae,ésemprebarradopelocomandante.
—Fortunato.
—Sim.Eumproblemasé rio.Você vaisesurpreenderaovercomoeleenvelheceu,Buck,
massuavisitavaimelhorarseuestadodeânimo.
—Hámaisalgumacoisaquevocêqueiramecontar?
—Queeumelembre,não.Ah!sim.Nãomencioneaeleapalavraderrame.
—Derrame?
—Vocêsabe,quandoocorpo...
—Euseioqueé,Jacov.Porquenãopossomencionaressapalavradiantedele?
—Parecequeeleestáobcecadoporesseassunto.
—Derrame...—Buckdeixouafrasenoar.—Eporquê?
— Nã o sabemos, Buck. Nó s desistimos de tentar compreendê -lo. Um parente dele sofreu
um derrame, e agora ele ica olhando para as fotogra ias desse homem. Meu patrã o mudou
muito. E uma pena. Ele deve estar com medo de sofrer um derrame també m. Ele nunca foi
assim.Vocêsabe.
Os edifı́c ios que compunham o palá cio da Comunidade Global passaram a ser um local
deprimente. Cerca de 15% dos funcioná rios tinham sido mortos por fumaça, fogo ou enxofre.
Carpathia lançou publicamente a culpa em Tsion Ben-Judá . Os noticiá rios transmitiam as
alfinetadasproferidaspelopotentado:
"Aquele homem tentou me matar diante de milhares de testemunhas em Jerusalé m, no
Está dio Teddy Kollek, há mais de um ano. Ele está mancomunado com aqueles dois sujeitos
radicais que vomitam seu ó dio diante do Muro das Lamentaçõ es e se vangloriam de ter
envenenado a á gua potá vel. Seria um despropó sito acreditar que essa seita poderia provocar
umaguerrabacteriológicanorestantedomundo?Certamente,essagentejádesenvolveualgum
antı́doto,porqueaté agoraningué mouviufalarquealgumdelestenhasidovı́t ima.Aocontrá rio,
inventaram uma histó ria que nenhum homem ou mulher com o mı́nimo de raciocı́nio pode
engolir. Querem nos fazer acreditar que nossos parentes e amigos estã o sendo mortos por um
bando de cavaleiros gigantescos montados em cavalos lutuantes, cuja metade do corpo é
cavalo e a outra leã o, que expelem fogo pela boca como se fossem dragõ es. E claro que os
crentes, os santos, os que se consideram melhores do que todos nó s, podem enxergar essas
criaturasmonstruosas.Dizemquenó s,osmal-informados—naverdade,osnã o-vacinados-,é
que somos cegos e vulnerá veis. Os seguidores de Ben-Judá nã o tê m condiçõ es de nos persuadir
comseuexclusivismo,intolerâ ncia,crı́t icasexacerbadaseodiosas.Eporissoqueoptarampor
nosmatar!"
O nú m ero de funcioná rios do departamento de David estava sendo lentamente reduzido.
Os sobreviventes, assustados demais para sair à rua, apesar de nã o terem segurança nem
mesmodentrodecasa,trabalhavamemturnosdobradoseandavamaterrorizados.
A alegria que David e Annie sentiam por viver essa nova fase de seu relacionamento foi
ofuscadapelosofrimentodetantaspessoas.Aquelesqueosconheciam,quepoderiamter icado
felizes com a nova situaçã o deles, passaram a considerar o namoro como um fato trivial. Por
maior que fosse o amor entre David e Annie, eles nã o podiam contestar esse ponto. As pessoas
estavam morrendo e indo para o inferno. David sentia-se tã o triste que pensou seriamente na
possibilidade de fugir do palá cio com Annie para evangelizar o povo antes que fosse tarde
demais.
Annieajudou-oare letirmaisumavezsobreaposiçã oprivilegiadaqueeleocupava.Certa
noite, eles se sentaram de mã os dadas diante do computador na sala de David. Um simples
toque na letra Y permitiu-lhes ouvir a conversa entre Leon e Peter II no escritó rio do sumo
pontíficelocalizadonoPaláciodaFé.
— A era de Carpathia já terminou, Leon. Você deve parar de reagir todas as vezes que
deixodeusarumdessestítulosridículosquevocêsdoisinventaram.
—Masvocêinsisteemserchamadode...
— Eu conquistei meu tı́t ulo, Leon. Sou um homem de Deus. Dirijo a maior igreja que já
existiu na Histó ria. Milhõ es de pessoas ao redor do mundo prestam homenagem à minha •
liderança espiritual. Quanto tempo ainda demorará para que eu també m passe a liderá -los
politicamente? Os judeus religiosos e os fundamentalistas cristã os sã o apenas facçõ es que nã o
aceitamaFéMundialEnigmaBabilônia.
—Facçõ es?Pontı́ ice,pelosnossoscá lculos,umbilhã odepessoasestá acessandoosite de
Ben-Judátodososdias.
—Issonãosignificanada.Souumadelas.Quantas,porém,sãoseguidorasdele?Eunãosou,
mas preciso me manter atualizado a respeito dessas bobagens. Tenho sido paciente com eles,
aceitando suas excentricidades e dissidê ncias em nome da tolerâ ncia, mas esse perı́odo está
chegando ao im. Pedi a Carpathia que torne ilegal a prá tica de qualquer religiã o que nã o se
enquadrenaFé MundialUnica.Embreve,vouconversarcomCarpathiaaesserespeitoepedir
que ele tome uma providê ncia. Você nã o acha que ele deseja passar para a Histó ria por ter-se
oposto à igura religiosa mais amada de todos os tempos? Meu pessoal espera que eu me
manifeste rapidamente, tome uma atitude de initiva contra esses apó statas intolerantes. Mas
vocêacreditaqueCarpathiaéumdeus.
—Sim,acredito.
—Dignodeseradorado.
—Claro,pontífice.
— Por que, entã o, esse tal de homem-deus nã o pode fazer nada contra esses dois
pregadores?Elesoestãoexpondoaoridículo.
—SuaExcelêncianegocioucomelese...
—Etudo icouporissomesmo.Eledissequedefendeuo imdabarganha,recusando-sea
perseguir os crentes se essas tais testemunhas permitissem que os israelenses bebessem á gua
emvezdesangue!Bem,talvezelesestejambebendoáguapura,masestãomorrendosufocados!
Quempassouporbobo,Leon?Nenhumaresposta.
—Você nã opoderesponderaestapergunta,nã o,Leon?Nã opodeadmitirqueseupatrã odeusé incapazdefazeracoisacerta.Você mesmonã otolerariaumainsolê nciadessaspartindo
deumdeseussubordinados.Mas iquetranqü ilo.Nã oseiquemsã oessesdoismalucos,nemde
ondevê mousetê mpoderesmá gicos.Maselesnã oestã oacimadalei.Estã osujeitosà sleisda
ComunidadeGlobal,e,seLeonFortunatofossepotentado,esseproblemajá teriasidoresolvido
há muito tempo. Estou certo? Hein, Leon? Você faria o mesmo que eu, nã o faria? Já teria
eliminadoaquelesdois.
Nenhumaresposta.
—Assimqueeu izerisso,Leon,você vai icardomeulado,vaimeouvir?Sedesdeagora
sou amado e reverenciado pelo povo, imagine só como icará minha imagem depois que eu
acabar com esses tra icantes de pragas! Admita, Leon. Nicolae está perdendo tempo. Ele está
esperando o quê ? E preciso ter coragem. E preciso agir com diplomacia. Ele nã o pode fazer
nada.Defenda-o,Leon!Vocênãopode,nãoéverdade?Nãopode.
—Tenhodemeapressarparaatenderaumoutrocompromisso,pontı́ ice,masdevodizer
que, quando o ouço falar com tanta veemê ncia, chego a desejar o retorno daquele tipo de
liderança.
—Hápotentadosregionaisqueconcordamcomvocê,Leon.
— Bem, para ser sincero, pontı́ ice, um homem em minha posiçã o teria de ser cego e
surdoparanãoverquantoospotentadosoveneram.
—Eutambémnãosoucego,Leon.Gosteidesaberquevocêreconheceminhasqualidades.
Chego até a pensar que eles apoiariam minha liderança em outras á reas fora do â mbito
espiritual.
CAPÍTULO14
Os novos computadores foram instalados, e os funcioná rios de David Hassid, agora em
nú m eroreduzido,estavamtrabalhandoarduamente.Cé rebrosjovenseinteligentescombinados
comamaismodernatecnologia,geradaeanalisadapeloscomputadores,tentavamdescobrira
origemdastransmissõesdeTsionBen-JudáeCameronWilliams.
Ben-Judá tornara-se o nome mais conhecido do mundo, com exceçã o de Carpathia. Ele
transmitia â nimo, exortaçã o, sermõ es, ensinamentos bı́blicos e até mesmo explicaçõ es sobre
idiomasepalavras,baseadoemseusestudosdeumavidainteira.
Buck, por outro lado, transmitia uma revista virtual semanal chamadaA Verdade. Ele
també m tinha um grande nú m ero de admiradores que se lembravam do tempo em que ele
recebeu o prê mio de articulista mais jovem doSemanário Global. Tornou-se editor da revista
depoisqueCarpathiaseapoderoudetodososmeiosdecomunicaçã o—impressoseeletrô nicos
—eonomedoSemanárioGlobalfoimudadoparaSemanárioComunidadeGlobal.Quandoosseus
verdadeirosmotivospassaramaserconhecidoseBuckseconverteuaCristo,eletornou-seum
fugitivo.PorterumaligaçãocomHattieDurham,ex-amantedeCarpathia,ecomBen-Judá,ele
tevedeviverescondidoeviajarincógnito.
Buck insistia com seus leitores: "Tenham sempre em mã os um exemplar do Semanário
Comunidade Global, o mais moderno perió dico de notı́c ias já criado. No dia anterior de cada
ediçã o,visitemapá ginadeAVerdadeeconheçamaverdadeirahistó riaqueexisteportrá sda
propagandaqueogovernonostemimpingido."
DavidHassidadoravaouvirareaçã odopessoaldopalá ciodiantedosataquessemanaisde
BuckaoSemanárioComunidadeGlobal.ArevistaAVerdadefaziajusaseunome,etodossabiam
disso. David desenvolvera um programa que lhe permitia monitorar todos os computadores do
gigantesco palá cio. Suas estatı́sticas revelavam que mais de 90% dos funcioná rios da CG
visitavam semanalmente a revista virtual de Buck, a segunda mais popular, perdendo apenas
paraossitesqueabordavamassuntospornográficosepsíquicos.
O uso de enormes antenas parabó licas conectadas a saté lites e de tecnologia de
microondas tornava teoricamente possı́vel rastrear a origem de qualquer transmissã o
ciberné tica. A maioria dos operadores clandestinos mudava constantemente de lugar ou
instalava programas de proteçã o contra rastreamentos, o que di icultava muito a localizaçã o.
Alé m de ter ajudado a montar o protocolo de transmissã o para o Comando Tribulaçã o sediado
nosEstadosUnidos,Davidtomouumaduplaprecauçã o,instalandoumdispositivoparaprovocar
falhasnoscomputadoresdeseudepartamento.
Ocomplicadorerapuramentematemá tico.Osegredoparatraçarcoordenadasé mediros
â ngulosecalcularasdistâ nciasentrevá riospontos.Nopapel,essescá lculoslevariamhoraspara
ser feitos. Em uma calculadora, menos tempo. Mas, em um computador, os resultados eram
praticamenteinstantâ neos.Davidimplantouaquiloqueelechamavademultiplicador lutuante.
Em termos leigos, todas as vezes que o computador fosse acionado para fazer um cá lculo, um
componente escolhido ao acaso invertia os dı́gitos na terceira, quarta ou quinta etapa. Nem
mesmo David sabia que etapa seria selecionada, e muito menos que dı́gitos. Quando o cá lculo
fosserepetido,oerroseriaduplicadotrê svezesseguidas;portanto,denadaadiantariachecaro
computadorsemteroutrafontedecomparação.
Se algué m levantasse alguma suspeita e eles resolvessem checar o computador usando
uma calculadora nã o-contaminada, o computador ocultaria a falha e forneceria uma leitura
correta.Assimqueoté cnicoseconvencessedequepoderiaterhavidoumerrohumanoouum
defeitotemporá rionaoperaçã oanterior,elepassariaparaocá lculoseguintee,provavelmente,
sóperceberiahoras,oudiasdepois,queocomputadorhaviavoltadoacometeromesmoerrode
antes.
David imaginava que na é poca em que as discrepâ ncias apresentadas nos computadores
fossemdescobertasesetornassemumproblemasé rio,oprojetoestariatã oobsoletoqueseria
descartado como sucata. Enquanto esse dia nã o chegasse, os computadores usados para
transmitirosensinamentosdeTsionearevistadeBuckcontinuariamprogramadosparamudar
seus sinais aleatoriamente, modi icando, entre um segundo e outro, 9 trilhõ es de combinaçõ es
separadasdeatalhos.
Sob o pretexto de localizar a origem das transmissõ es de Buck, os té cnicos do
departamento de David passavam grande parte do tempo lendo atentamente a revista virtual
de Buck. Ficou claro para todos que Williams obtinha informaçõ es de dentro do palá cio, mas
ningué m sabia de onde elas partiam. David tinha conhecimento de que Buck usava dezenas de
contatos, inclusive o pró prio David, mas Buck era muito esperto e sempre dava um jeito para
protegerseusinformantes.
AúltimaediçãodoSemanárioComunidadeGlobalrelatouahistó riadofracassadoatentado
aCarpathia,promovidapelopotentadoregionalRehoboth.Osredatoresdarevista ingiramser
totalmenteimparciais,revelandoqueoatentadohaviasidoumchoqueaoregimedeCarpathia.
"Homemdecará ter,honestoesincerotentadiscutirdiplomaticamenteasdiferençasentreele
eseuscomandados",iniciavaoeditorial.
Mwangati Ngumo, de Botsuana, demonstrou ser um homem honrado quando insistiu há
mais de trê s anos que Nicolae Carpathia o substituı́sse como secretá rio-geral da Organizaçã o
das Naçõ es Unidas. Aquele gesto altruı́sta e de grande visã o resultou na enorme Comunidade
Globalquedesfrutamoshoje,ummundodivididoemdezregiõesiguais,cadaumagovernadapor
umsubpotentado.
Sua Excelê ncia pediu ao supremo comandante Leon Fortunato que visitasse o ilustre Sr.
Ngumo para tentar persuadi-lo a permitir que o potentado reconstruı́sse Botsuana. Ngumo, o
grande estadista africano, havia insistido em que sua naçã o aguardasse até que todos os paı́ses
maispobresrecebessemajuda.OSr.Ngumofoitã ogenerosoapontodepermitirqueareuniã o,
programada para realizar-se em Gaborone, fosse transferida para Joanesburgo, porque o
aeroportodacapitaldeBotsuanaaindanã otinhacondiçõ esdeacomodaraenormeaeronaveda
CG.
Quandotomouconhecimentodessareuniã o,opotentadoRehoboth,dosEstadosUnidosda
Africa,proporcionoutodasascondiçõ esparaareuniã o,oferecendo-se,inclusive,paraparticipar
dela em prol da diplomacia. A Comunidade Global recusou polidamente essa oferta, uma vez
que o assunto a ser tratado era mais de natureza pessoal que polı́t ica. O potentado Rehoboth
recebeuapromessadequeteriaumencontropessoalcomSuaExcelência.
Deve ter havido um mal-entendido da parte de Rehoboth, porque ele supô s que o
potentado Carpathia participaria da reuniã o com o Sr. Ngumo. Embora a CG desconhecesse
qualquer reaçã o de inveja ou raiva pelo fato de Rehoboth ter sido excluı́do da reuniã o, o
potentado regional zangou-se a ponto de responder de maneira sanguiná ria. Deu ordens para
assassinarNgumoeseusassessores,substituiu-osporimpostoreseentrounoComunidade Global
Um(oCondor216)paraassassinarSuaExcelência.
Apesar de seus capangas terem conseguido destruir a aeronave e matar quatro
funcioná rios nossos, os gestos heró icos do piloto e do co-piloto — Capitã o Montgomery (Mac)
McCullum e Sr. Abdullah Smith — salvaram a vida do supremo comandante. As Forças
Paci icadoras da Comunidade Global reagiram de imediato, o que resultou na morte dos
assassinos.
Fotogra ias da imponente comemoraçã o em honra ao piloto e co-piloto ilustravam o
artigo. Seis dias depois,AVerdade esmiuçou a histó ria. Buck descreveu os fatos dentro de seu
estilojovial:
A Comunidade Global nã o quer que os cidadã os tomem conhecimento de que o
relacionamento entre Carpathia e Ngumo tinha fracassado havia muito tempo. Ngumo nã o foi
assim tã o magnâ nimo como eles nos levam a crer. Ele deixou seu cargo na ONU sob forte
pressã o, acreditando que seria nomeado um dos dez potentados regionais e que Botsuana
receberia autorizaçã o para usar a fó rmula fertilizante descoberta em Israel, da qual Carpathia
temseaproveitadoparanegociarcommuitosoutrospaíses.
Ngumo, que quase chegou a ser endeusado, tornou-se um pá ria em seu paı́s por ter sido
vergonhosamentepassadoparatrá spelaComunidadeGlobal.Afó rmulanuncalhefoientregue.
Areconstruçã odeBotsuanafoiesquecida.Ngumoviusuatã osonhadaposiçã odepotentadoser
concedidaaseuarqui-rival,odé spotaRehoboth—quesaqueouapró priaterranatal,oSudã o,
parafavorecersuasinú m erasmulheresedescendentes,transformando-osemmultimilioná rios.
Esse homem tornou-se tã o impopular no Sudã o que desistiu de instalar o opulento palá cio
regional da CG em Cartum, instalando-o em Joanesburgo, um local impró prio por ser tã o
descentralizadoquantoaCidadedoCabo.
Sabendo que Rehoboth e Ngumo eram inimigos ferrenhos, a CG programou
deliberadamente uma reuniã o de alto nı́vel no territó rio de Rehoboth, a bordo doCG Um.
Rehoboth imaginou que Carpathia estivesse a bordo e vulnerá vel ao ataque, porque Ngumo
també machavaqueeleestivesseabordo.Essaarmaçã oparainsultarNgumotambé menganou
Rehoboth,quehaviasidoconvidadoparaareuniã o,oqueseriamaisumasurpreendenteafronta
aNgumo.
Opessoalqueescapoucomvidafoimaisafortunadoqueheró ico.AsForçasPaci icadoras
da CG, dominadas por Rehoboth, nã o reagiram durante vá rios minutos apó s o aviã o ter-se
incendiado. Os assassinos nã o foram alvejados. Um deles fugiu, dois morreram por causa da
pragadafumaça,fogoeenxofre,conformeaconteceucommuitasoutraspessoasnaqueledia.
Rehoboth sabia de tudo e permaneceu em seu palá cio durante os momentos em que ele
achavaqueCarpathiaestavasendoexecutado.DepoisqueascoisasdesandaramequeRehoboth
foi eliminado, as forças paci icadoras entraram novamente em açã o e conseguiram dominar a
á rea. A morte da famı́lia inteira de Rehoboth, atribuı́da pela CG à praga, foi visivelmente uma
execuçã o. Até agora, a praga matou cerca de 10% da populaçã o da Terra. Qual a explicaçã o
que algué m daria para o fato de todos os membros de uma famı́lia tã o numerosa terem sido
atacadosemumsódia?
A revista virtual de Buck comentou todos os disparates do regime de Carpathia,
mencionando a "predileçã o por maquiar uma tragé dia internacional, imaginando que você s se
preocupamcomosdesfilesemhomenagemaopotentadoenquantoamorterondaomundo".
David gostava de ouvir clandestinamente as conversas nos escritó rios de Carpathia e
FortunatosemprequearevistasemanaldeBuckerapublicadanaInternet.
—Oque izemosaté agorapararastrearessarevista?-inquiriuCarpathiaaLeonnaquela
manhã.
—Temosumdepartamentointeirotrabalhandoemtempointegral,senhor.
—Quantos?
—Escalamos70,mas,emrazãodosrecentesproblemas,eudiriaquetemosuns60.
—Deveriaserumnúmerosuficiente,não?
—Deveria,senhor.
—Onde ele está conseguindo as informaçõ es? Parece que ele está acampado do lado de
foradenossaporta.
—Osenhormesmodissequeeleeraomelhorjornalistadomundo.
— Isso nã o tem nada a ver com habilidade para escrever, Leon! Eu poderia acusar esse
sujeitodeestarinventandocoisas,masnóssabemosqueelenãoestá.
Naquela tarde, David recebeu um memorando de Leon, pedindo-lhe que os detectores de
metal destruı́dos no incê ndio do aviã o fossem substituı́dos "antes que Sua Excelê ncia apareça
em pú blico novamente". Aquele pedido deu uma idé ia a David. Talvez ele pudesse ter uma
participaçã o na morte de Carpathia. Que tal se ele conseguisse provocar um defeito nos
detectores de metal nos pontos estraté gicos? Se ele podia montar computadores cheios de
truques,seráquenãoseriacapazdeprovocarumdefeitonosdetectoresdemetal?
DavidrespondeuoseguinteaLeon:"SupremocomandanteFortunato,providenciareipara
que os novos detectores de metal sejam entregues e instalados no Fê nix 216 daqui a dez dias.
Nessemeio-tempo,pedireià tripulaçã oqueexaminecadadetalhedoaviã oparaquetudoesteja
dentrodospadrõ esexigidospelopotentado.Supervisionareitudopessoalmentecomaajudada
tripulaçãodacabinadecomando."
David e Annie, em conjunto com Mac e Abdullah, que aos poucos iam se recuperando,
passaram suas horas de folga instalando no Fê nix um dispositivo de escuta clandestina de
tecnologiatã oavançadaqueosomrecebidonosfonesdeouvidodopilotoedoco-pilototinham
quaseamesmaqualidadedosomproduzidoemestúdiosdegravação.
Quando tudo estava terminado, David pediu a seus té cnicos de primeira linha que
examinassemoaviã oà procurade"grampos".Umaequipedequatroespecialistasvasculhoua
fuselagemduranteseishorasenãoencontrounada.
Rayforddivertiu-seaoverBoHansontentandoconseguirumacarona,doladodeforados
portõesdoAeroportodePalwaukee.
—Quebobalhão!—eledisse.
T,quecontinuavasentadodiantedesuamesanatorre,perguntou:
—Oqueeleestáfazendo?
— Pedindo carona. Falta de combustı́vel. — Em seguida, Rayford virou-se para pegar o
telefone. — Acho que preciso dizer a Dwayne Tuttle como chegar até aqui. — T começou a
levantar-se.—Fiqueaí.Aligaçãovaiserrápida.
—Tenhoumassuntopararesolver—disseT.—Podemosconversardepois?
Rayford consultou seu reló gio enquanto o telefone de Tuttle tocava. — Posso icar mais
umpouco.
ASra.Tuttleatendeu.Enquantoseapresentavaelhefalavasobreose-mailsdesua ilhae
comoconseguiraonú m ero,Rayfordcaminhouaté ajanela.TrudychamouDwayneaotelefone,
e Rayford icou satisfeito por nã o precisar falar durante esse pequeno intervalo de espera, por
causadosustoquelevou.Tdirigira-seaté ocarrodeBoeestavadespejandogasolinanotanque
comumalata.Seráqueosdoiseramconiventes?SeráqueToenganaraessetempotodo?
Alguma coisa lhe dizia que, se ele tivesse mais alguns instantes para re letir, encontraria
umaoutraexplicaçã o.Tnã ohaviasidomordidopelosgafanhotos.TinhaoselodeDeusnatesta.
Conhecia as pessoas da igreja, dizia coisas coerentes, parecia sincero. Mas estaria agora a
serviçodoinimigo?AjudandoohomemresponsávelpelafugadeHattie?
—Sr.Steele!—disseDwayne.
—Sr.Tuttle,oupossochamá-lodeDart?
Tretornou,subindolentamenteaescadaenquantoRayfordterminavaseusacertosparaa
viagemà França.Depoisdedesligar,eleolhouparaTcomardeinterrogaçã o.Ambosestavam
sentadosfrenteafrente.OsemblantedeTeratãosombrioquantoodeRayford.
—Vocêpensaqueeunãovi?—perguntouRayford.
—Viuoquê?
—Oquevocêacaboudefazer.Aqueleassuntoquevocêprecisavaresolver.
—Oquefoiqueeufiz?Rayfordrevirouosolhos.
— Eu vi você , T. Estava fornecendo gasolina a Bo. T lançou-lhe um olhar como que
dizendo:"Edaí?"
—Osujeitoque...
—EuseiquemBoé,Ray.Estoucomeçandoaquerersaberquemvocêé.
—Eu?Eunãosou...Tlevantou-se.
—Vocêquervernovamentemeuselo,nãoquer?Vamos,podever.
Rayford estava atô nito. Como a situaçã o poderia ter chegado a este ponto? Eles eram
amigos,irmãos.
—Eunã oprecisoverseuselo,T.Só quero saber o que você tinha em mente quando fez
aquilo.
—Eupediparafalarcomvocê,Ray.Lembra-se?
—Sim,edaí?
—EuqueriasaberoquevocêtinhaemmentequandofaloucomBo.
—Qualé omisté rio,T?Euconseguideleainformaçã odequeprecisava.Nã ooajudeinem
oacobertei.
—Comoeufiz.
—Comovocêfez.
—Éissooquevocêachaqueeufiz?
—Queoutronomeeupoderiadaraoquevocê fez,T?Você sdoisestã otrabalhandocontra
mim,pelasminhascostas,éisso?
Tsacudiuacabeçatristemente.
—Eissomesmo,Ray.Estouagindodecomumacordocomumrapazquenã otemnadaa
perder,sóparatrairmeuirmãocristão.
—Éoqueparece.Oquemaiseudeveriapensar?
Tlevantou-seecaminhouaté ajanela.Rayfordnã oencontravaexplicaçã oparaaatitude
doamigo.
— Você deveria pensar, Ray, que Bo Hanson nã o vai durar muito neste mundo. Ele vai
morrerevaiparaoinfernocomoaconteceuoutrodiacomseuamigoErnie.Eleénossoinimigo,
claro, mas nã o é algué m que devemos tratar como um canalha, só para que ele nã o descubra
quemsomos.Elejá sabequemsomos,irmã o.SomosseguidoresdeBen-Judá eacreditamosem
Jesus.Nã ofazemosbarganhascomsujeitoscomoBo,Rayford.Nã onosdivertimoscomeles,nã o
mentimosparaeles,nã oroubamosdelesnemfazemoschantagemcomeles.Nó samamosessa
gente.Suplicamosporeles.
— Bo é tã o ingê nuo — prosseguiu T -, que lhe passou todas as informaçõ es de que você
necessitava sem pensar nas conseqü ências que ele teria. Nã o estou dizendo que tenho todas as
respostas, Ray. Nã o sei qual seria a outra maneira de conseguirmos as informaçõ es, mas sua
atitude nã o me pareceu ser a de um cristã o. Eu preferia quevocê tivesse comprado a
informaçã o. Que ele fosse o vilã o. Você foi tã o vilã o quanto ele. Bem, já falei demais. Entenda
comoquiser,mas,deagoraemdiante,medeixeforadesseassunto.
Buck imaginou que encontraria Chaim Rosenzweig na cadeira de rodas, mas o israelense
estava do mesmo jeito que ele o vira na ú ltima vez. Pequeno, magro, um pouco mais velho,
cabelosbrancosesvoaçantes.Eumsorrisosinceronorosto.Eleabriuosbraçosparareceberum
abraço.
—Cameron!Cameron,meuamigo!Comovai?Quebomvervocê .Eumafelicidadepara
meusolhoscansados!OqueotrouxeaIsrael?
— Você , meu amigo — disse Buck enquanto Chaim o conduzia pelo braço até a sala de
visitas.—Estamostodospreocupadoscomvocê.
—Ora!—disseChaim,fazendoumgestodepoucocaso.-Tsionestá preocupadopensando
quenãovaimeconverterantesqueoscavalosmepisoteiem.
—Elenãodeveriaestarpreocupado?Possodaraeleanotíciadesuaconversão?
—Talvez,Cameron.Masvocê nã oprecisariaperguntar,certo?Você s,quepodemveros
cavalos,tambémpodemverosselosunsdosoutros.Eentão?Omeuseloestávisível?
A maneira como Chaim disse a palavrameu fez o coraçã o de Buck dar um salto. Ele
inclinou-separaafrente,masnãoviunada.
—Nóspodemosveroselonatestadenossoscompanheiros—disseBuck.
—Epodemvertambémoshomenspoderososmontadosemcavalos-leões,eusei.
—Vocênãoacreditanisso.
—Vocêacreditariaseestivesseemmeulugar,Cameron?
— Ora, Dr. Rosenzweig, eu já estive em seu lugar. Lembra-se? Fui jornalista, fui um
homem pragmá tico, racional. Ningué m conseguia me convencer enquantoeu nã o me
convencesse.
OsolhosdeChaimbrilhavam,eBuckselembroudoquantoaquelehomemgostavadeum
bomdebate.
—Querdizerqueeunãodesejoserconvencido,certo?-perguntouChaim.
—Talvez.
—Eissonã ofazsentidoparavocê ,faz?Porqueeunã ohaveriadequerer?Euquero que
seja verdade! Que maravilha! Assim eu teria uma resposta para essa loucura, um alı́vio para
tantosofrimento.Ah!Cameron,estoupertodeacreditar,maisdoquevocêimagina.
—Foioquevocêmedissenaúltimavez.Receioquevocêdemoremuitotempo.
— Todo o pessoal que trabalha para mim se converteu, você sabe. Jacov, sua esposa, a
mãedela,Stefan.Jonastambém,masnósoperdemos.Vocêficousabendo?
—Fiquei.Foiumapena.
Derepente,Chaimperdeuosensodehumor.
— Veja, Cameron, eu nã o entendo essas coisas. Se Deus é tã o bom quanto você diz,
preocupa-se com seus ilhos e é todo-poderoso, nã o haveria uma maneira melhor? Por que
enviar julgamentos, pragas, destruiçã o, morte? Tsion diz que já tivemos a nossa oportunidade.
Entã o,agoranã ohá maisningué mbonzinho?Existeumacrueldadetã ograndeemtudoissoque
obscureceoamorqueeudeveriaenxergar.Buckinclinou-separaafrente.
— Tsion també m diz que até mesmo este perı́odo de sete anos de tribulaçã o é mais do
quemerecemosdeDeus.Nó snã oacreditá vamosporquenã opodı́amosver.Agora,nã ohá mais
dúvida.Estamosvendo,e,mesmoassim,opovocontinuaresistenteerebelde.
Chaimmergulhouemsilêncio.Emseguida,bateucomasmãosnosjoelhos.
— Bem — ele disse inalmente -, nã o se preocupe comigo. Confesso que estou sentindo
minhaidade.Estoucommedo,assustado,presoemcasa.Nã opossomaismeaventurarasair.
Carpathia,emquemeuacreditavacomoacreditariaemumfilho,provouserumenganador.
Buckqueriaaprofundaroassunto,masnã oseatreveu.Qualquerdecisã otinhadepartirdo
próprioChaim,enãodeumaidéiaplantadaporBuckououtrapessoaqualquer.
—Estouestudando—disseChaim.—EstouorandoparaqueTsionestejaenganado,que
aspragaseastormentasnãocontinuemapiorar.Procuromemanterocupado.
—Comoquê?
—Projetos.
—Ciênciaeleitura?
—Eoutrascoisas.
—Porexemplo?
—Ora,Cameron,hojevocê está agindocomoumjornalista.Tudobem,euvoulhecontar.
Meusempregadosachamque iqueimaluco.Talvez.Compreiumacadeiraderodas.Você quer
vê-la?
—Vocêprecisadeumacadeiraderodas?
— Ainda nã o, mas logo vou precisar. O sofrimento causado pelos gafanhotos me
enfraqueceu.Acontagemdegló bulosnosangueeoutrostestesrevelaramqueestouameaçado
desofrerumderrame.
— Você está tã o saudá vel quanto um cava... um touro. Rosenzweig endireitou-se na
cadeiraeriualto.
—Gostei.Ningué mmaisquersersaudá velcomoumcavalo.Masnã oé omeucaso.Corro
umsérioriscoequeroestarpreparado.
— Parecem palavras de um homem derrotado, doutor. Com uma dieta bem dosada,
exercícios,arpuro...
—Eusabiaquevocêdiriaisso.Queroestarpreparado.
—0quemaisvocêestápreparando?
—Comoassim?
—Noquevocêestátrabalhando?Emsuaoficina?
—Quemlhecontou?
— Quem me contou nã o sabe de nada. Jacov simplesmente mencionou que você passa
muitotempolá.
—Éverdade.
—Oqueé?Oquevocêestáfazendo?
—Projetos.
—Eununcasoubequevocêtivessehabilidadeparaisso.
—Hámuitascoisasquevocênãosabesobremim,Cameron.
—Possoconsiderá-loumamigoquerido,Dr.Rosenzweig?
—Eugostariamuito.Masserá queumamigoqueridodevesereferiraooutrodemaneira
tãoformal?
—Édifícilparamimchamá-lodeChaim.
— Chame-me do que você quiser, mas você é um amigo querido e me sinto muito feliz
porserseuamigotambém.
—Então,querosabermaissobrevocê.Sehouvermuitacoisasobrevocêqueeunãosaiba,
nãovoumesentirseuamigo.
Chaim afastou a cortina e olhou para fora. — Hoje nã o há fumaça. Mas ela vai voltar.
Tsiondizqueoscavaleirosnãonosdeixarãoempazenquantonãoforexterminadaaterçaparte
dahumanidade.Vocêpodeimaginarcomoficaráomundo,Cameron?
—Sobraráapenasmetadedapopulaçãoquerestoudosdesaparecimentos.
—Estamospresenciandoofimdacivilização.TalveznãosejacomoTsionpensa,masestá
acontecendoalgumacoisa.
Buck nã o disse nada. Chaim nã o havia feito caso de seus argumentos, mas talvez se ele
nãopressionassetanto...
Rayfordabaixouacabeça.Suavozestavatrêmulaerouca.
—T,eunãoseioquedizer.
—VocêsoubeoquedizeraBo.Fezdeleum...
Rayfordlevantouumadasmã os.—Porfavor,T.Você temrazã o.Eunã oseioqueestava
pensandonaquelemomento.
—Vocêpareciaestargostando.
Rayfordqueriasumirdali.—QueDeusmeperdoe,maseugostei.Oqueestá acontecendo
comigo?Parecequeenlouqueci.Emcasa,eupercoasestribeiras.Leah,apessoadequemjá lhe
falei,conseguiutiraroquehaviadepioremmim...Nãopossoculpá-laporisso.Tenhosidomuito
grosseirocomela.Eunãoestoumeentendendo.
—Sevocê seentendesse,já estarialongedaqui.Nã osejatã oduroconsigomesmo,irmã o.
Vocêestáestressado.
— Todos nó s estamos, T. Até Bo. Você sabe que minha bronca nã o é de hoje. Sempre
acheiqueBonãopassadeumsalafrário.
—Eleéumsalafrário,Ray.Masétambém...
— Eu sei. E o que estou dizendo. No dia em que eu conheci aquele rapaz, ele estava
falandomaldoscrentes,e,desdeentã o,crieiumaantipatiaporele.Euqueriacolocá -loemseu
devidolugarefiqueifelizquandoaoportunidadechegou.Santinhoeu,hein?
Tnãoargumentou.Rayfordentendeuaatitudedele.
—Oqueeudevofazeragora?Correratrá sdeBoecomeçaraagircomoumcristã ocom
ele?
Tsacudiuacabeçaeencolheuosombros.
—Seilá.Achoqueomelhorquevocêtemafazerésumirdavidadele.Sevocêmudarseu
comportamentoradicalmente,elevaidesconfiar.
—Eudeveriaaomenosmedesculpar.
—Nã o,amenosquevocê estejaprontoparaprovar,pagandopelainformaçã oqueelelhe
deu.
—Agoraelepassouaserobomeeuomau?
—JamaisvoudizerqueBoé umbomsujeito,Ray.Eutambé mnã odissequevocê é mau.
Foivocêquemdisse.
Rayfordsentou-secomosombroscurvadosdurantealgunsminutosenquantoTmexiaem
suapapelada.
— Você é um bom amigo — disse Rayford, inalmente. — Tenho de ser sincero. Outras
pessoasnãoteriamsepreocupadocomigo.
Tcontornousuamesaesentou-seemumadaspontas.
—Achoquevocêfariaomesmopormim.
—Comosevocêestivesseprecisando.
—Porquenão?Tambémacheiquevocênãoestivesseprecisando.
—Bem,dequalquerforma,obrigado.Tcutucou-lhenoombro.
—Eentão?OquevocêacertoucomosTuttles?VaipilotarumSuperJ?
—Vocêachaqueeusaberia?
— Depois de todos os aviõ es que você pilotou? Dizem que quem sabe pilotar um
Gulfstream, que é grande, sabe també m pilotar o Super J, um modelo mais rá pido. Talvez um
PorscheemrelaçãoaumChevy.
—Voupilotaresseaviãocomosefosseumadolescente.
—Achoquevocêestáansiosoporisso.
A princı́pio, David icou entusiasmado, e, logo a seguir, alarmado quando recebeu um emailpessoaldeTsionBenJudá noinı́c iodanoitedodiaseguinte.Depoisdea irmaraDavidquegostariadeconhecê loantesdoGloriosoAparecimento,Tsionpassouparaoassuntoprincipal.
Eu nã o consigo entender tudo aquilo que você é capaz de fazer milagrosamente por nó s
comessasuatecnologiagenial.Normalmente,nãomeintrometonosaspectospolíticosdenosso
trabalho e nem sequer questiono o que está se passando. Fui chamado para transmitir
ensinamentosbı́blicos,equeropermanecerconcentradonessaminhamissã o.ODr.Rosenzweig,
de quem tenho certeza você já ouviu falar, ensinou-me muita coisa quando eu lutava para
entender botâ nica nos meus tempos de faculdade. Minha especialidade está voltada para
histó ria,literaturaelı́nguas;ciê ncianã ofazmeugê nero.Depoisdeesforçosconstantes,resolvi
recorrer ao Dr. Rosenzweig. Ele me disse: "A coisa principal é manter a coisa principal como
sendoprincipal."Emoutraspalavras,hánecessidadedeconcentração!
Portanto, eu estou aqui concentrando-me e deixando para o capitã o Steele e sua ilha a
tarefa de organizarem a cooperativa, deixando para Buck a missã o de transmitir furtivamente
sua revista, e assim por diante. Mas, Sr. Hassid, temos um problema. Permiti que o capitã o
Steelelevasseadiantesuaidé iadeencontrarHattie(seiquevocê está apardesteassunto)sem
perguntar-lhe se ele já havia descoberto o que Carpathia sabe a respeito do paradeiro daquela
moça.
Ningué m,anã oseraspessoasmenosavisadas,acreditaqueelaafundounomardentrode
um aviã o. Se a CG permitiu que aquele boato circulasse, é sinal de que eles tê m as cartas na
mã o. Meu receio, evidentemente, é que eles agora se sintam livres para descobrir o paradeiro
delaematá-la,porque,aosolhosdopúblico,elajáestámorta.
A ú nica vantagem que ela leva em ingir que está morta é pô r Carpathia em situaçã o
constrangedoraouatémesmoperigosa.
Só posso dizer o seguinte: tenho a impressã o de que ningué m que trabalha com você na
escutaclandestinaouviufalarqueCarpathiatemconhecimentodeondeelaseencontra.Acho
que,paraRayford,teriasidomaisprudenteesperarumpoucoeprocurá -laapenasdepoisdeter
acertezadequenãoestariacaindoemumaarmadilhadaCG.
Possoserumintelectualparanóicoquedeveriaater-seunicamenteaseutrabalho,mas,se
você conhecesseahistó riademinhavida,saberiaquejá fuivı́t imadeviolê nciaporpartedesse
sistemamundialdemonı́aco.Eugostariadesaber,Sr.Hassid,seexistealgumapossibilidadede
descobrir uma pista, por mais remota que seja, que pudesse ser transmitida rapidamente ao
capitã oSteeleantesqueelemergulhecegamenteemumasituaçã odeperigo.Sevocê pudesse
ter a gentileza de me con irmar o recebimento destee-mail e me dizer se acredita que existe
umainformaçãoqualquerquenospossaserútil,eulheficariaimensamentegrato.
NonomeimaculadodeCristo,
TsionBen-Judá.
Daviddigitourapidamenteumaresposta:
Estouemdú vidasobreasprobabilidadesdesucesso(umavezquetenhomonitoradotodas
as conversas telefô nicas e transmissõ es por computador do pessoal do alto escalã o e até agora
nã o ouvi nada a respeito de Hattie), mas darei total e imediata atençã o a este assunto.
CompreendosuapreocupaçãoetransmitireiaocapitãoSteele,pormeiodeseutelefonesigiloso,
todas as informaçõ es pertinentes. Eu poderia me estender mais, poré m nã o posso perder um
minutosequer.
David vasculhou freneticamente seulaptop, acessando o compacto disco rı́gido, entrando
no possante computador do palá cio e decodi icando cada arquivo criptografado. Procurou
referê ncias aHattie, Darham, HD, assistente pessoal, amante, gravidez, ilho, fugitiva, acidente
aéreo,eoutraspalavrasqueconseguiulembrar.Evidentemente,tudooquehaviasidofaladonos
escritó rios administrativos durante semanas estava gravado em seu minidisco de alta
tecnologia, mas os ú nicos subtı́t ulos que se encontravam ali eram datas e locais. Nã o havia
tempo para ouvir tudo o que Fortunato e Carpathia disseram desde que Hattie foi dada como
morta.
David ligou para Annie, que se dirigiu apressada ao escritó rio de seu noivo. Ele fechou as
persianas e trancou a porta para que ningué m do turno da noite pudesse vê -lo andando de um
ladoparaooutro,passandoamãonoscabelos.
— O que devo fazer, Annie? Tsion tem razã o. Rayford está cometendo um grave erro,
mesmoquesejabem-sucedido.Você sabequeaCGestá mantendoHattiecon inadaemalgum
lugar ou a matou. Com certeza, há guardas vigiando o local onde ela deve estar escondida.
Qualquer pessoa que se atreva a ir atrá s dela, vai ter de enfrentar a CG. Ela nã o passa de uma
isca.Rayforddeveriasaberdisto.
—Penseemalgumacoisa—eladisse.
—Queroquevocêmeajude.
— Eu gostaria de ajudá -lo, David, mas concordo que você está procurando uma agulha
no...
—OqueopessoaldoComandoTribulaçã odosEstadosUnidosestavapensando?QueaCG
caiunocontodoacidenteaé reo?Elesdeviamsermaisespertos!Só iqueisabendoqueRayford
estava atrá s dela depois que ele já havia partido. Por que ele nã o recorreu a mim, em ú ltima
instância,paravasculharoserviçodeinteligênciadaCG?
Anniesacudiuacabeça.
—Vocêachaqueestámuitoseguro,David?
—Oquê?
— Você tem acesso aos computadores deles, aos escritó rios deles, ao aviã o deles, aos
telefonesdeles.Seráqueninguémaindadesconfioudevocê?
— Nã o. A demora na instalaçã o dos computadores poderia ter levantado suspeitas, mas
nã opercebinenhumareaçã oemLeon.Seeutivessedeadivinhar,diriaqueelecon iamuitoem
mim.Tenhomuitosdedosnofogodeumasó vezepossomequeimar,masporenquantoestou
nalistadoshomensdeouro.
—Aíestáaresposta,super-homem!
—Nãomevenhacomenigmas.Rayfordjáembarcoueestáemplenovôo.
—Pergunteaeles.
—Comoassim?
—FalediretamentecomLeon.Digaaelequeoassuntonã oé dasuaconta,masquevocê
tem pensado muito sobre estas notı́c ias do acidente aé reo, que você sempre admirou sua
perspicá cia, sua sabedoria, sua esperteza... Você conhece as manhas. Insinue que talvez o
acidente nã o tenha acontecido conforme foi divulgado, e diga que gostaria de saber a opiniã o
dele.
—Annie,vocêéumgênio!
CAPÍTULO15
— Você gostaria de ver meus projetos, Cameron? — perguntou Chaim Rosenzweig. —
Seráque,depoisdevê-los,vocêficariamaissatisfeito,sesentiriamaismeuamigo?
—Comcerteza!
— Prometa que nã o vai me achar um maluco, um velho excê ntrico, como meus
empregadospensam.
Buck o acompanhou. Apesar da opiniã o que os irmã os e irmã s que trabalhavam na casa
tinhamarespeitodeChaim,eleestavamuitolúcido.
Rayford conheceu os Tuttles, um casal de norte-americanos cujos quatro ilhos adultos
foramarrebatados.
—Enó sperdemosachance...—disseDwaynenoSuperJ.cruzandooscé usdolestedos
Estados Unidos. — O mais velho foi para a faculdade, e achamos que ali se envolveu com
religiã o. Até aı́ tudo bem, só que ele começou a pregar aos outros trê s irmã os. De repente, o
mais novo passou a freqü entar a igreja també m. Foi bom, mas achamos que ele só estava
seguindooexemplodoirmãomaior,seuherói.
— Em seguida — prosseguiu Dwayne -, os dois do meio foram convidados para uma
atividadedaigreja.Achoqueelesjamaisteriamidoaliseosirmã osnã otivessemseconvertido.
Eles começaram a jogar no time de basquete da igreja, passaram uma semana num
acampamentoevoltaramsalvos.Homem,eudetestavaessapalavra,eelesausavamotempo
todo."Eufuisalva,elefoisalva,elafoisalvo,vocêprecisasersalvo..."Euamavaaquelesrapazes
maisdoquetudonavida,mas...
Dwayne, que falava muito rá pido, foi tomado subitamente pela emoçã o, e Rayford
demoroualgunsinstantesparapercebercomoeleestavacomovido.Agoraaquelehomenzarrã o
falavacomvozembargada,esforçando-separanã ochorar.Trudy,sentadanobancoatrá sdele,
pousouamãoemseuombro.
— Eu amava aqueles garotos — ele disse, com voz entrecortada por soluços -, e nunca
tivenenhumproblemacomeles,mesmodepoisquesetornaramreligiosos.Nuncativemesmo,
nãoéverdade,Tru?
— Eles amavam você , Dwayne — ela disse, pronunciando lentamente as palavras. —
Vocênuncaprecisoufazermarcaçãocomeles.
—Maselesfizerammarcaçãocomigo.Nãoerapormal,mascomoinsistiam!Eudiziaque
tudo estava bem, desde que eles nã o icassem pedindo que eu fosse à igreja com eles. Nunca
gostei disso desde criança, me trazia má s recordaçõ es. Eles diziam que aquela igreja era
melhor.Eutambé machava,maspediaqueelesmedeixassemempaz.Elesmediziamqueeu
eraresponsávelpelasalvaçãodaalmadamãe
deles. Aquilo me deixava furioso, mas como a gente pode icar furioso com os pró prios
ilhosquando,mesmoestandoerrados,elessepreocupamcomaalmadesuamã eedeseupai?
Rayfordconcordou,balançandoacabeça.
—Agentenãopodemesmo...
— Claro que nã o. Eles continuaram a insistir comigo. Queriam me vencer pelo cansaço.
Maseutambé merabomnisso.Eununcacaı́ nalá biadeles.Truquasecaiu,nã ofoimesmo,meu
bem?
—Eugostariadetercaído.
—Eutambé m,querida.Nó ssó ı́amosconheceroSr.Steelenocé u,eeubemquegostaria
deirlogoparalá,depoisdetudooqueestáacontecendo.Vocêtambém,capitão?
—Eutambém,Dwayne.
— Acho que você já adivinhou o resto da histó ria. Antes de resolvermos ir para a igreja,
aconteceu a coisa que eles nos disseram que ia acontecer. Eles sumiram. Nó s sobramos. Para
ondeagentefoilogoemseguida?
—Paraaigreja.
—Igreja!Deixamosdesertã oteimosos,nã o?Sersalvonã oeramaisumabobagem.Nã o
sobrou quase ningué m daquela igreja, mas a gente só queria encontrar algué m que soubesse o
que era preciso fazer para ser salvo. Sr. Steele, eu sou um artista. Bem, na verdade sou um
vendedoredemonstradordeaeronaves,massempregosteideteatro,desdeafaculdade.Eume
especializeiemimitarvozes.
—Macmecontouquevocêimitabemosotaqueaustraliano.
—Issomesmo.Elegostou,não?
—Nã oseisenaquelemomentoMacestavaemcondiçõ esdegostar,maseletemcerteza
dequevocêconseguiuenganarFortunato.
—Até umatartarugasurdapoderiaenganaraquelesujeito,Rafe.Você nã oseimportade
serchamadodeRafe,não?Gostodeencurtaraspalavrasparatertempodefalarmais.Ésóuma
brincadeira,masvocênãoseimporta,nãoémesmo?
—Eraassimqueminhaprimeiramulhermechamava.Elafoiarrebatada.
—Então,achoquevocênãogostariaqueeu...
—Nãosepreocupe,podeprosseguir.
— Quero dizer, Rafe, que sou um sujeito comunicativo. Acho que você já percebeu. Um
vendedor tem de ser assim. Mas eu nunca deixo de acrescentar um pouco de minha veia
artı́stica. Diziam que eu era sincero, determinado, e todos gostavam muito de mim. Só os
esnobes nã o gostavam. Quando encontrava pessoas desse tipo, eu usava a palavrasou quando
deveriausarsomos,sóparaprovocá-las.Enfim,souumcaraamigo,arrojado,umcara...
—Espalhafatosoéapalavraquevocêestátentandoselembrar,querido—disseTrudy.
Dwaynedeuumagargalhadacomosetivesseouvidoumapiadapelaprimeiravez.
—Está bem,Tru,concordo,souumcaraespalhafatoso.Masvocê temdeadmitirqueeu
era uma pessoa que fascinava todo mundo. Só que eu nã o ia à igreja, é verdade. De repente,
passei a ir. Estou salvo. Perdi muito tempo e tenho pouco dinheiro, mas estou aprendendo, e é
isso o que conta. Ainda vamos sofrer, vamos nos arrepender de nã o ter sido salvos antes, mas,
tudobem,agoraestamossalvos.Continuosendoestecaracomuni...
—Espalhafatoso.
—...espalhafatoso,masagorapasseiasertambé mumcarainsistente.Nã oparodefalar
sobre a salvaçã o. Até o nosso pastor diz que nã o entende como eu nã o afugento as pessoas de
tanto paparicá -las... o termo é dele, nã o meu... paparicá -las para aceitarem a Jesus. Aprendi
essaliçã oquandoeravendedor,masagoraé diferente.Nã osetratadeatingirminhameta,de
ganharumaboni icaçã ooudeversepossocomprarounã oumbeloaviã o.Aspessoasprecisam
saber, irmã o, que nã o estou vendendo nada. Agora estou falando de salvaçã o de almas. Bem,
sempre me empolgo quando falo disso. Gostaria de saber o que eu faria se encontrasse o
anticristo.Voulhedizerumacoisa,meuamigo,ou ele me mata ou ele se salva, uma coisa ou
outra.Sacou?Bem,fiqueianimadopornãoterdeixadodeserumbrave...brava...
—Bravateador—ajudouTrudy.
— Certo, fui um bravateador quando vi o ajudante nú m ero um do anticristo naquele dia.
Meu coraçã o parecia que ia explodir, nã o posso negar, mas e daı́? Sei que, mais cedo ou mais
tarde, eu vou morrer. Gostaria de estar aqui quando Jesus voltar, mas, se eu partir antes, tudo
bem.Nodia
em que aceitei a salvaçã o, decidi que nunca mais ia me envergonhar de falar de Jesus. Já
perditempodemais.Vouvermeusmeninosnovamente,e...
De repente, o intré pido Dwayne voltou a emocionar-se. Desta vez, ele nã o conseguiu
prosseguir.Trudypousounovamenteamã onoombrodomarido.EleolhouparaRayfordcomo
seestivessesedesculpando.Rayfordassumiuoscontroles,eoSuperJdisparoucomoumfoguete
nanoiteescura,emdireçãoaoleste.
— Que coisa estranha é esta? — perguntou Buck, olhando para uma tira de metal
superpolida.
Chaim caminhou pé ante pé até a porta e fechou-a. Buck compreendeu que estava
tomandoconhecimentodealgumacoisaqueRosenzweigaindanãorevelaraaninguém.
— Digamos que seja um passatempo que se tornou uma obsessã o. Nã o tem nada a ver
com meu trabalho, e nã o me pergunte o motivo dessa obsessã o. Estou tentando a iar
manualmente um objeto de metal de uma forma que ningué m conseguiu até hoje. Sei que
existem má quinas grandes com micrô m etros, computadores e raio laser que fazem este
trabalho quase com perfeiçã o. Nã o estou interessado em mecanismos arti iciais. Estou
interessado em fazer o melhor que posso. Minha habilidade manual ultrapassou minha
capacidade de enxergar. Com uma lâ mina presa em uma simples braçadeira instalada em
â ngulo,soucapazdedeixá -latã oa iadaquenã oconsigoenxergaro ioaolhonu.Nemmesmo
meusexcelentesó c ulosbifocaispodemmeajudar.Precisocolocaralâ minasobumaluzmuito
forteeusarumalupa.Acrediteemmim,istoémuitomaisinteressantedoqueaquelascriaturas
que você e eu analisamos sob a lupa um ano e meio atrá s. Aqui está , veja. Chaim entregou a
lupa a Buck e apontou para uma lâ mina brilhante, de cerca de um metro de comprimento,
presaentredoistorninhos.
— Tome muito cuidado, Cameron, para nã o tocar no io da lâ mina. Digo isto porque é
muitoperigoso.Antesdesentiro iodalâ minaencostaremsuapeleecomeçaradoer,você já
teráperdidoumdedo.
Depois desta advertê ncia, Buck olhou a lâ mina atravé s da lupa e icou atô nito. O io
pareciamuitasvezesmaisfinodoqueodequalquerlâminadebarbearqueelejávira.
—Puxa!—eledisse.
— A parte mais interessante é esta aqui, Cameron. Afaste-se um pouco, por favor. O
materialé aço-carbonosuper-resistente.Parece lexı́velcomoumalâ minadebarbearporqueé
a iadomicroscopicamente,masé rı́gidoeforte.Você sabeporqueumafacacomumperdeo io
comouso?Eporquequantomaiselaé a iadamaisrá pidasedeteriora?-Buckassentiucoma
cabeça.—Observeisso.
Rosenzweigtirouumatâmarasecadobolso.
—Umpetiscoparamaistarde—eleexplicou.—Masestaaquiaindanã ofoilimpaenã o
quero lavá -la. Tenho outras, portanto esta vai servir para você entender melhor o que estou
dizendo.Observe.
Ele segurou a tâ mara delicadamente pela pontinha, entre o polegar e o dedo mé dio. Em
seguida,levou-alentamenteecomextremocuidadoaté o iodalâ mina,colocandoapalmada
outramãoporbaixo.Ametadeinferiordatâmaracaiunamãodele,dandoaimpressãodequea
frutanãohaviasequerencostadonofiodalâmina.
—Agoravoulhemostrarmaisumacoisa.Rosenzweigolhouaoredordocômodoapinhado
debugigangaseavistouumaboladepano,secaedura,esquecidaporali.Elesegurouabolade
cerca de sete centı́m etros de diâ metro acima da lâ mina e soltou-a. Buck levou um susto, nã o
querendo acreditar no que acabara de ver. A bola havia se partido ao meio sem produzir
nenhumsome,aparentemente,semoferecernenhumaresistência.
—Vocêtambémviuoqueaconteceucomafruta—disseRosenzweig,comumbrilhonos
olhos.
—Éespantoso,doutor—disseBuck.—Mas,porquê?Chaimsacudiuacabeça.
—Nã omepergunte.Nã osetratadeumsegredodeEstado.Nemeumesmoseiexplicaro
quesepassacomigo.
Nofinaldaquelatarde,DavidapareceunasaladeesperadoescritóriodeLeonsemavisar.
— Eu gostaria de falar um minuto com o comandante, se for possı́vel — ele disse a
Margaret,queestavaseaprontandoparairemboradepoisdeumlongodiadetrabalho.
—DavidHassid?—disseLeonemvozaltapelointerfone.-Claro!Mande-oentrar.
QuandoDavidentrounasala,Leonlevantou-se.
—Querosabersevocêjáconseguiualgumacoisasobreaoperaçãorastreamento.
— Infelizmente nã o — disse David. — Aquela gente deve estar usando algum tipo de
tecnologiadaqualninguémaindaouviufalar.Voltamosaopontodepartida.
—Sente-se—disseFortunato.
—Nã o,obrigado—disseDavid.—Sereirá pido.Osenhorsabequenã otenhoohá bitode
aborrecê-locom...
—Porfavor!Soutodoouvidos!
—...assuntosquenã odizemrespeitoameudepartamento.AreceptividadedeFortunato
terminouali.
— E claro que, em minha posiçã o, tomo conhecimento de muitos assuntos con idenciais
quenãoposso...
—Tenhoumasugestãoafazer,emboraoassuntonãomedigarespeito.
—Prossiga.
—Bem...amorterecentedaex-assistentepessoaldeSuaExcelência...
Fortunatosemicerrouosolhos.-Sim?
—Foiumatragédia,éclaro...
—Sim...
—Bem,senhor,nãoerasegredoparaninguémqueaquelamulher,aSrta.Dunst...
—Durham.HattieDurham.Prossiga.
—...estavagrávidaenãosesentiafelizcomisso.
— A verdade, Hassid, é que ela estava tentando extorquir dinheiro de nó s para manter
segredodagravidez.SuaExcelê nciaachouquedeviarecompensá -lapelotempoqueeles...que
elespassaramjuntosepagou-lheumaquantiagenerosa.ASrta.Durhamdeveterentendidoque
aquele dinheiro lhe foi oferecido em troca de seu silê ncio, mas nã o foi. Veja, ela nunca se
preocupou em guardar segredo de coisas que pudessem ameaçar a segurança internacional,
nunca ocultou histó rias, verdadeiras é claro, que pudessem constranger o potentado. Portanto,
quando ela exigiu mais dinheiro, nó s recusamos. Sou forçado a dizer que ela nã o icou nem um
poucofeliz.
— Obrigado, senhor. O senhor me contou muitas coisas que eu nã o precisava tomar
conhecimento, mas ique descansado. Vou guardar segredo. Eu só queria perguntar sobre o
acidentecomoaviã o,masagoraissodeixoudeserrelevante.Agradeçootempoqueosenhor
gastoucomigo.
—Não,porfavor.Possolhecontartudooquevocêdesejasaber.
—Sinto-meumpoucoconstrangido,porque,conformeeudisse,seiqueoassuntonã ome
dizrespeito...nãoédaminhaconta.Pensandomelhor,achoquenãodevoinsistir.
—Porfavor,David.Queroconhecerseuspontosdevista.
—Está bem.Seique,tendoalgué maquicomsuacompetê nciaeperspicá cia,nã ohaveria
necessidadedequeeumepreocupassecomsegurançaourelações-públicas...
—Todosnósdevemosnospreocuparotempotodocomessascoisas.
—Tiveaimpressã odequeorelató riosobreamortedelafoimeiosuspeito.Querodizer,
talvez eu tenha lido muitos romances de misté rio, mas a histó ria nã o foi um pouco
inconsistente? Algué m encontrou os destroços do aviã o, os corpos? Alguns poucos objetos
pertencentesaelaseriamsuficientesparaprovarqueelamorreu?
— Sente-se, David. Eu insisto. Seu raciocı́nio tem ló gica. A verdade é que o tal acidente
comoaviãoemqueaSrta.Durhamviajavanuncaaconteceu.Assimquerecebemos
a notı́c ia, pedi ao chefe do serviço de inteligê ncia que investigasse os fatos. A Srta.
Durham, seu piloto amador e o aviã o foram rapidamente localizados. O piloto agiu de modo
imprudente, fugindo quando nosso pessoal pediu para interrogar a Srta. Durham. Infelizmente,
ele foi morto em uma troca de tiros. Você entende que, por motivos de segurança e princı́pios
morais,nemtodososincidentessãodivulgadosàimprensa.
—Claro.
—ASrta.Durhamestásobcustódia.
—Custódia?
— Ela se encontra em um local confortá vel e seguro em Bruxelas, protegida pela falsa
notı́c ia de sua morte. Essa moça nã o representa uma ameaça à Comunidade Global, mas
estamos preparando uma armadilha que nos leve até o local onde os companheiros dela a
esconderam.Elaserásoltaassimqueconseguirmospegá-los.
—Companheirosdela?
— Antigos funcioná rios da CG e simpatizantes de Ben-Judá proporcionaram-lhe asilo
quando a presença dela foi exigida em Nova Babilô nia. Eles representam uma ameaça muito
maiordoqueela.
— Quer dizer que ela se tornou uma isca sem querer e é responsá vel pelo que lhe
aconteceu.
—Exatamente.
—Eessaarmadilha,foiidéiadosenhor?
—Aquinóstrabalhamosemequipe,David.
—Masaidéiafoisua,não?Parececoisadeumapessoainteligentecomoosenhor.
Fortunatoergueuacabeça.
— Nó s nos cercamos de gente muito boa, e, quando ningué m se importa de receber o
mérito,seconseguemuitacoisa.
—Masaidéiadeprepararumaarmadilhaparaoscompanheirosdelafoisua.
—Acreditoquepodetersido.
—Edeucerto?
—Aindanã o.Ningué msabedamortedopiloto.Mandamosavisaroirmã odele,cú m plice
nessahistória,dizendoqueeleestavaescondidoequenãodarianotíciasporváriosmeses.
—Brilhante!
Fortunatoassentiucomacabeça,dandoaentenderquenãopodiacontestar.
— Nã o vou mais tomar seu tempo, comandante. De agora em diante, vou tirar esse tipo
depreocupaçãodacabeça,porqueseiqueosenhoreseupessoalestãotomandocontadetudo.
— Nã o se sinta constrangido. Sempre que você tiver alguma dú vida, nã o hesite em
perguntar. Depositamos muita con iança em uma pessoa de seu nı́vel e com alto grau de
responsabilidade.Poucaspessoastêmacessoaessasinformações,éclaro,portanto...
— Nã o precisa dizer nada, senhor — disse David, levantando-se. — Nã o tenho palavras
paraexpressarminhagratidão.
Rayford pilotou um grande trecho sobre o Atlâ ntico, o que nã o serviu para diminuir a
verborragiadeDwayne.Emboragostassedeouvi-lopapaguear,RayfordqueriaconhecerTrudy
um pouco mais. Quando chegou o momento de devolver os controles a Dwayne, Rayford
resolveuligarparaAlbie(abreviaçã odeAlB.,nomeque,porsuavez,haviasidoabreviadodeAl
Basrah).Albieeraochefedocontroledotrá fegoaé reodeAlBasrah,umacidadelocalizadano
extremo sul do rio Tigre, perto do Golfo Pé rsico. Ele era conhecido por muita gente como o
melhor elemento no mercado clandestino. Mac o apresentara a Rayford, e foi Albie quem
forneceu o equipamento de mergulho para Rayford explorar o fundo do rio Tigre à procura dos
destroçosdeumavião.
Albie, um muçulmano devoto, detestava o regime de Carpathia e era um dos poucos
gentios nã o-cristã os que resistiam bravamente à Fé Mundial Enigma Babilô nia. Seus negó c ios
eram simples. Para as pessoas em quem con iava, ele fornecia qualquer coisa, desde que
recebesse dinheiro em troca. O dinheiro servia para cobrir o preço da mercadoria e das
despesas,e,sealgué mfossepegocomocontrabando,elea irmavaquenuncaouvirafalardessa
pessoa.
Naquelemomento,DwayneestavasurpreendentementequietoenquantoTrudycochilava.
Rayford vasculhou sua sacola e pegou seu celular fenomenal — termo que Mac usava para
descreverotelefonemontadoporDavid,porqueocelularfaziadetudoetransmitiadequalquer
lugar.
DwaynesónotouocelularquandoouviuotelefonedeAlbietocando.
—Istoé oqueeuchamodetelefone!Quemaravilha!Sim,é umtelefoneetanto!Aposto
queeleécapazdecaptarruídosquenuncaouvie...
Rayfordlevantouamãopedindosilêncioedisse:
—Daquiapoucoeudeixovocêexaminá-lo.
—Nãovejoahora,parceiro.Comcerteza,voudarumaolhadanele.
—TorredeAlBasrah,Albiefalando.
—Albie,éRayfordSteele.Podemosconversar?
—Aquatronósdoleste.Qualésuaposição?
—Queromeencontrarcomvocêparatratardeumacompra.
—Positivo.Sintopelofracassodamissãoanterior.Eoco-piloto?
—Macestáserecuperando.Tenhocertezadequevocêjáouviufalarsobre...
— Positivo. Aguarde um minuto, por favor. — Albie cobriu o fone com a mã o, e Rayford
ouviu-o conversando em sua lı́ngua. Em seguida, ele retornou. — Agora estou sozinho, Sr.
Steele.Lamentomuitooqueaconteceucomsuaesposa.
—Obrigado.
— Tenho andado muito preocupado com Mac. Fiquei sem notı́c ias dele por uns tempos.
Agoraqueelepassouacapitã o,nã oestá maisprecisandomuitodemeusserviços.Oqueposso
fazerpelosenhor?
—Precisodeumaarma,pequenaparaserescondida,maspoderosa.
—Emoutraspalavras,osenhorquerumacoisaquefaçaaquiloqueelaprecisafazer.
—Vocêentendeuemaltoebomsom,Albie.
—Muitodifícil.Opotentadoéumpacifista...
—Oquesignificaquevocêéoúnicofornecedordeconfiança.
—Muitodifícil.
—Masnãoimpossívelparavocê,certo?
—Muitodifícil—disseAlbie.
—Carodemais,éoquevocêquerdizer?
—Agoravocêestámeentendendoemaltoebomsom.
—Seodinheironãoforproblema,vocêteriaalgumacoisaemmente?
—Quandoosenhordizqueelaprecisaserescondida,oqueissosigni ica?Quepossapassar
pordetectoresdemetalsemsernotada?
—Épossível?
—Só seforfeitademadeiraeplá stico.Duasseqü ênciasdedisparos,trê sviolentos,aı́ ela
sedesintegra.Alcancelimitado,éclaro,atéseismetros.
—Precisodeumaquealcancemaisoumenos30metros.Umsódisparo.
— Sr. Steele, eu posso conseguir-lhe uma. E mais ou menos do tamanho de sua mã o.
Pesada,mascerteira.Opesoé porcausadomecanismodedisparo,quenormalmenteé usado
emriflesdetamanhogrande.
—Quetipodeação?
—Exclusiva.Usainjeçãoporcombustívelevácuohidráulico.
—Parecemaisummotor.Nuncaouvifalardecoisasemelhante.
—Equemjáouviu?Eladisparaumprojétiladuasmilmilhasporhora.
—Munição?
—Calibre48,altavelocidade...pontamacia,cônica.
—Emumapistola?
—Sr.Steele,odeslocamentodearcausadopelarotaçã odabalaé su icienteparacausar
umgraveferimentonotecidodocorpohumanodemaisoumenoscincocentímetros.
—Nãoestouentendendo.
— Um homem foi alvejado com uma dessas pistolas a uma distâ ncia aproximada de dez
metros. O tiro rasgou a pele dele e feriu o tecido subcutâ neo do braço. Os mé dicos nã o
encontraramnenhumresı́duodemetalnotecido.Oferimentofoicausadopelodeslocamentode
arprovocadopelarotaçãodabala.
—Quecoisa!Vocêfalouoqueeuqueriaouvir.Valequanto?Muitomaisdecem?
—Milhares.
—Mil?
—Eudissemilhares,noplural,meuamigo.
—Quanto?
—Dependedolocaldeentregaousevocêvembuscaromaterial...oqueeuprefiro.
David estava frustrado. Ele havia corrido até seu quarto para ligar para Rayford, mas o
telefone estava ocupado. Aquele telefone emitia um sinal quando havia outra pessoa tentando
completar uma ligaçã o. David també m instalara um dispositivo que fazia o telefone tocar
mesmo quando estivesse desligado, desde que o usuá rio o deixasse na posiçã o de "inativo".
Rayfordsemprefaziaisso.Elefeznovaligação.Continuavaocupado.
—Eunã otinhaaintençã odeescutarsuaconversa,capitã o,masentendiquevocê estava
encomendando uma arma. Gostei de ver que você nã o se importa, mesmo sabendo que isso é
ilegal.Nãoestamosdebaixodasleisdoanticristo.
—Éassimqueeupenso.Vocêqueriaverotelefone,não?
—Ah,sim,obrigado.Querodarumaolhada.
Dwayneexaminouminuciosamenteotelefoneecolocou-onapalmadamão.
—Ébempesado.Devefazerdetudo,atéprepararseudesjejum,estoucerto?
—Atéisso,sónãofazovosmexidos.
—Ahá !Você ouviuoqueeledisse,Tru?Oh!—Elecolocouamã onabocaquandoviuque
sua esposa estava dormindo. Em seguida, cochichou. — Este modelo aqui é daqueles que
enviamerecebemligaçõesdequalquerlugar,nãoémesmo?
— E isso aı́. O melhor de tudo é que ele é sigiloso. Usa quatro canais diferentes por
segundo,porissonãopodeserrastreadonemgrampeado.Éamaravilhadasmaravilhas.
—Vocêcostumaguardá-lonasacola?—perguntouDwayne.
—Sim.
Dwaynefechouoaparelhoeesticouobraçoparatrá sa imdecolocá -lodevoltanasacola
de Rayford. Depois de re letir por alguns instantes, ele resolveu desligar també m o botã o que
desativavatodasasfunçõesdotelefone.
—Daquiemdiante,podedeixarporminhaconta—disseDwayne,assumindoocontrole
doaviã o.—Seiqueestoumetendoonarizondenã odevo,masvocê poderiamedizeroquevai
fazercomumapistolatãopoderosa?
Rayford pensou por alguns momentos. Ele havia se acostumado a abrir-se com qualquer
companheiro crente, até mesmo para falar de assuntos do Comando Tribulaçã o. Ele apenas
tomava o cuidado de nã o revelar o local da casa secreta ou contar o nome falso de um dos
membrosdoComandoparaqueointerlocutornã oviesseasofrerporcausadeumainformaçã o
que nã o necessitava saber. A arma, poré m, era um assunto pessoal que causava muito
sofrimento a Rayford, porque ele sabia muito bem de onde ia tirar aquele dinheiro todo para
comprá-la.Naquelemomento,elenãopodiaimaginarseconseguirialevarseuplanoatéofim.
—AComunidadeGlobaltalvezsejapaci istaeestejadesarmadaporforçadeumalei—
eledisse.—Masperdemosumpilotoemumtiroteio,equasetodosnó sjá estivemosnalinhade
fogo, pelo menos uma vez, e alguns foram alvejados. Atiraram em Buck e Tsion quando eles
estavam fugindo de Israel pelo Egito. Buck foi atingido. Buck també m foi perseguido quando
ajudava Hattie a fugir de um hospital daCG no Colorado. Nossa mais nova companheira e eu
escapamosdeumtiroteiorecentemente.EvocêsabeoqueaconteceucomMaceAbdullah.
—Estouentendendo,irmã o.Nã otenhoargumentosparacontestar.Noentanto,achoque
ficariamuitocaroequiparcadaumdevocêscomarmasdessetipo.
—Euvoutestá-laemprimeirolugar—disseRayford.
— Boa idé ia. E claro que os dois ú ltimos que você mencionou nunca vã o poder portar
armasemserviço.Seriabomsecadaumdelestivesseumaarmaescondidanoavião.
— Fizemos isso quando eu era capitã o doComunidadeGlobalUm. Tı́nhamos duas pistolas
guardadasnocompartimentodecargas.Oacessoaelaseramuitodifı́c il,masterı́amosdeusá lascomoúltimorecurso.Agoraelasnãoexistemmais.
— A propó sito, Rafe — disse Dwayne, apontando para o horizonte -, aquilo ali é o que
chamamosdesolnoramodaaviaçã o.Nossachegadaestá previstaparadaquia40minutos.A
alfâ ndegadeLeHavreé muitoexigentequandoalgué mchegalá pelaprimeiravez.Você temo
carimbodevistobritâniconopassaporte?
Rayfordassentiucomacabeça.
—EujápergunteiquemvocêéhojeeporqueoajudeiaatravessaroCanaldaMancha?
Rayfordpegouseupassaporteeabriu-o.
—ThomasAgee.Importaçã o/Exportaçã o.Evocê ,quemé ?Dwaynesorriuemostroudois
passaportesdaUniãodas
Naçõ es Britâ nicas, dizendo com um sotaque inglê s arcaico. — As suas ordens, senhor.
Rayfordleuemvozalta.
—IanHill.Onomedaesposaé...Eiva.Muitoprazeremconhecê-los.
David nã o ouvia mais o sinal de ocupado. Ele discou novamente, desta vez com muito
cuidado,parateracertezadequenã ohaviaerrado.Onú m eroestavacorreto.OuRayfordnã o
podia ouvir o toque ou o telefone tinha sido totalmente desativado. David ligou para Tsion e o
despertou. Algué m teria de entrar em contato com aquele aviã o em uma freqü ência livre. E
rápido.
CAPÍTULO16
Buck estava cansado por causa da longa viagem e por ter icado acordado até tarde
conversando com o Dr. Rosenzweig. Ele havia passado grande parte da noite tentando
convencerChaimaaceitaraCristo.
—Éporestemotivoqueestouaqui—disseBuckaseuamigo.—Vocênãodeveadiarsua
decisã o. Já nã o é mais criança. Os julgamentos e os ais vã o piorar cada vez mais até o im.
Talvezvocênãosobrevivaatélá.
Chaim,deitadonosofáemfrenteaBuck,quaseadormeceraporváriasvezes.
— Estou em uma encruzilhada, Cameron. Só posso dizer-lhe uma coisa: deixei de ser
agnó stico.Qualquerpessoaqueseconsidereagnó sticaé mentirosa.Reconheçoagrandebatalha
sobrenaturalentreobemeomal.
Buckinclinou-separaafrente.
—Eentã o,doutor?Você continuaneutro?Neutralidadesigni icamorte.Neutralidadenã o
levaanada.Vocêfingedeixaroassuntoparaosoutrosresolverem,masvaiacabarperdendo.
—Existemmuitascoisasqueeunãoentendo.
— Quem, alé m de Tsion, entende grande parte do que está acontecendo? Somos todos
novatos no assunto, tateando para descobrir o caminho. Você nã o precisa ser um teó logo.
Precisaapenasconheceroselementosbá sicos,eissovocê conhece.Aperguntaé aseguinte:o
quevocê fazcomtudooquesabe?Oquevocê fazcomJesus?Eleé odonodesuaalma.Elequer
você , e tem tentado de tudo para convencê -lo. O que mais é necessá rio, Chaim? Você precisa
ser pisoteado pelos cavalos? Precisa ser sufocado com enxofre, ser queimado? Você quer viver
aterrorizadopelorestodavida?Chaimsentou-senosofáesacudiuacabeçatristemente.
— Doutor, vou ser bem claro. A vida nã o vai icar mais fá cil. Nó s perdemos a primeira
oportunidade. A situaçã o vai piorar para todos nó s. E os crentes vã o sofrer mais do que os
incrédulosporqueestáchegandoodia...
—Eujá conheçoessaparte,Cameron.SeioqueTsiondizarespeitodamarcanecessá ria
paracomprarouvender.Evocêaindavemmedizerqueminhavidavaiserpiordoquejáestá.
— Estou lhe dizendo a verdade. Sua vida vai piorar, mas morrer será a melhor coisa que
lhe poderá acontecer! Nã o importa como será a sua morte, você acordará no cé u! E se
sobreviver até o dia do Glorioso Aparecimento... imagine só ! Estas sã o as opçõ es dos crentes,
doutor. Morrer e estar com Cristo, só retornando quando Ele retornar. Ou sobreviver até seu
aparecimento.
—Chaim—prosseguiuBuck-,queremosquevocê passeparaonossolado.Queremosque
seja nosso irmã o, agora e para sempre. Nã o podemos imaginar perdê -lo, sabendo que você
estará separadoparasempredoDeusqueoama.—Bucknã oconseguiuconteraslá grimas.—
Chaim,seeupudesse,trocariadelugarcomvocê!Vocênãosabeoquesentimosporvocê,oque
Deussenteporvocê?Jesusassumiuoseulugarparaquevocênãotivessedepagaropreço.
Chaim ergueu os-olhos e surpreendeu-se ao notar lá grimas nos olhos de Buck. O aviso
alarmante parecia ter aberto caminho para que Chaim começasse a compreender. Talvez ele
nã o conhecesse a profundidade do amor que o Comando Tribulaçã o lhe dedicava. Buck sentia
comoseestivessedefendendoacausadeDeussemapresençadeDeus.Deusestavaali,é claro,
mas,aparentemente,muitodistantedeChaim.
—Vougarantiravocê omesmoquegaranticertavezaTsion—disseChaim.—Nã ovou
ter a marca de Nicolae Carpathia. Mesmo que eu tenha de morrer de fome por assumir essa
posiçã o, ningué m me forçará a estampar uma marca, só para viver como um homem livre
nestasociedade.
Buckachouqueaquilojá eraumbomcomeço,masnã oosu iciente.Elechorounoquarto
de hó spedes até adormecer, orando por Chaim. As 9 horas, ele continuava exausto. Esperava
poderdarumaolhadanasduastestemunhas,masprometeraaChloeque,naviagemdevolta,
visitaria Lukas Miklos na Gré cia. O novo amigo, a quem eles chamavam de Laslos, seria o
contatoprincipalqueacooperativaterianaquelapartedomundo.
O reló gio marcava 7 horas em Le Havre quando Rayford e os Tuttles passaram pela
alfâ ndega como Thomas Agee e lan e Eiva Hill. Trudy foi encarregada de alugar um carro e
apresentar-se no Le Petit Hotel, localizado no sul da cidade, onde eles haviam reservado dois
quartos.Ohoteleracaro,massualocalizaçãonãoatraíaolharescuriosos.
DwayneusariaoutrocarroalugadoparadeixarRayfordadoisquarteirõ esdedistâ nciada
Rua Marguerite, onde Bo Hanson dissera que Hattie e o irmã o dele estavam escondidos sob
nomes falsos. Rayford planejava simplesmente bater no apartamento e dizer, pela fresta da
porta, que a CG estava atrá s dos dois e que eles deveriam sair dali. Rayford acreditava que
Hattie deduziria que Bo lhe fornecera o endereço e, portanto, a histó ria sobre a CG devia ser
verdadeira. Se eles estivessem preparados para fugir imediatamente, Rayford lhes ofereceria
umacaronaparainstalá-losemumhoteldiscreto.
OstrêsseencontrariamcomDwayneeimprovisariamalgumacoisa.Nomomentoemque
entrassemnocarroounomeiodocaminho,RayfordeDwayneselivrariamdeSamuelHanson,
deixando-oà pró priasorte.Eletinhaumaviã o.DepoisqueretornassemaosEstadosUnidos,eles
seexplicariam.
Rayford queria surpreender Hattie e Samuel logo ao amanhecer, portanto ele e Dwayne
alugaram o primeiro carro que encontraram. Depois de um rá pido adeus a Trudy, que se
encarregou de colocar todas as sacolas no carro que ela alugara, eles partiram. Dwayne
apresentavaumaidéiaatrásdeoutrasobrecomoludibriarSamuel.
— Você tem certeza de que deseja ir fundo nesta operaçã o do Comando Tribulaçã o? —
perguntouRayford.
— Você está querendo brincar comigo? Estou sempre atrá s de um pouco de aventura
desde que fui salvo. Preste atençã o, podemos nos livrar desse rapaz assim que entrarmos no
carro.Você pedeaelequedesçaporalgunsminutosporquetemumassuntoparticularatratar
com ele. O assunto pode ser o irmã o dele. Você se afasta com ele do carro e, em seguida, diz
queesqueceuumpapelládentro.Vocêentracorrendonocarro,euaceleroevamosembora.
—Talvezdêcerto—disseRayford.
— Que tal esta outra idé ia? — disse Dwayne, enquanto seguia as instruçõ es de Rayford
sobre o trajeto a ser feito. — Assim que você conseguir trazê -los até o carro, eu faço algumas
mesurasevocê meapresentaosdois.Euabroaportaparaamoçaepeçoaelaqueentre.Em
seguida, dou um safanã o nesse tal de Hanson. Ele rola uns seis metros pelo chã o, sem se
machucar.Assimqueelesedercontadoqueaconteceu,jáestaremoslonge.
Rayford analisou o mapa da cidade e o bilhete de Bo. — Eles estã o usando os nomes de
JamesDykeseMaeWillie.Àsvezesagente...
—Tenhoumaoutraidéia—disseDwayne,masRayfordointerrompeu.
— Nã o quero ofendê -lo, Dwayne, mas a maneira como vamos agir nã o me preocupa,
desdequeagenteconsigaoquedeseja.
—Vocêdeveterumplano.
—Tenhomuitos.Seeuacharquenã odevoconvidá -loasairdocarro,você saberá oque
fazer.
—Éissoaí,parceiro.
O desespero tomara conta de David. Já se encontrava no meio da manhã em Nova
Babilô nia.EleeMacestavamreunidossecretamentenoescritó riodopiloto.Davidprogramara
seu telefone sigiloso para discar o nú m ero de Rayford a cada 60 segundos e deixar uma
mensagem digital que dizia simplesmente ABORTE, acompanhada do nú m ero do celular de
David.
—Seeusoubessequeacoisaseriaassim—disseMac-,euteriavoadoaté aFrançapara
impedirRayforddelevarseuplanoadiante.
David, sem saber o que fazer, ligou seu computador para ouvir as conversas telefô nicas
gravadas entre Leon e o chefe do serviço de inteligê ncia, Walter Moon, no dia anterior, no
pró prio dia e no dia seguinte ao comunicado sobre a morte de Hattie. Quando ele conseguiu
ouviralgumacoisaútilquepoderiaajudarRayford,suasensaçãodemal-estaraumentou.
—Istovaiservirparapioraroseudia,Mac—Presteatenção.ÉumaconversaentreLeon
eMoon.
—OquevocêpretendefazernocasoDurham,Wally?
—Jáestáfeito,comandante.Elafacilitouascoisas.Faztempoqueestamostentando...
—Fazmuitotempo.Oqueestáfeito?Oquevocêfez?
—Conformeeudisse,já noslivramosdopiloto.EleestavausandoonomefalsodeDykes,
masrastreamosoaviãoelocalizamosSamHanson,emLouisiana.
—Quandovocêdizquejáselivraramdo...
—Você quersaberounã o?DigamosqueSamjá viroupicadinho.Abonecaestá emcana
emBruxelas.ElaestavausandoonomedeMaeWillie,edecidimosmanteressenomenaprisã o
paraqueelapossa icarnoanonimatolá dentro,sequiser.Seiqueochefã o...desculpe,Excel...
SuaExcelêncianãoquerbarulhoarespeitodisto.
—Correto.Mas,quemacreditariaqueelaéHattieDurham?Elafoidadacomomorta.
—Efoielaquemfezisso.Agentepodiadeixá-lanaBélgicaparasempre.
—Quevantagemlevamosnessahistória?
—Mandamosaoúnicoparentevivodopiloto,oirmãodele,umbilhetequeparecetersido
escrito por Sam, dizendo que icaria na França por uns tempos e que o irmã o nã o deveria se
preocuparsenã orecebessenotı́c iasdele.Imaginamosque,comopassardotempo,oirmã ovai
descon iar de alguma coisa ou perder a paciê ncia e sair à procura dele. Só esperamos que os
amiguinhos da moça saibam do paradeiro dela pelo irmã o, porque temos uma surpresa para
eles.
—Estououvindo.
—Pusemosumcaranoapartamentoquevaiseidenti icarcomoDykes.Noinı́c io,elevai
criarcaso,masdepois
vai prometer informar qualquer coisa que souber sobre Hattie. Eles vã o cair como
patinhos,seéquevocêestámeentendendo.
—Excelente,Wally.
Macabanouacabeça,aborrecido.
— Você está mantendo Tsion informado? Rayford está se metendo em um vespeiro, e
aquelagentedelá,principalmenteafilhadele,deveestarpreparada,casoelenuncamaisvolte.
David assentiu e pegou o telefone, que começou a tocar. Ele apertou a tecla de
identificaçãodechamadas.
—Éele!
Macinclinouocorpoparaouvir,eDavidapertouateclaparaconversarcomRayford.
—CapitãoSteele,ondeosenhorestá?Estoutentandoligarparaosenhor...
— Sinto muito, senhor. Aqui fala a Sra. Dwayne Tuttle. Pode me chamar de Trudy. Meu
maridoeocapitã oSteelemeincumbiramdedarentradanohoteletomarcontadabagagem.
Viestetelefonenasacoladocapitã oeliguei-oapenasporcuriosidade.Sintomuito.Há dezenas
e dezenas de mensagens para ele, todas vindas do mesmo nú m ero com o seguinte recado:
ABORTE.Acheiquedevialigar.
—Muitoobrigado,madame.OndeestáRayf...ocapitãoSteelenestemomento?
—EleemeumaridoestãoacaminhoparatentarencontraraSrta.Durham.
—Seumaridotemcelular?
—Não,senhor,elenão...
—Existeummeiodeentrarmosemcontatocomeles?
—Tenhooendereçodolocalparaondeelesestã oindo.Talvezvocê squeiramligarparaa
moça.
Macpegouotelefone.
—Madame,meunomeéMacMcCullum.AsenhoraselembrademimnaÁfrica?
—Sim,senhor,comovai...
— Trudy, preste atençã o e faça exatamente o que vou dizer. Trata-se de um assunto de
vidaoumorte.Vocêconheceacidadeondeestá?
—Sódoaeroportoatéaqui.
— Pegue um mapa na recepçã o e peça que algué m lhe informe qual o caminho mais
rá pidoaté oendereçodeHattie.Dirija-separalá imediatamente.Nã odeixequeningué mtente
impedi-la, diga que explicará mais tarde. Você precisa pedir ao capitã o Steele que aborte. Ele
vaientender.
—Queaborte,sim,senhor.
—Algumapergunta?
—Não,senhor.
—Façaistoagoramesmo,Trudy!Eligueparanósinformandooqueaconteceu.
Dwayne passou de carro diante do endereço da rua Marguerite e parou um quarteirã o e
meioadiante.
—Lugarzinhosujoeste,não?—comentouDwayne.
—Éperfeitoparaoqueelesquerem—disseRayford.—Estouimpressionado.Talvezseja
oqueelesconseguiramdemelhornestahistó riadesastrosa.Vamosaguardarumpoucoparaver
seelachegaousai.
Apó sdezminutos,Rayfordcomeçoua icara litoaoverqueapenasduaspessoashaviam
saídodoprédio,enenhumadelaseraHattie.
—Seeunãovoltaremcincominutos,váatrásdemim-eledisseaDwayne.
—Eseelesestiveremarmados?
— Duvido. Se Sam for tã o inteligente quanto o irmã o, ele nã o sabe de que lado deve
apontaraarma.EHattieficariapreocupadaemquebrarasunhas.
Rayford, poré m, gostaria de estar portando a arma que Albie descrevera. Ele jamais
atirariaemHattie,enã osearriscariaasofrerasconseqü ênciasporteracertadoumsujeitotã o
bobalhã ocomooirmã odeBoHanson.Amissã onã oseriatã operigosa,eleimaginou.Hattieo
deixaria entrar. Se nã o deixasse, ele tinha forjado uma histó ria sobre Sam Hanson para
convencê-la.
No pré dio de trê s andares, havia trê s conjuntos de dez caixas de correio embutidas na
parededosaguã o,ondenã ohavianenhumporteiroouvigia.Rayford icousurpresoporelesnã o
teremescolhidoumedifı́c iocomsistemadeinterfones.Eleleu"J.Dykes"nacaixanú m ero323e
subiu.
A escada entre um andar e outro era composta de quatro lances de degraus. Quando
chegouaoúltimoandar,Rayfordestavaofeganteecomdornojoelho.Oapartamento323ficava
nafrentedopré dio,à esquerda.Talvezalgué motivessevistoquandoeleentrounopré dio.Sam
eHattiepoderiamtervistoocarropassandonarua.
Rayfordserecompô seavistouobotã odacampainhaemumacaixademetalnomeioda
porta do apartamento. Ao apertá -lo, ouviu um forte toque de dois sons, que se poderia escutar
també mnosoutrosapartamentosdoandar.Rayfordpercebeuummovimentodooutroladoda
porta, mas ela nã o foi aberta. Quando ele fez mençã o de apertar novamente o botã o, teve a
certezadequehaviaalguémládentro.Talvezapessoaestivessesevestindo.
—Nãoseapresse—elegritou.—Possoaguardar.
Ele imaginou que algué m tivesse andando pé ante pé até a porta para ouvir. Nã o havia
olho má gico. Quem quer que estivesse ali, deveria estar prestando atençã o para saber se ele
haviadesistido.Eleapertouobotãorapidamente.
—Quemé?—Avozeraadeumhomem.
—TomAgee.
—Quem?
—ThomasAgee.
—Nãoseiquemé.
—Souamigodamulherquemoraaí.
—Aquinãomoranenhumamulher.Sóeu.
—MaeWillienãomoraaí?Silêncio.
—Porfavor,possofalarcomMae?Digaaelaqueéumamigo.
Rayfordouviuosominconfundı́veldeumapistolasemi-automá ticasendodestravada.Ele
virou-se. Talvez tivesse vindo da escada, mas a porta abriu-se abruptamente e um jovem
musculoso apareceu, colocando uma das mã os em suas costas. Ele estava descalço e sem
camisa,usandoapenascalçajeans.
Rayforddecidiuenfrentá-lo.
—Possoentrar?
—Quemvocêdissequeestavaprocurando?
—Vocêouviu,senãonãoteriaabertoaporta.Ondeelaestá?
—Eujálhedisse,morosozinhoaqui.Oquevocêquercomela?
—Comquem?Comamulherquenãomoraaqui?
—Desembuchelogoousumadaqui.
—VocêéSamuelHanson?
Orapazolhoufirmeparaele.
—MeunomeéJimmyDykes.
—Entã ovocê éSamuelHanson.Ondeestá HattieDurham?Orapazcomeçouafechara
porta.
—Vocêbateuemportaerrada,cara.Nãoháninguémaquicomesse...
Rayfordavançouecolocouumdospésentreaportaeobatente.
— Se eu bati em porta errada, como eu sabia o seu nome verdadeiro e o de Hattie?
Vamos,querofalarcomela.
"Dykes"pareciaestarrefletindo.
—VocênãoédaCG,é?
—SouamigodeHattie—disseRayfordbemaltoparaqueelapudesseouvi-lo.
—VocêtambémnãosechamaTommyAgee,acertei?
—Temosdesermuitocautelosos,Samuel.SouRayfordSteele.Estoutrazendonotı́c iasde
seuirmãoBo.
Samuelcontinuavasemsemexer.
—Hattienãoestáaqui,maseupossolevá-loatéela.Entreenquantoeutrocoderoupa.
Samuelescancarouaporta,eRayfordentrou.Enquantoaportaestavasendofechada,ele
ouviupassosdealguémsubindoasescadascorrendo.Samueldirigiu-separaumoutrocômodo,e
Rayfordoviupegarumaarmanobolsotraseirodacalçaesegurá-la.
Samuel colocou a arma em cima de uma mesa, bloqueando a visã o de Rayford com seu
corpo.Elepegouumacamisae,quandocomeçouavesti-la,algué mbateucomforçanaportae
apertouacampainhaaomesmotempo,fazendocomqueosdoisseassustassem.
RayfordesperavaquefosseHattie.SemfazercasodeSamuel,eleabriuaporta.Trudy?!Os
pensamentos rodavam em sua cabeça em câ mara lenta enquanto ele tentava
desesperadamentelembrar-sedonome ictı́c iodeTrudy.AoolharparaSamuel,eleviuorapaz
tirandoacamisacomtantaforçaapontoderasgá-laeesticandoobraçoparapegaraarma.
—Aborte!—gritouTrudy,tentandotirarRayforddoapartamento,maselepercebeuque
nenhumdosdoispoderiafugirdaquelaarma.OfatodeTrudyapareceralicomumamensagem
pedindo-lheparaabortarofezentenderqueaquelerapaz,fossequemfosse,iamatá-los.
Trudy disparou escada abaixo, e Rayford imaginou que ele receberia uma bala calibre 45
nas costas e outra no alto da cabeça. Trudy seria morta antes de chegar ao primeiro andar.
Rayfordnãopoderiadeixaraquelerapazsairdoapartamento.
Ele virou-se enquanto a porta se fechava lentamente e correu na direçã o do moço, que
havia se livrado da camisa rasgada e segurava a arma. Em seguida, Rayford viu que ele
engatilhouaarmaecolocouodedoindicadornogatilho.
Rayford nã o queria cometer a loucura de lutar com um homem que portava uma arma.
Ele conseguiria facilmente cobrir a mã o do rapaz com as suas, mas as probabilidades de levar
vantagem nã o lhe pareciam favorá veis. Resolveu, entã o, investir contra ele com as mã os
fechadas,deencontroaopeito,cotovelosparafora,comoumjogadordefutebolamericanoindo
deencontroaoadversárioqueacaboudeagarraraabola.
O rapaz nã o se intimidou, mas voou para longe. Rayford o atingiu no pescoço com o
cotovelo, atirando o corpo dele para trá s com a cabeça para a frente. Com o impulso da
pancada, os pé s descalços do rapaz escorregaram no piso e ele tropeçou em uma mesinha,
caindocomospé sparacimaebatendoaparteposteriordacabeçacomforçanajanela.Ainda
tonto,comaarmanamã oeodedonogatilho,orapazviuRayfordcorreremdireçã oà porta,
tã orá pidoqueospé sdelemaltocavamochã o.Rayfordtinhaaimpressã odequeestavatendo
umpesadelo,sendoperseguidoporummonstroecorrendonalama.
Ele abriu a porta com força e olhou para trá s enquanto corria. A cabeça do rapaz
continuava presa no vidro quebrado da janela. Ele estava na posiçã o horizontal, com o tronco
abaixodoníveldospés.Pormaisqueseesforçasseesecontorcesse,nãoconseguiasairdali.
No entanto, isso nã o o impediu de atirar. Dois estrondos ensurdecedores, quase
simultâneos,fizeramdesabaraparededivisóriademadeira.
Rayford desceu as escadas, pulando trê s ou quatro degraus por vez, quase passando por
cimadeTrudy,quetentavafugiromaisrá pidoquepodia,descendoumdegrauporvez.Quando
chegou ao segundo andar, Rayford agarrou o corrimã o e rodopiou no meio da escada, o que
serviu para piorar a dor no joelho. Ele só conseguiu equilibrar-se no momento em que Trudy
chegavaaoúltimodegrau.
Ela gemia enquanto corria como se estivesse certa de que receberia um tiro. Rayford
tambémtinhaasensaçãodequeumabalaatravessariasuascostas.
Trudy havia deixado o carro, com o motor ligado e a porta aberta, bem em frente ao
pré dio. Dwayne a vira chegar e encostara o carro atrá s do dela, sem saber que outra atitude
tomar.QuandoavistouRayfordeTrudycorrendoemsuadireção,elegritou:
—Oque...?
—Acelere!—disseRayford,fazendoumgestoparaqueeledesaparecessedali.—Vamos
darumjeitodealcançarvocê!
Rayfordsentou-serapidamenteaovolante,eTrudyabriuaportadoladodopassageirosob
umasaraivadadebalas,vindasdoterceiroandar.Assimqueouviuaportaserfechada,Rayford
pisoufundonoacelerador,deixandoatrásdesiumrastodepoeiraecascalho.
Seus instintos o salvaram, ele sabia disso, mas, enquanto seu coraçã o bombeava sangue
paratodoocorpo,Rayfordnã oconseguiasentir-seagradecidoporaquelapresençadeespı́rito.
Ele sabia que Deus estivera a seu lado, protegendo-o, poupando sua vida. Mas, naquele
momento,Rayfordsentiaficarmaisfortearaivaqueoatormentavahaviameses.
AquelesentimentoiniciavaeterminavaemNicolaeCarpathia.Rayfordqueriaassassinaro
homemedecidiuquelevariaseuplanoadiante,mesmoquefosseaú ltimacoisaqueele izesse
nestemundo.Eelepoucoseimportavacomisso.Fariaopossı́velparacompraraarmadeAlbie
eestarianolugarcertoenomomentocerto,custasseoquecustasse.
Trudy, ofegante, esforçava-se para atar o cinto de segurança. Enquanto Rayford seguia
Dwaynepelasruasestreitasdacidade,elapegouotelefonedelenochãodocarroeperguntou:
—Qual...é....onúmero...dediscagemrápidaparaMac...?
—Dois.
Elaapertouobotão,eRayfordouviuavozdeMacatendendo.
—Sra.Tuttle?
— Mi... mi... missã o cumprida! — exclamou Trudy, passando o telefone a Rayford e
irrompendonumchoroconvulsivo.
CAPÍTULO17
Davidestavaexausto.
Ele e Mac tinham ouvido o relato de Rayford enquanto os dois carros atravessavam, em
altavelocidade,asruasdeLeHavreemdireçã oaohotel.Todosconcordavamque,seelesnã o
estivessem sendo seguidos, chegariam rapidamente ao hotel onde estavam registrados sob
nomes falsos. Poré m, teriam de sair do paı́s o mais rá pido possı́vel. Rayford dissera seu nome
falsoeoverdadeiroa"Samuel",que,evidentemente,eraumespiã odaCG.Seelenã oestivesse
gravementeferido,játeriainformadoopessoaldeláqueRayfordestavanaFrança.
Aquilo poderia ter di icultado a passagem de Rayford pela alfâ ndega. Felizmente, ele
separou-se dos "Hills", que passaram antes pela alfâ ndega. O nome falso de Rayford nã o foi
relacionadocomodeles.
—Nãopodemosajudá-lodaqui—disseDavid.
—Mantereicontato—disseRayford.—Sóquenãovouvoltardiretoparacasa.
Buck partiu de Israel sem visitar o Muro das Lamentaçõ es e sem relatar a Tsion os
detalhesdeseuencontrocomChaimRosenzweig.Queriafazerissopessoalmente,porquesabia
queTsionsesentiriatã opesarosoquantoele.TodoseleshaviamaprendidoaamarChaim.Nã o
bastavadizerquenãofoipossívelfazeroisraelensetomarumadecisão.Oscrentesqueamavam
Chaimqueriamqueeleseconvertesse.
BuckficousatisfeitocomocalorosoencontroquetevecomLukasMiklosesuaesposa.Em
seuinglêsarrastado,aSra.MikloscontouaBuckcomorgulho:
—Laslosadoraumaconspiraçã o.Elemelembradiaenoitequeonomedoamigoé Greg
North,enãoooutroqueeusei.
Lasloscumprirasuapartenoacordo.Ocomé rciodelinhitoprosperoutantoqueeleobteve
grandeslucros.Seuplanoeravenderaempresaà ComunidadeGlobalpoucoantesdoinı́c iodas
restriçõesdecompraevenda,queestavamprestesaserpostasemprática.
LaslosmostrouaBuckumaá reaenorme,instaladaemumnovolocal,ondeeleabrigaria
os caminhõ es e empilhadeiras para poder embarcar mercadorias aos diversos pontos onde
funcionavaacooperativa.Essenovoempreendimentoseriasemelhanteaumnegó c ioaprovado
pela CG, só que dez vezes maior do que aparentava. Seria o centro das atividades da
cooperativanaquelapartedomundo.
Buck també m visitou a igreja secreta de Laslos, composta de um grande nú m ero de
crenteslideradosporumjudeuconvertido,cujapreocupaçã oprincipaleraconseguiracomodar
tanta gente no local. Buck retornou aos Estados Unidos animado pelo que viu na Gré cia, mas
tristepelaindecisãoespiritualdeChaimRosenzweig.
Aochegarà casasecreta,eleencontrouTsioneChloenervososporcausadeumaatitude
que tiveram de tomar com relaçã o a Leah. Buck aprovou, mas Tsion e Chloe estavam
preocupados, sem saber se deviam ir adiante sem consultar Rayford. Em razã o da quase
tragé dia com Rayford e da di iculdade de comunicaçã o entre os membros do Comando
Tribulaçã ocomorestodomundo,Tsionsugeriradesignarumapessoaparacentralizartodasas
informaçõ es. Leah se pronti icou imediatamente, dizendo que tinha tempo disponı́vel entre o
preparo de uma refeiçã o e outra. Chloe passara horas com ela, ensinando-a a lidar com o
computador,eLeahdissequenuncasesentiratãorealizada.
Os quatro reuniram-se ao redor do computador, e Leah contou que havia encontrado um
programa que a ajudava a incorporar todas as mensagens recebidas e transmitidas. Com um
poucodeatençã oeaajudadealgumasteclas,elatransmitiaatodosdacasaasmensagensque
saíamechegavam.
— Assim, nunca vamos ter dú vidas se algué m está ou nã o por dentro do assunto, se já
tomou conhecimento ou nã o. Se Mac ou David relatarem um incidente que todos necessitem
saber,vouprovidenciarparaquetodostomemconhecimento.
AmedidaqueametadedoperíododaTribulaçãoseaproximava,Bucktinhaasensaçãode
queelesestavamconvenientementepreparados.
Rayford tinha de ser justo com Dwayne. Talvez ele fosse um homem espalhafatoso, mas
haviaengendradoomelhorplanoparatirarRayforddeLeHavre.
— Nã o precisamos usar minhas idé ias para nos livrar do amiguinho de Hattie — disse
Dwayne-,portantoestamosquites.
Evidentemente, Trudy icou orgulhosa de sua façanha aquela manhã , mas continuava
abalada e nã o queria assumir responsabilidade por outra aventura no momento em que
estivessemsaindodopaís.
Trudy e Dwayne chegaram ao aeroporto 15 minutos antes de Rayford para entregar o
carro alugado e preparar o aviã o para a decolagem. Rayford deveria chegar logo depois e
entregar o outro carro. Em seguida, ele se dirigiria normalmente para os fundos do terreno do
estacionamento,ondehaviaumacercaqueseparavaoscarrosdoterminal.Dwaynenotaraque
olocalatrásdacercadavaacessoàextremidadedoterminaldoaeroportoeàpista.
— Você pode pular a cerca e correr até o aviã o — dissera Dwayne -, assim que ouvir os
motores funcionando, ou eu conduzo o aviã o até perto da cerca para facilitar as coisas para
você.
—Quaissãoospróseoscontras?
—Você vaiterdecorrerumbocadoaté oaviã ocomessejoelhodolorido.Poroutrolado,
seeuconduziroSuperJaté acerca,vouatrairaatençã odemuitagenteepodeserquealguma
autoridadenãopermitaqueeumeaproximedaquelaárea.
Ficou decidido que Dwayne deixaria o Super J na posiçã o de decolagem e, em seguida,
pediria permissã o para taxiar até perto do terminal a im de veri icar um problema na parte
inferiordoavião.Comisso,eleficariapertodolocalondeRayfordpulariaacerca.
— Vou dizer que ouvi um rangido em uma das rodas e tentar levá -los comigo para
examinarmosarodajuntos.Enquantoisso,vocêentranoavião.
Deutudocertoaté omomentoemqueRayfordparouocarronoestacionamento.OSuper
J estava na pista, com os motores funcionando. O funcioná rio da locadora de carros perguntoulhealgumacoisaemfrancêse,emseguida,traduziuparaoinglês.
—Osenhorvaipagarcomcartãodecrédito?
Rayford assentiu com a cabeça. O funcioná rio começou a imprimir o recibo, olhando ora
paraRayfordoraparaaimpressora.
— Com licença — ele disse, dando as costas a Rayford e falando em seuwalkie-talkie.
Rayford entendia pouco de francê s, mas teve a certeza de que o funcioná rio estava fazendo
algumasperguntasaumcolegasobre"ThomasAgee".
Enquantoisso,orecibofoiimpresso,masofuncionárionãooentregouaRayford.
—Nãodeucerto—eledisse.
—Oquevocêestádizendo?—perguntouRayford.—Ocartãoestáaí.
—Porfavor,aguarde.Voutentarnovamente.
— Estou atrasado — disse Rayford, recuando ao perceber movimento perto do terminal.
—Mandeacontaparamim.
—Não,osenhorprecisaaguardar.Precisamosdeumnovocartão.
—Mandeacontaparamim—insistiuRayford.
EleolhouporcimadosombroseviuoSuperJtaxiandolentamenteemsuadireçã o.Trê s
homenssaı́ramapressadosdoterminalrumoaoestacionamento.Rayfordcorreuparaacerca,e
um dos homens gritou pedindo ajuda. Pelos cá lculos de Rayford, a cerca devia ter mais ou
menos1,40mdealtura.OSuperJestavaauns100metrosdedistâ ncia,rodandolentamente.Os
trê shomensquecorriamatrá sdeRayfordestavamaaproximadamente30metrosdele.Todos
pareciamjovensedeporteatlético.
Rayford tentou dar um impulso e saltar por cima da cerca, mas o salto do sapato do pé
dianteiro enroscou-se nela. Com a parada brusca, ele perdeu o equilı́brio e icou com o corpo
tombado para o outro lado da cerca. Ele agarrou-se na parte superior da cerca para nã o se
estatelar no chã o, mas, enquanto tentava se soltar, icou de cabeça para baixo por alguns
instantes. Finalmente, ao conseguir se desenroscar, caiu, batendo o ombro com força no chã o,
levantou-serapidamenteecorreuemdireçãoaoavião.
Ao olhar de relance para trá s, ele viu que seus perseguidores tinham conseguido pular a
cerca com facilidade. Se Dwayne nã o aumentasse a velocidade, eles alcançariam Rayford. Ele
ouviu o ronco dos motores e viu um homem com uma prancheta na mã o acenando para que
Dwayne reduzisse a velocidade. Felizmente, ele nã o obedeceu. Trudy abaixou a escada, e
Rayfordtentousubir.
Os homens gritavam para que ele parasse. Enquanto Trudy inclinava o corpo para fora
tentandoseguraramã odele,Rayfordouviupassosatrá sdesi.Nomomentoemqueeledeuum
impulso para agarrar-se à escada, um dos homens, o mais rá pido deles, mergulhou no chã o e
segurou-o pelo calcanhar. Rayford desequilibrou-se e quase caiu da escada pela lateral, mas
Trudyprovousermaisfortedoqueaparentava.Rayfordagarrouopulsodelaereceouarrastá -la
para fora, mas o peso dele a fez cair no piso do aviã o. Ela icou atravessada na porta, com os
ombrospresosemumdosladoseosjoelhosnooutro.Elesaltousobreela.Dwayneacelerou,e
RayfordajudouTrudyafecharaporta.
— E a segunda vez que você salva minha vida hoje — ele disse. Trudy sorriu, desabando
trêmulanobanco.
— E també m foi a ú ltima. Estou muito cansada. Dwayne gritava como se estivesse em
umrodeioenquantooSuperJdisparavarumoaocéu.
—Quemaravilha!Elanãoéfenomenal?Segura,peão!
—Éumabelamáquina—disseRayford,imaginandoadorquesentirianocorponamanhã
seguinte.
Dwaynelançou-lheumolhardesconcertado.
—Eunãoestavafalandodaaeronave,parceiro.Estavafalandodestamulherzinha.
Trudyinclinou-separaafrenteepassouosdoisbraçosaoredordopescoçodomarido.
—Émelhorvocêparardemechamarassim—elaprotestou.
—Querida,vouchamarvocê damaneiracomoestemeuvelhocoraçã omandar.Segura,
peão!
—Vocêestáindoparaooeste?—perguntouRayfordrepentinamente.
—Vounadireçãoquevocêquiser,Rafe.Ésódizer.
—Leste.
— Entendido, e vou icar abaixo da linha do radar por uns tempos até que eles se
esqueçamdetentarnoslocalizar.Apertemoscintosesesegurem!
Dwayne nã o estava brincando. Ele fez uma manobra tã o rá pida para mudar a rota do
SuperJqueacabeçadeRayfordficougrudadanoencostodobanco.
—Igualaumamontanha-russa,não?Vocêvaiadorarestaviagem!
Rayfordresmungoualgumacoisaparasimesmo.
—Quetalestaoutramanobra,capitão?—perguntouDwayne.
— Eu disse que você precisa ser um pouco mais entusiasmado. Dwayne riu tanto que
chegouachorar.
No inal do dia, David recebeu ume-mail pessoal de Annie, comunicando que o chefe do
departamentodelaedoisoutrosfuncioná riosdoaltoescalã ohaviam-sereunidorapidamenteno
escritó riodeFortunato.Davidrespondeuoseguinte:"Euadorariadetodoocoraçã oestaraseu
lado mesmo que você nã o fosse o dedo-duro mais importante da organizaçã o." Enquanto ele
vasculhava o disco rı́gido do computador tentando localizar o á udio da referida reuniã o, a tela
exibiu outro sinal de mensagem recebida. Era outra de Annie. "Nunca imaginei receber um
elogio tã o lisonjeiro do amor de minha vida. O dedo-duro lhe agradece do fundo do coraçã o.
Beijos,AC."
Quando encontrou o que procurava, David reconheceu a voz de seu colega, o chefe do
departamento de Annie. Depois de fazer os rapapé s obrigató rios, ele passou a palavra ao chefe
deaná lisedoserviçodeinteligê ncia.JimHickmaneramuitointeligente,senhordesieparecia
gostardosomdesuavoz.
— Esses beatos — Hickman começou a dizer — sã o aquilo que eu chamo de
fundamentalistas.Elesacreditamemescritosantigos,principalmentenaTorajudaicaenoNovo
Testamento cristã o, e nã o fazem distinçã o entre registros histó ricos, muitos deles corretos, e
registros igurativos, com linguagem simbó lica, das tais passagens profé ticas. Por exemplo,
qualquer pessoa, inclusive eu, que tenha estudado super icialmente a histó ria das antigas
civilizaçõ es sabe que muitos dos chamados livros profé ticos da Bı́blia nã o sã o nada profé ticos.
Depois da ocorrê ncia de alguns fenô m enos sobrenaturais, algué m poderia fazer essa descriçã o
cheia de imaginaçã o encaixar-se ao evento. Por exemplo, essa onda atual de morte por fogo,
fumaçaeenxofre,talvezprovocadaporessagente,passouaserocumprimentodaquiloqueeles
acreditamserumaprofecia,queincluicavalosmonstruososcomcabeçadeleã o,montadospor
200milhõesdecavaleiros.
—Aondevocê querchegar,Jim?—perguntouFortunato.-SuaExcelê nciaestá à procura
defatosespecíficos.
— Ah! sim, comandante. Só posso dizer o seguinte: como esses beatos levam as palavras
aopédaletra,elesatribuemaessesdoispregadoresmalucos...
—OpotentadooschamadeDupladeJerusalém!—disseFortunato.
— Sim! — exclamou Hickman. — Adorei o termo! Os seguidores de Ben-Judá acreditam
que esses velhos caducos sã o as tais testemunhas mencionadas no capı́t ulo 11 do livro de
Apocalipse. Um dos versı́c ulos deste capı́t ulo diz: "Darei à s minhas duas testemunhas que
profetizempormilduzentosesessentadias,vestidasdepanodesaco."
—Então,éporissoqueaquelesdoissevestemcomroupasdeaniagem—disseFortunato.
—Elesestãotentandonosfazeracreditarquesãoessastaistestemunhas.
Hickmanaquiesceu.
— Exatamente, comandante. E Ben-Judá sempre garantiu que esse perı́odo começou no
diaemqueogovernomundialassinouumtratadodepazcomIsrael.Secontarmos1.260diasa
partirdaqueladata,chegaremosaoqueospregadoreschamamde"tempodeterminado".
Fortunato pediu licença aos outros para icar a só s com Hickman por alguns instantes.
David ouviu o som de cadeiras sendo arrastadas e de pessoas saindo. Em seguida, Fortunato
disse:
— Jim, preciso con idenciar-lhe uma coisa que está me incomodando. Você é um sujeito
esperto...
—Obrigado,senhor.
— Nó s dois sabemos que existem coisas nesses escritos antigos que sã o difı́c eis de ser
falsificados.
— Nã o sei, nã o. A transformaçã o da á gua em sangue está sendo feita pelas mesmas
pessoas que estã o nos matando com a guerra bioló gica. Trata-se de um truque, alguma coisa
queelespuseramnasestaçõesdetratamentodeágua.
—MasnoEstádioTeddyKollekaáguatransformou-seemsanguedepoisdeengarrafada.
— Tenho visto má gicos fazerem a mesma coisa. Eles colocam alguma substâ ncia que
reagedeacordocomatemperatura,talvezquandoelacaiemdeterminadoperíododanoite.Se
soubéssemosquandoissoocorre,poderíamosfazeromesmoeprovocarofenômeno.
—Eporqueestádemorandotantotempoparachover?
— Coincidê ncia! Já vi Israel passar meses sem chuva. Qual é a novidade? E fá cil algué m
a irmar que está impedindo que chova quando nã o há chuva. O que eles vã o dizer quando a
chuvacomeçaracair?Quenosderamumatrégua?
—Aspessoasquetentarammatá-losforamincineradas...
— Algué m disse que os dois tê m um lança-chamas escondido, que usam quando a
multidã o se distrai. Francamente, comandante, o senhor nã o está querendo dizer que aqueles
doisexpelemfogopelaboca!
Fortunatopermaneceuemsilêncioporalgunsinstantes.Emseguida,disse:
— Bem, se eles nã o sã o quem dizem ser, como poderemos saber que icarã o vulnerá veis
nomomentodeterminado?
—Nã ovamossaber.Masouelessã ovulnerá veis,ounã osã oquemdizemser.Dequalquer
maneira,nósvenceremos.Elessairãoperdendo.
David deveria transmitir a informaçã o a Tsion, mas precisava antes ouvir o relato de
FortunatoaCarpathia.Eleveri icouostelefonesdeFortunatoeMargaret.Nada.Oescritó riode
Fortunato estava silencioso. Ele resolveu dar uma vasculhada no escritó rio de Carpathia.
FortunatotinhaacabadoderelatarsuaconversacomHickman.
—Milduzentosesessentadiasdesdeotratado-repetiuCarpathia.—Já decidimosfazer
uma grande festa. Agora sabemos exatamente quando devemos encená -la. Você precisa
elaborar um plano de trabalho, Leon. Precisa fazer com que os potentados regionais iquem
contra Peter Segundo. E verdade que já estã o contra ele, mas o tal homem precisa ser
eliminado. Vou deixar o assunto sob sua responsabilidade. Eu tomarei conta das tais
testemunhas. O mundo, principalmente Israel, aguarda ansiosamente o im daqueles dois.
Durantemeses,acrediteiquenã ocaberiaamimatarefadelivraromundodosdois.Penseiem
darumaordemparaqueastropasdaCGosmatassem.Maselesserãotãomalvistosatémesmo
por seus seguidores que resolvi eliminá -los pessoalmente, transformando esse ato na façanha
maisimportantedeminhavidaatéagora.
—Osenhorestácertodisso?
—Vocênãoconcorda?
—Seriafá cildemais,Excelê ncia.Melhorfazerissosemcomprometê -lo.Osenhorpoderia
atédeploraroatopublicamente,reafirmandoqueincentivaaliberdadedeexpressãoedeidéias.
—Masnãoaliberdadeparaatormentaromundocompragasejulgamentos,Leon!
—Essaspragasejulgamentosnãosugeremqueelessãoquemdizemser?
— Isso nã o faz nenhuma diferença, você nã o entende? Quero responsabilidade e votos de
confiança,ganharpontospormelevantarcontraessesimpostores.
—Claro.Comosempre,Excelência,osenhoréinsuperável.
O Super J pousou no inal da pista em Al Basrah. Assim que eles chegaram, vá rios
funcioná rios do aeroporto correram descalços até o aviã o, olhando curiosos para suas linhas
arrojadas e a bandeira britâ nica. No local em que "Dart", oalter ego australiano de Dwayne
colocaraoemblema"TrabalhoHonesto",haviaagoraumdecalquequedizia"AngusNegro".
Rayford icouimpressionadocomosotaquebritâ nicocarregadodeDwayneeaté mesmo
comovolumedesuavoz.
—Muitobem,cavalheiros—eledisse.—SouIanHill,proprietá riodaaeronave,eestaé
minhaesposa,Eiva.Obrigadoporcuidaremdoreabastecimento.
Rayford apresentou-se como Jesse Gonder, e um dos funcioná rios entregou-lhe um
envelopecontendochaveseumbilhetequedizia:"Vocêselembradocaminhão.Vácomeleaté
esteendereço.Sigoatrásdevocê.AlB."
Rayford encontrou o velho caminhã o de Albie, e eles se dirigiram até um local de
comé rcio muito movimentado no centro da cidade. Ele, Dwayne e Trudy aguardaram Albie
sentadossobotoldodeumagitadocaféencravadonumaconstruçãodepedra.
Aparentemente, Dwayne sabia manter um tom de voz baixo em pú blico, principalmente
quando precisava acentuar seu sotaque britâ nico. Os trê s bebericavam refrigerantes enquanto
RayfordeDwayneconversavamreservadamentesobreoComandoTribulaçã o.Trudycochilava
entreumgoleeoutro.
—Sintomuito—eladisse.—Foiaventurademaisparaumdiasó.
—Elaé umverdadeirosoldado—cochichouDwayne,olhandoparaosfreguesessentados
porperto,que,provavelmente,nã oentendiamoqueeledizia.—Masachoqueelanunca icou
tãoassustadanavida.
Trudyconcordoucomacabeçaeemseguidacontinuouacochilar.
— Sua ilha é um azougue, e nã o me importo de dizer isso a você , Rafe. Sei que você s
todos tê m muitas idé ias, mas ela conseguiu organizar essa cooperativa como ningué m. Você
sabequetenhosidoexageradamentearrojadoarespeitodeminhascrenças.
—Ouvidizer.
— Vou ter de pô r um im nisso assim que exigirem que a gente tenha uma marca para
comprar e vender. A posiçã o que defendo vai icar clara, e, pelo que entendo, posso perder a
cabeça. Todos nó s podemos perder a cabeça. Pelo menos é isso o que dizem as mensagens do
pastorBen-Judá.
Rayford deu um sorriso cansado. Ele estava pensando em Hattie e na tolice que ela
cometeraparaserpresa.Maselenuncaviraninguémreferir-seaTsioncomopastorBen-Judá,e
gostoudisso.Eraumtı́t uloperfeito.EleeramaisqueumpastordoComandoTribulaçã o.Erao
pastordequalquerpessoaquedesejasseouvirsuaspregaçõescibernéticasdiárias.
Enquanto Dwayne falava sobre a honra que ele e Trudy sentiam por ser os elementos
principaisdaregiã osudoestenaconduçã odosnegó c iosdacooperativademercadorias,Rayford
pensava na sugestã o de Leah. Ela estava certa; nã o tinha mais obrigaçõ es familiares. Talvez
pudesse deslocar-se de um lugar para outro. Era uma fugitiva recente em comparaçã o aos
outrosquemoravamnacasasecreta.Sua isionomiasó seriareconhecidapelopessoaldaCGde
sua cidade. Com um pouco de maquiagem, lentes de contato, tintura no cabelo, ela poderia
viajarparaqualquerlugar.
AtémesmoparaBruxelas.
ElapoderiapassarporparentedeHattie.Algué mteriadedaraelaatristenotı́c iasobre
sua irmã . Rayford esperava que a CG mantivesse Hattie viva até que ela se convertesse, mas
nã o se importaria se ela icasse presa até que eles ultrapassassem a metade do perı́odo da
Tribulaçã o. Se ela fosse libertada, tentaria assassinar Nicolae. Rayford tinha de admitir que
aquela façanha lhe pertencia. Embora soubesse que agiria de modo ridı́c ulo, ele teria mais
condiçõ esqueHattiedeperpetraroato.Fossequemfosseoautordocrime,nã osairiaileso.Ele
orou silenciosamente:Senhor, peço-te que entendas meus motivos. Eu desejo o que tu desejas.
DesejoqueHattiesejasalvaantesquecometaumatoquepossapôrumfimàvidadela.
—Eugostariadeconheceraquelegregodoqualvocêmefalou—Dwayneestavadizendo.
— Explorar o oceano a partir do Estreito de Bering, despachar grã os do sudoeste e
comercializarprodutosdaGré ciasã ocoisasquefazempartedaquiloqueaSra.Williamsjá pô s
emprática.Tudovaidarcerto,Rafe.
Uma charanga mais velha que o caminhã o emprestado por Albie freou com grande
estardalhaçonaruaestreita.Albiesaltou,deuumtapanalatariadacharangaeelacontinuoua
rodar, sacolejando. Rayford levantou-se para cumprimentá -lo, mas Albie, carregando um saco
de papel pardo, fez um gesto para que ele se sentasse. Albie curvou-se para cumprimentar
Trudy,maselaaindacochilava,apoiandooqueixocomamão.
—Umdemeusfuncioná riosmedissequeviupessoasestranhas—elecochichou,puxando
umacadeira.
—Podeconfiaremnós,Albie—disseDwayne.
—Eucon ioporquealgué mjá mefaloudosenhor—disseAlbie.—Osenhorestá comele.
Euconfionele,confionosenhor.
— Pessoas estranhas onde? — perguntou Rayford, nã o querendo se envolver novamente
comaCG.—Elasestãoaqui?
— Você nunca vai vê -las aqui — disse Albie. — Isso nã o signi ica que nã o estejam aqui.
Elasaprenderamasemisturarnomeiodopovo.
—Então,ondeelasestão?
—Noaeroporto.
—Precisamosvoltarparaaqueleavião,Albie.
—Nã osepreocupe.Pediaalgué mquecolasseumavisodequarentenanaporta,igualao
da CG, alertando que há vapores de enxofre a bordo. Ningué m vai ousar aproximar-se. E, até
onde sei, nã o há ningué m da CG na pista. Se você s conseguirem levantar vô o e permanecer
abaixodalinhadoradarporalgunsinstantes,poderãofugir.
—Maselesestãoànossaprocura?Albieencolheuosombros.
—Souumempresá rio,enã oumespiã o.Você sconhecemessascoisasmelhordoqueeu.
Vamos,deixe-memostrarasuamercadoria.Vocênãoseimportaqueseusamigosavejam?
—Dejeitonenhum.
—Vamosnosafastardaquiparatestá-la.
— Pre iro icar aqui com Trudy — disse Dwayne. Ela parecia estar dormindo
profundamente,comacabeçasobreosbraçosapoiadosnamesa.—Nã oseesqueçadenó saqui,
ouviu?
—Fiqueatento—cochichouRayford,levantando-se.
— Nã o se preocupe comigo, parceiro. Nã o vou cochilar. Nã o me divirto tanto desde que
minhairmãfoidevoradapelosporcos.
RayfordlançouumolharperplexoparaDwayne.
—Estoubrincando,Rafe.Éumaexpressãoqueusamosnointerior.
—Éverdade?—Leonperguntou.
—Nãoentendi,senhor—disseDavid,sentando-senoescritóriodeFortunato.
—Éverdadequevocênãoviuorelatóriodeauditoriainternasobreseudepartamento?
Davidlutouparamanteracalma.
— Eu sabia que eles estavam fazendo uma auditoria, mas achei que nã o icaram lá o
temposuficienteparafazerumrelatório.
—Eleschegaramaalgumasconclusões,eeunãogosteinemumpouco.
—Ninguémconversoucomigo.
— Desde quando o pessoal da auditoria interna conversa com algué m? Eles fazem o que
precisa ser feito, mas nunca trocam idé ias com ningué m. Você també m nã o vai gostar do que
elesencontraram,mascontinuoinsistindoparaquevocêrespondaàminhapergunta.
Davidsabiaquesuapulsaçãoestavarápidademaisetentoucontrolararespiração.
—Eugostariamuitodeanalisaroqueelesencontraramemeexplicardamelhormaneira
quepuder.
—Eleslhederamnotasaltas.Disseramqueaculpanãoésua.
—Culpa?
—Pelo iasco,pelofracasso,masqueissonã otemnadaavercomsualiderança,queeles
consideramexcelente.
—Oqueelesestãochamandodefracasso?
— E claro que o fracasso nã o tem relaçã o com o estado de espı́rito de seus funcioná rios.
Nem com sua é tica de trabalho, David. Com exceçã o do potentado e de mim, você trabalha
muitomaisdoquequalqueroutrapessoa.
—Bem,eunãosabiadisso...
— O ponto principal, Hassid, é que eles estã o recomendando cancelar o projeto para
detectarastransmissõesviaInternet.
—Oh!não!Eugostariadecontinuartentando.
—Seiqueessetrabalhoé ameninadeseusolhosequevocê pô saalmaeocoraçã onele.
Ofatoéqueocustodoprojetonãoécompensador.
— Mas nã o valeria a pena investir um pouco mais de tempo para ver se conseguimos
descobriralgumacoisa?
— Você nã o está nem perto de descobrir alguma coisa, está , David? Seja honesto. A
auditoriainternadizquevocênãoobtevenenhumsucessodesdeodiaemqueoequipamentofoi
instalado e que, em razã o do nú m ero de horas trabalhadas e do dinheiro que foi gasto, nã o faz
sentido dar prosseguimento ao projeto. David simulou uma expressã o de grande
desapontamento.
— Vou voltar à minha pergunta inicial — disse Leon. — E verdade? E verdade que esse
projetoestánostrazendomaisdoresdecabeçadoqueesperávamos?Devemoscancelá-lo?
—Oqueopotentadovaidizer?
— Esta é a minha preocupaçã o. Vou usar o argumento de que nã o temos tanta
necessidadedesaberdeondepartemaquelese-mailsequeosseguidoresdeBen-Judá estã onos
fazendodetolos.Elevaiconcordar.Evocê?
—Quemsoueuparadiscordardopotentadoedosupremocomandante?
—Éassimquesefala,garoto.
—Semmencionaraauditoriainterna.
— Você entendeu o espı́rito da coisa. Tenho uma idé ia para aproveitar aquelas horas de
trabalhoeoscomputadores.
—Quebom!Detestodesperdiçartempoedinheiro.
—Agoraqueatripulaçã odacabinadecomandovoltouaotrabalhoequeoFê nix216está
totalmente equipado, Sua Excelê ncia incumbiu-me de fazer uma viagem para visitar as dez
regiõesnaspróximassemanas.Comopreparativoparaacelebraçãodegalaportermoschegado
ao ponto intermediá rio do acordo de paz de sete anos, assinado entre a Comunidade Global e
Israel,elegostariaqueeumereunissecomcadaumdospotentadosregionais,inclusivecomo
novolı́derafricano.Eugostariadepodercontarcomseusfuncioná rios,aquelesqueestarã ocom
otempoociosoemrazãodocancelamentodooutroprojeto...
—Comlicença,comandante,tenhoumaperguntatola...
—Aúnicaperguntatolaéaquelaquenãoéfeita.
Nunca ouvi essa pérola antes!, pensou David. — Bem, quero dizer que nã o diz respeito à
minhaáreadeatuação.
—Desembuche.
—Emtermosdecustos,nã oseriamelhorqueosdez...hã ...potentadosviessematé aqui
ouseencontrassemcomosenhoremalgumlugarqualquer?
—Seuraciocíniotemlógica,masexistemmotivosparaagirdamaneiracomolhefalei.—
Leon falava agora de maneira condescendente. Com as mã os abertas e juntando as pontas dos
dedos,eleprosseguiu.—Alé mdemuitasoutrasexcelentesqualidadesdeliderançaquepossui,
Sua Excelê ncia Nicolae Carpathia é um diplomata incompará vel. Ele lidera por meio de
exemplos. Lidera sendo ú t il aos outros. Lidera ouvindo. Lidera delegando poderes, e esta é a
razã odeminhaviagem.Opotentadosabequecadaumdeseusdezsubpotentadosnecessitater
asensaçãodequeestásemprecontandocomapresençadele.Paramantê-losleais,fortalecidos
e inspirados, ele prefere delegar-lhes autoridade e autonomia dentro de seus territó rios. O fato
de Sua Excelê ncia me enviar como seu emissá rio para visitá -los, digamos, em seus campos de
atuação,éumahonraparaeles.
— Isto lhes dará a oportunidade de estender seus tapetes vermelhos — prosseguiu
Fortunato-,provaraseussú ditosqueestã osendohonradoscomapresençadeumvisitantedo
palá cio. Em cada capital internacional, farei um convite o icial em pú blico ao potentado
regionalparaquecompareçaà FestadeGalaGlobalemsetembro.Seussú ditostambé mserã o
convidados, e insistiremos que estendam a viagem a Jerusalé m, fazendo uma peregrinaçã o a
NovaBabilônia.
—Interessante—disseDavid.
— Eu esperava este seu comentá rio. E é aı́ que você , seus funcioná rios e todos os
computadores disponı́veis entram na histó ria. Para mim, Sua Excelê ncia sempre foi um
exemplo impecá vel de orador pú blico. Você sabe que ele fala vá rios idiomas luentemente.
Minha luê ncianã ochegaatanto,maseugostariadecompreenderumafraseouduasdoidioma
faladoemcadagrupoprincipalaoqualdevereidirigirapalavra.Nã oseisevocê já notou,maso
potentadonunca,nuncamesmo,usagírias,nemmesmoduranteumaconversainformal.
—Tenhotidopoucocontatocomele...
— Claro. Mas deixe-me falar sobre o magnı́ ico dom de orató ria que ele possui e de sua
habilidade inigualá vel para memorizar pá ginas e pá ginas de um discurso, fazendo com que
jamais pareça longo ou inoportuno. A verdade é a seguinte: o potentado Carpathia conhece a
histó ria de cada paı́s que visita com detalhes, tanto quanto o pró prio povo a quem ele dirige a
palavra. Você já teve a oportunidade de ver os videoteipes de seu primeiro discurso na
OrganizaçãodasNaçõesUnidastrêsanosatrás?
—Tenhocertezadequetodosnóstivemos.
—Aquelediscursoemsi,David,praticamenteselousuanomeaçã ocomosecretá rio-geral
e,depois,lı́derdanovaordemmundial.Elesubiuà tribunacomoumsimplesoradorconvidado,
presidente de um pequenino paı́s do leste europeu. A posiçã o que o potentado ocupou como
secretá rio-geral nem sequer estava vaga quando ele iniciou seu discurso. No entanto, com sua
inteligê ncia,poderdeseduçã o,perspicá cia,conhecimentodoidiomadecadapaı́s iliadoà ONU
e uma extraordiná ria narrativa da histó ria daquela importante instituiçã o, ele granjeou a
simpatia do mundo inteiro. Se nã o tivé ssemos acabado de perder entes queridos em
conseqüênciadosdesaparecimentosem
todooplaneta,quenos izerammergulharnomaisprofundosofrimento,eugarantoquea
platé ia que assistiu à quele maravilhoso discurso teria sido muito maior. Mas, aparentemente,
tudo transcorreu conforme Deus ordenou, e Sua Excelê ncia foi perfeito naquele momento.
Fortunatotinhaumolharperdido.
—Ah!foiummomentomá gico—eledisse.—Eusabia,dentrodocoraçã o,queseumdia
tivesse o privilé gio de contribuir, nem que fosse de maneira ı́n ima, para os ideais e objetivos
daquele homem, eu con iaria minha vida a ele. Você já sentiu a mesma coisa a respeito de
alguém,David?
—Possodizerquesim.Sintoessamesmadevoçãodentrodemim.
AquelafrasepareceutirarLeondeseusdevaneios.—Sério?Possosaberquemé?
— Quem é ? O senhor quer saber quem eu... idolatro a ponto de con iar minha vida a ele?
Ah!sim.MeuPai.
—Quecoisabonita,David.Eledeveserumhomemmaravilhoso.
—Oh!Eleé.EleécomoDeusparamim.
—Verdade?Oqueelefaz?
—Eleécriativo,trabalhacomasmãos.
—Mas,peloqueentendi,éocaráterdelequeofascina.
—Maisdoqueosenhorpodeimaginar.Maisdoqueeupossodizer.
—Deveseralguémmuitoespecial.Euadorariateraoportunidadedeconhecê-lo.
— Ah! o senhor terá — disse David. — Tenho certeza de que o senhor se encontrará um
diacomEle,faceaface.
— Espero que esse dia chegue logo. Mas fugi da minha linha de raciocı́nio. Vou voltar ao
ponto em que parei e, em seguida, liberarei você . Desculpe-me, mas gosto de incentivar um
jovemlealquetemumacarreirapromissora.
—Nãoháoquedesculpar.
— Eu gostaria que seus funcioná rios usassem aqueles computadores para vasculhar fatos
importantes a respeito de cada homem que vou visitar, sua regiã o, sua histó ria. Se souber
informaçõ es detalhadas sobre eles, poderei homenageá -los. Você poderia conseguir isso para
mim, David? Preciso de informaçõ es que me façam parecer admirá vel, que façam Sua
Excelênciapareceradmirável,oqueserámuitobomparaaComunidadeGlobal.
—Aceitareiseupedidocomoumdesafiopessoal,senhor.
CAPÍTULO18
Estrelas cintilavam no cé u escuro quando, inalmente, Albie parou o velho caminhã o em
um local poeirento de uma planı́c ie deserta. Ele deixou os faró is do veı́c ulo acesos iluminando
umapedragrandepró ximaaumaá rvore,cercadecemmetrosdedistâ ncia.Albiesaltouparaa
carroceriadocaminhão,subiunacabinaeolhouparatrás.
— Meus olhos precisam acostumar-se à escuridã o — ele disse -, para eu ter certeza de
queestamossozinhos.—Satisfeito,elepulouparaacarroceriae,emseguida,paraochão.
—Eucostumavadescerdaquicomumsaltosó.Masmeutornozelo...vocêselembra?
—Foiferidonoterremoto—disseRayford.
— Nã o foi tã o grave, considerando tudo o que aconteceu. Albie fez um gesto para que
Rayfordoseguisseaté afrentedocaminhã o,ondeeleseagachoudiantedosfaró isepegouuma
sacoladepapel,tirandodelaumapeçaretangulardemetalpreto,semelhanteaumacaixade
maisoumenos25centímetrosdecomprimentopor12delargurae4dealtura.
—CapitãoSteele,istoaquiésensacional.Custacaro,masencontreioqueosenhorqueria.
Observe atentamente e veja como a peça é feita. Se o senhor nã o conhecer o truque, nã o vai
sabercomofunciona.Segureparaterumaidéiadoqueistorepresenta.
Rayford pegou a peça e icou impressionado com seu peso e solidez. Nã o havia emendas
visíveis,eapeçapareciaresistente.
—Abra—disseAlbie.
Rayford revirou a peça sob a luz, procurando uma trava, um dispositivo para abrir, uma
molaparaapertar,qualquercoisa.Nãoviunada.
—Tente—disseAlbie.
Rayfordsegurouapeçapelaspontasepuxoucomforça.Emseguida,procurouportodosos
ladosparaversehaviaalgumaabertura.Virou-a,sacudiu-aeapertouasbeiradas.
—Estouconvencido—eledisse,devolvendo-aaAlbie.
—Oqueestapeçafazlembrar?
— Uma pedra de lastro. Talvez algum tipo de peso. Quem sabe uma antiga bateria de
computador?
—Oqueosenhordiriaaoagentedaalfândegaseesteobjetoaparecessenateladoradar?
—Umadascoisasqueeucitei.Eudiriaquedevepertenceraocomputadorquedeixeiem
algumlugarduranteminhaúltimaviagem.
—Vaifuncionar,porqueelenãoserácapazdeabrir.Sóseelefizeristo,masnãoacredito.
Albie segurou a peça diante de si, na posiçã o horizontal, e colocou o polegar esquerdo no
canto superior esquerdo, irmando o dedo mé dio esquerdo na parte de trá s do canto inferior
esquerdo. Depois, fez o contrá rio com a mã o direita, colocando o polegar no canto inferior
direito,odedomédionapartedetrásdocantosuperiordireito.
— Estou empurrando delicadamente com os polegares e irmando os dedos. Quando eu
sentirumlevemovimentoindicandoqueapeçaestá sendodestravada,passoospolegarespela
borda inferior, coloco os dedos indicadores na borda superior, seguro com força e puxo. Veja
comoelaseabrefacilmente.
Rayfordtinhaaimpressãodequeestavapresenciandoumtruquedemágicaaumpassode
distâ ncia, sem ter nenhuma pista de como funcionava. A peça abriu-se pouco mais de dois
centímetros,eAlbieafechourapidamente.
—Asemendasparecemsumir,porqueestaé umapeçainteiriçafeitadeumblocodeaço.
Tentemaisumavez,capitão.
RayfordcolocouospolegareseosdedosmédiosnoslugaresindicadosporAlbie.Quandoele
apertousuavementeospolegaresesentiuapressã onosdedos,percebeuumlevemovimentode
que a peça estava sendo destravada. Ele se lembrou de um brinquedo dos tempos de infâ ncia,
queconsistiaemtentarfazerumamoedinhacairdentrodeumburacorasofeitoemumpedaço
de cartolina. A moeda só caı́a quando se inclinava num ponto determinado, nem mais nem
menos.
Ele segurou as extremidades da peça conforme Albie izera, e ela se abriu suavemente.
Em sua mã o esquerda, estava um bloco de aço compacto, no formato de um grande quebracabeça,queseajustavaperfeitamentecomaarmapesadaemsuamãodireita.Impressionante.
—Estácarregada?
—Algué mmeensinouquesempredevemostermuitacerteza,aosegurarumaarma,de
queestá descarregada.Muitaspessoasjá morreramemacidentescomarmasqueacreditavam
estarsembalas.
—Concordo.Mas,eseeuapontareatirar...
—Abalavaiserdisparada?Sim.
—Vocêtemalgoqueeupossacolocaremcimadaquelapedraeusarcomoalvo?
—Porenquanto,émelhorsómirarnapedra.Vocêprecisaacostumar-secomaarma.
—Eueraumbomatiradornostemposdaacademiamilitar,anosatrás.
—Sóanos?Nãodécadas?
—Quebeleza!Fuiofendidopormeufornecedor.
—Conheçaprimeiroasuaarma.
Rayfordcolocouobloconochã o,segurouaarmaeexaminou-adetalhadamente.Embora
fosse muito pesada, era bem-feita e adaptava-se perfeitamente à palma de sua mã o. Ele
imaginousenãoseriadifícilsegurá-lacomfirmezaemrazãodopeso.
— Nenhuma outra arma — disse Albie — possui esse mecanismo. Só os ri les de alta
potê ncia.Nã oé necessá rioengatilhar.Elaé semi-automá tica.Você precisapuxarogatilhopara
cada novo tiro, mas ela dispara uma seqü ência de tiros rapidamente enquanto você solta o
gatilho e o puxa de novo. Acho que é a arma mais barulhenta que existe, e eu recomendo que
você usealgumacoisaparataparoouvidoque icapró ximoà arma.Porenquanto,bastacobrir
oouvidocomaoutramão.
—Nãoestouvendotravadesegurança.
— Nã o existe. Você simplesmente aponta e dispara. A ló gica por trá s desta peça é que
vocênãoprecisaabriroblocodeaçoedeixaraarmaàvista,anãoserquepretendaatirar.
Evocênãovaiquereratirar,anãoserquepretendadestruiraquiloquevocêestámirando.
Sevocê atirarnaquelapedra,vaidestruı́- la.Sevocê derumtiroeatingirumadaspartesvitais
docorpodeumapessoa,a60metrosdedistâ ncia,vaimatá -la.Sevocê atingi-laemumaparte
neutra, atirando da mesma distâ ncia, a muniçã o vai rasgar pele, carne, gordura, tendõ es,
ligamentos,mú sculoseossoseatravessarocorpodeixandoduasperfuraçõ es.Sevocê estivera
trê smetrosdedistâ ncia,acá psulaocaterá tempodeseabrirporcausadocalordaexplosã odo
tiroedaforçacentrı́fugaprovocadapelarotaçã odabala.Asestriassulcadasdentrodotambor
produzemarotação.Oprojétilfica,então,comquasequatrocentímetrosdediâmetro.
—Abalaseabreesetransformaemumdiscogiratório?
—Exatamente.Conformeeulhedisseportelefone,umabalaqueerrouoalvoepassoua
cinco centı́m etros de um homem a uma distâ ncia de quase dez metros do atirador causou-lhe
umferimentoprofundosó porcausadodeslocamentodear.Sevocê acertaralgué mqueesteja
aumadistâ nciaentre3e60metros,oburacodabalavaiserdemaisoumenos15centı́m etros
de diâ metro, dependendo da parte do corpo que ela atingir. A bala, a iada e girando
rapidamente,perfuraqualquercoisaqueestejanocaminhoporcausadesuaaltı́ssimarotaçã o.
O sangue coagulado ica grudado nela como grama na lâ mina de um cortador, e ela se
transformaemumgrandeobjetodedestruiçã o.Duranteotestedestaarma,umté cnico,auma
distâ ncia aproximada de seis metros, recebeu um tiro acidental acima do joelho. A perna dele
foipraticamentedecepada.Apartedebaixo icoupresasó poruma inatiradepeledecadalado
dojoelho.
Rayfordsacudiuacabeçaeolhou irmeparaaqueleobjetomedonhoquetinhanasmã os.O
queeleestavafazendo?Seráqueseatreveriaacarregaraquelamonstruosidade?Teriacoragem
deusá-la?Seriamuitodifíciljustificar-sedizendoqueaquiloeraumaarmadedefesa.
— Você está tentando me convencer a icar com a arma ou a desistir dela? — Rayford
perguntou.
Albieencolheuosombros.
— Quero que você ique satisfeito com a compra. Nã o aceito reclamaçõ es. Eu disse que
poderia encontrar uma mais barata. Você disse que queria e iciê ncia. Nã o me interessa o que
você vai fazer com esta arma e nã o quero icar com ela. Mas eu lhe garanto, capitã o, que, se
umdiavocêtiverdeusá-laparaacertaralguém,nãovaiprecisarusá-laduasvezes.
—Nã osei—disseRayford,comocorpodoloridoporter icadoagachado.Elemudoude
posiçã o,pegouaoutrametadedapeçaesegurou-aolhandodefrenteparaaarmaa imdever
comoelasseajustavam.
—Pelomenos,façaumatentativa—disseAlbie.—Vaisersóumaexperiência.
—Espero.
Rayfordpô sobloconochã onovamente, icouempé entreosfaró isdoveı́c ulo,afastouas
pernaseapontouaarmaparaapedra,firmandoamãoqueapertariaogatilhocomaoutra.
Albietapouosouvidos.Emseguida,disse:
—Vocêprecisataparoouvidodireito.
Rayford en iou a mã o no bolso e pegou o bilhete que Albie havia escrito. Rasgou um
pedaço,umedeceu-onalı́nguaeamassou-ofazendoumabolinha.Colocou-anoouvidoevoltou
àposiçãodeatirar.
— E estranho nã o poder engatilhar esta arma — ele disse. -Tenho a sensaçã o de que ela
estáprontaeeunão.
—Nã oestououvindonada—gritouAlbie.—Estoucommedodequevocê atirequando
eutirarasmãosdosouvidos.
A arma estava relativamente perto do ouvido que Rayford protegeu com a bolinha de
papel.Quandoeleapertouogatilho,recebeuumtrancoqueoatiroudecostascontraocapodo
caminhão,fazendo-ocairsentadonopára-choquee,emseguida,nochão.Aexplosãosooucomo
uma bomba e o deixou surdo por alguns instantes, impedindo-o de ouvir o eco. Rayford icou
satisfeito por nã o ter apertado novamente o gatilho no momento em que caiu no chã o. Albie
olhavaparaelecomardeexpectativa.
—Vocêtinharazão—disseRayford,comoouvidozumbindo.—Foiumaexperiência!
—Veja—disseAlbie,apontandoparaumlocaldistante.Rayfordsemicerrouosolhospara
vermelhor.Apedrapareciaintacta.
—Euaatingi?—eleperguntou.
—Vocêacertounaárvore!
Rayford mal podia acreditar. A bala tinha atingido o tronco a uma altura de quase trê s
metrosdochão,umpoucoabaixodosgalhos.
—Euprecisoverisso—eledisse,levantando-sedochãocomesforço.
Albieoseguiue,aochegarperto,viuquemaisdametadedotroncohaviasidodecepada.
A outra parte que icou intacta nã o agü entou o peso dos galhos e a copa da á rvore desabou no
chão,caindoaoladodapedra.
—Ouvifalarqueexistemcirurgiõesdeárvores—disseAlbie.—Mas...
—Quantasbalaselacomporta?
—Nove.Quertentarnovamenteparaverseconsegueacertaroquevocêestámirando?
—Vouterdecontrabalançaropeso.Elapuxaparacimaeparaadireita.
—Não,nãopuxa.
—Vocêviuoqueeuacertei.Euestavamirandoomeiodapedra.
—Perdoe-me,capitão,masoproblemanãoestavanaarma.Estavanoatirador.
—Oquê?
—Emsuaprofissão,diriamquefoiumerrodopiloto.
—Oquefoiqueeufiz?
—Vocêhesitou.
—Nãohesitei.
—Hesitou.Você esperououvirosomforteeaaçã oe,semquerer,apontouotamborpara
cimaeparaadireita.Destavez,alé mdeconcentrar-senoquevocê está fazendo, irmebemo
péatrásparapodersuportarotrancocomasduaspernas.
—Émuitacoisaparaagentepensar.
—Tente.Casocontrá rio,você vaicairnochã ooutravezedarumtirodemisericó rdiana
árvore.
Rayfordtapouosdoisouvidos, irmouapernadireitanochã oedobroulevementeooutro
joelho. Ele nã o poderia hesitar de jeito nenhum no momento de apertar o gatilho. Com os
ouvidosbemtapadoseatentoparanã obatercomascostasnocaminhã o,elemirouapedrae
atirou. Uma parte enorme do topo explodiu! Rayford recolheu do chã o um pedaço de pedra de
cercade25centímetrosdediâmetropor8centímetrosdeespessura.
—Apropósito,quemfabricaestacoisa?
—Sósabequemprecisasaber.
—Elanãotemmarca—disseRayford.—Comoéonomedela?
—AspessoasqueconhecemaarmaachamamdeSabre.
—Porquê?
Albieencolheuosombros.
—Talvezparaqueaoutrapartedapeçapossaserchamadadebainha.Quandooblocoea
armaseencaixam,apeçaficaparecidacomumaespadadentrodabainha.
Albie mostrou novamente a Rayford como montar a peça e a colocou numa sacola de
papel.Emseguida,levouRayforddevoltaaocentrodacidadenovelhocaminhão.
_Vocêdevesaberqueeunãocarregotantodinheiroassim—disseRayford.
—Euarecebiemconsignação.Vocêpodememandarodinheirodaquiaduassemanas?
—Macvaicuidardisso.-Muitobom...In!...Oh!...
Rayfordlevantouacabeça.Aestradaquedavaacessoà á reacomercialestavabloqueada
por carros das Forças Paci icadoras da CG com luzes pisca-pisca. Albie desviou pelas ruas
secundá rias. Quando eles avistaram o café , Albie parou bruscamente e deu um longo suspiro.
Rayfordfoiatiradoparaafrente,batendoacabeçanopá ra-brisa.Umamultidã oestavanarua.
Nãohavianinguémnocafé,anãoserosTuttles.
Trudy continuava sentada na mesma posiçã o em que Rayford a deixara, com a cabeça
apoiadanosbraçossobreamesa.Mashaviaumenormeburaconapartedetrásdesuacabeça,e
elaestavacobertadesangue,quepingavanochão.
Ao lado dela, de frente para Rayford, estava o grandalhã o, loiro e sardento Dwayne. Sua
cabeça tinha sido atirada para trá s, e seus braços pendiam ao longo do corpo, mã os abertas e
polegares apontando para fora. Em sua testa, havia uma perfuraçã o redonda, de onde jorrava
sangueformandoumapoçadebaixodacadeiraemqueeleestavasentado.
Rayfordfezmençãodeabriraportadocaminhão,massentiuosdedosdeAlbieagarrandolheobraçocomforça.
— Você nã o pode fazer nada por eles, amigo. Nã o mostre a cara na frente de seus
inimigos.Dê-meseucelular.
Atordoado, Rayford entregou-lhe o celular. Em seguida, começou a esmurrar o painel do
caminhã o, enquanto Albie afastava-se em marcha a ré do local, atravessando um terreno
arenoso.Elefalourapidamenteemsualı́nguanativa.Emseguida,desligouocelulareocolocou
aoladodeRayford.
Rayfordnã oconseguiaparardeesmurraropainel.Suacabeçalatejava,eospunhosdoı́am
por causa dos murros. Seus dentes estavam cerrados, e seu cé rebro zunia. Parecia que sua
cabeçaiaexplodir.Oinstintolhediziaparaorar,maselenã oconseguia.Suasforçasseesvaı́am
comoseeletivessedeixadoumatorneiraaberta.Afundou-senobancodocaminhão.
— Preste muita atençã o — disse Albie. — Você sabe que quem fez aquilo está atrá s de
você .Elesvã o icardetocaianoaeroportoetalvezjá tenhamcolocadoumcaçaoudoisnoar.
Vocêsabepilotaraqueleavião?
—Sei.
— Eu pedi a um funcioná rio da torre que avisasse que o aeroporto ia icar fechado por
causa de ventos na redondeza. Ele vai dar dez minutos para o pessoal sair antes de apagar as
luzes da pista. Ele me disse que nã o há ningué m perto de seu aviã o, mas que há muito mais
gente no aeroporto do que o normal. O local vai estar escuro e vazio, assim espero, quando
chegarmoslá.Mas,paramaiorsegurança,voupedirquevocêdesçaantesqueeuentrenatorre.
Caminhe no escuro até seu aviã o. Quando eu ouvir o barulho dos motores, acendo as luzes da
pistaparavocê.
Rayfordnã oconseguiafalaremuitomenosagradeceraAlbie.Aliestavaumhomemque
nem sequer era crente, mas era inimigo de Carpathia e estava disposto a fazer qualquer coisa
para contrariá -lo. Albie nã o conhecia a situaçã o de Rayford e pedira-lhe, insistentemente, que
nã o lhe contasse. Ele nã o queria saber. Poré m, ao tentar ajudar Rayford, estava arriscando a
própriavida.Rayfordjamaisseesqueceriadisso.
Elesestavamchegandoaoaeroportoquandoasluzesseapagarameumapequena ilade
carros saiu do estacionamento. Albie parou e fez sinal a Rayford para que descesse, apontando
paraaá reaaoredordoaeroporto,agoracompletamenteà sescuras.Rayfordpegouasacolae
começou a descer, mas Albie o segurou e abriu a peça de aço. Em seguida, entregou as duas
partesaRayford.Colocouumpoucomaisdemuniçã onapalmadamã oeadespejounobolsode
Rayford.
— Para uma eventualidade — ele disse, guardando a sacola de papel vazia debaixo do
banco.
A raiva deixou Rayford com a garganta apertada, impedindo-o de falar. Ele guardou a
armaemumdosbolsoseobloconooutro,pegouseucelulareestendeuamã oparaAlbie.Eles
trocaramumforteapertodemão.
—Eusei,eusei...—disseAlbie.—Agoravá.
Rayfordcaminhouapressadonoescuropeloterrenoarenoso,livrando-sedomatorasteiro
e ouvindo sua pró pria respiraçã o ofegante. Quando inalmente suas cordas vocais destravaram,
elecomeçouagemeracadarespiração.Derepente,deuumurroabafado,tãoforteeagudoque
chegoua icarzonzoequasecaiunochã o.Quandoestavaauns30metrosdoaviã o,eleouviuo
somdepassosatrásdeleeumgrito.
—RayfordSteele!PareemnomedasForçasPacificadorasdaComunidadeGlobal!
— Nã o! — resmungou Rayford. Ele continuou a caminhar e en iou a mã o no bolso para
pegaraarma.
—Vocêestápreso!
Elecontinuouacaminhar.
—Pareoueuatiro!
Rayford sentiu um comichã o nas costas. Parecia um acontecimento distante e irreal ele
terludibriadoumoutrohomemdaCGnaquelemesmodia...Elesacouaarmaevirou-se.
Comafracaluzquevinhadaestrada,eleavistouovultodohomemdaCGaproximandose,dearmaempunho.
Rayfordparou.
— Nã o me obrigue a atirar em você ! — ele gritou, mas o homem continuou a caminhar
emsuadireção.
Rayford apontou a arma para baixo e atirou no chã o, a cerca de um metro do homem,
levantando uma nuvem de areia. O homem voou para trá s e caiu de bruços com um grito,
soltando a arma. Rayford correu na direçã o do aviã o. Ao olhar por cima do ombro, ele viu o
homemestendidoimóvelnochão.
Deus, não permitas que ele morra! ele orou, abrindo a porta com força e mergulhando
dentrodoavião.Quandofechouaporta,eleviuqueestavabanhadodesuor.Eunãoqueriamatar
aquelehomem!
Rayfordpulouporcimadoencostodapoltronadopilotoeligouosmotores.Oponteirodo
mostradordotanquedecombustı́velsubiu,osoutrosdispositivosbrilharamnopaineleasluzes
dapistaforamacesas.
—Tudocerto?—eleperguntoupelorá dio,tomandoocuidadodenã omencionaronome
deAlbie.
—Doisfantasmasaseismilhasaonorte—soouaresposta.Elespoderiamalcançá -loem
segundos,masesperariamqueeleseguisseparaoesteedecolasserapidamente.
Rayford olhou para a sua esquerda antes de alcançar a velocidade para decolagem. O
homem da CG conseguira levantar-se do chã o e cambaleava como se estivesse recuperando a
respiraçã o e procurando sua arma. O Super J subiu suavemente e Rayford rumou para o sul,
permanecendo abaixo da linha do radar até ter a certeza de que nã o estava sendo seguido.
Pouco depois, ele acelerou o mais que pô de. O impulso fez seu corpo grudar no encosto da
poltrona. Ele embicou o aviã o na direçã o das estrelas e rumou para o oeste. Tudo o que ele
queriaeracruzarocé u,alcançaravelocidademá ximanaaltitudemaisfavorá velevoltarpara
casaafimdereverseuscompanheiros.
Passavaumpoucodomeio-diaemIllinois.TsionBen-Judá estavaempé olhandoparafora
atravé s da janela do andar superior da casa secreta. O verã o se aproximava. Ele acabara de
fazer uma refeiçã o leve com Buck, Chloe, o bebê e Leah. Leah havia revelado ser uma mulher
extraordiná riaefervorosa.Elenã oentendiaporqueRayfordseaborreciacomela.ParaTsion,
elaeramuitosimpática.
Ele havia quase terminado sua mensagem aos ié is e ia começar a revisã o que seria
transmitidadaliapoucosminutos.Namensagem,eleadvertiaquequantomaisocalendá riose
aproximasse de setembro — o 42° mê s do perı́odo da Tribulaçã o — o nú m ero de mortes
provocadas pelos 200 milhõ es de cavaleiros chegaria cada vez mais perto de atingir a terça
partedapopulaçã o.AgravidadedamensagementristeceuTsion,eelesentiuumsú bitodesejo
deorarporseuvelhomentorecompatriota,ChaimRosenzweig.
Pai,eleorou,já não sei mais como orar por meu amigo. Prosseguindo em sua intercessã o,
ele citou um versı́c ulo bı́blico:"Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa
fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós
sobremaneiracomgemidosinexprimíveis.Eaquelequesondaoscoraçõessabequaléamentedo
Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos." E, concluiu
dizendo:Obrigado,Senhor.
E, quando abriu os olhos, Tsion Ben-Judá pensou, a princı́pio, que estivesse sonhando.
Tomando conta de todo o seu campo de visã o, do outro lado da vidraça, havia um exé rcito de
cavaleiros montados em cavalos preparados para a guerra. Centenas e centenas de milhares,
cavalgando,cavalgando.Acabeçadocavaloerasemelhanteà cabeçadeumleã o,eeleexpelia
fogoefumaçapelaboca.
Tsionjá haviaescritoaesserespeito,tinhaouvidorelatosdeoutraspessoas,desejandono
ı́ntimo ter um vislumbre dessa cena. Mas agora, enquanto os itava com os olhos arregalados,
sempiscar,querendochamaroscompanheiros,principalmenteBuck,quetambé mnã ooshavia
visto,elenãoconseguiaproferirumasópalavra.
No meio do dia, com o sol da primavera a pino banhando a cena, o imenso exé rcito de
cavaleiros parecia irado e determinado. Suas couraças coloridas brilhavam, e os enormes
animais nos quais eles estavam montados lado a lado movimentavam-se fazendo um ruı́do
estrondoso, ganhando velocidade e passando do trote para o galope e do galope para uma
corrida desenfreada. Parecia que o tempo deles havia chegado. As incursõ es ocasionais tinham
sidoumsimplesensaio.Acavalariademonı́aca,quesó poupariaosescolhidosdeDeus,disparou
enraivecidaparaatacartodaaTerra.Aquelecertamenteseriaseuataquefinal.
—Tsion!—chamouBuck,dopédaescada.—Olhepelajanela!Rápido!
Rayford ajustou os controles do Super J no rendimento má ximo do piloto automá tico. O
cansaço havia tomado conta de seu corpo, mas ele nã o queria cochilar, mesmo tendo uma
tecnologia tã o avançada à sua disposiçã o. Quando pegou o celular para ligar para casa, seus
olhos captaram uma cena estranha a algumas milhas abaixo. Fogo e rolos de fumaça preta e
amarelasubiampartindodeumain initaextensã odemilhõ esdecavaleirosecavalosagitados,
quecruzavamrapidamenteooceanoemdireçãoàterra.
CAPÍTULO19
TrêsMesesDepois
Omê sdeagostocomeçouquenteeú m idoemMonteProspect,semvento,eoarestava
quasetãoparadoquantoRayford.Acasasecretanãopossuíaar-condicionadoe,comamorteda
metadedapopulaçãomundialdesdeoArrebatamento,nadavoltaraasercomoantes.
Umterrívelpressentimentotomavacontadetodosdacasa.Osânimosestavamexaltados,
e os nervos, à lor da pele. O bebê já dava seus primeiros passos e falava algumas palavras,
passandoaseroú nicoatrazerumpoucodealegriaà casa.MasKennytambé mandavairritado
com o calor, e até mesmo Tsion saı́a da sala quando a criança começava a icar irrequieta e
Chloenãoconseguiaacalmá-la.
SeoArrebatamentohaviaimpostoumsofrimentocoletivoaomundoporcausadaperda
defamiliaresedetodasascrianças,eoterremotodagrandeiradoCordeiromodi icaraomodo
de vida e a forma de locomoçã o do povo, os julgamentos que se seguiram haviam sido piores
ainda. A escuridã o temporá ria do Sol, da Lua e das estrelas, a destruiçã o de um terço da
populaçãodaTerrapormeiodefogo,oenvenenamentodeumterçodaáguaeagoraamatança
de mais de um bilhã o de pessoas... bem, pensava Rayford, seria difı́c il haver algué m com as
idéiasnolugar.
Talvez nã o houvesse. Talvez todos tivessem enlouquecido. Rayford alimentava
pensamentos que ele pró prio considerava absurdos. Haveria a possibilidade de acordar ao lado
de sua querida esposa Irene — tã o negligenciada e desprezada -, de ver Raymie, de apenas 12
anos, dormindo no quarto, no im do corredor, de ainda ter tempo de ser o marido e o pai que
deveria ter sido? Teria isso tudo sido apenas um aviso em forma de sonho, como o daquele
personagemdofamosocontodeNataldeCharlesDickens,queviucomoseriaterrı́velsuavida
futurasenãomudasseseumododeser?
Será que ele despertaria um novo homem, pronto para entregar sua vida a Deus,
exercendoinfluênciapositivasobresuafilha,suaesposaeseufilho?
Talvez fosse possı́vel, nã o? Ou tudo continuaria a ser o pior dos pesadelos? Rayford sabia
que seu cé rebro limitado nã o havia sido programado para assimilar todo o sofrimento que lhe
fora imposto. Ele nã o queria mais nem pensar em tudo o que vira, tudo o que perdera. A dor
haviasidomaiordoqueummortalpoderiasuportare,mesmoassim,elecontinuavavivo.
O mundo inteiro tinha sido convidado para a Festa de Gala Global a realizar-se dali a um
mê s em Jerusalé m. Como Carpathia ousava fazer tal festa? Como poderia concordar com essa
grande comemoraçã o, sabendo que o nú m ero de pessoas mortas na ú ltima praga havia sido
maiordoqueodedesaparecidosnoArrebatamento,trêsanosemeioantes?
Tsionalertouseusleitoresanã ocomparecerem,anã osedeixareminduzirpelasprofecias
queindicavamaqueladatacomoaderrocadadafé mundial,otempodeterminadoparaasduas
testemunhas e para a morte de Carpathia. Apesar de morar na mesma casa, Rayford també m
lia as mensagens diá rias de Tsion, assim como todos os que residiam ali. Tsion escrevera o
seguintearespeitodamalfadadaFestadeGalaGlobal:
Estranhei ter sido convidado como um "estadista internacional". Tudo foi perdoado, eles
declararam anistia aos dissidentes e nos garantiram proteçã o. Bem, meus queridos amigos,
irmã os e irmã s em Cristo, eu nã o comparecerei. Há uma profecia que diz que um terremoto
exterminará adé cimapartedaquelacidade.Nã otemoporminhavida,porquemeufuturoestá
assegurado — da mesma forma que o de todos os que se entregaram a Cristo para receber
perdãoevidaeterna.
Poré m, nã o optei por testemunhar pessoalmente o mais singular e o mais histó rico dos
eventos,porqueestá evidentequeSataná smarcará presençaali.Minhafamı́liafoitrucidadaem
retaliaçã o ao "pecado" que cometi por manifestar em pú blico minha crença de que Jesus é o
Messias aguardado há tanto tempo. Durante a fuga de minha terra natal até o local onde me
encontroexilado,fuioprimidopelaterrívelpresençadoautordamorte.
A morte estará pairando no ar em Jerusalé m no pró ximo mê s, meus amigos, apesar da
maneiravistosacomoesteeventovemsendoembrulhadoevendidoaomundo.Eumaafronta
transformar uma festa em desculpa para reunir essa gente. Por um lado, o tal potentado
mundial decreta o im dos sacrifı́c ios e oferendas no templo, porque violam os princı́pios da
tolerâ ncia defendidos pela Fé Mundial Enigma Babilô nia. Por outro, ele tem em mente
comemorar o acordo entre a Comunidade Global e Israel. Como podemos juntar estas duas
coisas? Embora o potentado tenha intimidado o mundo e impedido que inimigos em potencial
atacassem Israel, ele passa por cima das tradiçõ es milenares desse povo e trai sua herança e
autonomiareligiosa.
Damesmaformaqueorestantedomundo,acompanhareiosfestejospelaInternetoupela
televisã o. Poré m, meus queridos, nã o aceitarei o convite para comparecer. Esse evento
antecede a segunda metade da Tribulaçã o, chamada a Grande Tribulaçã o, que fará com que
estesdiasterríveisqueestamosvivendopareçamapenascansativos.
Nem mesmo os meios de comunicaçã o controlados pela CG poderã o dourar a pı́lula
daquilo que sabemos ser a verdade. O crime e o pecado estã o descontrolados. Os gê neros de
primeira necessidade começam a faltar por escassez de mã o-de-obra e de condiçõ es para
fabricá -losedistribuı́- los.Apesardisso,portodososcantosdaTerracontinuamaexistirbordé is,
sessõ es espı́ritas e casas de quiromancia ou templos pagã os para adoraçã o de ı́dolos. A vida
passouaserinsigni icante,enossosconcidadã osmorremdiariamentedeixandocasasenegó c ios
nas mã os de saqueadores. Nã o existem Forças Paci icadoras su icientes para fazer o
policiamento, porque grande parte de seu contingente morreu, e aqueles que continuam
trabalhandoestãosendosubjugadosousãocorruptos.
Mesmo com um nú m ero tã o reduzido de pessoas em todos os ramos de atividade, é
impressionante observar que muita coisa ainda continua a prosperar. Praticamente, nã o
existemmais ilmeseprogramasnovosnaTV,masapornogra iaeaperversã oproliferamnas
centenasdecanaisqueaindafuncionam,sendolivrementeassistidosporqualquerumquetenha
umtelevisoremcasa.
Estestempossombriosnã onoscausamsurpresa,meusqueridosirmã oseirmã s.Oropara
que você s se mantenham irmes e continuem a divulgar a verdade até a volta de Jesus. Daqui
emdiante,você spassarã oamaiorpartedotempolutandoparasobreviver.Exortoatodosque
se preparem, que tracem planos para enfrentar o inevitá vel dia em que a proibiçã o de entrar
nestesite ou de declarar-se cristã o passará a ser mais abrangente. Estejam preparados para o
diaemqueserá exigidaatraiçoeiramarcadabestanatestaounamã oparapodercomprarou
venderlegalmente.
Emuitoimportantequevocê snã ocometamoerrofataldepensarquepodemestampar
aquelamarcaporconveniê nciae,aomesmotempo,serumcrenteemCristo.Eledeixoubem
claro:"Aquelequemenegardiantedoshomens,eutambé monegareidiantedemeuPai."Nas
próximasmensagens,explicareiporqueamarcadodemônionãopodeserinvalidada.
Sevocê sjá aceitaramaCristoeestã osalvos,porcertopossuemoselodeDeusnatesta,
visı́velapenasaoscrentes.Felizmente,oselonatestaeadecisã oquevocê stomaramtambé m
nã o podem ser invalidados, portanto nã o há motivos para ter medo de perder a posiçã o que
ocupam perante Ele. Porque está escrito: "Quem nos separará do amor de Cristo? Será
tribulação,ouangústia,ouperseguição,oufome,ounudez,ouperigo,ouespada?Emtodasestas
coisas, poré m, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou." Assim como o
apó stolo Paulo, "estou bem certo de que nem morte, nem vida, nem anjos, nem principados,
nem coisas do presente, nem do porvir, nem poderes, nem altura, nem profundidade, nem
qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso
Senhor".
Mesmo em meio a provaçõ es e tribulaçõ es, devemos continuar a agradecer a Deus, que
nos dá a vitó ria por meio de nosso Senhor Jesus Cristo. A Bı́blia també m diz: "Portanto, meus
amadosirmã os,sede irmes,inabalá veis,esempreabundantesnaobradoSenhor,sabendoque,
noSenhor,ovossotrabalhonãoéemvão."
Permaneçamfirmesnoamor.Seuamigo,
TsionBen-Judá
Hattieestavapresa,semsaberdamortedesuairmã ,eRayfordsentia-seresponsá velpor
ela.
OsassassinatosdeDwayneeTrudyTuttleforamumgolpeduroparaocoraçãodele.
A reaçã o de Bo Hanson diante da morte do irmã o serviu apenas para aumentar o
desesperodeRayford.TfoiincumbidodedaranotíciaaBo,porquedemonstraraseramigodele,
apesar das diferenças de idé ias entre ambos. Rayford havia tido uma discussã o acalorada com
Bo, e agora esperava que T conseguisse dar um testemunho cristã o ao rapaz quando lhe
transmitisse a triste notı́c ia. Depois disso, talvez Rayford pudesse desculpar-se por seu mau
comportamentoetivesseaoportunidadedeverorapazaceitaraCristo.
TretornaraanimadodeseuencontrocomBo.Depoisdeumtelefonema,elesedirigiuao
apartamento do rapaz e contou-lhe o que havia acontecido. Entre lá grimas, Bo lhe perguntou
sobreobilhetequereceberadeSam.
—EudisseaelequeobilhetefoiforjadopelaCG,Ray—explicouT.—Aparentemente,
eleaceitou.Choroumuito,sentindo-seculpado.Dissequeentregouseuirmã opordinheiro.Mas
ele nã o fez isso. Simplesmente cometeu o erro de envolver Sam em um plano malfeito. Bo
estava abatido quando o deixei, mas permitiu que eu orasse com ele. Achei que foi um grande
passo.
—Tenhocertezadisso—disseRayford-,masvocê nã oquisencontrar-secomigosó para
darestaboanotícia.Oqueaconteceu?
Trecostou-senacadeiraedeuumlongosuspiro.
— Bo se matou ontem à noite, Ray. Bebeu demais em um bar, sacou uma arma,
amaldiçoouCarpathiaeomundoedeuumtiroemsimesmo.
Rayfordpassaradiasediasinconsolável.
—Parecequefuieuquepuxeiogatilho—eledizia.
OpessoaldoComandoTribulaçã ooconsoloudizendoqueelenã oeraculpado.Finalmente,
Rayford concordou com seus companheiros e jogou a culpa naquele que era o responsá vel por
tudo:NicolaeCarpathia.
Rayfordpassouaconcentrar-senaspassagensprofé ticasarespeitodamortedoanticristo,
deixando de buscar os conselhos ou as interpretaçõ es de Tsion. Em sua obsessã o, ele
interpretava a Bı́blia da maneira que lhe convinha, arvorando-se no agente escolhido por Deus
para perpetrar o ato. Quando lia "se algué m matar à espada, necessá rio é que seja morto à
espada", Rayford estremecia porque tinha certeza de que até mesmo Tsion acreditava que o
versı́c ulo referia-se ao anticristo. Será que a mensagem era dirigida a ele? Um versı́c ulo mais
adiante dizia: "[...] que façam uma imagem à besta, à quela que, ferida à espada, sobreviveu."
Estadeviaserumareferê nciaaumadascabeçasdabestaquefoi"golpeadademorte,masessa
feridamortalfoicurada".
Ele nã o conseguia compreender. Quem conseguiria? Sem a ajuda de Tsion, Rayford
acreditava que encontrara uma explicaçã o para aqueles versı́c ulos. Carpathia ia ser
mortalmente ferido na cabeça por uma espada e, em seguida, voltaria a viver. Uma espada?
Como era mesmo o nome que Albie deu à quela má quina mortı́fera fenomenal que Rayford
esconderanoporão,atrásdealgunstijolossoltos?Sabre.
Seria ele o autor? Teria condiçõ es? Seria dele a incumbê ncia? Rayford sacudiu a cabeça,
atordoado.Quepensamentosmaisestranhos!
MacsentiaafaltadeRayford.Paraele,Rayfordtinhasidoavozdarazã o,ummentor,um
exemplodeespiritualidade.Mactambé mgostavadeDavideAnnie,doisjovensexcelentes.Mas
nã o tinha muita a inidade com eles. Abdullah era um ó t imo co-piloto e companheiro de vô o,
poré m passava dias sem dizer quase nada, limitando-se apenas a responder à s perguntas de
Mac.
A vida era interessante, mas, certamente, nunca mais voltaria a ser divertida. Voar para
as principais capitais e ouvir a incessante bajulaçã o de Fortunato aos dez reis eram situaçõ es
quesetornaramcansativase,aomesmotempo,fascinantes.Ocupandoumatribunanapistado
aeroportodeNairóbi,Leondiscursoucomgrandepompa:
— Saú do um dos principais potentados regionais de Sua Excelê ncia Nicolae Carpathia, o
ilustreSr.EnochLitwala.
Oesquecimentodonomedestegrandelı́dererenomadopaci istaduranteafaseinicialda
escolhadeumpotentadoregionalparaosEstadosUnidosdaAfrica icará registradonahistó ria
da Comunidade Global como um fato constrangedor. Talvez tenhamos nos lembrado dele um
pouco tarde, mas nó s o descobrimos, nã o? A multidã o aplaudia seu ilho favorito. Leon
prosseguiu:
—SuaExcelê nciaenviasuasmaissincerassaudaçõ esà Africaeosmaisaltoselogiospelos
objetivosinternacionaisalcançados.EmnomedeSuaExcelê ncia,tenhooprazerdeconvidaro
novopotentadoparaaFestadeGalaGlobalarealizar-senomêsdesetembroemJerusalém!
Apó s aguardar alguns instantes até que a multidã o se aquietasse, Leon deu um tom de
seriedadeàvoz.
— Temos atravessado tempos difı́c eis e enfrentado perdas de muitas vidas. Mas Sua
Excelê ncia nã o está poupando esforços nem dinheiro para a realizaçã o de uma festa como
nunca se viu antes. Alé m de comemorar a metade do perı́odo de vigê ncia do tratado de paz
com Israel, també m tenho a satisfaçã o de a irmar-lhes que recebi permissã o para comunicar
publicamente que Sua Excelê ncia está garantindo — sim, os senhores ouviram bem -,
garantindo um im aos dois assassinos. Os senhores querem saber como ele fará isso? O
potentado a irma que, se as tais testemunhas diante do Muro das Lamentaçõ es nã o desistirem
deatormentaropovodeIsraeleorestantedomundo,elepró prioseincumbirá delidarcomos
dois.
Esta mensagem foi repetida em todas as capitais, sendo recebida com entusiasmo pelo
povo. Mac achava que as pessoas estavam tã o cansadas de morte e devastaçã o e tã o
prisioneiras de seus pecados que queriam desfrutar a vida antes que os dois profetas que
pregavamacondenaçã osoltassemoanjodocé u.Será queCarpathiaassassinariaosdois?Elejá
nã ohaviafeitoestaameaçaantes?Eacabouridicularizadopelosprofetas.Masagoraeleestava
garantindo.Eestavatambé mempenhandosuapalavradequeajudariaopovoacomparecerà
FestadeGalaGlobal,apesardaescassezdeserviçospú blicosemrazã odonú m eroreduzidoda
população.
— Estamos prestes a presenciar uma reviravolta dramá tica em direçã o aos nossos
objetivoseideaisquevisamaumasociedadeutó pica—disseFortunato,citandoaspalavrasde
Carpathia.AFestadeGalaGlobalmarcariaoprimeiropasso.
Macachavaestranhoveroanticristoenvolvidopessoalmenteemumassuntoderelaçõ es
públicas,tentandosalvarsuaimagem.
Nascapitais,Leonprosseguiuemseuselogiosaospotentadosregionaisincluindopromessas
daComunidadeGlobalparamelhoraroserviçopúblico.
— Vamos trabalhar com mais vigor e mais a inco — ele dizia -, para atender à s
necessidades dos senhores. Dentro de uma dé cada, a ú nica lembrança amarga será a tristeza
por causa daqueles que perdemos. A palavra inconveniê ncia fará parte do passado, porque
trabalharemos juntos até conseguir uma tecnologia de ponta que nos proporcione serviços de
altonívelcomojamaisimaginamos.
Havia sempre uma sessã o de fotogra ias reservada para a imprensa controlada por
Carpathia, nas quais Fortunato observava, com ar solene, as á reas subdesenvolvidas em
conseqü ênciadoaltoı́ndicedemortalidade.Emseguida,elebeijavaosbebê seoslevantavanos
braços, proclamando "o futuro da Comunidade Global". Depois de atrair o entusiasmo dos
habitantesdolocal,eleconvidavaopotentadoregionalparaentrarnomajestosoFê nix216para
"umareuniã ocon idencialdealtonı́vel,naqualolı́derdossenhorespoderá melhorrepresentar
asnecessidadesdestaregião".
Fortunatoouviaoqueospotentadostinhamalhedizerefaziapromessasquenemmesmo
ummilhã odeCarpathiaspoderiamcumprir.E,emcadareuniã oparticular,oassuntoprincipal
passava a girar em torno da "situaçã o da Fé Mundial Enigma Babilô nia". Enquanto ouvia a
conversa pelo sistema de escuta clandestina, Mac notou que a maioria dos potentados sabia
exatamente o que Leon queria dizer, assim que o assunto era levantado. Alguns perguntavam:
"Dequesituaçãoosenhorestáfalando?",mas,nomomentoemqueLeonpartiaparavisitaruma
nova regiã o, ele já sabia com quais potentados poderia contar. O fato mais surpreendente para
MaceraquetodosafirmavamestarfazendooposiçãoaoarrogantePeterSegundo.
Mac icou tã o intrigado que resolveu ter uma conversa telefô nica particular com Tsion,
apesar da diferença de fusos horá rios. O telefonema foi atendido por Leah, que passara a
coordenar todas as ligaçõ es. Mac lhe garantiu que, se Tsion nã o tivesse tempo para atendê -lo,
elecompreenderia.Nodiaseguinte,osdoisconversarampelalinhasigilosa.
— Capitã o McCullum, meu amigo, estou muito agradecido por toda a informaçã o que
você nos tem enviado. Isso tem facilitado muito o meu trabalho e me fornecido dados que eu
jamaisconseguiriasemsuaajuda.Emquelhepossoserútil?
—Bem,senhor,tenhoumaperguntará pidaalhefazer,assimespero.SeiqueDavidtem
mantidotodoopessoalinformado,porintermé diodeLeah,sobreaconspiraçã oparainstigaros
dez reis contra Peter Segundo. Sabemos que nem todos os reis sã o leais a Carpathia, mas eles
tê m subido a bordo, um de cada vez, para ouvir coisas contra Peter. Minha pergunta é se eles
estã o apenas enrolando Fortunato ou estou sendo ingê nuo demais a ponto de acreditar que a
raivadelescontraPeteréverdadeiraetodosestãodeacordo?
—Excelentepergunta,capitã o.Eusó nã otrateiaindadesteassuntopelaInternetporque
acheiqueestariameexpondoemdemasiaemeintrometendonocursodaHistó ria,oqueseria
umprecedenteperigoso.DevemosnosabsterdetentarajudarDeusacumprirsuaspromessas.
SeEledissequevaiacontecer,vaiacontecer.
— Mas nó s sabemos — prosseguiu Tsion -, que os dez reis estã o dispostos a conspirar
contra Peter Segundo. E bı́blico. Deus está elaborando seu plano eterno. Ele está usando esses
reis da mesma forma que usou exé rcitos pagã os nos tempos do Antigo Testamento para punir
seupovoehojeusaexé rcitosdemonı́acosparachamaraatençã odosincré dulos.EmApocalipse
17lemososeguinte:"Osdezchifresqueviste"(estessãoosreis,Mac)"eabesta,essesodiarãoa
meretriz"(queé afalsareligiã o,representadaagoraporPeterSegundo),"eafarã odevastadae
despojada,elhecomerãoascarnes,eaconsumirãonofogo."
— Agora, preste atençã o, capitã o. O versı́c ulo seguinte responde à sua pergunta. Eles
estã o concordando com essa conspiraçã o, mas, na verdade, nã o passam de egomanı́acos que
nã oconcordamcomnada,nemmesmocomCarpathia.Eomotivoé este.Ouçaatentamenteo
que vou ler. "Porque em seus coraçõ es incutiu Deus que realizem o seu pensamento, o
executem à uma e dê em à besta o reino que possuem, até que se cumpram as palavras de
Deus."
—Quecoisa!
—Nãoédemais?Émaravilhosotestemunharocumprimentodaprofecia.
—Obrigado,senhor.
— Você vai descobrir que, se esses reis pensam da mesma maneira, foi porque Deus quis
assim.EvocêsabequeissoredundaránamortedePeter,nãosabe?
—Imaginoquesim.
—Aperguntaécomoeondeessefatoocorrerá.
—Eutenhoumaidéia—disseMac.
—Verdade?—perguntouTsion.
Maccontou-lheacercadaconversaparticularentreLeoneoreirecentementenomeado,
o queniano Enoch Litwala. Fortunato ouviu a lista de sugestõ es e pedidos de Litwala e anotou
tudo,dizendooquepensavaarespeito.Emseguida,mudouoassuntoparaPeterSegundo:
—SuaExcelê nciapediu-mequetratassepessoalmentecomvocê deumasituaçã omuito
delicada. Ele tem grande admiraçã o por sua sabedoria e habilidade em compreender as
circunstâ ncias, mas este é um assunto com o qual talvez você nã o esteja familiarizado. Você
tem conhecimento de qualquer, digamos, hesitaçã o por parte dos outros potentados regionais
quantoao...exibicionismodePeterSegundo?
Litwala respondeu tã o rapidamente que Mac precisou aprumar o corpo na cabina de
comandoeajustarmelhorofonedeouvido.
—Nã oseienã omeinteressaoquemeuscolegaspensam—disseLitwala-,masvouser
francocomosenhor.Paramim,aquelehomemé umsujeitodesprezı́vel.Eleé egoı́sta,apegado
demaisà sleis,temsangue-frio.Apropriou-sedeenormesquantiasdedinheiroparasuaEnigma
Babilô niaquedeveriamtersidousadasemmeupaı́sparaajudarmeupovo.Eunã ooconsidero
lealaSuaExcelência,opotentadoe...
—Sério?
—Assimqueouviufalarquemeunomeestavasendocogitadoparaocuparesteposto,ele
veiomever.Voouatéaqui,creioeu,nestemesmoavião.Esteaviãoeradele,certo?
—Era.
— Ele tentou conquistar meu apoio para conseguir uma funçã o mais abrangente no
governomundial,alé mdaquejá ocupacomoreligioso.Eunã odissenada.Achoqueelejá tem
prestı́gio demais. Por que eu haveria de querer que ele tivesse mais ainda? Eu disse que ia
estudar suas propostas e, caso tivesse a honra de ser escolhido para ocupar esta posiçã o,
conversaria com os potentados regionais mais experientes para conhecer a opiniã o deles.
Aparentemente, aquilo o deixou satisfeito. Ele tentou extrair de mim uma opiniã o negativa
sobreoqueeupensoarespeitodeSuaExcelê ncia,masmelimiteiaouvir.Nã ooprovoqueinem
contestei, mas també m nã o revelei minha posiçã o. Aquela conversa provou ser valiosa
posteriormente.
—Muitobem,potentadoLitwala.Eleacreditaquecontacomoapoiodosoutrosesupõ e
quevocê també mvaiceder.Você concordaqueelerepresentaumperigoempotencialparaa
harmoniadaliderançadaComunidadeGlobal?
—Nãosóumperigoempotencial.Eleéumperigoiminente.
—Oquevocê proporiaemrelaçã oaele?Estaé aperguntaqueSuaExcelê nciatempara
você.
—Elenãogostariadeconhecerosmeussentimentosmaisprofundos.
—Talvezvocêtenhaumasurpresa.
— Se o potentado gostar de saber que eu acho que Peter deve ser eliminado, isso me
causariaumagrandesurpresa.
—Paravocê,eliminadosignificaserretiradodiplomaticamentedo...
—Paramim,supremocomandante,eliminadosignificaeliminado.
Houveumsilêncioporalgunsinstantes.Litwalavoltouafalar:
—Meuproblemaéquehápoucaspessoasemquemconfio.
DepoisdetudooquetivedesuportarcomRehobotheoutros...
—Euestoulhedizendoqueosoutrospotentadosestã odeacordocomestaidé ia—disse
Leon.
—Queeledevesereliminado?
—Exatamente.Outrapausa.
—Masquemfariaisso?
—Vocêprecisaconversarcomelesaesserespeito.
— Deve haver uma maneira de ter certeza de que estamos unidos, de que nã o existe
nenhumapossibilidadedetraição.Todosseremosigualmenteresponsáveis.
—Querdizertodoscontribuindoparaopagamentodoresponsávelpelaeliminação...
— Nã o! — disse Litwala. — Todos nó s devemos ser igualmente responsá veis e culpados
pelaação.
Depois que Litwala saiu da aeronave, Mac ouviu Fortunato conversando com Carpathia
pelotelefone.
—OsenhorconseguiudobraronovopotentadodaAfrica!...Verdade?...Osenhornã oestá
falando sé rio... E verdade?... Impressionante. O senhor já fez isso comigo?... Chegou a me
hipnotizar...Oqueelevaisugerir?...Todososdez?Aomesmotempo?Assim,umnã ovaipoder
delatarooutro.Brilhante!MacligouparaDavid.
—VocêtemgravadoasconversastelefônicasdeCarpathia?
—Otempotodo.
—Ligueogravadorparaouvir.Você selembradaquelahistó riaqueBuckWilliamscontou
sobre Nicolae, quando ele convenceu as pessoas de que elas tinham visto uma coisa que nã o
aconteceu e que, dali em diante, só se lembrariam da histó ria que ele pró prio inventou? Acho
queNicolaeacaboudecontaraLeonquefezalgoparecidooutravez.
—Elesaindaestãoconversando?
—Estão.
—Vououviraconversaaovivo,Mac.Boaviagem.
Quando David acessou o telefone de Carpathia, a conversa entre Nicolae e Leon estava
terminando.
— Eu vou icar totalmente fora dessa histó ria — Carpathia estava dizendo. — Ningué m
vai querer falar, nã o haverá arma, nã o haverá corpo. Apenas DNA su iciente nas cinzas para
identificarocorpo,casoalguémdesconfie,mas,comoPeternãovaiaparecernuncamais,tenho
certezadequenãohaverádúvidanenhuma.
—Equemconfirmariaaenfermidade?Elesseatreveriamaenvolvermaispessoas?
—Leon!Pense!OdGustav.
— Ah, sim! Odoutor Gustav. Por que precisarı́amos usar algué m de fora se um dos dez
podeassinaroatestadodeóbito?Eujádissequeosenhorébrilhante,Excelência?
—Talvez,masaté mesmoumhomemcon iantecomoeugostadeouvirumelogiodestes
maisdeumavez.
—Aidéiadogeloéestupenda.Estoufalandosério.Nãoháoutrapalavraparadescrevê-la.
—Obrigado,comandante.Boaviagem.
David sorriu ao ouvir as mesmas palavras que ele usara para despedir-se de Mac. Dois
companheirosdizendoadeus.DaveeMac;NickeLeo.Duasduplasdeparceirostraçandoplanos,
tentandoderrotarosconcorrentes.Eledeuumlongosuspiro.Só queadiferençaentreasduplas
erainfinita.
Davidresolveuouviragravaçãodaconversadesdeoinício,quandoFortunatodisse:
—OsenhorconseguiudobraronovopotentadodaÁfrica!
— E como! — disse Carpathia. — Eu tenho esse homem nas mã os desde o dia em que
visitei a ONU pela primeira vez. Eu sabia que teria de esperar enquanto nã o resolvê ssemos a
situaçãocomNgumoouRehoboth.Percebiqueessesujeitoeramuitosugestionável!
—Verdade?
—Desdeoinı́c io.Euohipnotizeiportelefoneumavez.Dissequeeleseriatotalmenteleal
amim,quemeusinimigosseriamseusinimigosequemeusamigosseriamseusamigos.
—Osenhornãoestáfalandosério.
—Querqueeuprove?EleestádispostoaeliminarPeter,nosentidoliteraldapalavra.
—Éverdade?
—Elequertodosmetidosnisso,todososdez.Quetal?
—Impressionante.Osenhorjáfezissocomigo?
—Fizoquê?
—Chegouamehipnotizar?
—Eunã oprecisofazerisso,Leon.Você é oamigoeoconselheiroemquemmaiscon io.
ComEnoch,conseguiaté aincutirumplanointeironacabeçadele.Elevaipensarnoassuntoe,
quandovoltarafalarcomigo,vaisugeriroquejáestáincutidonacabeçadele.
—Oqueelevaisugerir?—perguntouLeon.
—Umareuniã oemJerusalé mnamanhã anteriorà FestadeGalaGlobal.Elevaiconvidar
Peterparadiscutiraminhasucessão,vaidizerquePeterocuparámeulugarseumdeterminado
planodercerto.SeráumareuniãoentrePetereospotentados.
—Todososdez?
—Sim.Areuniã oserá realizadanoeleganteGrandeHoteldaComunidadeGlobal,ondeas
esculturasdegelosetornarammuitopopulares.Elesvã oencomendarumagrandeesculturade
Peter, em tamanho natural, retratando-o como um anjo poderoso com asas enormes e penas
pontudas e a iadas. Enquanto os dez reis estiverem admirando a escultura, cada um deles
pegará umadasa iadaspenasdegelo.Petervaiestranharoqueestá acontecendo.Nessemeiotempo, cada um dos reis o atacará de diferentes â ngulos, no pescoço, nos olhos, nas tê mporas,
nocoração.
— Ao mesmo tempo? — quis saber Leon. — Assim, um nã o vai poder delatar o outro.
Brilhante!
— As armas derreterã o, o corpo será transportado para o cremató rio dentro de um saco
que o potentado Gustav, da Escandiná via, trará na maleta. O corpo será queimado para evitar
que se espalhe uma doença mortal, que provoca sangramento até a morte por secreçõ es das
membranasmucosas.
—Issoexplicaráosvestígiosdesanguenasaladereuniões.
—Exatamente.Euvou icartotalmenteforadessahistó ria.Ningué mvaiquererfalar,nã o
haveráarma,nãohaverácorpo.ApenasDNAsuficientenascinzas...
CAPÍTULO20
Buckestavasesentindodesprezado.
FaziamuitotempoqueeleeChloehaviamcomeçadoasedesentender.
— Sei que temos apenas trê s anos e meio pela frente -ela disse -, mas você acha que eu
querocriarestacriançasozinha?
—Nadaderuimvaiacontecer—eledisse,tentandoabraçá-la.Elaseesquivou.
—Você vaipartir—eladisse.—Está escritoemseurosto.EuadoroChaim,masnã oé
justooqueeleestápedindo.
— Se eu nã o for, Tsion irá , e nã o queremos isso. Chaim Rosenzweig havia recebido um
convitepara
comparecer à Festa de Gala Global como convidado de honra de Sua Excelê ncia, o
potentado. Chaim pedira a Jacov que avisasse o pessoal do Comando Tribulaçã o por meio de
umamensagemcriptografadanositedeTsion.Leahencontrouamensagem,quaseporacaso.
—Vocêsabeoqueéisto?—elaperguntouaRayfordquandoosdoisestavamtrabalhando,
tarde da noite, em seus computadores na cozinha da casa secreta. — Estas iniciais nã o sã o
coincidência,são?
Ela virou olaptop para que ele visse o que estava escrito na tela. A mensagem era uma
entre as milhares enviadas aosite do Dr. Ben-Judá . Algumas o incentivavam, outras faziam
perguntas, outras continham crı́t icas ou ameaças. Parte do serviço de Leah era fazer uma
triagem e separar as que precisavam de uma resposta pessoal. A maioria nã o necessitava. A
mensagemqueelaestranharatinha-lhechamadoaatençãoporsermuitocurtaeconteriniciais
estranhas.Diziaoseguinte:"C(B)WligueJrefpatrão.Assinado,H."
—Nã oseiquemé JnemoqueesseHsigni ica—eladisse-,masquantaspessoassabem
que podem enviar mensagens para Cameron (Buck) Williams nestesite? Ou estou imaginando
coisas?
Rayford analisou a mensagem e chamou Buck. Os trê s se sentaram diante da tela do
computadordeLeah.Derepente,Buckpuloudacadeira.
— E Jacov! — ele disse. — Que esperto! Ele é marido de Hannelore e quer falar sobre
Chaim.
Buck consultou seu reló gio e fez a ligaçã o. Eram sete horas em Israel. Jacov costumava
levantarcedo.
—ElefoiconvidadoparaaFestadeGalaGlobal—disseJacovrapidamente.—Todosnó s
achamos que nã o deve ir. Ele nã o tem passado bem, ica acordado até tarde da noite. Sua
aparênciaestáhorrível.Conversecomele,quemsabeeledesiste.
Pela voz, Chaim demonstrou que nã o estava bem. Ele tentou dar um tom jovial à
conversa,masseuacentuadosotaqueisraelensedeixavatransparecercansaçoe,à svezes,uma
certadificuldadeparapronunciaraspalavras.
— Eu nã o vou desistir, Cameron, mas insisti em levar meu criado e dois convidados.
Disseram-me que posso ir acompanhado de quem eu quiser. Stefan tem aversã o a Carpathia e
diz que prefere pedir demissã o a comparecer à festa. Jacov concordou em fazer as funçõ es de
motoristaecriado.
—Dr.Rosenzweig,vocênãodeveir.JáleuasadvertênciasdeTsione...
— A advertê ncia de Tsion é para aqueles que a Comunidade Global chama de seguidores
de Ben-Judá . Eu gosto muito de Tsion e o considero como uma pessoa da famı́lia, masnão soa
seguidordeJudá.Estoudecididoair,masqueroquevocêeTsionmeacompanhem.
Buckrevirouosolhos.
—Perdoe-me,doutor,masvocê está sendoingê nuo.Nó sdoissomosconsiderados persona
nongrataperanteaCG,enãoconfiamosnemumpouconaproteçãogarantidaporCarpathia.
—Elesdisseramquepossolevarquantosconvidadoseuquiser.
—Elesnãosabemquemvocêpretendeconvidar.
—Cameron,vocêeeunostornamosamigos,não?
—Claro.
—Nossaamizadenãoéprofissional,certo?
—Certo,mas...
— Você é um cosmopolita. Devia saber que, em minha cultura, consideramos altamente
ofensiva a recusa a um convite formal. Eu estou convidando formalmente você e Tsion para
compareceremàFestadeGalacomigo,emesentireiinsultadosevocêsnãoaceitarem.
— Doutor, eu tenho famı́lia. O Dr. Ben-Judá é responsá vel por milhõ es de pessoas que
contamcomseus...
— Você s estarã o em minha companhia! O regime de Carpathia tem cometido atos
abominá veis,masameaçarasegurançadealgué mtã oimportantequantoTsionnapresençade
umconvidadodehonra...
— Eu posso dizer-lhe de antemã o, doutor, que Tsion nã o comparecerá . Nem sei se vou
transmitir-lheoconvite.Talvezelesesintanaobrigaçãodeatenderaoseupedido,porquegosta
muitodevocê,masseriaumairresponsabilidadedeminhaparte...
—Vocêtambémgostamuitodemim,não,Cameron?
—Sim,gostoosuficienteparalhedizerqueissoé...
—EuretirooconviteaTsionsevocêvier.Buckhesitou.
— Eu nã o poderia usar meu nome verdadeiro. E, embora eu esteja com a isionomia
bastantediferenteparapassarpelaalfâ ndega,nã ovoupoderapareceraseuladosevocê estiver
pertodachefiadaCG.Elesmereconheceriamimediatamente.
Chaimcalou-seporalgunsinstantes.Emseguida,disse:
—Estoumuitotristeporquedoisdemeusamigosaquemprezotanto,amigosquedizem
quesepreocupammuitocomigo...
—Doutor,nã ofaleassim.Nã oé verdade.Você querqueeuvá só porqueestá mefazendo
sentirculpado?Éjusto?Vocênãoestápensandoemminhamulheremeufilho?
Rosenzweig, demonstrando total insensibilidade, ignorou completamente a ú ltima
observaçãodeBuckeperguntou:
—OqueTsiondiriasevocê lhecontassequeeutalvezestejaprontoparaserumseguidor
deJudá?
Bucksuspirou.
— Antes de mais nada, ele detesta esse termo. Você , mais do que ningué m, deveria
conhecermuitobemTsionapontodesaberquenã ofazpartedocará terdeleterseguidores.E
tomarumadecisãoarespeitodesuaalmacomoseestivessefazendoumabarganha...
—Cameron,eujálhepedialgumacoisaantes?Fazmuitosanosqueoconsideroumjovem
cuja admiraçã o por mim é gratuita, mas muito sincera. Acho que nunca tirei vantagem disso.
Tirei?
—Não,eéporissoque...
—Vocêéumjornalista!Comopodequerernãoestarpresente?
Buck icou sem resposta. Na verdade, ele icou com vontade de comparecer à Festa de
Galadesdeomomentoemqueouviufalardela.Elemalpodiaacreditarqueopró prioCarpathia
estivesse patrocinando um evento no qual muitas profecias seriam cumpridas. Mas nunca
pensara seriamente em ir, apesar de sentir um certo orgulho pela facilidade com que entrou e
saiudeIsraelusandoumnomefalso,poucotempoatrá s.MaseChloe?EKenny?Eosavisosde
Tsionparaquenenhumcrentecomparecesse?Buckconsideravaessaviagemforadecogitação.
Finalmente, Chaim conseguira tocar no ponto vulnerá vel de Buck. Incré dulo ou crente,
solteirooucasado,comousemfilhos,eleerajornalistadesdequeseconheciaporgente.Quando
criança,sempreforacurioso—xereta,conformediziamosamigoseafamı́lia-,mesmoantes
de ter uma oportunidade de publicar suas histó rias. Sua marca registrada era realizar uma
reportagem incisiva e testemunhada pessoalmente. Ele só se sentia feliz de verdade quando
estavatrabalhandoemalgumamaté ria,nã oaliescondidonacasasecreta,ondeomá ximoque
podiafazereracomentarmaterialjápublicado.
Suahesitaçã opareceuanimarRosenzweig,comoseelesoubessequeBuckmorderaaisca
equedaliemdiantebastavapuxaralinhaetirá-lodoanzol.
— Nã o estou dizendo que nã o quero estar aı́ — disse Buck vacilante, detestando dar um
tomdelamentoàvoz.
—Entãovocêvirá?Issosignificariamuitopara...
—Nã osetratadeumadecisã oqueeupossatomarsozinho—disseBuck,dando-seconta
de que havia conseguido lavrar um tento. Depois de uma recusa taxativa, ele descobrira um
meiodeprotelarsuadecisão.
— Esta é uma das diferenças entre nossas culturas — disse Chaim. — O homem do
OrienteMédioédonodopróprionariz,deseuscaminhos,nãodevesatisfaçõesa...
—Eunãopossoservistocomvocê—disseBuck.
— Fico feliz só em saber que você estará lá , Cameron. Com certeza, encontraremos um
momentoparaumaconversaparticular.VouretirarmeuconviteformalaTsion,enã ovoume
alongarsobrenossasdiscussõesdenaturezaespiritual.
— Você nã o precisa esperar por mim para tomar uma decisã o, doutor. Na verdade, eu
insistoque,antesdepensaremparticipardafesta,vocêdeveria...
—Euprecisodiscutiressascoisaspessoalmente,Cameron.Vocêcompreende.
Buck nã o compreendia, poré m, se permanecesse mais tempo ao telefone, receava fazer
outras concessõ es. Mesmo tendo a certeza de que suscitaria a ira do Comando Tribulaçã o, ele
negociouumacondição.
—Euinsistoemumacoisa—eledisse.
—Ora,Cameron,vocênãovaivoltaratrás,vai?
—Eunãoqueroquevocêestejapresentenosegundodiadafesta.
Chaimnãoargumentou,masBuckouviuosomdepapéissendorevirados.
— O evento vai durar cinco dias — disse Rosenzweig -, de segunda a sexta-feira da
pró ximasemana.Oaniversá riodotratadoé nasegunda.Nicolaequerqueeuestejapresentena
tribuna para essa comemoraçã o. Na terça-feira, haverá uma festividade no Monte do Templo,
onde eu receio que se inicie um confronto entre ele e os dois pregadores. E isto que você quer
queeuevite?
—Exatamente.
—Concordo.
—Obrigado,doutor.
—Asinformaçõ esdequedisponhoexigemahonrademinhapresençanascerimô niasde
abertura e de encerramento. A abertura será na segunda-feira à noite, e o encerramento, na
sexta-feiraànoite.
—Pormim,vocênãocompareceriaanenhumadelas.
—Ouvivocêdizerqueestarialá.
Annie e David desenvolviam cada vez mais seu relacionamento. Ele nã o gostou quando
Annie lhe disse que, à s vezes, ela achava que o namorado gostava mais dela como uma
companheirasubversivadoquecomoalgué mqueoamava.Olhandoaoredorparatercerteza
de que estavam sozinhos no inal de um corredor, ele segurou o rosto de Annie e encostou a
pontadonariznodela.
—Euamovocê—eledisse.—Emoutrascircunstâncias,eumecasariacomvocê.
—Vocêestámepedindoemcasamento?
— Bem que eu gostaria. Você pode imaginar a pressã o, o desgaste que estou sofrendo.
Você també m sente isso. As ú nicas duas pessoas crentes que vimos por aqui, alé m de Mac e
Abdullah, foram aquelas duas mulheres que trabalham no inventá rio. Elas foram descobertas
ontemànoite.
— Oh! nã o! Nem tivemos tempo de conversar com elas. Provavelmente pensaram que
eramasúnicascrentes.
—ElasforamenviadasparaBruxelashojecedo.
—Oh,David.
— Acho que nó s també m nã o vamos permanecer aqui por muito mais tempo. Nã o sei
exatamentequandoelesvãocomeçaraexigiratalmarca,masvamosterdefugirantes.
—Euquerosersuaesposa,nemquesejaporpoucosanos.
— Eu també m quero me casar com você , mas nã o podemos fazer nada enquanto nã o
soubermossevamosconseguirsairjuntosdaqui.Seumdenó sforemboraeooutronã o,avida
nãoterámaissentido.
— Eu sei — ela disse. — Vamos ser os primeiros da lista quando Carpathia começar a
exigiramarcadalealdade.Evocêsabequeelevaicomeçaraquinopalácio.
—Ébemprovável.
— Enquanto isso, David, seria melhor você dizer ao pessoal do Comando Tribulaçã o nos
EstadosUnidosque,seelesprecisaremviajar,agoraé amelhorocasiã o.Viumdocumentoque
vai ser enviado à s Forças Paci icadoras do mundo inteiro, dizendo que haverá um perı́odo de
tré gua no qual ningué m poderá ser preso nem detido até o té rmino da Festa de Gala, nem
mesmoosinimigosdaComunidadeGlobal.
Evidentemente,BucknãoguardousegredoaTsionsobreoconvitefeitoporRosenzweig.A
partirdaquelemomento,Tsioncomeçouademonstrarumamelancoliainusitada.—Eunãovou
dizeroquevocê devefazer,Buck—eledissenafrentedeRayford-,masgostariaqueseusogro
ofizessedesistir.
— Para ser franco — disse Rayford na reuniã o seguinte -, eu gostaria de acompanhar
Buck.
—Você está permitindoqueelevá —disseChloe,carregandoo ilhode14mesesnocolo.
Kenny virou-se para ela e cobriu-lhe os olhos com as mã os enquanto a mã e falava. Chloe
precisou virar o rosto para enxergar. — Eu nã o posso acreditar. Entã o, por que você nã o vai
com ele, papai? Por que nã o vamos todos nó s? Se, ao que tudo indica, nã o vamos conseguir
chegar até o inal da Tribulaçã o, que tal atirarmos todas as precauçõ es pela janela? Que tal
deixarmosKennyórfãosemternemmesmoumavô?
—Kenny!—repetiuobebê.—Vovô!
Rayford deu um tapa na perna e abriu os braços. Kenny escorregou do colo de Chloe e
correunadireçã odoavô . Rayfordolevantouacimadacabeça,fazendo-ogritardealegria.Em
seguida,sentou-onocolo.
—Averdadeéqueestoupensandoemfazerumaviagem,masnãoparaIsrael.
— Que ó t imo! — exclamou Chloe. — Quer dizer que nã o temos mais direito a voto, que
podemosfazercomoHattie,fugirparaondeagentequiser?
—Nã oestamospraticandoumademocraciaverdadeira-disseRayford.Quandoviuoolhar
que Tsion lhe lançou, ele percebeu que estava pisando em terreno perigoso. O bebê desceu de
seucoloeengatinhouatéooutrocômodo.—Leaheeutemosconversado,e...
—Leahtambémvaiviajar?—perguntouChloe.—Nãopossoabrirmãodotrabalhodela.
—Nãoserápormuitotempo—disseLeah.
—Vocêsjádecidiramantecipadamente?
—Nãoestamosdiscutindo.Estamossimplesmentecomunicando—disseRayford.
—Éclaro.Vamosouviroquevocêtemanosdizer.Rayfordcomeçouafalarcomcautela,
temendo demonstrar seus verdadeiros planos. No fundo do coraçã o, ele queria ir a Jerusalé m
comseuSabre.Maseledisse:
—PrecisamosfazercontatocomHattie.Sinto-meresponsá velporela,querosaberseela
está bem, quero que ela saiba que continuamos a seu lado, quero ver o que podemos fazer por
ela.E,acimadetudo,queroteracertezadequeelaaindanãonosdelatou.
AtéChloenãosoubecontra-argumentar.
— Hattie precisa saber o que aconteceu com a irmã dela, mas a CG está atrá s de você ,
papai.
— Eles nã o vã o suspeitar muito de uma mulher. Estamos pensando em fazer Leah se
passar por tia materna de Hattie. Para isso, ela vai precisar mudar a isionomia, ter uma nova
céduladeidentidade.Elavaidizerqueouviuumboatoouquealguémfezvazarainformaçãode
que Hattie está lá . Se eles nã o associarem Leah conosco, por que nã o permitiriam que ela
entrasseemcontatocomHattie?
—Masjustoagora,papai?BemagoraqueBuckvaiviajar?
— David nos disse que esta é a melhor ocasiã o para viajarmos. Em breve, será quase
impossíveliraqualquerlugar.
—Éverdade—disseTsion.
Rayford olhou surpreso para ele, e percebeu que os outros també m tiveram a mesma
reação.
—Nã oestouapoiandoessaviagem—disseTsion.—Mas,seaquelapobregarotamorrer
naprisã oseparadadeDeus,depoisdetermoradodebaixodenossotetoportantotempo...—A
voz de Tsion icou trê mula e ele fez uma pausa. — Nã o sei por que Deus me fez sentir tanta
ternuraporaquelamoça.
Chloesentousacudindoacabeça,desanimada.Rayfordsabiaqueelanã oestavafeliz,mas
nãotinhamaisargumentos.
— T acha que seria muito arriscado eu voltar a voar no Super J e está preparando o
Gulfstream—disseRayford.
—Eunãoficariasurpresasevocêdissessequeaviagemjáestáacertada—disseChloe.
Rayfordnotouumardeadmiraçã oresignadanorostoda ilha,comoseelajá aceitasseo
fatodequeelenuncavoltavaatrásdepoisdetermetidoumplanonacabeça.
—Buckpodevoarconoscoaté Bruxelas.Delá ,elepodepegarumvô ocomercialaté TelAviv. Com isso, economizaremos alguns dó lares. Vou icar escondido na Bé lgica e me
encontrareicomLeahquandoelaterminarsuamissão.
— Talvez Buck possa voltar com você s — disse Chloe. — Isso vai depender de quanto
tempovocêsvãoquereresperarporeleemBruxelas.
—Talvez—disseRayford.—Vocêprefereassim,Chloe?
—Émelhorqueelevolteparacasacommeupaidoquearriscaravidavoandoporaícom
uma tripulaçã o desfalcada. Sim, pre iro. E claro que pre iro que ele nã o vá , mas, já que isso é
impossível,quesejaassim.
OclimaeradefestanoFê nix216quandoMaceAbdullahpartiram,namanhã desá bado,
num vô o rumo a Israel com a aeronave lotada. Parecia que todo o setor administrativo de
Carpathia estava a bordo, o que para ele era uma gló ria. Mac ligou o botã o secreto enquanto
Leonpediaqueospassageirossereunissem.
—Sejamtodosbem-vindos—eledisse.—E,paraonossoconvidadomuitoespecial,que
generosamente cedeu esta aeronave à Sua Excelê ncia em tempos difı́c eis, enviamos uma
saudaçãotambémmuitoespecial.
Seguiu-seumaplausodiscreto,eMacgostariadetervistoorostodePeterMathews.
—OsenhorteriaalgumacoisaadizerantesqueSuaExcelênciatomeapalavra,pontífice?
—perguntouFortunato.
—Oh!sim,obrigado,comandante.Eu...nó s,daFé MundialEnigmaBabilô nia,aguardamos
com ansiedade a realizaçã o da Festa de Gala. Como os senhores sabem, Israel é uma das
ú ltimas regiõ es a concordar com nossos ideais. Creio que teremos a oportunidade de dar um
novoaspectoàfémundialeque,apartirdestasemana,conquistaremosmuitosnovosmembros.
Eu, francamente, gosto de ter oportunidades para desa iar dissidentes, e, sabendo que os dois
pregadoreseosseguidoresdeJudá estarã opresentes,nã opoderá haverlocalmelhorparafazer
isso.Émuitobomestarcomvocês!
—Obrigado,sumopontífice—disseLeon.—Agora,SuaExcelência...
Carpathiapareciaextasiado,aguardandoosacontecimentos.
—Minhassaudaçõ espessoaisatodosvocê s—eledisse.-Creioque,umdia,você svã ose
recordardapró ximasemanacomooinı́c iodomelhormomentodesuasvidas.Temossofridoda
mesma maneira que o mundo inteiro em razã o das pragas e mortes. Mas o futuro está claro.
Sabemosoquetemosdefazereestamosfelizesporisso.Divirtam-se!
Etempodealegria,defesta.Jamaisaliberdadepessoalfoitã ocomemorada.Epossodizer
que há mais lugares em Jerusalé m do que em qualquer outra cidade para você s se divertirem.
Regalem-se nos prazeres fı́sicos e gastronô m icos que mais lhes apetecerem. Mostremao
restante da Comunidade Global que eles tê m permissã o para se entregarem aos prazeres
epicuristasdacarnemesmonessestemposdifı́c eisedecaosqueatravessamos.Vamossaudaro
novomundocomumfestivalqueningué mjamaisviu.Muitosdevocê sforamresponsá veispela
organizaçã odessesmomentosdelazerediversã o,eeulhessoumuitograto.Malpossoesperar
paraassistiraoespetáculo!
Mac e Abdullah desfrutaram a regalia de icar hospedados em quartos privativos
adjacentes no exuberante Hotel Rei Davi, onde Carpathia reservara dois andares inteiros. O
restante da comitiva foi acomodado em locais pró ximos, igualmente luxuosos. Os dez
potentados regionais icariam hospedados no Grande Hotel da CG, distante cerca de meio
quilômetrodoHotelReiDavi.
Durante os dois dias que precederam a abertura o icial da Festa de Gala, a tripulaçã o da
cabina foi incumbida de fazer viagens de ida e volta no 216 a Tel-Aviv. Na manhã de segundafeira, eles ajudaram a conseguir transporte do Aeroporto Ben Gurion até Jerusalé m para os
potentados e suas enormes comitivas. Mac trabalhou com o serviço de segurança da CG para
descarregar os detectores de metal que David colocara no compartimento de cargas, os quais
foram instalados nos dois lados do gigantesco palanque construı́do a pouco menos de um
quilô m etro do Monte do Templo e do Muro das Lamentaçõ es. Todos os que estariam no
palanque,desdeartistasatéconvidadosdehonra,passariampelosdetectoresdemetal.
Opisodopalanqueestavaaumaalturadequasequatrometrosdochã oetinhaumaá rea
decercade90metrosquadrados.Umaenormecoberturadelonaimpermeabilizadaprotegiao
lugar do Sol forte. Nas imponentes armaçõ es em formato de torre, foi instalado o sistema de
alto-falantes, que transmitiria mú sicas e discursos à multidã o estimada em dois milhõ es de
pessoas.Estendendo-seaofundodopalanque,umacortinacombinandocomacoberturadelona
ostentavamensagensvariadas,escritasnosprincipaisidiomasalirepresentados.Elassaudavam
osdelegadoseanunciavamaprogramaçã odoscincodiasdaFestadeGalaGlobal,emmeioao
reluzentelogotipodaComunidadeGlobal.
Mac notou que a frase mais extensa impressa na cortina dizia o seguinte: Um Só Mundo,
UmaSó Verdade:LiberdadeIndividualparaTodos.Portodaparte,emtodosospostes,murose
paredes,lia-seoslogan:HojeÉoPrimeiroDiadoRestantedaUtopia.
EnquantoMaceAbdullahajudavamnainstalaçã odosdetectoresdemetal,vá riosgrupos
musicaisededançarinosensaiavam,eosté cnicosdesomaglomeravam-senolocal.Macpuxou
Abdullahparapertodesiecochichou:
—Eudevoestarvendocoisas.Comquemsepareceaquelamoça,asegundadaesquerda
paraadireita?
— Eu estava tentando nã o olhar — disse Abdullah -, mas já que você insiste... Que coisa!
Elaémuitoparecida.Masnãoépossível,é?
Mac sacudiu a cabeça, concordando que nã o era ela. Eles sabiam que Hattie estava em
Bruxelas.Aquelamoçasedestacavadasoutrasdançarinasporparecerumpoucomaisvelha.O
restantenãopassavadeumbandodeadolescentes.
Ochefedasegurançarecordouaosmúsicosedançarinosqueninguémpoderiapermanecer
nopalanque,apartirdacerimô niadeaberturananoitedesegunda-feira,semportarumcrachá
esempassarpelodetectordemetais.
— Se você s estiverem usando bijuterias ou jó ias, devem retirá -las para que sejam
examinadasantesdesubiremaopalanque—eledisse.
Emumareuniã ocomosfuncioná riosdosetordesegurança,Macouviuochefeinstruiros
policiaisfardadosdizendoqueelesserevezariamnafrentedopalanque.
— Principalmente quando o potentado estiver diante do microfone — ele disse -,
mantenhamsuasposiçõ es.Deixemqueopú blicomudedelugarsevocê sestiveremimpedindoa
visã o. Você s devem icar em semicı́rculo, de oito em oito, com os pé s afastados, mã os nos
cintos,olhandoparaafrente.Nã oconversem,nã osorriam,nã ofaçamnenhumgesto.Seforem
chamadospelosfonesdeouvido,nãodigamnada.Limitem-seaobedeceràsinstruções.
Macsentiuumagrandetristezaenquantocaminhavaaté avanquelevariaAbdullaheele
devoltaaoHotelReiDavi.Olhouparatrá seobservouopalanqueadistâ ncia,dooutroladodo
enorme terreno asfaltado. A mú sica ensurdecedora voltou a tocar, e o grupo de dançarinos
terminouumaseqüênciadedançassensuais.
— Este é um novo mundo, Abdullah. Agora existe uma liberdade individual, sancionada
pelogovernointernacional.
—Eaté mesmocomemorada—disseAbdullah.Derepente,eleparouedebruçou-seem
umacerca.—Capitã o,nestasocasiõ eseusintoumdesejoenormedeirparaocé u.Nã oquero
morrer, principalmente da maneira como tenho visto acontecer com outras pessoas. Mas nã o
seránadafácilviveratéodiadoGloriosoAparecimento.
Macassentiucomacabeça.
— Foi terrı́vel o que aconteceu com os Tuttles. Provavelmente eles nem viram o que os
atingiu.Acordaramnocéu.
Abdullaholhouparaocéusemnuvens.
—QueDeusmeperdoe,maseuqueroterumamorterápidaesemdor.
Mac ouviu Eli e Moisé s pregando a uma distâ ncia de uns 800 metros, mas nã o conseguia
entenderoqueelesdiziam.
— Tenho ouvido falar muito sobre eles — disse Mac. — Acho que nã o seria muito
arriscadosealguémnosvisselá.
—Euadorariaverosdois—disseAbdullah.—Quetalpassarmosporlá apé ,nocaminho
devoltaaohotel?Nã oprecisamos icarnomeiodamultidã o.Só vamosveroqueforpossı́vele
ouviroqueconseguirmos.
—Concordoplenamente,Smitty—disseMac.
Aolongodocaminho,MaceAbdullahpassaramporbares,clubesdestrip-tease,casasde
massagem, prostı́bulos, templos pagã os e estabelecimentos de cartomantes. Em uma cidade
comumahistóriamilenardereligiosidadeeonde—damesmaformaquenorestantedomundo
— metade da populaçã o havia sido exterminada a partir do Arrebatamento, essas atividades
nã o eram proibidas. Nã o funcionavam clandestinamente nem eram relegadas a uma
determinadapartedacidade.També mnã ofuncionavamnoescuroportrá sdeportasnegrasou
entradas em formato de labirinto poupando ameaças "reais" à queles que estavam ali de
propósito.
Aocontrá rio,enquantoorestodaCidadeSantapareciaestarsucumbindopornegligê ncia
oufaltademã o-de-obra,aliseviamfachadasbemiluminadaseexpostas,exibindocomorgulho
todootipodeperversãoepecadocarnalqueohomemconhecia.
Mac apressou o passo, apesar da di iculdade que Abdullah tinha para andar, e os dois
seguiram rapidamente em direçã o ao Monte do Templo e à s duas testemunhas, como se elas
fossemumafonteemquelavariamtodaasujeiraquehaviamvisto.
CAPÍTULO21
Damesmaformaqueosdemaismoradoresdacasasecreta,Bucknã oconseguiaentender
o relacionamento entre seu sogro e Leah Rose. Ela parecia uma pedra no sapato de Rayford,
maseletinhadereconheceragrandecontribuiçã oqueeladeraaoComandoTribulaçã o,alé m
desuafortuna.
RayforddiscutiacomLeahporcausadecoisasinsigni icantes,eelamantinha-sein lexı́vel.
Mesmo assim, eles passavam cada vez mais tempo juntos, à medida que a metade do perı́odo
daTribulaçã oseaproximava.Apó sRayfordtercomunicadoseusplanosdelevá -laaBruxelas,a
proximidade entre os dois icou menos misteriosa para Buck. Aparentemente, Rayford
necessitavaqueLeahlheprestasseumserviço,eelaestavaansiosaporexecutá -lo.Talvezfosse
esseomotivodaaproximaçãoentreosdois.
ZekeJr.,orapazcomocorpotatuadoeconhecidoporZ,conseguiuó t imosresultadoscom
osdocumentosqueforjouparaLeah.Sua isionomia icoutotalmentemodi icadadepoisqueela
tingiu os cabelos de loiro, colocou lentes de contato escuras e adaptou um imperceptı́vel
aparelho nos dentes que a deixou nã o muito bonita, com a arcada superior projetada para a
frente.LeahpassouaserDonnaClendenon,daCalifórnia,ex-esposadeumdosirmãosdamãede
Hattie Durham. Ela seria a portadora da notı́c ia da morte de Nancy, a irmã de Hattie (o que,
infelizmente, era um fato verı́dico). Rayford imaginava que essa notı́c ia facilitaria sua entrada
na prisã o da Comunidade Global em Bruxelas, cujo nome havia sido mudado para Presı́dio de
Reabilitaçã o Feminina da Bé lgica, conhecido popularmente como PRFB. Tratava-se de um
presı́dio de segurança má xima. As mulheres que ali entravam di icilmente saı́am. E, quando
saíam,nãoestavamnemumpoucoreabilitadas.
AesperançadeBuck—eadeRayford,assimeleimaginava—eraqueaCGconsiderasse
Hattieumapessoavaliosademaisparasersimplesmenteeliminada.Carpathiadeviaconsiderá la,nomı́nimo,umaiscaparaajudá -loacapturarRayford,Buckouaté mesmoTsionBen-Judá .
OsoutrosmoradoresdacasasecretaesperavamqueaCGnã otivesseperdidoapaciê nciacom
Hattiepelafrustraçãodenãoterconseguido,porduasvezes,agarrarRayford.
Para Buck, a despedida foi relativamente suave, porque Chloe nã o quis manifestar o que
sentia naquele momento. Ela lhe dissera em particular, e també m durante a reuniã o, que
consideravaseuinteressepelaFestadeGalaumaobsessãoperigosa.
— Nã o estou querendo impedi-lo de fazer a cobertura de um dos eventos mais
importantes da Histó ria, mas você está disposto a sofrer as conseqü ências de um terremoto e,
agora, os riscos sã o muito maiores. Você está mais preocupado em manter a palavra dada a
Chaimdoqueemprotegersuafamília.
MasnodiaemqueChloe,Tsioneobebê viramostrê spartindo,elapareciaterdecididoa
nã otocarmaisnoassunto.Buckentendeuquesuaesposaseconformara.Elapermitiraqueele
icasse bastante tempo com Kenny. Na hora da despedida, abraçou o marido e prometeu orar
porele,dizendoqueseuamorjamaismorreria.
—Esperoqueseuamorpormimtambémnãomorra—elacomplementou.
—Meuamorporvocêjamaismorrerá,mesmoqueeumorra.
—Nã ofoiexatamenteoqueeugostariadeterouvido.BuckagradeceuaChloeporelater
permitidoqueeleviajasse.Eladeu-lheumlevetapanobraço,dizendo:
—Comoseeutivesseescolha.Será quetorneisuavidatã oinfelizassim?Achoqueé por
issoquevocêestáindoembora.
Chloe conseguiu manter o bom-humor, apesar das lá grimas que teimaram em rolar por
seurostoquandoBuck,RayfordeLeahsaı́ramdacasasecretadepoisdaoraçã odeTsion,queos
abençoouedesejou-lhesboaviagem.
— Você acredita nisso? — perguntou Mac a Abdullah enquanto eles olhavam com
curiosidade para os re letores, cabos de TV e saté lites montados perto do Muro das
Lamentações.Pareciaqueolocalhaviasidotomadosóporcâmeras.
Abdullah,comseucostumeiroestilolacônico,limitou-seasacudiracabeça.
Mac emocionou-se ao ver Eli e Moisé s, mesmo a uma distâ ncia razoá vel. Eles estavam
pregandoasdoutrinasdoEvangelhoaosgritos,eamultidã opareciaalvoroçada.Algué mhavia
dito a Mac que, normalmente, o pú blico ouvia os pregadores em silê ncio, por respeito ou por
medo. O povo mantinha distâ ncia daqueles dois homens estranhos, que, segundo diziam,
lançavam fogo em direçã o a seus agressores deixando-os carbonizados. Ningué m queria correr
talrisco.
Aquelamultidão—maiordoqueonormalemaisturbulenta
— parecia composta de pessoas que chegaram antecipadamente para a Festa de Gala.
Algumassaudavam,aplaudiam,assobiavamediziamamémapóscadafraseproferidapelasduas
testemunhas. Outras gritavam, vaiavam. Mac olhou espantado para algumas pessoas que
dançavamecorriamemdireçã oà cerca,comoquequerendodemonstrarvalentia.Ficouclaro
que os pregadores sabiam distinguir entre assassinos em potencial e recé m-chegados à cidade,
queconsideravamessapregaçãopartedadiversãodaFestadeGala.
Omaisestranho,contudo,eraumgrupodecercadeumadú z iadepessoasquepareciam
comovidas pela pregaçã o. Elas se ajoelharam a uns trê s metros da cerca e estavam chorando.
Eli e Moisé s falavam, um por vez, suplicando ao povo que aceitasse a Cristo antes que fosse
tardedemais.Aquelegrupoestavaatendendoaoapelodosdois.
—Ummotivoparasermosagradecidos—disseMac-,nomeiodetodaestaconfusão.
As duas testemunhas pareciam sentir urgê ncia. Mac conhecia as razõ es. També m era
aluno de Tsion e sabia que o "tempo determinado" mencionado por Eli e Moisé s com tanta
freqü ência coincidia com o inı́c io da Festa de Gala Global, que ocorreria a pouco menos de um
quilômetrodali.
Nocaminhoaté Palwaukee,Buckconheceuumpoucomaisdorelacionamento—oufalta
dele—entreRayfordeLeah.AconversadelagiravaemtornodeTsion.
—Tsion?
—Eleparecetãosolitário—eladisse.
—Everdade—concordouRayford.—Comexceçã odeChloeedeBuck,todosnó ssomos
solitários,vivendoemaposentosisolados.
—Comoseeunã osoubesse...—eladisse,perguntando,emseguida,detalhessobreavida
deTsionantesdeeleintegrar-seaoComandoTribulação.Bucklhecontouahistóriatoda.
EmPalwaukee,TentregouoGulfstreamabastecido,inclusivecomumageladeira,ecom
omapadevôoabordo.
—Émuitomaisdoquemerecemos,T—disseRayford.
— Nã o diga isso. Os membros de nossa pequena igreja estã o orando por todos você s,
embora,pormotivosóbvios,eunãotenhafornecidodetalhesdaviagem.
MacligoudeIsraelparaDavid,naNovaBabilônia,nofinaldanoitededomingo.
—Estelugaraquipareceumacidadefantasma—disseDavid.—Temostodaliberdade,
semninguémparanosespionar.Annieeeuestamospassandobastantetempojuntos,planejando
comofugirdaquiedecidindoparaondeir.
—Nãováemboraantesdahora—disseMac.—Precisamosdevocêaí.
Orelógiomarcavaduashorasmaiscedo,horáriodaBélgica,quandoRayfordaterrissouem
Bruxelas. Ele estava tã o nervoso quanto no dia em que batera na porta do apartamento de
HattieemLeHavre,masnã opodiadeixartransparecerisso.BuckeLeahimaginavamquesua
funçã oaliseriaadesimplesmotorista.Comoelesinterpretariamumnervosismosemnenhum
motivo?
"Donna" se hospedaria em um hotel mais ou menos pró ximo do PRFB, planejando uma
visita para o dia seguinte. Buck, sob o novo pseudô nimo de Russell Staub, pegaria um vô o
comercialparaTel-Aviv.
— Você memorizou o nú m ero de meu telefone sigiloso? -perguntou Rayford a Leah
enquantotaxiavaaaeronaveparapertodoterminal.
—OseueodeBuck.
—NãovoupoderfazermuitacoisasevocênãoconseguirfalarcomRayford—disseBuck.
— Se eu nã o conseguir contatar Rayford — ela disse pegando sua sacola -, vou precisar
mesmomedespedirdealguém.Deseje-meboasorte.
—Nãocostumamosdesejarboasorte—disseBuck.—Vocêselembra?
—Ah!sim—eladisse.—Então,orepormim.
Rayford sabia que devia ter dito alguma coisa, mas estava preocupado. E Leah já havia
partido.
— Onde você vai se hospedar, Ray? — perguntou Buck. Rayford lançou-lhe um olhar de
censura.
—Quantomenosvocêsouber,menorseráasuaresponsabilidade.
Bucklevantouasmãos.
— Ray! Fiz uma pergunta gené rica. Você tem onde icar, coisas para fazer, meios de
passardespercebido?
—Játomeiminhasprovidências—disseRayford.
—ELeahsabetudooquequeremosdizeraHattie?
—EunãoteriatrazidoLeahatéaquisesoubessequeelanãoestavapreparada.
RayfordsabiaqueestavairritandoBuck.Oquesepassavacomele?
— Só estou querendo saber se está tudo em ordem para eu poder seguir a viagem
tranqü ilo, Ray. Vou enfrentar uma situaçã o estressante e quero ter poucas coisas com que me
preocupar.
—Emelhorvocê ir—disseRayford,olhandoparaoreló gio.—Sevocê descobrirumjeito
desepreocuparcompoucascoisas,meinforme.Estamosenviandoumaespiã novinhaemfolha
paraaprisãoe,espertacomoé,quemsabeoqueelavaifazeroudizerseforpressionada?
—Issomedeixamaistranqüilo.
—Étempodecrescer,Buck.
—Étempodepegarumpoucomaisleve,papai.
—Tomecuidado,ouviu?—disseRayford.
Rayford sentiu-se solitá rio quando Buck desceu do aviã o. Ainda nã o havia decidido por
onde começar e sabia o que os outros do Comando Tribulaçã o pensariam a respeito do que ia
fazer.SeDeusousasseparaassassinarCarpathia,elenã oteriacomofugir.Rayfordreceavater
visto seus queridos pela ú ltima vez. E esperava nã o ter sobrecarregado Buck com seus
problemas,umavezqueseriaseugenroquemcuidariadoretornodeLeahaosEstadosUnidos.
DezminutosdepoisqueBuckentrounoterminal,Rayfordreabasteceuaaeronaveepediu
autorizaçã o à torre para decolar. Ele havia pensado em descobrir uma pista de pouso que nã o
izesse parte do Ben Gurion ou do aeroporto de Jerusalé m, mas decidiu que, com seu novo
pseudônimo-MarvBerry-,seriamelhordescerondehouvessemaiormovimento.BenGurion.
David estava com di iculdade, mesmo com a ajuda de Annie, de memorizar os
pseudô nimos que os trê s membros do Comando Tribulaçã o estavam usando no exterior. Ele
escreveu em um cartã o as iniciais invertidas de cada um deles, ao lado do pseudô nimo, desta
forma: "RL Donna Clendenon; SR. Marvin Berry; WC Russell Staub." Para maior segurança,
acrescentouopseudônimodeHattie:"DHMaeWillie."
Buck foi diretamente para Jerusalé m em um vô o noturno e registrou-se em uma
hospedaria usando o nome falso. A meia-noite, pegou um tá xi e dirigiu-se para o Muro das
Lamentaçõ es. A multidã o era tã o grande que ele nã o conseguia enxergar Moisé s e Eli.
Aproveitando a ocasiã o, ligou para David, depois para Chloe, e, em seguida, para Mac. Por
último,ligouparaChaim.Jacovatendeu.
—Oh!Buck!—eledisse.—Espereitantoporseutelefonema!Foimedonho,terrível!
—Oqueaconteceu?
— O Dr. Rosenzweig nã o conseguiu levantar-se hoje de manhã nem conversar conosco.
Ele parecia paralisado e muito assustado. Balbuciou alguma coisa, e sua mã o esquerda estava
crispada, o braço esticado. Nã o conseguia pronunciar direito as palavras. Chamamos uma
ambulância,maselademoroumuito.Ficamoscommedodequeelemorresse.
—Foiumderrame?
— Disseram que sim. Eles o transportaram para o hospital e estã o fazendo os exames
necessários.Sóvamossaberoresultadoamanhã,masparecequefoigrave.
—Ondeeleestá?
— Eu posso lhe dizer, Buck, mas você nã o vai conseguir entrar. Nenhum de nó s tem
autorizaçã o para visitá -lo. Ele está na UTI, e disseram que os sinais vitais ainda estã o em
ordem,depoisdetudooqueaconteceu.Masestamospreocupados.Enquantoaambulâ ncianã o
chegava, nó s oramos por ele, suplicando que ele se convertesse. Como o Dr. Rosenzweig nã o
podiafalar, icamosobservandoseeletambé morava.Masnã ovimosnada.Elepareciazangado
eassustado,acenandootempotodocomaoutramãoparaqueeumeafastassedali.
—Sintomuito,Jacov.Queroquevocêmeaviseassimquerecebernotíciasdele.
—Nãopodemosligarparavocêdaqui.Seutelefoneésigiloso,masonosso,não.
—Vocêtemrazão.Vouligarsemprequepuder.Evouorarporele.
Rayford, ou melhor, Marv Berry, foi barrado por pouco tempo no movimentado setor da
alfâ ndega.Oagenteaceitousuahistó riadequeapesadacaixademetalemsuamaletaerauma
bateriadecomputador.Rayfordalugouumcarroehospedou-seemumhotelsimplesnaregiã o
oeste de Tel-Aviv. Ele ligou para o hotel de Leah em Bruxelas, onde já passava um pouco da
meia-noite.Elaaindadeviaestaracordadaporcausadamudançadefusohorá rioedocansaço
da viagem. A telefonista do hotel relutou em ligar para o quarto da Sra. Clendenon, mas o "Sr.
Berry" insistiu que se tratava de uma emergê ncia. Apó s o sexto toque, Leah atendeu com voz
sonolenta,eRayfordficouimpressionadocomoautocontroledela.
—AquifalaDonna—eladisse.
—ÉMarv.Acordeivocê?
—Sim.Oquehouve?
—Estátudobem.Presteatenção,nãovoupoderbuscarvocêantesdesexta-feira.
—Oquê?
—Nãopossoentraremdetalhes.Estejaprontanasexta-feira.
—Bem...Marv...équeeudevoestarprontanaterça-feira.
—Nãoligueparamimantesdesexta-feira,estábem?-Estabem,mas...
—•Estábem,Donna?
—Estábem!Vocênãopoderiasermaisespecífico?
—Eubemquegostaria.
Buckdespertoucedonasegunda-feiraedirigiu-seapressado30MurodasLamentações.Na
noite anterior, nã o conseguira aproximar-se de Eli e Moisé s, mas icou emocionado ao ver
algumas pessoas saindo do meio da multidã o e ajoelhando-se perto da cerca para aceitar a
Cristo.
As testemunhas sempre falavam com energia e insistê ncia, mas Buck percebeu que elas
sabiam, como as demais pessoas, que seu tempo estava se esgotando. A populaçã o do mundo
havia diminuı́do em razã o das mortes causadas pelos 200 milhõ es de cavaleiros. Aqueles que
sobreviveramestavamdeterminadosacontinuarnopecado.Agora,pareciaqueastestemunhas
estavamusandoseusúltimosrecursosparalivrarasalmasdoMaligno.
Na segunda-feira, a multidã o no Monte do Templo aumentou, enquanto as pessoas
aguardavam a Festa de Gala, que só começaria no inı́c io da noite. Centenas de milhares de
delegadosestavamcuriososparaverospregadores,queaindanã oconheciampessoalmente.O
centro de Jerusalé m, onde as atividades lascivas proliferavam, també m estava lotado, mas a
maioria dos turistas preferiu dar uma olhada naqueles homens estranhos que pregavam detrá s
dacerca.
Aquele era o 1.260° e ú ltimo dia para que pregassem e profetizassem antes do "tempo
determinado".Bucksentiaserumprivilé gioindescritı́velpoderestarali.Eleabriucaminhocom
os ombros em meio à multidã o até conseguir icar um passo à frente dos novos convertidos,
ajoelhados diante da cerca. Aproximou-se de Eli e Moisé s o mais que pô de, quase tocando a
cerca. Algumas pessoas o advertiram, dizendo que muita gente havia morrido por ter se
aproximadomaisdoquedevia.Eleajoelhou-se,comosolhos ixosnosdois,epreparou-separa
ouvir.
Eliestavaempé ,eMoisé s,sentadoumpoucoatrá s,encostadonaparededeumapequena
construçãodepedra.
—Observeaqueleali!—gritoualguém.—Eletemumlança-chamasescondido!
Muitas pessoas riram, mas a maioria pediu silê ncio. Buck surpreendeu-se ao perceber a
emoçã o na voz de Eli, que gritava, quase em lá grimas, alto o su iciente para ser ouvido a
quarteirõ esdedistâ ncia,apesardesuasmensagensestaremsendotransmitidascomfreqü ência
pela CNN da CG. Os repó rteres de TV espalhados por toda Jerusalé m noticiavam o entusiasmo
crescentedopovopelaFestadeGalanaquelanoite.Pareciaquetodoshaviamresolvidoestarali
diantedoMuro.Eligritava:
— Como o Messias se desesperou ao contemplar do alto esta cidade! Deus, o Pai,
prometeu abençoar Jerusalé m se seu povo obedecesse a seus mandamentos e nã o adorasse a
outrosdeuses.ViemosemnomedoPai,enã onosrecebestes.Jesusdisse:"Jerusalé m,Jerusalé m!
quematasosprofetaseapedrejasosqueteforamenviados!Quantasvezesquiseureunirosteus
ilhos,comoagalinhaajuntaosseuspintinhosdebaixodasasas,evó snã ooquisestes!Eisquea
vossa casa vos icará deserta. Declaro-vos, pois, que desde agora já nã o me vereis, até que
venhaisadizer:BenditooquevememnomedoSenhor!"
Amultidãosilenciou.Eliprosseguiu:
—DeusenviouseuFilho,oMessiasprometido,quecumpriuasprofeciasdemaisdecem
dos antigos profetas, sendo, inclusive, cruci icado nesta cidade. O amor de Cristo nos leva a
dizer-vos que Ele morreu por todos, que aqueles que vivem nã o mais viverã o para si mesmos,
masparaEle,quemorreuportodosospecadoreseressuscitou.
—SomosembaixadoresdeCristo,poisDeusnospediuqueclamá ssemosporvó s.Oramos
por vó s em nome de Cristo, para que vos reconcilieis com Deus. Porque aquele que nã o
conheceu pecado, Ele o fez pecado por nó s; para que nele fô ssemos feitos justiça de Deus. Eis
queesteéotempocerto;eisqueesteéodiadasalvação.
— E nã o há salvaçã o em nenhum outro; porque abaixo do cé u nã o existe nenhum outro
nome,dadoentreoshomens,peloqualimportaquesejamossalvos.Emboraestemundoeseus
falsos profetas prometam que todas as religiõ es levam a Deus, isso é mentira. Jesus é o ú nico
caminho que leva a Deus, conforme Ele pró prio declarou: "Eu sou o caminho, e a verdade, e a
vida;ninguémvemaoPaisenãopormim."
Elipareciaexaustoeafastou-sedacerca.Moiséslevantou-seeproclamou:
— Este mundo pode estar presenciando o nosso im, mas vó s nã o presenciareis o im de
Jesus, o Cristo! De acordo com os profetas, Ele virá novamente em poder e grande gló ria para
estabelecerseureinoaquinaTerra.OSenhorvirá ,commilharesemilharesdeseussantos,para
julgaratodoseparatornartodososı́m piosconvictosdetodasasobrası́m piasqueimpiamente
praticaram,edetodasaspalavrasinsolentesqueproferiramcontraEle.
— O seu domı́nio é domı́nio eterno, que nã o passará , e o seu reino jamais será destruı́do.
Achegai-vosaElehoje,agora!OSenhornã odesejaquenenhumaalmapereça,masquetodosse
arrependam.AssimdizoSenhor.
Elilevantou-seeaproximou-sedeMoisés,eambosdisseramemuníssono:
— Temos servido ao Senhor Deus Todo-Poderoso, criador do cé u e da Terra, e a Jesus
Cristo,seuunigê nitoFilho.Vede,temoscumpridoonossodevereencerradoanossamissã oaté
otempodeterminado.ÓJerusalém,Jerusalém...
Osdoispermaneceramempé diantedacerca,imó veis,sempiscar;seuscabelos,barbase
mantos oscilavam ao sabor da brisa. A multidã o começou a agitar-se. Alguns pediam mais
pregaçõ es;outrosescarneciamdeles.Bucklevantou-selentamenteeseafastou,sabendoqueos
dois haviam terminado suas pregaçõ es. Para muitos, a impressã o era a de que Carpathia
vencera. Ele havia decidido realizar sua Festa de Gala Global em Jerusalé m e silenciado os
pregadores.
RayfordreceavaencontrarinesperadamenteBuckoualgué mdaCG.Elehaviadeixadode
barbear-se de propó sito desde o dia do vô o. Na segunda-feira, dirigiu-se de carro a Jerusalé m,
estacionounaperiferiaecaminhouaté ocentrodacidade,usandoumturbanteverdedetecido
grosso por cima de uma longa peruca grisalha. Os ó c ulos escuros com pequeninos orifı́c ios
permitiam-lheenxergarbem,semqueseusolhosficassemvisíveis.
Ele també m usava um manto que ia até a altura do tornozelo, comum naquela regiã o.
Dentro do bolso interno, carregava o Sabre. O manto era largo o su iciente para que ele
caminhassesó comasmã osparaforaeaarmaescondida.Emborativessevistodetectoresde
metal de ambos os lados do enorme palanque, os milhares de espectadores tinham permissã o
paracaminharpelaáreasemserrevistados.
Rayford sentia um comichã o que percorria a coluna vertebral inteira por saber que
portava uma arma poderosı́ssima, que podia matar algué m a mais de 30 metros de distâ ncia.
Depoisdetantaansiedadepararealizarseusplanos,eleagoraimploravaaDeusqueopoupasse
dessa missã o. Estaria ele disposto a ir até o im e assassinar Carpathia se Deus tornasseisso
claro?
A multidã o havia se reunido ali bem antes do inı́c io da festa, e uma banda latina, que
precedia a cerimô nia de abertura, tocava alto para os que apreciavam esse tipo de mú sica.
Metadedamultidãodançavaecantava,e,àmedidaqueatardeavançava,onúmerodepessoas
aumentavacadavezmais.Mú sica,cantoriasedanças,intercaladascomavisoseufó ricossobre
abrevechegadadopotentado,levavamamultidãoaodelírio.
Enquantoocé uescureciaaospoucos,Rayfordcontinuavaacaminhar,sempreatentopara
passardespercebido.Emumdeterminadomomento,elequaseparouetirouosó c ulos.Poderia
jurarqueHattiepassararenteaele.Comocoraçã obatendoacelerado,elevirou-seeviuuma
moça caminhando. A mesma altura, o mesmo porte, o mesmo modo de andar. Nã o podia ser.
Simplesmentenãopodiaser.
MaceAbdullahcaminhavamaesmopelolocaldaFestadeGala,emmeioaumamultidão
dedelegados.
—Vocêpreferequeagenteandejuntoouseparadonestasemana?—perguntouMac.
Abdullahencolheuosombros.
—Sevocêquiserandarsozinho,nãoháproblema.
— Nã o é bem isso — disse Mac. — Eu só quero que você se sinta livre para fazer o que
bementender.
Abdullah encolheu os ombros novamente. A verdade era que Mac nã o se importaria de
icar sozinho. Sozinho no meio de uma multidã o. Sozinho, pensando como o mundo e sua vida
haviam mudado. Ele tinha tomado uma decisã o. Se Carpathia conseguisse sobreviver a esse
evento,se,porummotivoqualquer,TsionBen-Judá estivesseenganadoarespeitodasprofecias,
Mactinhaumplano.Rayfordtinhalhefaladosobreoqueachavasobreoassunto.Temposatrá s,
umdelesdeviaterembicadooaviã odeCarpathiaemdireçã oaumamontanha,sacri icandoa
pró pria vida pelo bem de todos. Mac nã o queria ser tã o egoı́sta a ponto de envolver Abdullah.
Ele precisava encontrar um meio de voar sozinho com o potentado. Na verdade, nã o haveria
necessidade de uma montanha. Bastava cortar a energia e deixar que a gravidade tomasse
contadoresto.
Será que ele poderia? Deveria? Mac olhou para Abdullah e esquadrinhou a multidã o. Isso
nãoeravidaparaninguém.
Finalmente,oshelicó pterosapareceramnocé u.Rayfordolhouparacimaenquantoopovo
gritava de alegria. Os helicó pteros pousaram, dos dois lados do palanque, e os dignitá rios
desceram sob intensa ovaçã o. Os dez potentados regionais, o supremo comandante e uma
mulher, trajando uma vestimenta pomposa da Fé Mundial Enigma Babilô nia, subiram
rapidamente a escada que dava ao palanque. Um contingente reforçado da segurança formava
umsemicírculoaoredordatribuna.
Depois que todos já estavam acomodados em seus lugares, Carpathia chegou sozinho em
outro helicó ptero. Sob aplausos ensurdecedores, ele subiu ao palanque, sendo saudado pelos
convidados de honra, todos parecendo ansiosos por apertar-lhe a mã o. Fortunato foi o ú ltimo a
cumprimentá-loe,emseguida,conduziuopotentadoatéumaenormepoltrona,enfeitadacomo
umtrono.
O restante dos presentes só sentou depois dele, mas os aplausos interminá veis obrigaram
Carpathia a levantar-se vá rias vezes e acenar de modo tı́m ido e humilde para a multidã o.
Sempre que ele se levantava, o pessoal do palanque fazia o mesmo. Rayford estava a cerca de
60metrosdedistânciadopotentadoeporduasvezeshaviaenfiadoasmãosnobolsoetateadoo
Sabre, abrindo a caixa apenas alguns centı́m etros para, em seguida, voltar a fechá -la. Ele nã o
tinhaumavisã oclaradeCarpathiaporcausadamultidã o.Seamissã ofossedele,Deusteriade
comandar.RayfordaguardariaomomentocertoparaverseDeusprovidenciariaumaabertura
ouabririaumcaminhoatéafrente.SealguémnomeiodaquelamultidãoatirasseemCarpathia,
ningué m perceberia de imediato, em razã o do fascı́nio com que todos olhavam para o
potentado.
Buck, depois de deixar com relutâ ncia o Muro das Lamentaçõ es, chegou apó s o inı́c io da
solenidade e permaneceu atrá s da multidã o de quase dois milhõ es de pessoas. Ele observava a
festança sem conseguir aplaudir. Estava preocupado com Chaim. Tentou ligar para Jacov, mas
percebeuquenãoconseguiriaouvirnada.
Finalmenteopovoseaquietouosu icienteparapermitirqueLeontomasseapalavra.Ele
se virou para veri icar se Carpathia estava bem acomodado e, em seguida, aproximou-se da
tribuna.
— Sejam bem-vindos todos os cidadã os do novo mundo -ele começou a dizer, sendo
interrompidomaisdeumadezenadevezespelosaplausos.
Cada frase provocava entusiasmo no povo, fazendo Buck se perguntar de que planeta
surgiraessamultidã o.Será queningué mconsideravaaquelelı́derresponsá velportantasmortes
esofrimentos?Emtrê sanosemeio,apopulaçã otinhasidoreduzidaà metadee,mesmoassim,
essepovocomemorava?
— Meu nome é Leon Fortunato. Tenho o privilé gio de servir aos senhores e a Sua
Excelê nciacomosupremocomandantedaComunidadeGlobal.Queroapresentarospotentados
regionais, e peço que os senhores os recebam com o entusiasmo que eles merecem. Antes,
poré m,devemosreceberabê nçã odograndedeusdanaturezae,paratanto,passoapalavraà
assistente do supremo pontı́ ice da Fé Mundial Enigma Babilô nia, que tem um comunicado a
fazer.Porfavor,umasalvadepalmasparaavice-pontíficeFrancescaD'Angelo.
Buck admirou-se ao ver que, aparentemente, a vice-pontı́ ice nã o fez caso das vaias e
assobios.Derepente,elesentiuumarrepioquetomoucontadetodooseucorpo.QuandoaSra.
D'Angelo aproximou-se da tribuna, Carpathia levantou-se e a multidã o, em vez de aplaudir,
mergulhouemprofundosilê ncio.Bucksentiuqueeraoú nicocapazdenã oolharparaorostode
Carpathia. Os potentados encaravam ixamente seu lı́der, e Fortunato també m virou-se para
olharparaele.
Carpathiacomeçouafalarcomaquelamesmavozsoturnaehipnó t icaqueBuckjá ouvira
apenasumavez.Trê sanosemeioantes,Nicolaecometeraumduploassassinatodepoisdeter
ditoatodosospresentesnasaladoqueelesdeviamlembrar-seedoquenã odeviam.Buck,na
é poca um crente recé m-convertido, foi o ú nico que nã o passou pela lavagem cerebral.
Posteriormente,ninguémselembroudequeBuckestavapresentenasala.
Agora o potentado falava, mas sua voz nã o era transmitida pelos alto-falantes. Buck, em
pé a uma grande distâ ncia do palanque, ouvia claramente as palavras dele, como se Carpathia
estivesseaseulado.
—Vocêsnãoselembrarãodequeeumeantecipeiàvice-pontífice—disseNicolae.
Oh!Deus,orouBucksilenciosamente,protege-me!Nãopermitasqueeusejadominadopor
ele.
— Você s vã o ouvir falar de uma morte que lhes causará surpresa — disse Carpathia.
Ningué m se mexeu no lugar. -Esta notı́c ia vai chegar até você s como se já tivesse sido
comunicadatemposatrás.Vocêsnãovãofazercasodela.
Carpathia sentou-se, e o burburinho recomeçou do ponto em que havia parado. A Sra.
D'Angelotomouapalavra:
—Antesderezarparaograndedeusemquemtodosnó scon iamosequecon iaemtodos
nó s,tenhoumcomunicadoafazer.Osumopontı́ icePeterSegundomorreusubitamentenesta
manhã.Ovírusqueoacometeueraaltamentecontagioso,tornando-senecessárioqueseucorpo
fossecremado.Nossascondolê nciasaseusfamiliares.Umacerimô niareligiosaemsuamemó ria
serárealizadaamanhãcedonestemesmolocal.Agora,vamosrezar.
Amanhãcedo?,pensouBuck.OprogramadaFestadeGalamencionavaum"debate"entre
Carpathia e a "Dupla de Jerusalé m" à s 10 horas de terça-feira, seguido de uma "comemoraçã o
domeio-diaaté ameia-noite"nodistritohedonista.Buckolhouparaorostodosdelegados.Eles
estavamimpassíveis.Buckficouabalado.Nicolaefoicapazdecontrolaramentededoismilhões
depessoasaomesmotempo!
Amultidã oaplaudiuareza,quepareciaprestarhomenagematodasascé lulasvivas.Em
seguida,aplaudiuaapresentaçã odecadapotentadoregional,principalmenteomaisrecente,o
Sr. Litwala, da Africa. Os delegados pareciam igualmente impressionados com os discursos
enfadonhosdecadapotentado,elogiandoCarpathiaemcadafraseproferida.Finalmente,chegou
ograndemomento.
— E agora — Fortunato começou a dizer, mas os aplausos frené ticos da multidã o
abafaram o inı́c io de seu discurso, que Buck só conseguia ouvir porque estava debaixo de um
alto-falante -, o homem que Deus escolheu para liderar o mundo e livrá -lo da guerra e do
derramamento de sangue, transformando-o em uma sociedade utó pica de perene harmonia, o
supremopotentadodossenhoresemeu,SuaExcelênciaNicolaeCarpathia!
O restante dos convidados de honra — com exceçã o de Fortunato — deixou
humildemente o palanque. Carpathia acenava com as duas mã os e sorria, andando de um lado
paraooutronopalanque,sempreprotegidopeloimpassívelcontingentedesegurança.Leon,que
comandava os aplausos, permaneceu em pé atrá s de Nicolae e na frente de uma cadeira
colocadaaoladodireitodotrono.
CAPÍTULO22
Buck tinha de admitir que o dom de orató ria demonstrado por Nicolae Carpathia na
Organizaçã o das Naçõ es Unidas, trê s anos e meio atrá s, havia melhorado ainda mais com o
passar do tempo. Naquele é poca, Nicolae usou sua prodigiosa memó ria para relembrar fatos
histó ricosedominarcommaestriavá riosidiomas,surpreendendoatodos,inclusiveaimprensa.
Quem já viu os meios de comunicaçã o se levantarem para aplaudir, de forma unâ nime, um
oradorveemente?
Aquele primeiro discurso transmitido ao mundo inteiro havia sido proferido dias apó s o
desaparecimento de milhõ es de pessoas, inclusive de todos os bebê s e crianças. Carpathia
parecia o homem perfeito para o momento, e o mundo aterrorizado — inclusive Buck — o
aceitou de braços abertos. Povos de todas as raças consideravam Carpathia a voz da paz, da
harmonia e da razã o. Ele era jovem, bonito, dinâ mico, carismá tico, eloqü ente, brilhante,
decididoe,paradoxalmente,humilde.Pareciarelutanteemaceitaraliderançaqueapopulaçã o
fascinadalheimpunha.
Nicolae modi icara completamente o mundo dividindo-o em dez regiõ es, cada uma com
umpotentado.EmmeioaoantagonismocrescentequeoprimiaaTerra,aindapiorqueaperda
demilhõ esdepessoasnoArrebatamento,elesedestacoucomoumavozpaternaldeconfortoe
encorajamento. Durante todas as catá strofes -Terceira Guerra Mundial, fome, terremoto da
grande ira do Cordeiro, queda de meteoros, desastres marı́t imos, contaminaçã o da á gua,
escuridã o e resfriamento da temperatura do mundo, invasõ es de gafanhotos e, mais
recentemente, pragas de fogo, fumaça e enxofre que exterminaram outra terça parte da
população-Carpathiapermaneceufirmenocontrole.
Havia rumores de insubordinaçã o por parte de pelo menos trê s potentados, mas nada de
concreto acontecera ainda. De vez em quando, o povo sofrido e dominado pelo desespero
rebelava-se contra o novo mundo, querendo saber por que a situaçã o piorava a cada dia, mas
Carpathia acalmava a todos, por meio dos sistemas de comunicaçã o, demonstrando
solidariedadeeprometendotrabalharincansavelmenteemproldobem-estardahumanidade.
O povo acreditava nele, principalmente aqueles que lutavam pela liberdade pessoal a
qualquer custo. Enquanto a Comunidade Global reconstruı́a cidades, aeroportos, estradas e
sistemas de comunicaçõ es, o ı́ndice de assassinatos, roubos, bruxarias, orgias e adoraçõ es a
ı́dolos continuava em ascensã o. Estes trê s ú ltimos eram aplaudidos por Carpathia e por todos
aquelesquenãosabiamdistinguirobemdomal.
O ú nico ponto vulnerá vel de Carpathia eram duas testemunhas em Jerusalé m, contra as
quais ele parecia impotente. Foi por isso que ele programou a Festa Global de Gala: para
apressar a chegada do "primeiro dia do resto da utopia" na cidade onde os dois profetas
atingiramoaugedoatrevimento.SeNicolaefossenovamentehumilhadoporsuainabilidadede
dominá-los,seelesnãoparassemdetransformaraáguaemsangueedeimpedirquechovesse,a
estruturadesualiderançapoderiafinalmentecomeçaraenfraquecer.
Apesar disso, ali estava ele, de frente para as câ meras que transmitiam sua imagem ao
mundointeiropelaTVepelaInternet.Aos36anosdeidade,con ianteecharmosocomonunca,
ele caminhava pelo palanque, protegido pelo contingente de segurança. Sem se contentar em
permanecerdiantedatribuna,elesemovimentavaotempotodoparateracertezadequeseus
acenos e sorrisos alcançavam cada segmento da multidã o, que parecia jamais cansar-se de
olharparaele.
Finalmente,elelevantouasmã osparaacalmaropovo.Semanotaçõ es,sempausas,sem
tropeçar nas palavras, Carpathia falou durante 45 minutos, sendo interrompido por aplausos
entusiasmados entre uma frase e outra. A animaçã o demonstrada por ele no inı́c io do discurso
aumentavacadavezmais.
Elereconheceuasdi iculdades,osofrimentoeatristezaqueseabateramsobretodoseo
trabalhoqueaindanecessitavaserfeito.Dandoà vozumtomembargado,eledirigiu-seaseus
queridoscompatriotasquehaviamsofridograndesperdas.
Quando o discurso dramá tico e eloqü ente começou a chegar ao im, Carpathia passou a
falar mais alto, mais direto, com mais segurança ainda. Para Buck, parecia que a multidã o
estava pronta para explodir de tanto amor. Todos o adoravam, con iavam nele, acreditavam
nele,contavamcomeleparasobreviver.
Nicolae fez uma pausa comovente, afastou-se um pouco até a beira do palanque, pousou
uma das mã os no anteparo, cruzou as pernas na altura dos tornozelos e colocou a outra mã o
fechadanoquadril.Aimagem,mostradanasgigantescastelasinstaladasportodaapraça,eraa
de um homem imponente e arrogante fazendo promessas ao pú blico. Exibindo um sorriso
marotoqueprovocoumurmúriosdeempolgação,gargalhadas,assobioseaplausos,demonstrava
claramentequeestavaprontoparafazerumpronunciamentoousado.
Carpathia aguardou até a tensã o aumentar. Em seguida, caminhou decididamente em
direçãoàtribunaeapoiou-senelacomasduasmãos.
—Amanhã cedo—eledisse-,conformevocê spodemvernaprogramaçã o,voltaremosa
nosreunirpertodoMontedoTemplo,ondeeuestabelecereiaautoridadedaComunidadeGlobal
sobre todas as localidades geográ icas. -Mais aplausos e gritos de alegria. — Nã o importa que
estejam proclamando isto ou aquilo, advertindo isto ou aquilo ou sendo responsá veis por todo
tipodeataquesinsidiososcontraestacidade,estaá rea,estanaçã o...eumesmocuidareidepô r
um imaoterrorismoreligiosoperpetradopordoisimpostoresassassinos.Deminhaparte,estou
cansadodeopressõ essupersticiosas,cansadodaseca,cansadodeveraá guatransformar-seem
sangue. Estou cansado dessas tais profecias bombá sticas, de escuridã o e julgamentos, de
promessasquenuncasecumprem!
—SeaDupladeJerusalé mnã opararcomissoaté amanhã ,nã odescansareienquantonã o
cuidarpessoalmentedeles.E,assimqueminhamissãoforcumprida,dançaremosnasruas!
O povo ameaçava aproximar-se do palanque, aclamando e gritando sem parar: "Nicolae,
Nicolae,Nicolae!"Carpathiafaloumaisalto,abafandoosgritosdamultidão:
— Divirtam-se esta noite! Aproveitem! Mas durmam bem para que amanhã possamos
participardafestaquenãoteráfim!
Os helicó pteros reapareceram no cé u, e o povo foi afastado do local de pouso. Carpathia
acenava e sorria enquanto caminhava em direçã o à escada do palanque. Leon, logo atrá s dele,
ajoelhou-secomosbraçosabertosecomeçouagesticularespalhafatosamente.Paraespantode
Buck, a maioria do povo fez o mesmo. Dezenas de milhares de pessoas dobraram os joelhos e
adoraramCarpathiacomoseelefosseumatleta,umartista...ouumdeus.
Rayford estava nervoso demais. Ele caminhava para nã o evidenciar que se recusava a
ajoelhar-se.Cadapassoolevavaparamaispertodopalanque.En iouamã onobolsoeretirouo
Sabre da caixa. A arma pesada, só lida e mortal o animou e, ao mesmo tempo, o assustou.
Rayford parecia estar sonhando, vendo seu corpo de longe. Como havia chegado a este ponto?
Tinha se transformado num maluco, deixando de ser um homem pragmá tico? Ele nã o queria
atrever-seafazerpartedahistó ria,amenosquetivesseplenacertezadequeesseeraoplano
de Deus. O assassino, fosse quem fosse, jamais voltaria a ser livre. Seria identi icado no
videoteipeenãoteriacondiçõesdeirmuitolonge.
Ele estava a cerca de 15 metros do palanque quando Carpathia fez o ú ltimo aceno,
agradeceuà multidã oedesapareceuabordodohelicó ptero.Rayfordencontrava-sebemabaixo
dohelicó pteroepodiateratiradoparaoalto. Ele cerrou os dentes e fechou o Sabre dentro da
caixa,recolocando-anobolsointernoedeixandoasmãosàmostra.
Osdentescerradosprovocaram-lhedornosmaxilares.
Enquantoamultidã osaı́adolocalparafestejar,Rayfordcaminhoucompassos irmesaté
seu carro, ainda cerrando os dentes, as mã os escondidas dentro das mangas imensas. Ele nã o
agiriaprecipitadamente,amenosquerecebesseumavisodeDeus.
Buck estava sentindo saudade de sua famı́lia. O espetá culo da Festa de Gala o deixara
triste. Ele caminhou pelas ruas como um sonâ mbulo, acompanhando displicentemente a
multidã o, mas tendo certeza de que estava se dirigindo para a hospedaria. Ligou para casa,
conversou com Chloe, Kenny e Tsion. Ligou para Nova Babilô nia, conversou com David,
"conheceu" Annie. Ele nã o gostou de ter de interromper o telefonema, principalmente porque
era a primeira vez que conversava com ela, mas umbip o avisou de que havia uma nova
ligação,eatelaexibiaonomedeLeah.
—Lamentoincomodá -lo,Buck—eladisse-,mastiveumdiafrustrantenoPRFBequeria
conversarcomalguém.
—Nãoháproblema,masnãoseriamelhorvocêligarparaRayford?
—Nãopossoligarparaeleatésexta-feira.
—Oquê?
ElalhecontouasinstruçõesrecebidasdeRayford.
—Eemcasodeaconteceralgumproblema?
—Imagineiqueeudeverialigarparavocê.
—Oquepossofazer?AlugarumcarroeiratéaFrança?
—Não,euseiquevocênãopodefazernada.
—VocêviuHattie?
—Elesestãoestudandomeupedidoevãomeinformardepois.
—Essahistórianãoestácheirandobem.
—Parecequeelesestã odescon iandodealgumacoisa,Buck.Nã oseisevouemfrenteou
desisto.
—VouligarparaRayfordesaberqualéaopiniãodele.
—Vocêfariaissopormim?
Buck parou sob um poste iluminado a alguns quarteirõ es de distâ ncia do Muro das
Lamentaçõ es e ligou para o nú m ero de Rayford. Ele saberia quem estava chamando, porque
veriaonomedeBucknatela.Rayfordatendeu.
—Esperoqueoassuntosejaimportante,Buck.
—Acheiquedeixaralgué mdonossogrupoà pró priasorteé importante.Comovocê pô de
fazerissocomela?
Rayfordpareciaaborrecido.
—Qualéoproblema?Elasemeteuemalgumaencrenca?Buckcontou-lheoquesabia.
—Digaaelaparaseguiroplanoenãoligarparavocênemparamimatésexta-feira.
—Oquevocêtememmente,Ray?
—Ouça,Buck.QuandoeudisseaLeahquenã oqueriaqueelaligasseparamimaté sextafeira,eunãoesperavaqueelaligasseparavocê.Precisoquevocêconfieemmim.
Buckdeuumsuspiroeconcordoucomrelutâ ncia.Decidiunã ocontaraChloequeeleeo
paidelapoderiamvirasedesentender.Elenãosabiaqualeraoproblema.
Bucksubiuemumaá rvoreparaenxergaroMurodasLamentaçõ eseavistouElieMoisé s.
Eles continuavam em pé , lado a lado, com os olhos ixos em um ponto, imó veis, na mesma
posiçãoemqueosviradaúltimavez.Opovoescarneciadosdois.
BuckligouparaJacovparasabernotíciasdeChaim.
—Tenhoumaboaeumamánotícia—disseJacov.—Osexamesficaramprontos.
—Eoquepoderiaseramánotícia?
—Omé diconã osabedeterminaracausadaparalisiaedaperdadafala.Tudoindicaque
foiumderrame,maselenãotemcerteza.
No dia seguinte, Rayford partiu logo cedo em direçã o ao Muro das Lamentaçõ es. As ruas
estavam molhadas pelo sereno, um pouco mais que o normal. Ele icou espantado ao ver uma
aglomeraçã o tã o grande duas horas antes do proclamado confronto. Havia rumores de que a
cerimô nia religiosa em memó ria do sumo pontı́ ice Peter Segundo fora cancelada por falta de
interesse e porque a Sra. D'Angelo já tinha sido destituı́da do cargo. Aparentemente, a Fé
Mundial Enigma Babilô nia desapareceria apó s a morte de seu fundador. No governo de
Carpathia,nãohaviaespaçonemmesmoparareligiõespagas.
Com o Sabre escondido sob o manto, Rayford abriu caminho até o meio da multidã o
alvoroçada.Elenã ohaviadormidobem.Orougrandepartedanoiteeagoragostariadeterum
lugar para se sentar. Mas agü entou irme. As testemunhas pareciam duas está tuas, e o povo
dizia que elas estavam em pé nessa mesma posiçã o havia horas. Certamente, elas se
movimentariamquandoCarpathiachegasseparaconfrontá-las.
A um quarteirã o de distâ ncia, ouvia-se o som estridente de bandas de mú sica ensaiando
paraafestaquedurariaumdiaeumanoiteinteira.
[Fazerfioaqui]
Bucktentousubirnamesmaá rvoredanoiteanterior,masosguardasdesegurançadaCG
oafugentaramdali.Eledescobriuumlugaremumasaliê nciaderocha,deondeteriaumavisã o
claradamultidão.Osilênciodastestemunhasoentristecia,eelegostariaque,quandoCarpathia
chegasse, os dois pelo menos se movimentassem. Mas o tempo determinado chegara; aquele
erao1.261°dia.ABíbliadiziaqueelesseriamdominados.
Quandofaltavaumminutoparaasdezhoras,oroncodosmotoresdoshelicó pterostomou
conta do local. Da mesma forma que no dia anterior, trê s helicó pteros desceram trazendo os
potentados, Fortunato e Carpathia. Agora, nã o havia nenhum representante da Enigma
Babilô nia. Era a primeira vez que Buck via Carpathia sem gravata. Ele estava usando sapatos
luxuosos, calça e camisa com o colarinho aberto e paletó esporte de casimira, deixando à
mostraemumdosbolsosalgumacoisaparecidacomumaBíblia.
Os potentados e Fortunato postaram-se atrá s de uma barreira que os separava da
multidã o. O re letores foram acesos, as câ meras entraram em açã o e Carpathia caminhou
apressadamenteemdireçã oà cerca.Emsuacamisa,estavapresoummicrofonesem io,eele
parou diante de um maquiador para empoar o rosto. Em seguida, sorriu para a multidã o
barulhentaeaproximou-sedastestemunhas,quecontinuavamempé ,movimentandoapenaso
peitoporcausadarespiração.
Carpathia, como um má gico pronto a encenar seu nú m ero, tirou o paletó esporte e
pendurou-o em um dos ferros pontudos da cerca. O paletó pendeu para o lado do bolso onde
havia um objeto. Quando Nicolae arregaçou as mangas como se fosse partir para a luta, a
multidãofoiàloucura.
— O que você s, cavalheiros, tê m a dizer em seu favor esta manhã ? — ele perguntou,
olhandoprimeiroparaastestemunhasedepoisparaamultidão.
Buckorouparaqueosdoisreagissemcomeloqüência,comprovocação,comenergia.
Era madrugada em Illinois. Tsion sentou-se em uma poltrona diante da TV vestindo
pijama,roupãoechinelos.Chloeacomodou-seemumacadeira.
—Obebêestádormindo?—perguntouTsion.
—Está—respondeuChloe.—Esperoqueelenãoacordeparaveristo.
QuandoCarpathiacomeçouafazeraquelaperguntadesafiadora,Chloedissebaixinho:
—Acabecomele,Eli.Vamos,Moisés.Masosdoisnãoreagiram.
Oh, Deus, orou Tsion.Oh, Deus, oh, Deus. Eles estão oprimidos e humilhados e, mesmo
assim,nãoabremaboca;comocordeiros,estãosendolevadosaomatadouroe,comoovelhas,se
calamperanteosseustosquiadores,porissonãoabremaboca.
Buck desejava estar portando uma arma naquele instante. Ele tinha uma visã o clara de
Carpathia. Que arrogâ ncia! Que presunçã o! Como ele gostaria de acertar a testa de Carpathia
entreosolhos,mesmoquefossecomumestilingue.Bucksacudiuacabeça.Eleeraapenasum
jornalista, um observador. Nã o era esse o seu objetivo. Seu coraçã o estava do lado das
testemunhas.Maselenãopodiafazernada.
Rayford nã o conseguia icar imó vel. Ele precisou morder a lı́ngua para nã o gritar com
Carpathia.Escondeuosbraçossobomantoesegurouacaixacomasduasmã os.SeCarpathia
estivesse pretendendo fazer Eli e Moisé s de tolos, talvez o tolo acabaria sendo ele, caindo em
cimadoprópriosangue.Carpathiasedeliciavacomsuaglória.
— Você s perderam a lı́ngua? — ele disse, andando de um lado para o outro diante das
testemunhas silenciosas, olhando para a multidã o em busca de apoio. — A á gua de Jerusalé m
está fria e refrescante hoje! O veneno acabou? Os comparsas dos conspiradores fugiram?
Deixaramdeteracessoaosistemadeabastecimentodeágua?
Opovogritavaezombavadosdois.
—Expulseestesdoisdaqui!—gritoualguém.
—Quesejampresos!
—Quemofemnacadeia!
—Quesejammortos!
Rayford sentia vontade de gritar: "Calem a boca!", mas certamente nã o seria ouvido por
causadosprotestosdamultidãoensandecida.ECarpathiacontinuavaaprovocarosdois.
—Erachuvaaquiloquebateuemminhajanelaestamanhã?Oqueaconteceucomaseca?
Ei, algué m está vendo gafanhotos por aqui? Homens montados em cavalos? Fumaça?
Cavalheiros!Vocêsnãopodemfazernada!
Amultidãomordeuaisca.Rayfordestavaexaltado.
—Fazdoisanosqueproibivocê sdoisdepermaneceremnestaá rea!—disseCarpathia,de
costasparaamultidã o,mascertodequepoderia ser ouvido pelo povo e pela TV por causa do
microfone preso em sua camisa. — Por que você s ainda estã o aqui? Saiam já ou serã o presos!
Você s nã o me ouviram dizer que seriam executados se fossem vistos em pú blico em qualquer
lugardepoisdareuniãodaquelesfanáticos?Carpathiavirou-separaamultidão.
—Eudisseisso,nãodisse?
—Sim!Sim!Mateosdois!
— Eu tenho sido negligente! Nã o tenho cumprido meus deveres! Como posso estar aqui
diante dos cidadã os que me acusaram de ser um ditador depois de eu ter a irmado que esse
crime nã o passaria impune? Eu nã o quero ser envergonhado perante meu povo! Nã o quero
sentir-me constrangido na festa de hoje! Vamos! Saiam de trá s dessa cerca e me enfrentem!
Provoquem-me! Respondam! Passem por cima da cerca, pulando ou voando, venham até aqui
setiveremcoragem!Nãomeobriguemaabriroportão!
Carpathiavirou-senovamenteparaamultidão.
—Será queeudevotemerofogoqueelesexpelempelaboca?Será queessesdragõ esvã o
meincinerar,metrucidar?
A multidã o já nã o gritava tanto. Os risos eram nervosos. As testemunhas nã o saı́ram do
lugar.
—Jáestouperdendoapaciência!—disseNicolae.
OchefedasForçasPaci icadorasdaCGtirouumachavedobolsoeentregou-aaNicolae.
Eleabriuoportã o,eamultidã oseafastou.Algumaspessoastinhamarespiraçã oofegante.Um
grandesilêncioseabateusobreolocal.
Carpathia abriu o portã o com um gesto estudado e caminhou apressado em direçã o à s
testemunhas.
—Fora!—elegritou,masosdoiscontinuaramnamesmaposição.
Carpathiaaproximou-sedeElipeladireitaeatirou-odeencontroaMoisé s,fazendocom
queamboscambaleassememdireçã oaoportã o.Eleosafugentavadalicomempurrõ es,socose
safanões.
A multidã o afastou-se um pouco mais. Carpathia agarrou Eli e Moisé s pelas roupas e
atirou-oscontraacerca.Emseguida,virouascostasparaelesesorriuparaamultidão.
— Aqui estã o os seus algozes! — disse Carpathia. — Seus juizes! Seusprofetas! — Ele
cuspiuapó sdizerestaú ltimapalavra.—Eoqueelestê madizerparasedefender?Nada!Eles
já foram julgados, condenados e sentenciados. Agora só falta serem justiçados, e, conformeeu
decretei,voufazerisso!
Ele virou-se para os dois, puxando-os pelas roupas novamente até que eles icassem a
poucomenosdedoismetrosdacerca.
—Vocêstêmalgumacoisaadizerpelaúltimavez?
ElieMoisésentreolharam-see,emseguida,olharamparaocéu.
Carpathia caminhou até o local onde colocara o paletó e tirou um objeto preto do bolso.
Rayford levou um susto ao reconhecer o objeto. Nicolae estava de costas para a multidã o,
retirandoumSabredacaixa.Eleseafastouunstrê smetrosdastestemunhaseapontouaarma
paraoladodireitodeEli.Asúbitaexplosãofezcomquetodosrecuassemetapassemosouvidos.
AbalapenetrounopescoçodeEli;elecambaleoue,emseguida,bateucomacabeçanacerca
antes que seu corpo tombasse ao chã o. O sangue que saı́a do enorme rombo em seu pescoço
esguichounacercaenaconstruçãodepedraatrásdele.
Moisé sajoelhou-seecobriuosolhoscomoseestivesseorando.Carpathiaacertouumtiro
noaltodacabeçadele.Seucorpovoounadireçã odacerca,caindodebruços,comosbraçose
aspernasabertos.
AbocadeRayfordestavaseca,arespiraçã oeracurtaeseupulsopareciabaternaspontas
dos dedos das mã os e dos pé s. Ao redor dele, as pessoas continuavam com os ouvidos tapados,
olhandoestarrecidasparaoscorpos.Carpathiaencaixounovamenteaarmanacaixa,colocou-a
nobolsodopaletó,vestiu-oe,comumsorriso,fezumareverênciaàmultidão.
O desejo de atirar em Carpathia era tanto que Rayford abaixou o ombro e correu na
direçã o dele. Ao fazer esse movimento, ele deu uma cabeçada no homem que estava à sua
frente,oqualdeuumberronomomentoemqueamultidã oaplaudiaCarpathia.Opovopulava,
gritava, assobiava e dançava. Rayford abriu caminho à força, tentando aproximar-se de
Carpathia,tomandocuidadoparanãolargarseuSabre.
A multidã o estava agitada demais. Havia gente caindo, brigando, se divertindo. Rayford
levou um tombo no meio do povo e nã o conseguiu levantar-se por estar com os braços
escondidos dentro do manto. Com muito custo, ele passou uma das mã os pela abertura da
mangaparapoderapoiá -lanochã oe icarempé ,masalgué mlhedeuumesbarrã ocomforçae
ele caiu novamente. Enquanto tentava abrir espaço com os cotovelos, a caixa do Sabre rolou
pelo chã o. Ele começou a procurá -la, mas a multidã o enlouquecida o empurrava de um lado
para o outro. Quando ele conseguiu passar a outra mã o pela abertura da manga, sentiu uma
pancada nas costas e caiu, batendo a cabeça no concreto. Depois de muito esforço, e com um
enorme galo na cabeça, ele virou o corpo de lado e conseguiu levantar-se, mas onde estava o
Sabre?Teriasesaídodacaixa?Eleestavacarregadoeprontoparaserusado.
Buck continuou em pé na saliê ncia da rocha, completamente abatido, vendo o povo
dançandoesedivertindo,oshelicópterospegandoCarpathiaeosconvidadosdehonraparaleválosaolocaldafesta.Buckdetestavaestarpresenciandoaquelacenaterrı́vel,contemplandoos
corpos dos pregadores a quem ele tanto amava. Com o tempo, ele passara a gostar de tudo o
que se referia aos dois: a pele escura e curtida pelo sol, os pé s grosseiros e sujos, os trajes de
aniagem cheirando a fumaça. Para Buck, eles eram reis, patriarcas majestosos. Suas mã os e
ombros ossudos, o pescoço e o rosto enrugados, os cabelos e a barba longos e grisalhos
acrescentavamumardemistériosobrenaturalàquelasfigurasmaravilhosas.
Seus corpos haviam sido destruı́dos. Eles, que eram invencı́veis, agora estavam atirados
contra a cerca de ferro, amontoados um ao lado do outro numa cena grotesca. Buck sentiu-se
constrangido ao vê -los expostos daquela maneira. As roupas de aniagem mal cobriam suas
pernas.Asmãosestavamencolhidassobocorpo,osolhosabertos,abocaescancarada.Osangue
vermelho-escuro, quase preto, corria sob seus corpos trucidados por uma arma
tecnologicamentetãoavançadaquejamaispoderiaserchamadadepistola.
Buck sabia o que aconteceria a seguir. Ele nã o queria presenciar a comemoraçã o
programadaparaserrealizadadomeio-diaaté ameia-noite,masque,naverdade,durariamais
detrê sdias.Dolugarondeestava,contemplavacomprofundatristezaaascensã odopecado,a
maldade tomando conta de pessoas que haviam sido alertadas e que tiveram todas as
oportunidadespossíveisdeseconverter.
Tsionabaixouacabeça.
—Nã oimagineiquepudessesertã ohorrı́vel...Chloenã oconseguiadesgrudarosolhosda
tela.
—Buckdeveestarlá.
— Chloe — disse Tsion, levantando-se -, estamos presenciando coisas terrı́veis. Isto é
apenasocomeço.Embreve,Carpathiadeixará asformalidadesdelado.Amaioriadaspessoas
nãoterácondiçõesdeopor-seaele.
Rayford virou o corpo e agachou-se, desesperado, à procura do Sabre. De repente, pisou
neleeconseguiupegá -lo,masfoijogadoaochã onovamentepelaturbaenlouquecida.Ajoelhouseeagarrou-ocomasduasmãos,apertando-odeencontroaopeito,enquantoopovopulavapor
cima dele. Finalmente, escondeu-o dentro do manto e, depois de muito esforço, livrou-se da
multidão.Àquelaaltura,Carpathiajáestavamuitolongedali.
Buck retornou à hospedaria, passando pelo meio do povo que comemorava em todas as
esquinas e aglomerava-se em torno de aparelhos de TV. Ele ligou para Leah. Nã o obteve
resposta.
Nos trê s dias que se seguiram, a Festa de Gala concentrou-se no local do assassinato das
testemunhas.Amú sicaestridenteeosdiscursoscensuravamaDupladeJerusalé meelogiavam
Nicolae. Fortunato conclamava o povo a considerar Carpathia uma divindade, "talveza
divindade,oDeuscriadoresalvadordahumanidade".Eopovoaplaudiasemparar.
A ú nica mençã o à morte de Peter Segundo partiu do pró prio Carpathia, que disse o
seguinte:
—Alé mdecansadodospregadorespseudo-religiososedesuaarrogâ ncia,eutambé mnã o
suportavamaisaintromissã odaFé MundialEnigmaBabilô nia,quenã oserá restabelecida.Cada
pessoa deve encontrar dentro de si a divindade necessá ria para conduzir sua vida da maneira
quedesejar.Paramim,aliberdadeindividualestáacimadareligiãoinstituída.
Rayford começou a passar mais tempo perto do palanque da Festa de Gala, onde seria
realizada a cerimô nia de encerramento na noite de sexta-feira. Ele calculou os â ngulos, a
distâ ncia,ahoradechegar,onde icar,ondemovimentar-seecomoseposicionar,casoDeuso
escolhesse como seu instrumento. A cerimô nia se encerraria com um discurso de Carpathia.
Talvezaquelefosseomomentocerto.
O povo comemorava por toda Jerusalé m. Buck sentia-se enojado ao ver os noticiá rios
mostrandooscorposintumescidosefé tidosdeElieMoisé s,quesedecompunhamsobocalordo
sol.Amultidã odançavadiaenoiteaoredordeles,tapandoonarize,à svezes,atrevendo-sea
aproximar-separachutaroscorpos.Sangueesecreçõ esformavamumlı́quidoviscosoaoredor
deles.
Detodasaspartesdomundo,chegavamnotı́c iasdecomemoraçõ es,depessoastrocando
presentes como se fosse Natal. Um ou outro comentarista sugeria que era "tempo de acabar
comaquilo,dedaraesseshomensumenterrodignoedesairdali".Poré mopovoemfestase
recusava a atender a esses pedidos, e pesquisas realizadas no mundo inteiro mostravam que a
maioriadesejavaqueoscorposdosdoiscontinuassemalienãofossementerrados.
Na noite de quarta-feira, Buck inalmente recebeu permissã o para visitar Chaim no
hospital.Acorhaviavoltadoaoseurosto,eelejá conseguiapronunciaralgumaspalavras,mas
aindaestavaabatidodemais;oladoesquerdocontinuavaparalisado,eamã odireita,crispada.O
mé dico,atordoadodiantedosresultadosdosexames,relutavaematenderaopedidodeChaim
de"voltarparacasaemorrerempaz".
ChaimimplorouaBuck,balbuciando.
—Pegueumacadeiraderodasemetiredaqui!Porfavor!Queroiremboraparacasa.
Até a madrugada de sexta-feira, Buck ainda nã o havia conseguido falar com Leah nem
comRayford,masrecebeuumagradáveltelefonemadeJacov.
—Nã oseicomoeleconseguiu—disseJacov-,masoDr.Rosenzweigdeuumjeitodesair
do hospital e vir para casa. Ele melhorou bastante, e o mé dico acredita que foi um pequeno
derramecomsintomasdeumderramemaissé rio.Paramim,elenã oparecemelhor,masjá dá
paraentenderoqueelediz...Eestámeobrigandoalevá-loàcerimôniadeencerramentohojeà
noite.
CAPÍTULO23
Enquantotomavaumaduchanamanhã desexta-feira,Bucksedeucontadequedeveria
estar no Muro das Lamentaçõ es naquele dia, mesmo correndo o risco de ser identi icado. Ele
acreditava em Tsion, acreditava na Bı́blia, acreditava nas profecias. Nã o haveria nada mais
gratificantedoqueverosescarnecedoresdeElieMoisésreceberemotroco.
Buck prometera a Jacov que o ajudaria a convencer Chaim a nã o comparecer ao
encerramento da Festa de Gala naquela noite, para garantir que seu amigo tivesse a felicidade
de estar incluı́do nos 90% que seriam poupados do terremoto, profetizado para acontecer em
Jerusalém.
Rayford dormiu quase a manhã inteira, sem fazer caso dos toques insistentes de seu
celular,anã oserparaolharnovisoreverquemestavachamando.Todasasligaçõ eseramde
Leah.Oqueelepoderialhedizer?Sintomuito,masnã ovoubuscarvocê hojeà noitenemlevá ladevoltaaosEstadosUnidos,porquedevoestarpresooumorto?
Ele queria estar bem descansado e alimentado. Queria estar preparado e atento, mesmo
sem saber como seria o seu dia. Rayford també m orou para que Deus o alertasse, caso ele
estivesseagindoporcontapró pria.Estavadispostoachegarà festapelomenostrê shorasantes
do pô r-do-sol, misturar-se à multidã o e permanecer no local que ele já escolhera. Feito isso,
Deusteriadepuxarogatilho.
Rayfordpegouseucelulareleuoú ltimorecadodeLeahnovisor:"Nossopassarinhofugiu
dagaiola.Eagora?"
Hattienã oestavanapenitenciá ria?SuaperguntaeraamesmadeLeah.Eagora?Eleligou
paraela.Nãoobteveresposta.
Buck estava zangado consigo mesmo por nã o ter chegado mais cedo ao Muro das
Lamentaçõ es. Seu lugar na saliê ncia da rocha já estava ocupado. Os guardas da CG nã o
permitiamqueningué msubissenasá rvores.Aá reaestavarepletadegentebê bada.Buckpodia
jurar que algumas delas nã o saı́am dali havia dias. Quanto tempo essa festa ainda ia durar?
Danças, atos lascivos praticados em pú blico, gritarias, cantorias, bebedeiras, gente
cambaleando...
Milhares de pessoas gritavam palavras de ordem em vá rios idiomas, e agora só as mais
corajosas se aproximavam dos cadá veres das testemunhas, escurecidos e curtidos pela
exposiçã o ao Sol. Buck sentiu um cheiro rançoso de morte a centenas de metros de distâ ncia.
Mesmoassim,eleestavadispostoaaproximar-se.Depoisdecontornaroladoesquerdodomuro,
ele avistou um pequeno bosque composto de arbustos altos. Buck nã o queria arriscar-se a ser
reconhecido,masachouquevaleriaapenaenfrentaroperigo.Seaquelepequenobosquedesse
acesso à mesma vegetaçã o rasteira que, um dia, lhe permitira aproximar-se de Eli e Moisé s
sem atrair a atençã o dos guardas, ele seria testemunha ocular de um dos maiores milagres da
História.
TsioneChloelevantaram-seantesdoamanhecerparaassistirnovamenteaosnoticiá rios
exibidospelaTV.ElesserevezavamparadistrairKenny,quandoascâ merasmostravamacena
horripilantedoscorposdeElieMoisés.
— Por mais terrı́veis que tenham sido essas mortes — disse Tsion -, o que virá a seguir
seráextraordinário.
Sentado no sofá , Tsion balançava o corpo de um lado para o outro, sem conseguir icar
parado.TodasasvezesqueseusolhoscruzavamcomosdeChloe,eleselembravadesua ilha,
quandoelaaindaeramenina,namanhãdodiadeseuaniversário.
Buck esgueirou-se por entre os arbustos, passando despercebido por dois postos de
segurança, e chegou ao outro lado, onde poderia icar perto da cerca sem ser visto. Ele mal
podia acreditar em sua sorte. Jamais seria descoberto, a menos que acontecesse alguma coisa
errada. Na mesma hora, ele se lembrou de sua pró pria advertê ncia a Leah.Nós não desejamos
sorte.
—Obrigado,Senhor—elemurmurou.
Era muito triste ver o que restara dos dois homens poderosos a quem ele aprendera a
amar. Com exceçã o dos chutes ocasionais dados por algumas pessoas mais irreverentes, os
corpos estavam imó veis ali havia trê s dias e meio, servindo de alimento a animais, sendo
bicados por aves e comidos por vermes. Buck disse a si mesmo que jamais deixaria um corpo
apodrecendoaosol,mesmoquefosseodeseupiorinimigo.
Umabandabarulhentainvadiuolocallevandoopovoaodelı́rio.Osmaiscorajosos izeram
um cı́rculo ao redor dos corpos, dançando com os braços sobre os ombros do companheiro do
lado. Buck temia nã o conseguir enxergar o milagre se icasse atrá s desse grupo de bê bados
malucos. O malfadado cı́rculo transformou-se em uma ila, quando o grupo começou a dançar
entreoscorposeacerca.
Adançafoi icandocadavezmaisrá pidaaté quealgué minverteuadireçã o.A ilaparoue
seguiu o lı́der, mas alguns do grupo decidiram ir para o outro lado. Formou-se uma confusã o
total. Os dançarinos colidiam uns com os outros, gargalhando, gritando, chorando de tanto rir.
Uma senhora de meia-idade, sem um dos sapatos, curvou-se para vomitar e foi atropelada por
aquelesquecontinuavamdançando.
De vez em quando, o grupo se abaixava, deixando Buck com uma visã o clara de Eli e
Moisé s,queagoranã opassavamdemeraspartesretorcidas,desconjuntadasefé tidasdecorpos
emdecomposição.UmsentimentodepiedadefezBucksoluçar,sentindoumnónagarganta.
De repente, os mortos começaram a se movimentar. Buck prendeu a respiraçã o. Os
participantesdadançacomeçaramagritareafastaram-se,chamandoaatençã odorestantedo
povo.Anotı́c iadequeoscorposestavamsemovimentandoseespalhou.Osqueestavammais
pró ximosdalisaı́ramcorrendo,aopassoqueosqueestavammaislongecomeçaramadirigir-se
aolocal.
A mú sica parou, a cantoria transformou-se em gritos de terror. Muitas pessoas cobriram
osolhosouviraramorosto.Milharesfugiram.Outrosmilharescomeçaramaaproximar-se.
Eli e Moisé s, com muito esforço, icaram de joelhos. Seus corpos imundos começaram a
movimentar-se em câ mera lenta, o peito arfante. Com di iculdade, colocaram as mã os nas
pernas, piscaram os olhos e viraram-se para ver o que se passava. Ambos, um apó s o outro,
apoiaramamã onopavimentoe,emseguida,endireitaramocorpo,levantando-selentamente
eprovocandogritosterríveisdopovo,paralisadodemedo.
Quandoambos inalmente icaramempé ,asujeirasecaaoredordelestransformou-seem
á gua. As feridas cicatrizaram, a pele — esticada e rompida pelo inchaço — contraiu-se, os
hematomasroxosepretosforamdesaparecendoaospoucos.Oscabelosepartesdotecidoque
estavamnacercaenaparedemaisadiantesumirameseintegraramaocorpodeles.
Buckouviaosgritosagudosdamultidã o,masnã oconseguiatirarosolhosdeElieMoisé s.
Eles ajeitaram a parte de cima do manto junto ao peito, enquanto o restante da roupa de
aniagem, muito limpa, oscilava ao sabor da brisa. Ambos voltaram a ser altos e fortes, iguras
dignas,vitoriosaseimponentes.
Eli e Moisé s olharam para a multidã o com ar de tristeza e nostalgia. Em seguida,
ergueram o rosto em direçã o ao cé u. Eles pareciam tã o esperançosos que muitas pessoas na
multidãotambémolharamparaocéu.
Nuvensbrancascomoaneve lutuavamnocé uazul-escuroearroxeado.OSol,queestava
escondido,reapareceuemtodooseuesplendortornandoocé umulticolorido,envoltoemuma
neblinabranca.
Umavozecooudocéu,tãoaltaquefezopovotaparosouvidoseseabaixar:"SUBAM!"
Ainda com os olhos voltados para o cé u, Eli e Moisé s subiram. Um suspiro coletivo foi
ouvidoportodooMontedoTemplo,enquantopessoasseajoelhavam,algumascomorostoem
terra, chorando, gritando, orando, gemendo. As testemunhas desapareceram no meio de uma
nuvem,quesubiutã orapidamenteque,logoemseguida,transformou-seemumpontobranco,
antesdesumirdevez.
OsjoelhosdeBucktremiamtantoqueelecaiunochãochorandoesoluçando.
—LouvadosejaDeus—elemurmurou.—Obrigado,Senhor!Portodaparte,milharesde
pessoasseprostraram,chorando,lamentando,implorandoaDeus.
Buck começou a levantar-se, mas, antes que suas pernas se endireitassem, sentiu o chã o
se retirar de debaixo dele, como se o tivessem puxado. Ele correu para uma á rvore, mas
tropeçouecaiu,arranhandoopescoçoeascostas.Quandoselevantou,viucentenasdepessoas
caíremdepoisdeteremsidoatiradasaumagrandealtura.
O cé u icou negro, e uma chuva fria tomou conta da á rea. A quarteirõ es de distâ ncia,
ouviam-se terrı́veis sons de edifı́c ios desabando, á rvores caindo, metais e vidros estilhaçando,
carrossendoatiradosdeumladoparaooutro.
—Terremoto!—opovogritava,correndo.
Buck saiu cambaleando de seu abrigo, surpreso diante da devastaçã o provocada por um
terremoto tã o rá pido. O Sol surgiu por entre as nuvens, criando uma atmosfera sinistra. Buck
caminhouatordoadorumoàcasadeChaim.
Nomomentodoterremoto,RayfordestavanoquartodohotelcomaTVligada.Aenergia
elé trica foi cortada, e tudo o que havia no quarto acabou sendo atirado ao chã o, inclusive ele.
Quase que imediatamente, os caminhõ es da CG com alto-falantes começaram a percorrer as
ruas.
—Atençã o,cidadã os!Necessitamosdevoluntá riosnaregiã olestedacidade.Acerimô nia
de encerramento será realizada esta noite, conforme planejado. Alguns faná ticos fugiram
levando os corpos dos pregadores. Nã o acreditem em histó rias da carochinha de que eles
desapareceram, ou que foram responsá veis por este fenô m eno da natureza. Repetindo: A
cerimôniadeencerramentoserárealizadaestanoite,conformeplanejado.
Mac havia-se deitado tarde na noite anterior. Quando acordou, ligou a TV para ver as
notı́c iasdodia.Elechorouquandoascâ merasmostraramElieMoisé sressuscitandoesubindo
aocé unomeiodasnuvens.ComoaCGpoderiacontestarumfatomostradoaomundointeiro?
David Hassid lhe contara que vira a sinistra apariçã o de Carpathia na TV na noite de segundafeira, mas aquele incidente nã o apareceu em nenhum dos teipes do evento. E agora, os
noticiáriostambémnãomostravamnenhumaimagemdasressurreições.
Quepoder,pensouMac.Quecontroletotaldamídiaeatédamodernatecnologia!
Se, por um motivo qualquer, Carpathia saı́sse vivo de Israel, Mac nã o permitiria que ele
aterrissassevivo.Nã oemumaviã oqueeleestivessepilotando.Será quedeveriaesperartanto
tempo? Ele vasculhou o fundo de sua sacola de vô o e tateou a pistola contrabandeada, igual à
que Abdullah carregava. Se tivesse de levar a arma consigo naquela noite, Mac teria de
permanecerlongedosdetectoresdemetais.
O bairro de Chaim havia sido seriamente atingido. Ao contrá rio das casas vizinhas, que
desabaram, a de Chaim escapara quase ilesa. Apenas os tijolos da garagem icaram abalados e
umapartedeladesmoronou.
A energia elé trica foi restabelecida rapidamente naquela á rea, e Buck pô de assistir aos
noticiá riosdaTVaoladodeChaimedosempregadosdacasa.Onú m erodemortesanunciado
chegavaacentenas,maslogosubiuamilhares.
A maior devastaçã o ocorreu na regiã o leste de Jerusalé m, onde casas e edifı́c ios
desabaram, avenidas transformaram-se em tiras retorcidas de asfalto e lama, e milhares de
pessoasmorreram.Noinı́c iodanoite, icouevidentequeadé cimapartedaCidadeSantahavia
sidodestruídaequeonúmerodemortosnamanhãseguintechegariaa,nomínimo,setemil.
Todos os noticiá rios repetiam a insistê ncia da CG para que os delegados assistissem ao
encerramentodaFestadeGala.
— A cerimô nia será abreviada — dizia Leon Fortunato, dando à voz um tom solene
adequado à ocasiã o. — O potentado está envolvido nas operaçõ es de busca e salvamento, mas
pediu-mequeeuestendessesuasmaissincerascondolênciasatodososqueperderamfamiliares.
Estassã oaspalavrasdele:"Areconstruçã oinicia-seimediatamente.Nã oseremosderrotados.O
cará ter de um povo é revelado por sua reaçã o diante de uma tragé dia. Vamos nos erguer,
porquesomosaComunidadeGlobal.Etremendamenteimportanteestarmosreunidosconforme
planejado. Mú sica e dança nã o serã o apropriadas, mas estaremos juntos, animando uns aos
outrosededicando-nosmaisumavezaosideaisquetantoprezamos."
—Permitam-meincluirumapalavrapessoal—disse
Fortunato. — O potentado Carpathia icará extremamente encorajado se um nú m ero
expressivocomparecer.Vamoshomenagearosmortoseovalordaquelesqueparticiparamdos
resgates,alémdecuidardosferidos.
Bucknã otinhanenhuminteresseemassistirà mesmababoseiradacerimô niadeabertura
— os potentados regionais elogiando seu lı́der destemido e ele, com expressã o de santo,
fascinandoamultidão.
—Vocêprometeucomparecer—ralhouChaim.
—Ora,doutor,asestradascontinuamintransitá veis,arampaparacadeiraderodastalvez
tenhasidodanificada.Seriamelhorassistirmospela...
—Jacovpodedirigiremqualquerestradaemelevaraqualquerlugar.
Jacov encolheu os ombros. Buck fez uma careta como que indagando por que ele nã o o
apoiava.
— Ele tem razã o — disse Jacov. — Vamos colocar a cadeira de rodas no carro e levá -lo
atélá.
—Eunãopossocorreroriscodeserreconhecido—disseBuckaChaim.
—Eusóqueroquevocêfiquenomeiodamultidãomedandoapoio.
O Sol surgiu por trá s das nuvens e aqueceu Jerusalé m. O tom alaranjado no cé u da velha
cidadedeixouRayfordextasiadodiantedetantabeleza.Adevastaçã ohaviaproduzidoomesmo
efeitonele.Rayfordnã opodiaimaginarporqueCarpathiaestavatã odeterminadoacumprira
programaçã o. Mas o potentado agia de modo que os planos de Deus fossem cumpridos. Depois
deandarescondidoatrásdosgruposdepessoas,
Rayfordparounomeiodeumaaglomeraçã opertodatorredealto-falantes,à esquerdade
Carpathia.Calculouqueestavaacercade20metrosdatribuna.
—Eunãovou—avisouAbdullah.—PrefiroverpelaTV.
—Comoquiser—disseMac.—Talvezeuaindavámearrependerdeterido.
AvanquelevariaMacestavaestacionada,eeleaguardoumaisde20minutosaté elasair.
Quando inalmentepartiram,eleolhouparatrá seviuAbdullahsaindoapressadodohotel,com
asmãosnosbolsosdajaqueta.
Buck chegou ao local da festa antes de Jacov e Chaim e aguardou perto da entrada,
animadopornã oestarsendoreconhecidoporningué m.Seunovorostoajudavamuito.Naquele
momento,osfuncionáriosdaCGtinhamapreocupaçãovoltadaparaumconvidadodehonraque
acabaradechegar.
Algué mestacionouocarrodeChaim,enquantoJacovoconduzianacadeiraderodaspara
passarpelodetectordemetaisdoladodireitodopalanque.
—Seunome,porfavor—disseoguardadirigindo-seaJacov.
—Jac...
—Eleestácomigo,jovem—ralhouChaim.—Deixe-oempaz.
— Lamento muito, senhor — disse o guarda. — Estamos intensi icando nossa segurança,
conformeosenhorpodeimaginar.
—Eujádissequeeleestácomigo!
—Tudobem,senhor,masassimqueeleoajudarasubiratéopalanque,deverásairdelá.
—Queabsurdo!—disseChaim.—Agora...
—Ora,patrão—disseJacovrapidamente.—Eunãoqueroficarlánopalanque.Porfavor.
BuckviuChaimfecharosolhoscomoseestivesseexaustoefazerumgestoderesignação.
—Sómeleveatélá—eledisse.
— O senhor també m terá de passar pelo detector de metais -disse o guarda. — Nã o há
exceções.
—Ótimo!Vamoslá!
—Vocêprimeiro,moço.
As chaves no bolso de Jacov izeram acionar o alarme. Na segunda tentativa, ele passou
semproblemas.
— O senhor vai precisar levantar-se da cadeira por alguns instantes, Dr. Rosenzweig —
disseoguarda.—Meuscompanheirospoderãoajudá-lo.
—Não!—gritouChaim.
—Senhor—disseJacovaoguarda-,elesofreuumderramenaseg...
—Estousabendodetudo.
—Osenhorestá querendoinsultarumisraelense,ou,maisainda,umestadistaconhecido
nomundointeiro?
Oguardapareciaconfuso.—Preciso,pelomenos,revistá-lo.
—Estábem—resmungouChaim.—Sejarápido!
O guarda fez uma revista completa em Chaim, tentando localizar qualquer objeto
estranhopresonosbraços,pernas,frenteecostas.
— Mesmo que o senhor estivesse portando alguma arma, nã o poderia fugir tã o rá pido —
disseoguarda.
Jacov e mais trê s homens carregaram Chaim na cadeira de rodas até o palanque,
deixando-onaextremidadeesquerdadeuma ileiradecadeiras.Oguardafezumsinalparaque
Jacovvoltasse.
—Devodeixá-loalisozinho?
—Sintomuito—disseoguarda.Jacovencolheuosombros.
—Vá!—disseChaim.—Euvouficarbem.
Jacov desceu do palanque e postou-se ao lado de Buck, de onde eles viram Chaim se
divertindocomacadeiraderodasmotorizada,indodeumladoaooutrodopalanquevazio,para
alegriadamultidãoqueaumentavacadavezmais.
O cé u estava escuro, mas um extenso sistema de iluminaçã o clareava toda a praça.
Rayford calculou que o nú m ero de presentes era maior do que o do dia da cerimô nia de
abertura,massemomesmoalvoroço.
Osconvidadosdehonraforamtransportadosemcarros,porqueoshelicó pterosestavama
serviço da equipe de resgate à s vı́t imas do terremoto. Nã o houve ostentaçã o, danças, nem
oraçã o.Ospotentadossubiramaescada,cumprimentaramChaimeaguardaramempé diante
de suas cadeiras. Leon subiu atrá s de Nicolae, os dois cercados por um imenso aparato de
segurança.Opovoaplaudiucomentusiasmo,massemgritosouassobios.
Apósfazeraapresentaçãodospotentados,Leondisse:
— Contamos també m com a presença de mais um convidadomuito especial, a quem
gostarı́amos de saudar neste momento, mas Sua Excelê ncia insistiu para ter esse privilé gio.
Agradeço a colaboraçã o de todos durante estas comemoraçõ es e passo a palavra a Sua
Excelência,NicolaeCarpathia.
Rayford en iou as duas mã os dentro do manto e retirou o Sabre da caixa. Orando
silenciosamente,eledisseaDeusqueestavapreparadoparaexibiraarmanomomentocerto.
Carpathia,destavezumpoucomaiscontido,fezcessarosaplausos.
— Quero reforçar os agradecimentos do supremo comandante e enviar minhas
condolê ncias a todos os que perderam entes queridos. Nã o vou me delongar, porque sei que
muitos aqui presentes precisam retornar a seus paı́ses e estã o preocupados com os meios de
transporte. Os vô os estã o decolando de ambos os aeroportos, evidentemente com um certo
atraso.
— Antes de fazer outras observaçõ es, quero apresentar meu convidado de honra. Ele
deveria ter estado aqui na segunda-feira, mas foi acometido de um derrame. Tenho a enorme
satisfaçãodeanunciaromilagrosorestabelecimentodestegrandehomem,oquepossibilitousua
presençaaquiconosconestanoite,mesmoemcadeiraderodas,mascomó t imasperspectivas
de completa recuperaçã o de sua saú de. Senhoras e senhores da Comunidade Global, tenho a
honradeapresentar-lhesoestadista,ocientista,ocidadã olealemeudiletoamigo,oilustreDr.
ChaimRosenzweig!
OpovoaplaudiucomalegrianomomentoemqueCarpathiaapontounadireçãodeChaim,
e Rayford vislumbrou uma oportunidade. As pessoas à sua frente levantaram os braços para
aplaudir e acenar, e ele empunhou a arma e mirou. Poré m, Chaim estendeu a mã o sadia para
cumprimentarCarpathia,oqual,porsuavez,securvousobreacadeiraderodasparaabraçaro
ancião.
Rayfordnãopodiaatirar,poisatingiriaChaim.Eleabaixouaarmaeescondeu-anasdobras
da manga, observando o abraço desajeitado. Nicolae ergueu o braço de Chaim, e a multidã o
aplaudiunovamente.Carpathiaretornouàtribuna,eaoportunidadefoiperdida.
Mac McCullum sabia que Buck Williams devia estar no meio da multidã o. Talvez fosse
melhor tentar procurá -lo depois que tudo estivesse terminado. Abdullah també m estaria ali? E
porqueeledissequenãoiria?
Tremendo por ter quase atingido seu intento, Rayford sentiu um gosto amargo na boca.
Carpathiaoenojava.
—Cidadã osecompanheiros—Nicolaeestavadizendosolenemente-,nosprimeirosanos
da histó ria deste nosso governo mundial, temos lutado ombro a ombro contra fortes oposiçõ es
comoasqueenfrentamosagora.Euhaviapreparadoumdiscursodedespedidaparavoltarmos
para nossos lares com vigor renovado e maior dedicaçã o aos ideais da Comunidade Global. A
tragé diatornouessediscursodesnecessá rio.Provamosmaisumavezquesomosumpovocom
determinaçãoeideais,comespíritodeservirefazerboasações.
Trê spotentadossentadosatrá sdeCarpathia icaramempé ,oqueobrigouosoutrossetea
fazerem o mesmo, embora com relutâ ncia. Carpathia percebeu que a atençã o do povo fora
desviada e virou-se para trá s. Os trê s potentados que se levantaram primeiro começaram a
baterpalmas,seguidosporseuscolegasepelamultidã o.Rayfordpensoutervistoumatrocade
olharesentreCarpathiaeFortunato.
Estaria havendo uma conspiraçã o? Mac lhe contara que trê s potentados nã o eram tã o
leaisquantoNicolaepensava.Seriamaquelestrêsqueselevantaramprimeiro?
Os potentados sentaram-se e, pela primeira vez desde as reuniõ es no Está dio Teddy
Kollek, Carpathia demonstrou estar confuso. Ele tentou reiniciar o discurso, parou e repetiu as
palavras que já havia dito. Em seguida, virou-se para os potentados e disse em tom de
brincadeira:
—Nãofaçamissocomigo.
A multidã o voltou a aplaudir, e Nicolae aproveitou a situaçã o para provocar uma grande
gargalhada. Sem deixar transparecer sua preocupaçã o, ele recomeçou a falar, olhou para trá s
rapidamenteeretomouodiscurso,conseguindoatrairrisossilenciososdaplatéia.
De repente, os trê s potentados levantaram-se novamente e aplaudiram como se
estivessem tentando somar pontos com Nicolae. Rayford notou que um deles en iou a mã o no
bolsoaolevantar-se.Amultidã oachouqueostrê spotentadosestavamfazendoumaespé ciede
encenaçã o improvisada. Quando Chaim virou sua cadeira e rodou na direçã o de Fortunato, o
povoriuevibroudealegria.
Rayfordteveaatençã odesviadaparaaesquerda.Hattie?Nã oerapossı́vel.Eletentounã o
perdê -la de vista, mas as pessoas à sua frente levantaram as mã os novamente, gritando,
aplaudindo, pulando. Ele nivelou a arma, mirando-a num ponto entre os dois guardas de
segurança que estavam um de cada lado de Nicolae, e tentou apertar o gatilho. Mas nã o
conseguiu!Seubraçoestavaparalisado,suamã otrê mulaeavisã oembaralhada.Será queDeus
nã oqueriaqueeleatirasse?Será queeleseprecipitara?Elesesentiaumtolo,umcovarde,um
fraco, apesar de ter uma arma na mã o. Rayford tremia, sem tirar os olhos de Carpathia.
Enquantoamultidã ocomemorava,Rayfordrecebeuumtranconascostasenoladodocorpoe
aarmadisparou.Nomomentodaexplosã o,opovoafastou-seempâ nico,formandoumcı́rculo
aoredordele.Rayfordcorreu,tendová riaspessoasemseuencalço.Elejogouaarmanochã o,
deixando que a outra metade da caixa també m caı́sse. O povo gritava e pisoteava os que se
atiraramaochão.
Enquantotentavaabrircaminhoemmeioaumamassacompactadegente,Rayfordolhou
para trá s em direçã o ao palanque. Nã o conseguiu ver Carpathia. Os potentados abaixaram-se
para se proteger e um deles deixou cair alguma coisa, enquanto saı́a correndo do palanque. A
princı́pio, Rayford també m nã o conseguiu ver Fortunato. A tribuna tinha sido destruı́da, e a
enorme cortina de fundo de 30 metros de extensã o soltou-se da armaçã o e voou pelos ares.
RayfordimaginouqueabalativesseatravessadoCarpathiaeacortina.
Será queelehaviasidousadoporDeusmesmotendosidotã ocovarde?Será queelehavia
cumpridoaprofecia?Odisparoforaacidental.Elenãopretendiaatirar!
Assim que ouviu o tiro, Buck escondeu-se debaixo de uma armaçã o de ferro. Uma
multidã odesvairadapassouporeledosdoislados,ealgumaspessoastinhamumaexpressã ode
alegria. Seriam alguns convertidos que viram Carpathia assassinar seus heró is diante do Muro
dasLamentações?
Quando Buck olhou para o palanque, viu os potentados tentando levantar-se, a cortina
voandoadistânciaeChaimemestadocatatônico,comacabeçarígida.
Carpathiaestavaestendidonochã o,comosolhos,onariz,abocae—conformepareciaa
Buck—també moaltodacabeçasangrando.Omicrofoneemsualapelacontinuavaligado.Por
estarbemabaixodatorredosalto-falantes,BuckouviuomurmúrioguturaldeNicolae:
—Maseupensei...eupensei...quehaviafeitotudooquevocêspediram.
Fortunato debruçou seu corpanzil sobre o peito de Carpathia, passou a mã o por baixo da
cabeçadeleelevantou-a.Sentadonochã odopalanque,eleembalavaseupotentado,gemendo
otempotodo.
— Nã o morra, Excelê ncia! — gritava Fortunato. — Nó s precisamos do senhor! O mundo
precisadosenhor!Euprecisodosenhor!
Os guardas de segurança cercaram os dois, empunhando metralhadoras. Buck já havia
presenciadotragé diassu icientesparaumsó dia,maselenã oconseguiatirarosolhosdacena,
observandofixamenteocrânioensangüentadoeesfaceladodeCarpathia.
Com certeza, o ferimento havia sido fatal. E, do local em que Buck estava, nã o havia
dúvidasobreaarmaqueoprovocara.
— Eu nã o esperava um disparo — disse Tsion olhando irme para a TV, enquanto a
segurançadaCGafastavaopessoaleretiravaCarpathiadopalanque.
Duas horas depois, a CNN CG con irmou a morte e reproduziu in initas vezes o
pronunciamentoagoniadodosupremocomandanteLeonFortunato.
— Devemos suportar essa tragé dia dentro do espı́rito corajoso de nosso fundador e
defensordamoral,opotentadoNicolaeCarpathia.Acausadamortesó será divulgadadepoisde
concluı́dasasinvestigaçõ es.Masossenhorespodemestarsegurosdequeoculpadoserá levado
àJustiça.
Osnoticiá rioscomunicaramqueocorpodopotentado icariaexpostonopalá ciodaNova
Babilôniaatéosepultamento,quesedarianodomingo.
— Nã o saia de perto da TV, Chloe — disse Tsion. — E prová vel que a ressurreiçã o seja
captadapelascâmeras.
Mas a sexta-feira acabou e o sá bado amanheceu em Monte Prospect. Quando a noite de
sá bado começou a se aproximar, até mesmo Tsion passou a se questionar. A Bı́blia nã o
mencionava nada sobre a morte por projé til. O anticristo morreria de uma ferida na cabeça e,
emseguida,ressuscitaria.OcorpodeCarpathiacontinuavasendovelado.
Namadrugadadedomingo,enquantoviaopovopassandopeloesquifedevidronopá tiodo
paláciodaCGbanhadodesol,Tsioncomeçouaduvidardesimesmo.
Seráqueeleestavaenganado?
Duas horas antes do sepultamento, David Hassid foi chamado ao escritó rio de Leon
Fortunato. Leon e os diretores do Serviço de Inteligê ncia e Segurança estavam aglomerados
diantedeumaparelhodeTV.OrostodeLeondemonstravaumsofrimentoterríveleapromessa
devingança.
—AssimqueSuaExcelê nciaforsepultado—eledisse,comvozrouca-,omundochegará
aumaconclusã o.Quemomatouserá executado.Observeconosco,David.Osâ ngulosprincipais
estã obloqueados,masvejaestaimagemsecundá ria.Diga-mesevocê está vendoomesmoque
nós.
Davidolhouatentamente.
Oh,não!,elepensou.Nãopodeser!
—Eentão?—perguntouLeon,olhandofirmeparaele.-Existealgumadúvida?
Davidestavasemfala,masseusilê nciofezcomqueosoutrosdoishomensolhassempara
ele.
—Acâmeranãomente—disseLeon.—Jásabemosquemomatou,não?
Pormaisquequisesseinventaroutraexplicaçã oparaumacenatã oevidente,Davidsabia
queperderiasuaposiçãosedesseumarespostasemlógica.Eleassentiucomacabeça.
—Claroquesabemos.
EPÍLOGO
"Passouosegundoai.Eisque,semdemora,vemoterceiroai."
Apocalipse11.14
Jerry B. Jenkins (www.jerryjenkins.com) é o
autordasé rieDeixadosparaTrás e de mais
de 100 livros, quatro dos quais iguraram na
lista de mais vendidos do New York Times.
Foi vice-presidente da divisã o editorial do
Instituto Bı́blico Moody de Chicago e
trabalhou muitos anos como editor da
Moody Magazine, com a qual colabora até
hoje.
Escreveu artigos para vá rias publicaçõ es,
tais como Reader's Digest, Parade, revistas
de bordo e numerosos perió dicos cristã os.
Seus livros abrangem quatro gê neros
literá rios: biogra ias, obras sobre casamento
e famı́lia, icçã o para crianças e icçã o para
adultos.
Dentre outras, Jenkins colaborou nas
biogra ias de Hank Aaron, Bill Gaither, Luis
Palau, Walter Payton, Orei Hershiser, Nolan
Ryan,BrettButlereBillyGraham.
Cinco de seus romances apocalı́pticos —
Deixados para Trás, Comando Tubulação,
Nicolae, A Colheita e Apoliom — constaram
da lista dos mais vendidos da Associaçã o
Cristã de Livreiros e do semaná rio religioso
PublishersWeekly.DeixadosparaTrásfoiindicadoparareceberoprê miodeRomancedoAno,
pelaAssociaçãodasEditorasCristãsEvangélicas,em1997e1998.
Como autor e conferencista de assuntos relacionados ao casamento e à famı́lia, Jenkins tem
participado com freqü ência do programa de rá dio do Dr. James Dobson, Focus on lhe Family (A
FamíliaemFoco).
Jerrytambé mé oautordastirascô m icasGilThorp, distribuı́das aos jornais dos Estados Unidos
porTribuneMediaServices.
Elemoracomsuaesposa,Dianna,noColorado.
Convites para conferê ncias podem ser feitos pela Internet no seguinte endereço:
[email protected].
O Dr. Tim LaHaye, que idealizou o projeto de
romancear o Arrebatamento e a Tribulaçã o, é
autor famoso, ministro do evangelho,
conselheiro, comentarista de televisã o e
palestrante de temas sobre vida familiar e
profecias bı́blicas. E fundador e presidente do
Family Life Seminars (Seminá rios sobre a Vida
Familiar) e també m fundador do The PreTrib
Research Center (Centro de Pesquisas do
Perı́odo Pré -Tribulaçã o). Atualmente, o Dr.
LaHaye faz palestras sobre profecias bı́blicas
nosEstadosUnidosenoCanadá ,ondeseussete
livrossobreprofeciasfazemmuitosucesso.
ODr.LaHayeé formadopelaUniversidadeBob
Jones, com mestrado e doutorado em
ministé rio pelo Western Conservative
Theological Seminary (Seminá rio Teoló gico
Conservador do Oeste). Durante 25 anos, foi
pastor de uma das mais pró speras igrejas dos
Estados Unidos, em San Diego, a qual se
expandiu para outras trê s localidades. Nesse
perı́odo, fundou duas escolas cristã s de ensino
mé dio reconhecidas pelo governo, um sistema
deescolascristã scompostodedezestabelecimentoseaChristianHeritageCollege(Faculdade
HerançaCristã).
ODr.LaHayeescreveumaisde40livros,commaisde11milhõ esdeexemplaresimpressosem
32 idiomas, abordando uma ampla variedade de assuntos, tais como vida familiar, estados de
humor e profecias bı́blicas. Estas obras de icçã o, escritas em parceria com Jerry Jenkins —
Deixados para Trás, Comando Tribulação, Nicolae, A Colheita e Apoliom —, alcançaram o
primeiro lugar na lista dos livros cristã os mais vendidos. Outras obras escritas por ele:
Temperamento Controlado pelo Espírito; Como Ser Feliz Mesmo Sendo Casado; Revelation,
Illustrated and Made Plain (O Apocalipse Ilustrado e Simpli icado);Como Estudar Sozinho as
Profecias Bíblicas; Um Homem Chamado Jesus eEstamosVivendoosÚltimosDias? — publicados
pela Editora United Press —,No Fear of the Storm: Why Christians Will Escape Ali the
Tribulation (Sem Medo da Tempestade: Por Que os Cristã os Escaparã o do Perı́odo da
Tribulação);eDeixadosparaTrás—SérieTeen.
ODr.LaHayeé paidequatro ilhosetemnovenetos.Gostamuitodeesquiarnaneveenaá gua,
demotociclismo,degolfe,defériascomafamíliaedecaminhadas.
EsteePub teve como base a digitalizaçã o emRtf
feitaporumautordesconhecido.
Para esta formaçã o peguei como inspiraçã o a
ediçã o norte-americana mais recente, alé m da
formataçã o, iz a capa e a imagem utilizada na pá gina
comoslivrosdasérie.
Abrilde2014
LeYtor